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Efeito do anti-TNF-α em implantes endometriais no peritônio de ratas

Resumos

OBJETIVO: Avaliar o efeito da terapia anti-TNF-α no tratamento de implantes endometriais no peritônio de ratas. MÉTODOS: Os implantes endometrióticos foram induzidos cirurgicamente em 120 ratas Wistar-Albino. Os animais foram aleatoriamente distribuídos em 4 grupos. O grupo C (n=36) recebeu uma injeção intraperitoneal de 0,2ml de solução salina. O grupo L (n=41) recebeu uma injeção subcutânea de 1mg/kg de leuprolide. O grupo I5 (n=20) recebeu uma injeção subcutânea de 5mg/kg de anticorpo monoclonal anti-fator de necrose tumoral (TNF) a (infliximab). O grupo I10 (n=20) recebeu uma injeção subcutânea de 10mg/kg de infliximab. As ratas foram sacrificadas após 21 dias para se avaliar o tamanho dos implantes e a expressão do TNF-α. RESULTADOS: O tratamento com leuprolide promoveu uma redução absoluta na área de superfície do implante comparado com o grupo C (+14mm vs. 0mm; p=0,013) e com o grupo I10 (+14mm vs. +5mm; p=0,018). Da mesma forma, uma redução percentual da area de superfície do implante foi observada comparando o grupo L com o grupo C (+33,3% vs. 0%; p=0,005) e com o grupo I10 (+33,3% vs. +18,3%; p=0,027). O tratamento com infliximab não foi capaz de diminuir a área de superfície do implante comparado com o grupo C. A expressão de TNF-α reduziu nos grupos L, I5 e I10 comparado com o grupo C (505,6µm² vs. 660,5µm² vs. 317,2µm² vs. 2519,3µm², respectivamente; p<0,001). CONCLUSÃO: A terapia anti-TNF-α reduziu a expressão de TNF-α nos implantes endometrióticos mas não reduziu a área de superfície da lesão.

Endometriose; Fator de necrose tumoral alfa; Tumores do estroma endometrial; Peritônio; Experimentação animal


OBJECTIVE: To evaluate the effect of anti-TNF-α in the treatment of endometrial implants in the peritoneum of rats. METHODS: Endometrial implants were surgically induced in 120 female Wistar-Albino rats. The animals were randomly divided into four groups. Group C (n = 36) received an intraperitoneal injection of 0.2 ml of saline. Group L (n = 41) received a subcutaneous injection of 1mg/kg of leuprolide. Group I5 (n = 20) received a subcutaneous injection of 5mg/kg of monoclonal anti-tumor necrosis factor (TNF) a (infliximab). Group I10 (n = 20) received a subcutaneous injection of 10mg/kg of infliximab. The rats were sacrificed after 21 days to assess the size of the implants and the expression of TNF. RESULTS: Treatment with leuprolide (group L) promoted an absolute reduction in the surface area of the implant when compared with group C (+14 mm vs. 0mm, p = 0.013) and group I10 (+14 mm vs. +5 Mm, p = 0.018). Likewise, a percentage reduction of surface area of the implant was observed comparing group L with group C (+33.3% vs. 0%, p = 0.005) and group I10 (+33.3% vs. +18.3%, p = 0.027). Treatment with infliximab was not able to decrease the surface area of the implants when compared with group C. The expression of TNF-α in groups L, I5 and I10 was lower than in group C (505.6 mm² vs. 660.5 mm² vs. 317.2 mm² vs. 2519.3 mm², respectively; p <0.001). CONCLUSION: The anti-TNF-α therapy reduced the expression of TNF-α in endometriotic implants, but did not reduce the surface area of the lesion.

