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Esclarecer o idoso sobre o exame digital retal diminui o desconforto na sua primeira realização?

Resumos

OBJETIVO: Verificar o grau de desconforto referido por homens idosos que realizam pela primeira vez o exame digital retal (EDR) na prevenção do câncer de próstata e o efeito de esclarecimentos prévios sobre essa queixa. MÉTODOS: Estudo prospectivo e aleatório em 120 homens, com idade de 60 a 80 anos, distribuídos em dois grupos: grupo A (consulta médica rotineira) e grupo B (consulta médica com intervenção educativa). No grupo B, os instrumentos de informação foram: palestra informal com esclarecimentos sobre EDR e câncer de próstata, visualização de maquete da pelve masculina, mostruário com as relações anatômicas prostáticas, simulador do EDR e DVD com animação tridimensional dos órgãos pélvicos. O grau de desconforto foi medido através da escala visual de dor. Utilizou-se o teste do qui-quadrado, com significância de 0,05. RESULTADOS: Houve diferença significativa entre o grau de desconforto referido no EDR entre os dois grupos, 81% do grupo B referiram-no como leve e 80% do grupo A, como moderado ou intenso, com p significativo de 0,01. Os sinais e sintomas foram a principal razão da consulta em 35% dos pacientes, 78% foram à consulta sozinhos e 81% comentaram o exame com a parceira. Sem diferença estatística, 94,2% no grupo A e 97,8% no grupo B repetiriam o exame no ano seguinte e 91,6% no grupo A e 96,6% no grupo B relataram que o exame não foi pior do que imaginavam. Todos recomendariam o EDR para parentes ou amigos. CONCLUSÃO: Os pacientes que fizeram o EDR pela primeira vez após consulta urológica com esclarecimentos educativos prévios sobre o tema referiram significativamente menor desconforto.

Saúde do homem; Idoso; Neoplasias da próstata; Exame digital retal


OBJECTIVE: To assess the degree of discomfort reported by elderly men when first submitted to digital rectal examination (DRE) in the prevention of prostate cancer and the effect of previous explanations on this complaint. METHODS: A prospective, randomized study in 120 men aged 60 to 80 years, divided into two groups: group A (routine medical appointment) and group B (medical appointment with educational intervention). In group B, the information tools were informal talk with explanations of DRE and prostate cancer, visualization of model of the male pelvis and the anatomical relations with the prostate, DRE simulator and DVD with three-dimensional animation of the pelvic organs. The degree of discomfort was measured by visual scale of pain. We used the chi-square test, with significance at 0.05. RESULTS: There were significant differences between the degree of discomfort mentioned in DRE between the two groups; 81% of group B reported it as mild, while 80% of group A referred it as moderate or intense, with significant p=0.01. The signs and symptoms were the main reason for consultation in 35% of patients; 78% went to be consulted alone and 81% commented on their own examination with their spouses. With no statistical difference, 94.2% in group A and 97.8% in group B repeated the examination the following year and 91.6% in group A and 96.6% in group B reported that the exam was not worse than imagined. All would recommend DRE for relatives or friends. CONCLUSION: Patients who did the first DRE after urological consultation with prior educational clarification on the issue reported significantly less discomfort.

Men's health; Aged; Prostatic neoplasms; Digital Rectal Examination


ARTIGOS ORIGINAIS

Esclarecer o idoso sobre o exame digital retal diminui o desconforto na sua primeira realização?

Does clarifyng the digital rectal examination to the elderly reduce the discomfort in its first execution?

Bruno Vilalva MestrinhoI; Lucy GomesII; José Luiz Telles de AlmeidaIII; José Carlos de AlmeidaIV; Renata Verna Leal de OliveiraV

IMestre em Gerontologia pela Universidade Católica de Brasilia, DF-BR

IIDoutora em Fisiologia Respiratória pela Universidade de Londres, Inglaterra

IIIDoutor em Saúde Publica pela Fiocruz, RJ- BR

IVDoutor em Patologia Molecular pela Universidade de Brasilia, DF-BR

VPós-Graduada em Psiquiatria pelo IPEMED, SP-BR

Endereço para correspondência Endereço para correspondência: Bruno Vilalva Mestrinho E-mail: bruno.mestrinho@gmail.com

RESUMO

OBJETIVO: Verificar o grau de desconforto referido por homens idosos que realizam pela primeira vez o exame digital retal (EDR) na prevenção do câncer de próstata e o efeito de esclarecimentos prévios sobre essa queixa.

