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Utilização de fio de polipropileno de autossustentação de tripla convergência para a correção do desvio de hemiface causada por lesão do nervo facial

Resumos

OBJETIVO: Avaliar a utilização do fio de polipropileno de autossustentação de tripla convergência para a correção do desvio de hemiface que se apresenta como sequela tardia da paralisia facial periférica. MÉTODOS: Realizou-se um estudo retrospectivo e observacional em 34 indivíduos portadores de paralisia facial tardia. Utilizou-se fio de polipropileno de tripla convergência para a correção do desvio da hemiface paralisada. Trata-se de fio monofilamentar, sintético, transparente e inabsorvível que possui garras que tracionam os tecidos ptosados mantendo-os na posição correta, em simetria com o lado são. Os resultados foram avaliados através de análise subjetiva, quanto ao grau de satisfação dos pacientes, submetidos a um questionário próprio. RESULTADOS: Analisou-se 34 pacientes, 73,52% deles relataram grande melhora, 20,58% relataram melhora moderada e 5,88%, uma melhora leve; encontrou-se um alto índice de satisfação, 94,1%. Dois pacientes apresentaram extrusão parcial do fio. Nenhum paciente desenvolveu infecção. CONCLUSÃO: O emprego do fio de polipropileno de autossustentação de tripla convergência para a correção do desvio da hemiface, consequente à paralisia facial, ocasionou acentuada melhora da assimetria facial e a recuperação da autoestima dos pacientes.

Paralisia Facial; Músculos faciais; Nervo facial; Doenças dos nervos cranianos; Cirurgia plástica


OBJECTIVE: To evaluate the use of self-sustaining triple-convergence polypropylene thread for correction of hemiface deviation presenting as late result of facial paralysis. METHODS: We conducted a retrospective, observational study with 34 subjects with late facial paralysis. We used a triple-convergence polypropylene thread to correct the deviation of the paralyzed hemiface. It is a monofilament, synthetic, transparent and unabsorbable thread that has hooks that exert traction in the ptotic tissues, keeping them in the correct position, in symmetry with the healthy side. The results were evaluated by subjective analysis, with assessment of patient satisfaction with a proper questionnaire. RESULTS: We analyzed 34 patients, 73.52% of them reported great improvement, 20.58% moderate improvement and 5.88%, slight improvement; we found a high satisfaction rate of 94.1%. Two patients had partial extrusion of the wire. No patient developed infection. CONCLUSION: The use of triple-convergence polypropylene thread to correct the deviation of hemiface consequent to facial palsy markedly improved facial asymmetry and recovery of patients' self-esteem.

Facial paralysis; Facial muscles; Facial nerve; Diseases of the cranial nerves; Plastic Surgery


ARTIGO ORIGINAL

Utilização de fio de polipropileno de autossustentação de tripla convergência para a correção do desvio de hemiface causada por lesão do nervo facial

Marcelo Perrone

Professor Adjunto da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro – UNIRIO

Endereço para correspondência Endereço para correspondência: Marcelo Perrone E-mail: marceloperrone@hotmail.com

RESUMO

OBJETIVO: Avaliar a utilização do fio de polipropileno de autossustentação de tripla convergência para a correção do desvio de hemiface que se apresenta como sequela tardia da paralisia facial periférica.

MÉTODOS: Realizou-se um estudo retrospectivo e observacional em 34 indivíduos portadores de paralisia facial tardia. Utilizou-se fio de polipropileno de tripla convergência para a correção do desvio da hemiface paralisada. Trata-se de fio monofilamentar, sintético, transparente e inabsorvível que possui garras que tracionam os tecidos ptosados mantendo-os na posição correta, em simetria com o lado são. Os resultados foram avaliados através de análise subjetiva, quanto ao grau de satisfação dos pacientes, submetidos a um questionário próprio.

RESULTADOS: Analisou-se 34 pacientes, 73,52% deles relataram grande melhora, 20,58% relataram melhora moderada e 5,88%, uma melhora leve; encontrou-se um alto índice de satisfação, 94,1%. Dois pacientes apresentaram extrusão parcial do fio. Nenhum paciente desenvolveu infecção.

CONCLUSÃO: O emprego do fio de polipropileno de autossustentação de tripla convergência para a correção do desvio da hemiface, consequente à paralisia facial, ocasionou acentuada melhora da assimetria facial e a recuperação da autoestima dos pacientes.

Descritores: Paralisia Facial. Músculos faciais. Nervo facial. Doenças dos nervos cranianos. Cirurgia plástica.