Endometriosis; Tumor necrosis factor alpha; Endometrial stromal tumors; Peritoneum; Animal experimentation


ARTIGO ORIGINAL

Efeito do anti-TNF-α em implantes endometriais no peritônio de ratas

William Kondo, ACBC-PRI; Eduardo Andreazza dal LagoII; Lucia de NoronhaIII; Marcia OlandoskiIV; Paulo Gustavo KotzeV; Vivian Ferreira do AmaralVI

IGinecologista e Cirurgião Geral, Mestrando do Setor de Ciências da Saúde da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUC-PR)

IIEstudante de Medicina da PUC-PR-BR

IIIPatologista do Laboratório de Patologia Experimental da PUC-PR-BR

IVEstatística da PUC-PR BR

VCirurgião Geral e Coloproctologista

VIProfessora Adjunta de Ginecologia da PUC-PR e da Pós-Graduação em Ciências da Saúde da PUC-PR-BR

Endereço para correspondência Endereço para correspondência: William Kondo Site: drwilliamkondo.site.med.br E-mail: williamkondo@yahoo.com

RESUMO

OBJETIVO: Avaliar o efeito da terapia anti-TNF-α no tratamento de implantes endometriais no peritônio de ratas.

MÉTODOS: Os implantes endometrióticos foram induzidos cirurgicamente em 120 ratas Wistar-Albino. Os animais foram aleatoriamente distribuídos em 4 grupos. O grupo C (n=36) recebeu uma injeção intraperitoneal de 0,2ml de solução salina. O grupo L (n=41) recebeu uma injeção subcutânea de 1mg/kg de leuprolide. O grupo I5 (n=20) recebeu uma injeção subcutânea de 5mg/kg de anticorpo monoclonal anti-fator de necrose tumoral (TNF) a (infliximab). O grupo I10 (n=20) recebeu uma injeção subcutânea de 10mg/kg de infliximab. As ratas foram sacrificadas após 21 dias para se avaliar o tamanho dos implantes e a expressão do TNF-α.

RESULTADOS: O tratamento com leuprolide promoveu uma redução absoluta na área de superfície do implante comparado com o grupo C (+14mm vs. 0mm; p=0,013) e com o grupo I10 (+14mm vs. +5mm; p=0,018). Da mesma forma, uma redução percentual da area de superfície do implante foi observada comparando o grupo L com o grupo C (+33,3% vs. 0%; p=0,005) e com o grupo I10 (+33,3% vs. +18,3%; p=0,027). O tratamento com infliximab não foi capaz de diminuir a área de superfície do implante comparado com o grupo C. A expressão de TNF-α reduziu nos grupos L, I5 e I10 comparado com o grupo C (505,6µm2 vs. 660,5µm2 vs. 317,2µm2 vs. 2519,3µm2, respectivamente; p<0,001).

CONCLUSÃO: A terapia anti-TNF-α reduziu a expressão de TNF-α nos implantes endometrióticos mas não reduziu a área de superfície da lesão.

Descritores: Endometriose. Fator de necrose tumoral alfa. Tumores do estroma endometrial. Peritônio. Experimentação animal.

INTRODUÇÃO

A endometriose é uma doença ginecológica benigna definida pela presença de tecido endometrial, consistindo de epitélio glandular e/ou estroma, fora da cavidade uterina1,2. Esta condição é predominantemente encontrada em mulheres em idade reprodutiva e afeta 7 a 10% de todas as mulheres, 71 a 87% das mulheres com dor pélvica crônica, e 38% das mulheres inférteis3.

Embora a fisiopatologia da endometriose seja pouco compreendida, a habilidade dos implantes endometrióticos se desenvolverem em localizações ectópicas pode estar relacionada à imunoreatividade aberrante decorrente das próprias lesões4. O ambiente peritoneal das mulheres com endometriose contém um rico coquetel de citocinas, substâncias angiogênicas e fatores de crescimento5 que é produzido principalmente pelas células peritoneais imunes e pelas células endometrióticas6.