MÉTODOS: Estudo prospectivo e aleatório em 120 homens, com idade de 60 a 80 anos, distribuídos em dois grupos: grupo A (consulta médica rotineira) e grupo B (consulta médica com intervenção educativa). No grupo B, os instrumentos de informação foram: palestra informal com esclarecimentos sobre EDR e câncer de próstata, visualização de maquete da pelve masculina, mostruário com as relações anatômicas prostáticas, simulador do EDR e DVD com animação tridimensional dos órgãos pélvicos. O grau de desconforto foi medido através da escala visual de dor. Utilizou-se o teste do qui-quadrado, com significância de 0,05.

RESULTADOS: Houve diferença significativa entre o grau de desconforto referido no EDR entre os dois grupos, 81% do grupo B referiram-no como leve e 80% do grupo A, como moderado ou intenso, com p significativo de 0,01. Os sinais e sintomas foram a principal razão da consulta em 35% dos pacientes, 78% foram à consulta sozinhos e 81% comentaram o exame com a parceira. Sem diferença estatística, 94,2% no grupo A e 97,8% no grupo B repetiriam o exame no ano seguinte e 91,6% no grupo A e 96,6% no grupo B relataram que o exame não foi pior do que imaginavam. Todos recomendariam o EDR para parentes ou amigos.

CONCLUSÃO: Os pacientes que fizeram o EDR pela primeira vez após consulta urológica com esclarecimentos educativos prévios sobre o tema referiram significativamente menor desconforto.

Descritores: Saúde do homem. Idoso. Neoplasias da próstata / Prevenção e controle. Exame digital retal.

ABSTRACT

OBJECTIVE: To assess the degree of discomfort reported by elderly men when first submitted to digital rectal examination (DRE) in the prevention of prostate cancer and the effect of previous explanations on this complaint.

METHODS: A prospective, randomized study in 120 men aged 60 to 80 years, divided into two groups: group A (routine medical appointment) and group B (medical appointment with educational intervention). In group B, the information tools were informal talk with explanations of DRE and prostate cancer, visualization of model of the male pelvis and the anatomical relations with the prostate, DRE simulator and DVD with three-dimensional animation of the pelvic organs. The degree of discomfort was measured by visual scale of pain. We used the chi-square test, with significance at 0.05.

RESULTS: There were significant differences between the degree of discomfort mentioned in DRE between the two groups; 81% of group B reported it as mild, while 80% of group A referred it as moderate or intense, with significant p=0.01. The signs and symptoms were the main reason for consultation in 35% of patients; 78% went to be consulted alone and 81% commented on their own examination with their spouses. With no statistical difference, 94.2% in group A and 97.8% in group B repeated the examination the following year and 91.6% in group A and 96.6% in group B reported that the exam was not worse than imagined. All would recommend DRE for relatives or friends.

CONCLUSION: Patients who did the first DRE after urological consultation with prior educational clarification on the issue reported significantly less discomfort.

Key words: Men's health. Aged. Prostatic neoplasms / prevention and control. Digital Rectal Examination.

INTRODUÇÃO

Os homens ainda conservam preconceitos relacionados ao exame digital retal (EDR). O medo e a desinformação, apesar das campanhas recentes promovidas pela Sociedade Brasileira de Urologia (SBU) e pelo INCA, colaboram para que doenças prostáticas continuem sendo um problema grave de saúde1.

Estimou-se que 52.350 homens brasileiros morreram por câncer da próstata no ano de 2010. Esta doença predomina nos homens idosos, sendo que 75% dos pacientes acometidos têm mais de 65 anos2. Contrapondo-se a estas estimativas incômodas, entre 70% e 98% dos pacientes são hoje curados quando a doença é descoberta precocemente, com o tumor ainda confinado aos limites da glândula3.

O EDR é rápido, de baixo custo e de fácil realização, permitindo conhecer as dimensões, o formato e os limites da próstata, bem como a presença de deformidades, abaulamentos, alterações da consistência e da mobilidade dessa glândula1. O urologista, ao prestar esclarecimentos sobre a próstata e ao transmitir segurança no momento em que realiza o EDR, difunde a importância da consulta urológica, assim como fortalece o vínculo da relação médico-paciente. O paciente deve ser informado sobre o objetivo do exame, gerando enorme conforto quando não se detectam irregularidades ou nódulos endurecidos4.

