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O emprego do cateter duplo J diminui as complicações na ureterolitotomia retroperitoneoscópica

Resumos

OBJETIVO: Avaliar os resultados da ureterolitotomia retroperitoneoscópica no tratamento do cálculo ureteral e a necessidade do cateter duplo J para reduzir complicações relacionadas ao procedimento. MÉTODOS: Estudo retrospectivo comparativo de 47 pacientes operados pela técnica de ureterolitotomia retroperitoneoscópica, dos quais 31 foram selecionados e divididos em dois grupos: Grupo 1, cujos pacientes não receberam cateter duplo J, e Grupo 2, que foram submetidos ao implante de cateter duplo J transoperatório. Foram coletados dados de urografia excretora pré e pós-operatória, tempo cirúrgico, analgesia pós-operatória, tempo de internação e retirada do dreno. RESULTADOS: Os grupos foram semelhantes quando comparados na idade e sexo, grau de dilatação do trato urinário, posição e tamanho médio do cálculo (Grupo 1= 15,5 ± 6,6mm; Grupo 2= 16,3 ± 6,1mm). O tempo operatório também não teve diferença significativa (Grupo 1= 130 ± 40,3min; Grupo 2= 136,3 ± 49,3min). O Grupo 1 apresentou seis pacientes (37,5 %) com complicações precoces (quatro casos de fístula urinária) e tardias (um caso de estenose de ureter, um caso de exclusão funcional do rim operado), enquanto o Grupo 2 não teve complicações, sendo esta diferença estatisticamente significativa (p=0,011). CONCLUSÃO: O emprego do cateter duplo J foi associado a um número significativamente menor de complicações na ureterolitotomia retroperitoneoscópica. Tempo cirúrgico, analgesia pós-operatória e tempo de internação foram semelhantes entre os grupos com e sem cateter.

Cálculos ureterais; Cirurgia geral; Cateterismo ureteral; Espaço retroperitoneal; Laparoscopia


OBJECTIVE: To evaluate the retroperitoneoscopic ureterolithotomy in the treatment of ureteral calculi and the need for double-J catheter to reduce the procedure-related complications. METHODS: We conducted a retrospective study with 47 patients submitted to retroperitoneoscopic ureterolithotomy, of which 31 were selected and divided into two groups: Group 1, whose patients did not have double-J catheter placement, and Group 2, who underwent perioperative double-J catheter implantation. Data collected comprised pre-and post-operative excretory urography, operative time, postoperative analgesia, length of hospital stay and catheter removal. RESULTS: The groups were similar as for age and gender, degree of dilation of the urinary tract, position and average size of the calculi (Group 1 = 15.5 ± 6.6 mm, Group 2 = 16.3 ± 6.1 mm). Operative time was also not significantly different (Group 1 = 130 ± 40.3 min, Group 2 = 136.3 ± 49.3 min). Group 1 had six patients (37.5%) with early (four cases of urinary fistula) and late complications (one case of stenosis of the ureter, one case of functional exclusion of the operated kidney), while Group 2 had no complications. This difference was statistically significant (p = 0.011). CONCLUSION: The use of double-J catheter was associated with significantly fewer complications in retroperitoneoscopic ureterolithotomy. Surgical time, postoperative analgesia and length of stay were similar between groups with and without catheter.

Ureteral calculi; General surgery; Urinary catheterization; Retroperitoneal space; Laparoscopy


ARTIGO ORIGINAL

O emprego do cateter duplo J diminui as complicações na ureterolitotomia retroperitoneoscópica

Alexandre Cavalheiro CavalliI; Renato Tambara FilhoII; Luiz Edison SlongoIII; Rafael Cavalheiro CavalliIV; Luiz Carlos de Almeida RochaV

IProfessor Assistente de Urologia da Universidade Estadual de Ponta Grossa-PR-BR

IIProfessor Associado de Urologia da Universidade Federal do Paraná (UFPR)-PR-BR

IIIProfessor Adjunto de Urologia da UFPR-PR-BR

IVMédico Residente em Urologia do Hospital de Clínicas da UFPR-PR-BR; 5. Professor Titular de Urologia da UFPR-PR-BR

Endereço para correspondência Endereço para correspondência: Alexandre Cavalheiro Cavalli E-mail: alexandrecavalli@hotmail.com

RESUMO

OBJETIVO: Avaliar os resultados da ureterolitotomia retroperitoneoscópica no tratamento do cálculo ureteral e a necessidade do cateter duplo J para reduzir complicações relacionadas ao procedimento.