O fator de necrose tumoral a (TNF-α) é uma citocina chave em uma variedade de processos inflamatórios, e é provável que ele tenha um papel na patogênese da endometriose4. Numerosos investigadores têm mostrado que as concentrações de TNF-α estão elevadas no fluido peritoneal de pacientes com endometriose e que os níveis se correlacionam com o estágio da doença7.

Os efeitos anti-inflamatórios do bloqueio do

TNF-α por anticorpos monoclonais (como o infliximab) ou por receptores solúveis do TNF-α (como o etanercept) têm sido demonstrados in vivo em modelos animais e também em humanos8. A efetividade clínica do bloqueio do TNF-α tem sido demonstrada em condições inflamatórias como a doença de Crohn e artrite reumatóide, mas não em endometriose acentuada9. Em babuínos com endometriose confirmada por laparoscopia, o bloqueio do TNF-α com receptores solúveis p55 de TNF-α resultou na inibição do desenvolvimento e do crescimento dos implantes de endometriose10. O tamanho das lesões peritoneais vermelhas diminuiu em comparação com o grupo controle11, mas não houve aumento das taxas de gravidez12.

Esta associação entre a endometriose e o aumento das citocinas abre a possibilidade para novas propostas de tratamento clínico, particularmente utilizando terapias anti-citocinas. A inflamação mediada pelo TNF-α pode ser um fator causal na dor associada com a endometriose e o bloqueio do TNF-α parece inibir o desenvolvimento da doença em modelos animais.

O objetivo deste trabalho foi avaliar o efeito da terapia anti-TNF-α no tratamento de implantes endometriais cirurgicamente induzidos no peritônio de ratas.

MÉTODOS

Cento e vinte ratas Wistar-Albino com peso entre 200 e 250g foram utilizadas para o experimento. Os animais foram provenientes do Biotério Central da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUC-PR). As ratas foram mantidas em gaiolas apropriadas com cinco animais, sob controle de temperatura, umidade e luminosidade do ambiente, e alimentadas com água e ração ad libitum. Após um período de adaptação de uma semana, os implantes endometriais foram cirurgicamente induzidos nos animais.

O estudo experimental foi realizado no Setor de Ciências Biológicas da PUC-PR, obedecendo a Lei Federal 11794 e as orientações do Colégio Brasileiro de Experimentação Animal. O protocolo experimental utilizado neste estudo foi aprovado pela Comissão de Ética em Pesquisas Animais do Setor de Ciências Biológicas da PUC-PR em 19 de agosto de 2008 (parecer número 243).

Procedimentos cirúrgicos

Primeira operação

Os procedimentos cirúrgicos foram realizados no Laboratório de Cirurgia Experimental da Disciplina de Técnica Operatória do Setor de Ciências da Saúde da PUC-PR.

Os implantes endometriais foram induzidos cirurgicamente utilizando a técnica descrita por Jones13 em 1984. Os animais foram anestesiados com injeção intraperitoneal de 50mg/kg de ketamina e 7mg/kg de xilazina14. Os animais foram imobilizados à mesa cirúrgica em decúbito dorsal, com os membros em abdução.

Foi realizada a limpeza mecânica e a antissepsia da região operatória utilizando solução de povidone-iodine com 1% de iodo ativo. Após a colocação dos campos cirúrgicos, foi realizada uma incisão mediana de aproximadamente 3cm, iniciando 2cm acima do púbis do animal, para a exposição dos órgãos reprodutivos da rata. O útero bicorno foi identificado e os vasos sangüíneos do corno uterino esquerdo foram ligados com fio de vicryl 3-0. Um segmento de 10mm do terço médio do corno uterino esquerdo foi ressecado e imerso em solução salina 0,9% a 4ºC por cerca de 2 minutos. Este segmento foi aberto na borda antimesentérica dando origem a um retalho, de onde foi removido um segmento de 5x5mm. O implante foi suturado à parede abdominal do lado direito da rata utilizando dois pontos simples de mononáilon 6-0, próximo a um vaso sanguíneo, de modo que a face endometrial sempre ficasse voltada para a cavidade abdominal (Figura 1). Após checar a hemostasia do corno uterino esquerdo e promover a limpeza da cavidade abdominal, a parede abdominal foi suturada, sendo o plano músculo-aponeurótico com sutura contínua de poliglactina 3-0 e a pele com sutura contínua de mononáilon 3-0. Nenhuma suplementação hormonal foi administrada antes ou após a laparotomia.