Uma pesquisa realizada pela SBU em 10 capitais brasileiras, com 1061 homens de 40 a 70 anos de idade, mostrou que 76% deles afirmaram não ter conhecimento sobre o EDR para detecção do câncer de próstata. Apenas 32% confirmaram já ter realizado esse procedimento, sendo que a televisão, em especial a de canais abertos, foi a principal fonte de informação sobre a saúde prostática na metade deles5.

Alegado preconceito cultural explica o porquê da maioria dos homens resistirem ao EDR, sendo considerado uma ferida em sua masculinidade. Por outro lado, a maioria dos pacientes, que já se submeteram ao exame, aceitam repeti-lo sem restrições6.

O trabalho atual se justifica pela escassa informação no nosso meio sobre o desconforto referido no primeiro EDR realizado para prevenção do câncer de próstata em homens idosos. Assim sendo, objetivou-se verificar o grau desse desconforto quando da realização do primeiro exame e o efeito benéfico de esclarecimentos educativos prévios nessa queixa.

MÉTODOS

Trata-se de estudo comparativo, prospectivo e aleatório, realizado no período de janeiro de 2010 a fevereiro de 2011. A casuística foi formada por 120 pacientes idosos, idade de 60 a 80 anos, atendidos de forma consecutiva pelo mesmo médico urologista em ambulatório da especialidade no Hospital Regional do Gama, Distrito Federal. Os critérios de inclusão foram: não ter realizado previamente o EDR e ter assinado o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, e os critérios de exclusão: ser portador de diabetes, infecção urogenital, patologias ou cirurgias ano-orificiais, distúrbios mentais ou de cognição; ou fazer uso de psicotrópicos, terapias analgésico-sedativas e sonda vesical.

Foram estudados dois grupos: grupo-controle (grupo A), constituído de 60 pacientes, submetido à consulta urológica rotineira de 15 minutos; e grupo sob intervenção (grupo B), com 60 pacientes submetidos à consulta pormenorizada, com esclarecimentos verbais e visuais sobre o EDR e o câncer de próstata. Inicialmente, a fim de verificar o grau de cognição, em todos os pacientes foi aplicado o Mini Exame do Estado Mental7 utilizando-se o ponto de corte segundo a escolaridade8. Os seguintes dados clínico-demográficos foram coletados: idade, etnia, estado civil, escolaridade, aposentadoria, salário mínimo, histórico familiar de câncer de próstata e de mama, preferência sexual, se vida sexual ativa e se portador de disfunção erétil. Foram realizados também exame sumário de urina, cultura da urina e de esperma, dosagem do PSA e ultrassonografia prostática. Antes da consulta, todos pacientes foram interrogados sobre os motivos da vinda ao hospital e se vieram acompanhados. Após a execução do EDR, os mesmos foram questionados se repetiriam esse exame nos próximos anos, se o recomendariam para parentes ou amigos e se havia sido pior do que imaginavam.

No grupo B, foram prestados esclarecimentos educativos sob a forma de palestra informal interativa ministrada pelo pesquisador principal, com duração de 50 minutos, explicando-se durante a mesma qual a posição adotada para a execução do referido exame. Após a palestra, esses pacientes tiveram acesso durante 30 minutos ao mostruário da próstata e suas doenças, à maquete da pelve masculina, ao simulador do exame digital retal e ao DVD do Projeto Homem Virtual, com a participação ativa dos mesmos. O simulador utilizado é modelo útil para definir o tamanho e a consistência da próstata, sendo ferramenta para treinamento de médicos e de estudantes de medicina na realização do EDR9. O Projeto Homem Virtual disponibiliza material moderno, para fins educacionais, através de mídia interativa com fundamentos de anatomia, fisiologia, patologia e operações mais comuns da pelve masculina são apresentadas em tecnologia tridimensional e dinâmicas desenvolvidas por computação gráfica10.

O EDR foi realizado em outro consultório, adotando a posição de litotomia e aplicando-se previamente lubrificação com vaselina líquida. Após o exame, outro médico urologista questionou sobre o grau de desconforto pós-exame, utilizando a escala visual da dor, na qual: 0 a 2 é considerado desconforto leve, 3 a 7 moderado e 8 a 10 intenso11.

O estudo estatístico foi realizado com o teste de qui-quadrado, considerando-se como significativo o valor de p d"0,05. Alguns dos resultados foram apresentados como média e desvio-padrão.