MÉTODOS: Estudo retrospectivo comparativo de 47 pacientes operados pela técnica de ureterolitotomia retroperitoneoscópica, dos quais 31 foram selecionados e divididos em dois grupos: Grupo 1, cujos pacientes não receberam cateter duplo J, e Grupo 2, que foram submetidos ao implante de cateter duplo J transoperatório. Foram coletados dados de urografia excretora pré e pós-operatória, tempo cirúrgico, analgesia pós-operatória, tempo de internação e retirada do dreno.

RESULTADOS: Os grupos foram semelhantes quando comparados na idade e sexo, grau de dilatação do trato urinário, posição e tamanho médio do cálculo (Grupo 1= 15,5 ± 6,6mm; Grupo 2= 16,3 ± 6,1mm). O tempo operatório também não teve diferença significativa (Grupo 1= 130 ± 40,3min; Grupo 2= 136,3 ± 49,3min). O Grupo 1 apresentou seis pacientes (37,5 %) com complicações precoces (quatro casos de fístula urinária) e tardias (um caso de estenose de ureter, um caso de exclusão funcional do rim operado), enquanto o Grupo 2 não teve complicações, sendo esta diferença estatisticamente significativa (p=0,011).

CONCLUSÃO: O emprego do cateter duplo J foi associado a um número significativamente menor de complicações na ureterolitotomia retroperitoneoscópica. Tempo cirúrgico, analgesia pós-operatória e tempo de internação foram semelhantes entre os grupos com e sem cateter.

Descritores: Cálculos ureterais. Cirurgia geral. Cateterismo ureteral. Espaço retroperitoneal. Laparoscopia.

INTRODUÇÃO

A litíase urinária é uma das mais frequentes doenças da humanidade. Estima-se que 12% dos homens e 6% das mulheres apresentarão pelo menos um episódio de calculose urinária durante sua vida1. Além disso, em torno de 50% terão novo episódio dentro de dez anos2.

O tratamento do cálculo ureteral evoluiu nos últimos 25 anos com a endourologia e os litotridores extracorpóreos por ondas de choque, tornando a abordagem da ureterolitíase menos invasiva e que substituiriam a operação aberta como primeira escolha terapêutica3,4.

Com o avanço tecnológico houve também aumento nos custos de tratamento e com isso há restrição no seu emprego, em especial nos países em desenvolvimento5.

Em 1979, houve a primeira descrição de um caso de litíase ureteral tratado por retroperitoneoscopia6, que, a partir da década de 90, ganhou espaço por ser uma técnica minimamente invasiva e reproduzir a operação aberta7.

Muitos autores defendem a ureterolitotomia laparoscópica no tratamento primário do cálculo ureteral proximal, em especial nos cálculos maiores que 1,5cm, cálculos impactados e cálculos obstrutivos, bem como, segunda linha para cálculos refratários a tratamento primário, seja por ureteroscopia ou litotridores extracorpóreos por ondas de choque8-10.

As complicações relacionadas ao procedimento foram relatadas por alguns autores, porém o número é pequeno e, geralmente, de fácil resolução. São elas principalmente o extravasamento prolongado de urina pelo dreno no pós-operatório e a estenose ureteral11-13.

O uso de cateter duplo J no procedimento não é consenso. Muitos autores advogam que a abordagem minimamente invasiva com manipulação cuidadosa do ureter pode ser suficiente para uma boa cicatrização do órgão, sem complicações, e dispensando a utilização do cateter ureteral12,14-16.

Nas séries relatadas de ureterolitotomia laparoscópica, grande número de pacientes foram tratados sem o uso de cateter ureteral e com poucas complicações relatadas.

Na casuística do Hospital de Clínicas da Universidade Federal do Paraná em Curitiba, Brasil, pacientes submetidos à ureterolitotomia retroperitoneoscópica foram operados com e sem utilização do cateter duplo J. Diante da falta de consenso nos critérios de indicação do uso do cateter, desenvolveu-se este estudo com o objetivo de avaliar as complicações precoces e tardias ocorridas na ureterolitotomia retroperitoneoscópica.

MÉTODOS

Quarenta e sete pacientes foram submetidos à ureterolitotomia via retroperitoneoscópica e foram coletados os dados retrospectivamente. Eles foram separados em dois grupos: Grupo 1 no qual não se utilizou primariamente drenagem por cateter ureteral; e Grupo 2 em que se empregou de rotina o cateter duplo J implantado no transoperatório.

Esta pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Hospital de Clínicas da Universidade Federal do Paraná sob parecer nº 1297-145/2006-10.

Foram incluídos pacientes com cálculo ureteral proximal (médio ou superior) submetido ao tratamento cirúrgico por ureterolitotomia retroperitoneoscópica.