Após a primeira operação, todos os animais foram observados por 21 dias no Biotério sem nenhuma medicação, exceto analgesia pós-operatória com injeção intraperitoneal de dipirona na dose de 1mg para cada 100 gramas de peso a cada oito horas.

Três ratas foram a óbito durante o período entre a primeira e a segunda cirurgia. Na manhã do segundo procedimento cirúrgico, os animais foram aleatoriamente distribuídos em quatro grupos: Grupo C, grupo controle (n=36), recebeu uma injeção intraperitoneal de 0,2ml de solução salina 0,9% próximo ao implante; Grupo L, grupo controle positivo (n=41), foi tratado com agonista de GnRH (hormônio liberador de gonadotropina) com uma injeção subcutânea única de acetato de leuprolide em formulação de depósito (1 mg/kg de peso corporal; Lucrin; Abbott, Brasil®). A dose do acetato de leuprolide foi baseada em estudo prévio em que 1 mg/kg foi encontrada como ótima para ratas15; Grupo I5, grupo anti-TNF-α 5mg/kg (n=20), recebeu uma injeção subcutânea de 5mg/kg de anticorpo monoclonal anti-TNF-α (infliximab)16; Grupo I10, grupo anti-TNF-α 10mg/kg (n=20), recebeu uma injeção subcutânea de 10mg/kg de anticorpo monoclonal anti-TNF (infliximab)16.

Segunda operação

Cada rata foi anestesiada e uma laparotomia mediana foi realizada para comprovar macroscopicamente o desenvolvimento da lesão e a viabilidade do implante endometriótico. A área de superfície dos implantes foi aferida (altura x largura) em milímetros e anotada.

O grupo C recebeu uma injeção intraperitoneal de 0,2ml de solução salina próximo ao implante, o grupo L recebeu uma injeção subcutânea de acetato de leuprolide (1mg/kg), o grupo I5 recebeu uma injeção subcutânea de anti-TNF-α (5mg/kg) e o grupo I10 recebeu uma injeção subcutânea de anti-TNF-α (10mg/kg).

A laparotomia foi fechada e todas as ratas foram observadas por mais 21 dias.

Terceira operação

Três semanas após a segunda operação, a terceira laparotomia foi realizada. O efeito dos tratamentos sobre o implante endometriótico foi avaliado por meio da medida da área de superfície dos implantes (Figura 2). Os implantes foram excisados, fixados em formalina a 10% e processados para inclusão em parafina, para posterior análise morfológica junto ao Laboratório de Patologia Experimental da PUC-PR. Após o procedimento cirúrgico, as ratas sofreram eutanásia com ketamina.


Análise histológica

O patologista designado para avaliar as amostras desconhecia os grupos de tratamento. Os implantes endometriais fixados em formalina foram preparados em blocos de parafina, seccionados em uma espessura de 5µm (4 cortes por amostra), corados com hematoxilina e eosina e avaliados com microscópio ótico. A persistência de células epiteliais nos implantes endometrióticos foi avaliada semiquantitativamente 17: escore 3 = camada epitelial bem preservada; escore 2 = epitélio moderadamente preservado com infiltrado leucocitário; Escore 1 = epitélio mau preservado (apenas células epiteliais ocasionais); escore zero = nenhum epitélio (Figura 3).


Para a análise imuno-histoquímica das amostras foi utilizado o arranjo em matriz de amostras teciduais, ou tissue microarray (TMA), descrita por Kononen et al em 199818. Trata-se da construção de um bloco de parafina contendo fragmentos cilíndricos de amostras teciduais obtidas de dezenas de blocos de parafina originais. Os cilindros teciduais são dispostos no bloco receptor seguindo uma ordem pré-determinada.