O estudo foi submetido ao Comitê de Ética em Pesquisa das Faculdades Integradas do Planalto Central, DF, sendo aprovado com o parecer nº 13/2010.

RESULTADOS

Não houve perda amostral no presente estudo. A análise dos dados clínico-demográficos mostrou não haver diferença significativa dos mesmos nos pacientes dos grupos A e B (Tabela 1). Apresentaram hematúria microscópica 5 (8,3%) pacientes no grupo A e 3 (5,0%) no grupo B (p=0,09). Entre estes pacientes, 1 (0,8%) apresentava cisto renal gigante e o outro teve diagnóstico de câncer de rim localizado. Os outros pacientes foram considerados como portadores de hematúria de causa idiopática.

Quanto ao motivo da consulta nos grupos A e B, os sinais e sintomas urológicos predominaram em 35% dos pacientes, tendo ocorrido procura espontânea em 33%, a pedido familiar em 17% e encaminhamento por médico em 7%. A procura ao urologista foi motivada por queixas urinárias em 89,1% dos pacientes.

A maioria dos homens foi à consulta sem acompanhante (78%). Quando acompanhados, a maioria foi trazida pela esposa (45%), pela filha (30%) ou pelo filho (25%), sem diferença significativa entre os grupos (p=0,85).

O escore do grau de desconforto no EDR no grupo A foi de 5,06 e no grupo B de 1,31, com diferença significativa (p=0,02). No grupo A, 15% das respostas referiram escore 0 de desconforto, enquanto 6,6% referiram escore 10. No grupo B, 36,6% das respostas referiram escore 0 e nenhum paciente referiu escore 10.

A figura 1 mostra a estratificação do desconforto em leve, moderado e severo nos dois grupos. No grupo A, 80% dos pacientes referiram o desconforto como moderado e intenso e no grupo B, o desconforto como leve foi referido em 81%, com diferença significativa (p=0,01).]


Os 120 pacientes recomendariam o EDR para parentes ou amigos. Em relação à repetição do exame nos próximos anos, não surgiu diferença significativa entre as respostas dos grupos A (94,2%) e B (97,8%) (Figura 2).


Quando interrogados se o EDR foi pior do que imaginavam, 91,6% responderam que não no grupo A e 96,6% no grupo B, também sem diferença significativa entre os dois grupos (Figura 3).


DISCUSSÃO

No presente estudo, ter assistido à palestra e ter participado ativamente da apresentação dos recursos iconográficos contribuiu significativamente para diminuir o grau de desconforto durante a realização do primeiro EDR. Com relação ao grau do desconforto referido, o grupo sob intervenção obteve o escore médio de 1,31, sendo de 5,06 no grupo-controle, com diferença significativa, confirmando o impacto positivo dos esclarecimentos prévios.

O escore de 5,06 na escala visual para verificar o grau de desconforto ao EDR no grupo submetido à consulta urológica de rotina foi considerado alto, sendo comparável ao obtido nos pacientes com dores ósteo-musculares, consideradas de moderada intensidade e com necessidade, dentre outras medidas, do uso de opióides fracos para seu correto manejo11. Neste contexto, insere-se não só o desconforto físico, mas seguramente o impacto psicológico do EDR. Esse exame é uma prática que pode suscitar no homem o medo de ser tocado na "sua parte inferior". O toque, que remonta ao ato de penetração, pode estar associado à dor, tanto física quanto simbólica. Pelo modelo hegemônico de masculinidade, o homem foi criado desde criança a ter a região anal como espaço interdito, a ser o agente ou o penetrador. Assim, o exame do toque representaria justamente o contrário, o passivo ou o penetrado12.

No presente estudo, sinais e sintomas urológicos predominaram entre os motivos da consulta, referidos em 35% dos pacientes, seguidos de procura espontânea em 33% e encaminhamento em 24%, sendo que apenas 19,1% dos pacientes estavam assintomáticos do ponto de vista urinário. Estudo epidemiológico realizado no estado de São Paulo com 1915 pacientes portadores de câncer de próstata mostrou os seguintes motivos para que os mesmos procurassem o urologista: encaminhamento médico em 38%, de forma espontânea em 31%, por apresentarem sinais e sintomas em 15%, devido a campanhas públicas ou privadas em 12%, por indicação de familiares e não souberam responder em 2% cada um1. No estudo atual, a procura ativa por tratamento ambulatorial ocorreu predominantemente nos pacientes com intenção curativa, devido em parte à dificuldade na marcação de consultas médicas por essa população carente estudada, proveniente da periferia do Distrito Federal. Tal fato pode ter contribuído para o escore elevado encontrado no grupo-controle, que não teve esclarecimentos sobre o tema. É importante assinalar que todos os pacientes examinados estavam atrasados na realização do primeiro exame em pelo menos 15 a 20 anos, de acordo com a SBU13.