INTRODUÇÃO

A paralisia facial periférica é a neuropatia aguda craniana mais comum e se caracteriza pela lesão do nervo facial quando ela ocorre após a entrada no conduto auditivo interno1. Esta lesão pode ser do tronco, ou de algum de seus ramos: temporal, zigomático, bucal, mandibular ou cervical1-3.

Ocorre, como consequência, uma diminuição ou perda da mobilidade dos músculos da hemiface atingida, desde o supercílio até a boca, levando a um desvio desta hemiface para o lado são4.

Em muitos destes pacientes, a lesão do nervo facial será permanente, acarretando sequelas irreversíveis ocasionando graves transtornos funcionais, estéticos e psicológicos, que necessitarão de tratamento cirúrgico adequado4-7.

Para a reabilitação facial é necessária uma equipe multidisciplinar composta por neurocirurgião, oftalmologista, otorrinolaringologista, especialista em microcirurgia, cirurgião plástico, fisioterapeuta, fonoaudiólogo e psicólogo, entre outros especialistas1.

É fundamental, na reabilitação cirúrgica da face paralisada, que se conheça o diagnóstico e as técnicas possíveis para a reconstrução primária direta, indireta ou secundária4,5,7.

Em 1999, o médico e pesquisador russo Marlen Sulamanidze desenvolveu e patenteou um fio de poliuretano (APTOS-antiptose) com garras falhadas, para sustentação da face e utilizou-o para fins estéticos, senso conhecido como "fio russo". Posteriormente, em 2004, o médico boliviano radicado no Brasil, José Antonio Encinas Beramendi, aprimorou este fio, com inclusão de garras duplas e triplas, aumentando seu poder de tração e de sustentação, passando a utilizá-los para a correção do desvio de hemiface consequente à paralisia facial tardia. Além disso, a reação tardia destes fios, também mostrou um aumento da síntese do colágeno e da elastina ao redor dos fios, aumentando seu poder de sustentação. No planejamento cirúrgico, embora a restauração da função seja muito importante, nas sequelas tardias iremos encontrar um grande número de pacientes que irão se beneficiar de correções puramente estáticas da hemiface atingida, mostrando o quanto é importante o aspecto estético em indivíduos que têm sua imagem e autoestima acentuadamente comprometidas. Além disso, esses procedimentos, como a utilização de fios de autossustentação, apresentam uma baixa morbidade, podem ser realizados em nível ambulatorial, com um baixo custo material, além de apresentarem uma curva de aprendizado curta, ideal para serviços que possuam residência médica e/ou serviços de ensino.

Neste estudo, será avaliado o emprego do fio de autossustentação de polipropileno de tripla convergência para a correção do desvio de hemiface consequente à lesão permanente do nervo facial.

MÉTODOS

Realizou-se um estudo retrospectivo, observacional e descritivo de 34 pacientes portadores de paralisia facial tardia, operados pelo autor, na sua clínica particular, entre janeiro de 2006 e janeiro de 2008. Coletou-se informações quanto à idade, sexo, causa e tempo de evolução da paralisia facial.

Os pacientes foram submetidos à rotina laboratorial, radiológica e avaliação do risco cirúrgico, previamente ao procedimento cirúrgico. Também foi realizado o registro fotográfico de todos os pacientes.

Em todos os pacientes realizou-se a técnica da correção do desvio da hemiface atingida com a utilização do fio de polipropileno de autossustentação de tripla convergência. Trata-se de um fio monofilamentar, sintético, transparente e inabsorvível, que possui garras que tracionam os tecidos ptosados mantendo-os suspensos e na posição correta, em simetria com o lado são. A introdução destes fios é feita através de cânulas próprias, em plano cirúrgico que se situa entre o tecido celular subcutâneo e o sistema músculo-aponeurótico superficial. Tais fios tiveram sua aprovação efetuada pela ANVISA sob registro nº 80163090001, após estudos em cobaias e humanos.

A técnica utilizada consistia de uma marcação prévia, através de caneta dermográfica, dos trajetos onde seriam passados os fios, isto é, nos pontos utilizados para a suspensão da hemiface atingida. Em todos os casos foi utilizada a anestesia local infiltrativa com solução anestésica que correspondia à xylocaina à 2% com adrenalina na proporção de 1:200.000. Após a infiltração anestésica, era introduzida uma cânula de 20cm de comprimento, cuja luz permite a passagem do fio, nas áreas demarcadas, sendo que na área distal o fio tracionava o tecido ptosado com suas garras e na fase proximal havia fixação do mesmo no periósteo; ao fim do procedimento, era feito curativo microporado que deveria permanecer por uma semana. As figuras 1 e 2 demonstram detalhes da técnica.