Para a confecção das lâminas de tissue microarray, o implante endometrial foi identificado no exame histológico e um punch de 4mm da parede do cisto endometriótico foi realizado. Cada lâmina eletricamente carregada foi preparada com o material obtido do punch de 15 animais. A expressão do TNF-α foi avaliada utilizando um kit de imuno-histoquímica disponível comercialmente (mouse anti-human TNF alpha, Sinapse Biotecnologia Ltda, São Paulo, SP, Brasil®) e contada utilizando avaliação morfométrica digital. As imagens foram digitalizadas com uma câmera digital colorida (TV 0.45x Nikon lens, Tokyo, Japan®) adaptada ao microscópio (Nikon Eclipse E600, Tokyo, Japan®). As imagens foram analisadas utilizando o Programa Image Pro (Media Cybernetics), possibilitando que a expressão do TNF-α pudesse ser contada e integrada por área.

Análise estatística

Os quatro grupos foram comparados de acordo com as seguintes variáveis: redução absoluta da área da lesão, calculada pela subtração da área da lesão na terceira operação (após o tratamento) da área na segunda operação. Um valor positivo indicou uma redução na área da lesão e um valor negativo indicou um aumento da área; redução percentual da área da lesão, calculada dividindo a redução absoluta da área da lesão pela área na segunda cirurgia. O resultado foi multiplicado por 100. Um resultado positivo indicou uma redução na área da lesão e um resultado negativo indicou aumento da área; expressão do TNF-α na imuno-histoquímica.

Os resultados foram avaliados quanto à normalidade da distribuição pelo teste de Kolmogorov-Smirnov. As variáveis paramétricas com distribuição normal foram testadas por meio de análise de variância (ANOVA) e análise post hoc (correção de Bonferroni) para definir eventuais diferenças entre os grupos. Variáveis que não seguiram a distribuição normal foram analisadas pelo teste não paramétrico de Kruskal-Wallis com correção de Bonferroni. Os valores de p<0,05 foram considerados estatisticamente significativos. As variáveis de distribuição normal foram expressas como média ± desvio padrão. As variáveis que não seguiram a distribuição normal foram expressas como mediana (mínimo máximo).

RESULTADOS

Os implantes endometriais produziram lesões viáveis em todos os animais. Eles estavam bem vascularizados e aderidos ao peritônio da parede abdominal na segunda laparotomia.

A área dos implantes foi aferida na primeira (área 1), na segunda (área 2) e na terceira (área 3) operações (Tabela 1). Não houve diferença na área do segmento transplantado de endométrio na primeira operação. Houve um aumento da área do implante da primeira para a segunda cirurgia, mas os implantes do grupo C e do grupo L cresceram mais do que os implantes dos grupos I5 e I10 (p<0,001). Portanto, para fins de comparação do tratamento com leuprolide e anti-TNF-α, a área absoluta da lesão no terceiro procedimento não foi utilizada, mas sim as reduções absoluta e percentual da área da lesão.

A análise semiquantitativa da persistência de células epiteliais nos implantes endometriais (Tabela 2) não demonstrou diferença estatisticamente significativa entre os grupos (p=0,06).

Comparando os quatro grupos observamos redução absoluta e percentual estatisticamente significativa na área do implante da segunda para a terceira operação (Tabela 3). Houve uma redução absoluta estatisticamente significativa na área do implante apenas quando se comparou o grupo L com o grupo C (p=0,013) e com o grupo I10 (p=0,018). Do mesmo modo, houve uma redução percentual estatisticamente significativa na área do implante quando se comparou o grupo L com o grupo C (p=0,005) e com o grupo I10 (p=0,027). As demais comparações entre os grupos não revelaram diferença estatística na redução absoluta ou percentual da área dos implantes.