Foram excluídos aqueles submetidos ao método e que não foi possível coletar os dados de pré, trans ou pós-operatório, bem como, os que não realizaram seguimento ambulatorial e/ou não realizaram urografia excretora no controle no pós-operatório.

A técnica operatória utilizada foi a descrita por Gaur17 com algumas modificações, com anestesia geral e decúbito lateral (posição para lombotomia). O acesso aberto na região lombar posterior permitiu alcançar o retroperitôneo. Inseriu-se balão de confecção artesanal (Figura 1) utilizando dois dedos de luva fixas na extremidade distal de um trocarte de 10mm, o qual era preenchido com 500ml de salina a fim de criar-se espaço de trabalho retroperitoneal. Posicionaram-se os portais (Figura 2) e procedeu-se à dissecção do ureter, sua abertura utilizando-se tesoura, bisturi frio ou quente e, finalmente, retirada do cálculo.



Nos casos em que foi utilizado o cateter duplo J, a passagem do fio guia metálico era feita através de agulha de punção renal percutânea, por contraincisão, pela abertura ureteral, sentido distal no ureter e, na sequência, o cateter duplo J era posicionado por sobre o guia de forma anterógrada (Figura 3). A extremidade proximal do cateter era empurrada para a pelve renal, de maneira retrógrada. Nos casos de incisão ureteral mais baixa pela posição do cálculo, realizava-se outra incisão proximal no ureter, por onde era introduzido este dispositivo. Posteriormente, procedia-se a sutura do ureter com fio de poligalactina 4-0 (Figura 3), drenagem laminar do espaço retroperitoneal e o cálculo era retirado da cavidade.


Todos os pacientes tinham urocultura negativa.

A creatinina pré e pós-operatórias eram dosadas. A urografia excretora pré e pós-operatória foi realizada conforme protocolo da radiologia do hospital e a interpretação da dilatação do sistema coletor renal seguia o proposto por Talner et al.18, que graduava a dilatação de '1' a '4'. Os exames pós-operatórios foram obtidos em seis e 12 meses.

Analgesia foi feita com dipirona sódica a todos os pacientes no pós-operatório até o primeiro dia. Utilizou-se cetoprofeno ou cloridrato de tramadol como analgesia intermediária. Após o segundo dia a analgesia era feita via oral e se necessária, para os casos de dor refratária, usou-se sulfato de morfina.

Na análise estatística foram utilizados o teste paramétrico t de Student e os não-paramétricos Mann-Whitney, Qui-quadrado e exato de Fisher. O nível de significância adotado foi menor que 5% (p<0,05).

RESULTADOS

Foram avaliados 31 pacientes com média de idade de 45,1 ± 14 anos, variando de 19 a 71; 61,3% eram homens e 38,7% mulheres (Tabela 1).

Na avaliação da urografia intravenosa pré-operatória foi observado predomínio para excreção d" 15 minutos (67,7%), grau de dilatação igual a 4 (54,8%) e posição do cálculo no ureter proximal (87,1%).

O tamanho dos cálculos encontrados foi, em média, de 15,9 ± 6,3mm (variação entre 8 e 30mm) e não houve diferença significativa entre os grupos. O lado acometido mostrou discreto predomínio para cálculos no ureter direito (54,8%).

O valor da creatinina pré-operatória foi, em média, de 1,07 ± 0,24mg/dl.

Todos os pacientes de ambos os grupos do estudo apresentaram tempo de permanência do cálculo impactado no ureter por período superior a dois meses.

O tempo de operação observado foi de 130 ± 40,3min no Grupo 1, e 136,3 ± 49,3min no Grupo 2 (Tabela 2).

Os pacientes do Grupo 1 receberam alta hospitalar, em média, 4,1 ± 2,3 dias após a operação, enquanto os do Grupo 2 em 3,6 ± 0,9 dias de pós-operatório. Apesar de a diferença não ser estatisticamente significativa, os pacientes do Grupo 1 ficaram, em média, um dia a mais no hospital (Tabela 2). A taxa livre de cálculo foi 100%.

Todos os pacientes do estudo receberam dipirona no pós-operatório. No Grupo 1, cinco receberam também cetoprofeno e outros cinco tramadol (62,5%). No Grupo 2, dois pacientes receberam cetoprofeno e outros três tramadol (33,3%).

Houve necessidade de acrescentar opioide forte (sulfato de morfina) em oito pacientes do Grupo 1 e sete do Grupo 2. Em média, estes pacientes utilizaram 18,5 ± 6,5mg de morfina e não houve diferença entre os dois grupos neste parâmetro.