O grau de satisfação dos pacientes foi avaliado com auxílio de um questionário próprio, elaborado pelo autor e aplicado, rotineiramente, aos pacientes após o procedimento cirúrgico, durante a consulta ambulatorial. O questionário apresenta cinco opções para a resposta: 1- piora, 2- ausência de melhora, 3- leve melhora, 4- moderada melhora, e 5- grande melhora.

RESULTADOS

Analisou-se 34 pacientes sendo 21 homens (61,77%) e 13 mulheres (38,23%), com faixa etária que abrangia pacientes de 24 aos 75anos. A paralisia foi encontrada no lado esquerdo da face em 23 (67,6%) pacientes e no lado direito em 11 (32,4%) deles, apresentando tempo de evolução da doença entre dois e seis anos. Em oito pacientes a paralisia foi idiopática (23.55%), em nove, de origem traumática (26,47), dois tinham história de otite média maligna (5,88%), o herpes zoster originou a lesão em sete pacientes (20,58%) e oito de causa iatrogênica (23,52%).

A avaliação após o procedimento utilizado, mostrou o que os pacientes achavam de seus resultados: 25 de 34 pacientes (73,52%) relataram grande melhora, sete deles (20,58%) relataram melhora moderada e apenas dois (5,88%) uma melhora leve. Nenhum paciente relatou ausência de melhora ou piora do quadro. A melhora da aparência estética global foi unânime. As intercorrências encontradas foram: dois pacientes que apresentaram extrusão parcial do fio (5,88%) e um paciente que apresentou episódio de herpes simples labial (2,94%), devidamente controlados. Nenhum paciente desenvolveu infecção ou qualquer reação ao fio. Os resultados foram avaliados e mantidos por mais de um ano de seguimento.

As figuras 3, 4, 5 e 6 demonstram casos clínicos nas fases de pré e pós-operatórios da aplicação do fio de polipropileno de tripla convergência.





DISCUSSÃO

Os pacientes portadores de paralisia facial tardia apresentam uma assimetria estética facial consequente a uma lesão do nervo facial. O objetivo a ser atingido pelo cirurgião consiste em devolver a estes pacientes uma suspensão dinâmica ou estática do lado paralisado em contraposição ao lado são, criando uma animação simétrica e esteticamente harmônica5.

Os métodos cirúrgicos para tratamento da paralisia facial incluem excisões, enxertos, implantes de peso e suspensórios, suportes passivos e ativos, transposição muscular e transplantes livres de músculo e nervo8-15.

A maioria dos procedimentos encontrados na literatura mundial, como enxertos de nervo, neurorrafias, transplantes musculares e tantos outros, podem produzem sequelas estéticas como, cicatrizes, hipo e hiperestesias, assimetrias, correção incompleta com recidivas. Geralmente os procedimentos são múltiplos e envolvem várias internações, apresentando morbidade considerável, além de alto custo operacional, envolvendo procedimentos realizados sob anestesia geral e com necessidade de internações hospitalares por períodos médios e longos. Além destes procedimentos, várias outras técnicas devem ser consideradas, como a ritidoplastia, blefaroplastia, correção do lagoftalmo e o uso da toxina botulínica, valioso inibidor da ação muscular5.

Os fios de autossustentação de polipropileno de tripla convergência foram amplamente utilizados para fins estéticos, e só recentemente foram incorporados às técnicas para correção da paralisia facial. Eles promovem a correção do desvio da hemiface consequente à paralisia facial periférica, através de uma estabilização estática da hemiface atingida. Apresentam como vantagens: a biocompatibilidade, são utilizados através de técnica cirúrgica de baixa complexidade, um baixo custo operacional, aliados à execução do procedimento que pode ser feito no ambulatório sem necessidade de internação hospitalar e, um resultado que proporciona um alto grau de satisfação por parte dos pacientes submetidos a esta nova técnica. Tem como vantagem ainda, o fato de poderem ser utilizados em conjunto com outros procedimentos, que se encontram no vasto arsenal cirúrgico e terapêutico disponível na literatura mundial16-24.

Os nossos resultados demonstram que o emprego do fio de polipropileno de autossustentação de tripla convergência para a correção do desvio da hemiface, consequente à paralisia facial, ocasionou acentuada melhora da assimetria facial e a recuperação da autoestima dos pacientes.

Recebido em 28/02/2012

Aceito para publicação em 20/04/2012

Conflito de interesse: nenhum

Fonte de financiamento: nenhum

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  • Endereço para correspondência:

    Marcelo Perrone
    E-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      13 Nov 2012
    • Data do Fascículo
      Out 2012

    Histórico

    • Recebido
      28 Fev 2012
    • Aceito
      20 Abr 2012
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