A análise imuno-histoquímica das amostras utilizando o arranjo em matriz de amostras teciduais permitiu a avaliação objetiva da expressão do TNF-α (Tabela 4). Houve uma redução estatisticamente significativa na expressão do TNF-α no implante endometriótico quando se comparou o grupo L com o grupo C (p<0.001), quando se comparou o grupo I5 ao grupo C (p<0.001) e quando se comparou o grupo I10 ao grupo C (p<0.001).

DISCUSSÃO

O tratamento clínico tem um papel substancial no tratamento da dor associada à endometriose19,20. O acetato de medroxiprogesterona, o danazol, os anticoncepcionais orais e os análogos de GnRH são todos efetivos na redução da intensidade dos sintomas dolorosos causados pela endometriose. No entanto, a recorrência dos sintomas é comum após a interrupção do tratamento clínico19,20 e ele não tem benefício nenhum na infertilidade associada à endometriose21. Portanto, novos tratamentos clínicos mais efetivos do que os tratamentos hormonais

são necessários para um melhor controle e tratamento da doença.

Os modelos animais permitem o estudo de eventos envolvendo a fisiopatologia da endometriose assim como novas abordagens terapêuticas para esta doença15,22. Modelos animais utilizando primatas e não primatas têm sido utilizados para o estudo da endometriose há anos. Não primatas, incluindo roedores, não apresentam endometriose espontânea, mas ela pode ser induzida utilizando tecido uterino autólogo ou endométrio humano. Os primatas desenvolvem endometriose espontaneamente, e a doença também pode ser induzida com propósito de pesquisa. As vantagens do modelo utilizando não primatas incluem a seu relativo baixo custo e a habilidade de se estabelecer lesões semelhantes à endometriose22. O autotransplante de segmentos uterinos à cavidade peritoneal é um método bem estabelecido para a indução de implantes endometriais em ratas23-26.

Embora a expressão "endometriose experimental" seja usada na literatura, o presente estudo envolveu o implante de fragmentos de endométrio na cavidade peritoneal de ratas sadias. A real correlação existente entre estes implantes de tecido endometrial induzidos cirurgicamente e a endometriose que se desenvolve nas mulheres é incerta. No entanto, a ampla utilização de protocolos de pesquisa de "endometriose experimental" em modelos animais é justificada, uma vez que a avaliação completa e o acompanhamento das lesões de endometriose em humanos é difícil e muitas vezes não factível, pois os métodos diagnósticos são invasivos (laparoscopia ou laparotomia).

O presente estudo demonstrou que, em modelo animal utilizando ratas, o tratamento com anticorpo monoclonal anti-TNF-α (infliximab) diminuiu a expressão do TNF-α nos implantes endometrióticos, porém não foi efetivo em reduzir a área dos implantes endometriais. Apenas a terapia com leuprolide foi capaz de reduzir a área de superfície dos implantes endometriais.

Há evidência substancial de que fatores imunológicos têm um papel importante na patogênese da endometriose6,27. O aumento das citocinas inflamatórias (IL-1a, IL-6, IL-8. IL-18, TNF-α) tem sido relatado em pacientes portadoras de endometriose6,28,29. O TNF-α tem um papel chave em vários processos inflamatórios. É produzido pelos macrófagos, células natural killer, neutrófilos e várias células não hematopoiéticas, incluindo células endometrióticas epiteliais e estromais. Embora o TNF-α tenha sido inicialmente identificado por sua citotoxicidade contra certas linhagens celulares, sua função primária (associado à IL-1) é de iniciar a cascata de fatores associados à resposta inflamatória. Tem sido demonstrado que o TNF-α estimula a produção de prostaglandinas por células epiteliais endometriais em cultura30 e promove a aderência de células estromais cultivadas às células mesoteliais31. Estes achados indicam que o TNF-α possa ser um fator do fluido pélvico mediador do estabelecimento dos implantes endometrióticos. Vários autores têm demonstrado que as concentrações do TNF-α no fluido peritoneal de mulheres com endometriose estão elevadas32-34. Alguns investigadores também sugerem que os níveis do TNF-α no fluido peritoneal podem estar correlacionados com a intensidade da dismenorréia35.