Pesquisa brasileira envolvendo 269 pacientes em programa institucional para detecção de câncer da próstata em homens acima de 45 anos revelou que a expectativa negativa antes do exame mudou significativamente após o mesmo, encontrando escore de 1,69 na escala visual de dor, havendo em 98,1% deles intenção de retorno no ano seguinte14. Este último dado esta de acordo com nosso achado, pois dos 120 pacientes estudados na atual pesquisa, 96,5% assumiram retornar nos anos seguintes.

No presente estudo, 94,1% dos pacientes, independente do grupo a qual pertenciam, afirmaram não ter achado o exame tão ruim. O menor grau de desconforto referido no grupo sob intervenção se deveu provavelmente aos esclarecimentos prévios e à exposição dos recursos iconográficos fornecidos pelo urologista. Deve ser ressaltado o valor da relação médico-paciente, que ocorreu em maior tempo e profundidade no grupo sob intervenção. Tal fato foi comprovado pelo desconforto leve no grupo B (81%) e moderado e intenso no grupo A (80%), com p significativo de 0,01.

Mesmo com o escore de desconforto ao EDR elevado, os pacientes do grupo-controle afirmaram que não acharam o exame tão ruim. Isto provavelmente ocorreu devido à percepção contraditória do homem idoso brasileiro de que o EDR é ruim, dando-se conta que esse exame não é tão desconfortável como imagina após sua primeira execução. O preconceito e o desconhecimento do tema contribuem fortemente para tal expectativa.

Pesquisa da Unicamp mostrou que 60% dos homens acharam o EDR melhor do que imaginavam e 7% o acharam pior do que supunham, sendo que 90% deles estavam dispostos a repeti-lo regularmente. Neste estudo, não surgiu diferença no comportamento em relação ao EDR nas diversas camadas sociais, educacionais e econômicas15. Outro dado interessante desse estudo é que 60% dos homens que procuraram pela primeira vez o urologista para saber da saúde prostática foram trazidos por terceiros, principalmente do sexo feminino, ou seja, pelas filhas ou parceiras. No estudo atual, dos 26 pacientes que compareceram acompanhados na consulta, 75% vieram com as parceiras ou filhas, predominando as primeiras. Entre os 100 pacientes que tinham parceiras, 81% comentaram sobre o exame com as mesmas, ocorrendo reação favorável à realização do EDR em todas elas. Da mesma maneira, houve recomendação do EDR para familiares e amigos em todos os 120 pacientes.

A tecnologia médica pode levar o médico a subestimar o valor da semiologia, sendo o EDR uma forma de resgate da propedêutica clássica, reforçando a relação médico-paciente. Os esclarecimentos fornecidos pelo médico são insubstituíveis, levando à superação rápida do estigma do EDR a partir do primeiro exame, tornando rotina sua repetição nos anos subseqüentes.

No estudo atual, conclui-se que o desconforto no EDR pode ser significativamente reduzido por ações coletivas, como palestras para o público-alvo e esclarecimentos no momento pré-exame, utilizando recursos iconográficos modernos. Sugere-se que autoridades e profissionais da área de saúde, após instituição da Política Nacional da Saúde do Homem em 2009, em especial os urologistas, estimulem a execução do EDR, instituindo, como uma das propostas para diminuir o desconforto do mesmo, o uso do esclarecimento prévio. Pesquisas futuras devem aferir o desconforto psicológico ou simbólico do EDR, assim como a razão dos homens brasileiros não procurarem o médico para se submeterem à avaliação urológica em época mais precoce, a fim de detectarem o câncer de próstata em fase inicial.

Recebido em 07/03/2011

Aceito para publicação em 08/05/2011

Conflito de interesse: nenhum

Fonte de financiamento: nenhum

Trabalho realizado no Serviço de Urologia do Hospital Regional do Gama - Distrito Federal - BR.

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  • Endereço para correspondência:
    Bruno Vilalva Mestrinho
    E-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      02 Fev 2012
    • Data do Fascículo
      Dez 2011

    Histórico

    • Recebido
      07 Mar 2011
    • Aceito
      08 Maio 2011
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