No Grupo 1, quatro pacientes necessitaram de implante de cateter duplo J no período de pós-operatório em decorrência de drenagem urinária volumosa e prolongada (mais de 500ml de urina/dia por período superior a dois dias). Nestes pacientes, o cateter foi implantado entre o terceiro e o sétimo dia do pós-operatório, e retirado, em média, 6,3 ± 2,2 semanas de pós-operatório. No Grupo 2 ele foi retirado, em média, 7,6 ± 5,5 semanas após o procedimento.

O Grupo 1 teve quatro casos de complicação precoce, todos com fístulas urinárias e outros dois casos de complicação tardia (uma estenose de ureter de grau leve e um caso de exclusão renal por obstrução). No Grupo 2, nenhum paciente apresentou complicações. Na avaliação em separado das complicações não foi observada diferença significativa, no entanto ressalta-se que todas as complicações precoces foram relatadas no Grupo 1 (p=0,058) (Tabela 3). Avaliando-se as complicações globais (precoces + tardias), todas ocorreram no Grupo 1 (37,5%) (p=0,011), sendo esta diferença significativa (Figura 4).


DISCUSSÃO

O emprego de técnicas minimamente invasivas para tratamento de cálculos ureterais é o mais indicado atualmente, independente da situação. A ureterolitotripsia intracorpórea ou a litotripsia extracorpórea são as primeiras opções na maioria dos casos19. Algumas situações, porém, não são resolvidas com estes procedimentos e impõe-se a abordagem clássica (operação aberta). Na última década, a laparoscopia vem substituindo a operação convencional no tratamento desta doença20. Seus resultados são reprodutíveis e têm as vantagens da terapêutica minimamente invasiva: melhor controle analgésico, menor tempo de internação e retorno mais precoce às atividades habituais21.

A ureterolitotomia retroperitoneoscópica foi a primeira escolha para cálculos proximais e médios em 39 casos (83%) e após litotridores extracorpóreos por ondas de choque em oito (17%). A escolha deveu-se ao tamanho do cálculo, ao tempo de obstrução, bem como, a posição e a anatomia do trato urinário, e, principalmente, o fato de que não se dispunha de ureteroscopia flexível e/ou litotripsia a laser, além da baixa condição socioeconômica da população atendida. Gaur et al.12 e Matias et al.22 selecionaram a ureterolitotomia retroperitoneoscópica como tratamento primário em 59% e 55%, respectivamente. Ambos reforçam a condição socioeconômica como fator preponderante na opção terapêutica.

O tamanho do cálculo, em média de 16mm, não apresentou diferença entre os grupos, e todos os casos apresentavam litíase impactada no ureter por período superior a dois meses. Outros autores publicaram que cálculos grandes (>15mm) e, em especial aqueles que estão impactados por longo tempo, são os principais candidatos para o emprego desta técnica, em virtude da alta taxa de falha de outros métodos23-25.

O tempo operatório foi 133 minutos na média global, não sendo estatisticamente diferente entre os grupos (1= 130min; 2= 136min). Bove et al.26 e Fan et al.27 publicaram tempo de operação semelhante ao nosso em suas séries. Ambos destacam que o espaço reduzido no retroperitôneo e a falta de experiência nos casos iniciais contribuem substancialmente para o prolongamento da operação, e que o ganho de habilidade e experiência proporcionam redução no tempo operatório.

Os pacientes permaneceram, em média, por 3,9 dias após o procedimento e o dreno retirado no terceiro dia, em média. Comparando com os achados de Basiri et al.24 e El-Moula et al.10, que reportaram tempo de internação de 5,8 e 6,4 dias, respectivamente, pôde-se observar que a presente série teve melhor convalescença hospitalar. Também comparando com Kijvikai e Patcharatrakul15 e Bove et al.26, o tempo de retirada do dreno de 2,8 e três dias foi semelhante ao aqui encontrado.

O emprego de analgesia fraca foi rotineiro. A complementação analgésica com cetoprofeno e tramadol foi necessária em 15 pacientes e o sulfato de morfina em 15, em média de 18,5mg/paciente. Outros autores relataram uso de analgésico em 52% a 66% de seus pacientes16,23. Kijvikai e Patcharatrakul15 utilizaram 5,6mg de morfina nos seus casos operados. Apesar de não haver na literatura homogeneidade com relação ao tipo e dose de analgesia utilizada e, considerando que neste estudo houve uso de analgésicos em maior quantidade que nas séries encontradas na literatura, os autores primam pelo controle efetivo da dor, o que comprovadamente influencia na recuperação pós-operatória e na alta precoce20,28.

A retirada do cateter de duplo J ocorreu, em média, sete semanas após o procedimento, o que está próximo do tempo recomendado, que é de quatro a seis semanas25,29.