Em nosso estudo, demonstramos a diminuição na expressão do TNF-α no implante endometriótico nos grupos L (505,6µm2; p<0.001), I5 (660,5µm2; p<0.001) e I10 (317,2µm2; p<0.001) comparado com o grupo C (2519.3µm2). No entanto, a redução da expressão do TNF-α foi semelhante utilizando a terapia com leuprolide e com anti-TNF-α em ambas as doses. Apesar dessa redução da expressão do TNF-α, não houve redução absoluta ou percentual significativa na área de superfície dos implantes endometrióticos no grupo tratado com anti-TNF-α comparado com o grupo controle. Apenas o tratamento com leuprolide reduziu a área de superfície dos implantes endometriais comparado com o grupo controle e com o grupo I10. O grupo tratado com a dose de 10mg/kg de anticorpo monoclonal anti-TNF apresentou a maior redução da expressão do TNF-α no implante e, mesmo assim, o tratamento com leuprolide apresentou redução estatisticamente significativa da área de superfície dos implantes endometriais comparado com este grupo, mostrando que apenas a redução da inflamação não é suficiente para reduzir a área das lesões endometrióticas. As doses de 5mg/kg e 10mg/kg foram baseadas em um estudo prévio utilizando o infliximab em modelo experimental de colite em ratos16.

Achados negativos já haviam sido encontrados com o uso da terapia anti-TNF-α em endometriose. Em 2008, Koninckx et al8 avaliaram 21 mulheres portadoras de endometriose, com sintomatologia dolorosa importante e nódulo retovaginal de pelo menos 1cm. Elas receberam infliximab (5mg/kg) (n=14) ou placebo (n=7) e foram operadas três meses mais tarde. Os autores não observaram redução da dor associada à endometriose no grupo tratado com infliximab comparado ao grupo placebo e também relataram que a falta de eficácia do infliximab como um tratamento para a dor associada à endometriose foi inesperada, uma vez que sempre se acreditou que a inflamação seria a maior causa de dor na endometriose. Falconer et al12 estudaram o papel da inibição do TNF-α utilizando um anticorpo monoclonal anti-TNF na subfertilidade associada à endometriose em babuínos e observaram que não houve melhora significativa nas taxas de gravidez, taxas de fecundidade por ciclo, tempo mediano para a gravidez e taxa de gravidez cumulativa comparado ao grupo placebo. Uma revisão sistemática 36 que teve como objetivo determinar a efetividade e a segurança das drogas anti-TNF-α no manejo da dor pélvica associada à endometriose concluiu que não há evidência para embasar o uso dessas drogas no tratamento de mulheres com endometriose com o intuito de melhorar a dor pélvica.

Em nosso modelo animal, demonstramos a redução da expressão do TNF-α nos implantes endometrióticos com o uso de terapia anti-TNF-α e com leuprolide. No entanto, a redução do TNF-α promovida pela terapia anti-TNF-α não se correlacionou com a regressão da área de superfície da lesão, ao contrário do que foi observado com o uso de leuprolide. Conseqüentemente, a simples redução local da inflamação parece não ser suficiente para diminuir a área de superfície dos implantes endometrióticos.

Recebido em 05/08/2010

Aceito para publicação em 06/10/2010

Conflito de interesse: nenhum

Fonte de financiamento: nenhuma

Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUC-PR), Curitiba, Paraná, Brasil.

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  • Endereço para correspondência:
    William Kondo
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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      26 Set 2011
    • Data do Fascículo
      Ago 2011

    Histórico

    • Aceito
      06 Out 2010
    • Recebido
      05 Ago 2010
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