Finalmente, o estudo comparativo do emprego ou não de cateter ureteral na ureterolitotomia retroperitoneoscópica mostra que, no grupo sem cateter, houve drenagem prolongada de urina pela ferida em quatro de 16 operados, ou 25% da casuística, sendo estas considerados como complicações precoces. Deve-se reforçar que em todos estes pacientes foi necessária a passagem de cateter duplo J, o que significou novo procedimento invasivo. Em contrapartida, no grupo operado com cateter, nenhum caso de complicação precoce foi observado.

Da mesma forma, houve dois casos de complicações tardias, ambas no Grupo 1. Um dos pacientes apresentou estenose de ureter e foi tratado com ureteroscopia e dilatação, permanecendo quatro semanas com cateter duplo J; o outro paciente apresentava exclusão funcional do rim na urografia pós-operatória, com ecografia que revelou grande hidronefrose e afilamento do parênquima renal, sendo submetido à nefrectomia videolaparoscópica.

Assim, o índice de complicações do grupo sem cateter foi significativamente maior do que no grupo com cateter, considerando-se complicações no global. Deve-se ressaltar que, apesar de não haver diferença estatisticamente significativa quando avaliadas em separado, há tendência de mais complicações quando não se emprega o Stent, o que provavelmente se confirmaria com o aumento da casuística.

Analisando a literatura, encontrou-se apenas três publicações relevantes que comparam a utilização ou não de cateterização ureteral na ureterolitotomia retroperitoneoscópica 11,12,30. Estas, porém, não descrevem grupos comparativos e sim o emprego ou não de duplo J nas séries de casos operados. Sinha e Sharma30 na abordagem retroperitoneoscópica concluíram que o emprego do dispositivo diminui o tempo de drenagem e favorece a alta mais precoce.

Por outro lado, Goel e Hemal11 concluíram que a confecção de sutura meticulosa pode substituir o emprego do cateter ureteral, exceto quando há função renal diminuída e cálculos impactados por mais de três meses, situações nas quais deve-se utilizar o Stent. Gaur et al.12 descreveram a maior série de casos operados por via retroperitoneoscópica enfatizando que o emprego do cateter ureteral reduz o extravasamento de urina, porém não recomendaram este tipo de drenagem rotineiramente, apenas em situações especiais tais como: inflamação crônica, edema intenso, ureter friável e cálculo impactado por longo período.

Dentre os trabalhos pesquisados, há descrição dos dois métodos, com ou sem cateter duplo J. No entanto, não há clareza na comparação dos resultados entre os mesmos. Desta forma, tentou-se pelo presente estudo, reforçar se realmente o emprego do cateter é vantajoso para o paciente. Com relação às complicações aqui encontradas, há semelhança com a literatura10,12-14,22-25, apontando para o fato de que o uso de cateter provavelmente reduz o surgimento de complicações.

A ureterolitotomia retroperitoneoscópica é um procedimento ainda em debate, mas que tem obtido espaço como forma minimamente invasiva de tratamento do cálculo ureteral, seja como opção de segunda linha ou mesmo como primeira escolha em casos especiais.

Este estudo permite mostrar que o número de complicações precoces e tardias da ureterolitotomia retroperitoneoscópica foi menor no grupo de pacientes operados com a utilização do cateter duplo J. Com relação aos dados de tempo cirúrgico, analgesia e tempo de internação, houve semelhança entre os grupos com e sem cateter.

Apesar de se tratar de estudo retrospectivo, os autores recomendam o emprego rotineiro do cateter duplo J visando à redução de complicações. Da mesma forma, novos estudos nesta linha devem esclarecer melhor quais as situações em que o cateter duplo J é realmente imprescindível.

Em conclusão, o emprego do cateter duplo J foi associado a um número significativamente menor de complicações na ureterolitotomia retroperitoneoscópica. O tempo cirúrgico, a analgesia pós-operatória e o tempo de internação foram semelhantes entre os grupos com e sem cateter.

Recebido em 06/07/2011

Aceito para publicação em 16/09/2011

Conflito de interesse: nenhum

Fonte de financiamento: nenhum

Trabalho realizado no Programa de Pós-Graduação em Clínica Cirúrgica da UFPR e disciplina de Urologia do Setor de Ciências da Saúde da UFPR, Curitiba, PR, Brasil.

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  • Endereço para correspondência:

    Alexandre Cavalheiro Cavalli
    E-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      31 Maio 2012
    • Data do Fascículo
      Abr 2012

    Histórico

    • Recebido
      06 Jul 2011
    • Aceito
      16 Set 2011
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