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Hepatectomia videolaparoscópica com dispositivo de radiofrequência

Laparoscopic hepatectomy with radiofrequency device

Resumos

As ressecções hepáticas laparoscópicas vêm ganhando adeptos entre cirurgiões pois evidenciam recuperação rápida, menor permanência hospitalar e melhor resultado estético. A utilização do dispositivo laparoscópico de radiofreqüência foi pela primeira vez utilizada, com sucesso, no Brasil, para a ressecção de carcinoma hepatocelular no segmento VI, em dois pacientes cirróticos. Apesar do sangramento intraoperatório continuar sendo um grande desafio para o cirurgião durante ressecções hepáticas laparoscópicas, em ambos os casos, a exclusão vascular hepática foi dispensável e não houve necessidade de hemotransfusão. Os pacientes receberam alta hospitalar no quarto dia pós-operatório.

Cirrose hepática; Carcinoma hepatocelular; Hepatectomia; Cirurgia videoassistida; Dispositivo de identificação por radiofrequência


Laparoscopic liver resections are gaining adherents among surgeons, as they show rapid recovery, shorter hospital stay and better cosmetic results. The use of a laparoscopic radiofrequency device was first carried out successfully in Brazil for resection of hepatocellular carcinoma of the segment VI in two cirrhotic patients. Although intraoperative bleeding remains a major challenge for the surgeon during laparoscopic liver resections, in both cases the hepatic vascular exclusion was expendable and there was no need for blood transfusion. Patients were discharged on the fourth postoperative day.

Cirrhosis; Hepatocellular carcinoma; Hepatectomy; Video-assisted surgery; Radio frequency identification device


NOTA TÉCNICA

Hepatectomia videolaparoscópica com dispositivo de radiofrequência

Laparoscopic hepatectomy with radiofrequency device

Vivian Resende, TCBC-MGI; Cristiano Xavier LimaII; Mário Marcos LusckalIII; Milton Carlos Aguiar JuniorIV; Emanuele GammeriV; Nagy Adley HabibVI; José Renan da Cunha-MeloVII

IProfessora Adjunta do Departamento de Cirurgia da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG)

IIProfessor Adjunto do Departamento de Cirurgia da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG)

IIIMédico Residente (R4) em Cirurgia do Aparelho Digestivo do Instituto Alfa de Gastroenterologia (IAG) do Hospital das Clínicas da UFMG

IVMédico Residente (R4) em Cirurgia do Aparelho Digestivo do Instituto Alfa de Gastroenterologia (IAG) do Hospital das Clínicas da UFMG

VMédico Residente da Universidade de Messina (Sicília)

VIChefe do Serviço de Cirurgia Hepatobiliopancreática do Hospital Hammersmith, Imperial College of London

VIIProfessor. Titular do Departamento de Cirurgia da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG)

Endereço para correspondência Endereço para correspondência: Vivian Resende E-mail: vivianresen@gmail.com

RESUMO

As ressecções hepáticas laparoscópicas vêm ganhando adeptos entre cirurgiões pois evidenciam recuperação rápida, menor permanência hospitalar e melhor resultado estético. A utilização do dispositivo laparoscópico de radiofreqüência foi pela primeira vez utilizada, com sucesso, no Brasil, para a ressecção de carcinoma hepatocelular no segmento VI, em dois pacientes cirróticos. Apesar do sangramento intraoperatório continuar sendo um grande desafio para o cirurgião durante ressecções hepáticas laparoscópicas, em ambos os casos, a exclusão vascular hepática foi dispensável e não houve necessidade de hemotransfusão. Os pacientes receberam alta hospitalar no quarto dia pós-operatório.

Descritores: Cirrose hepática. Carcinoma hepatocelular. Hepatectomia. Cirurgia videoassistida. Dispositivo de identificação por radiofrequência.

ABSTRACT

Laparoscopic liver resections are gaining adherents among surgeons, as they show rapid recovery, shorter hospital stay and better cosmetic results. The use of a laparoscopic radiofrequency device was first carried out successfully in Brazil for resection of hepatocellular carcinoma of the segment VI in two cirrhotic patients. Although intraoperative bleeding remains a major challenge for the surgeon during laparoscopic liver resections, in both cases the hepatic vascular exclusion was expendable and there was no need for blood transfusion. Patients were discharged on the fourth postoperative day.

Key words: Cirrhosis. Hepatocellular carcinoma. Hepatectomy. Video-assisted surgery. Radio frequency identification device.

INTRODUÇÃO

O sangramento intraoperatório durante ressecções hepáticas continua a ser grande desafio para o cirurgião. Aparelhos, como dissector ultrassônico (CUSA), bisturi harmônico, pinça bipolar e radiofreqüência, são atualmente disponíveis para ajudar na secção do parênquima hepático. A manobra de Pringle é algumas vezes utilizada como medida para diminuir o sangramento.

As ressecções hepáticas laparoscópicas vem ganhando adeptos entre cirurgiões pois evidenciam uma rápida recuperação pós operatória, menor permanência hospitalar, além de melhor resultado estético1,2. O controle intraoperatório do sangramento durante procedimento laparoscópico pode ser muito difícil e algumas vezes resulta em conversão para cirurgia aberta. Desde a descrição inicial de ressecção hepática laparoscópica utilizando radiofreqüência um novo dispositivo para uso laparoscópico tem sido desenvolvido e utilizado 1,3,4.

O objetivo da presente nota é descrever a técnica para ressecção hepática laparoscópica utilizando-se, pela primeira vez no Brasil, o dispositivo de radiofreqüência, em pacientes cirróticos portadores de carcinoma hepatocelular.

DESCRIÇÃO TÉCNICA

Foram dois pacientes admitidos no Grupo de Fígado do Instituto Alfa de Gastroenterologia da Universidade Federal de Minas Gerais. O Primeiro deles do sexo feminino, 69 anos, portadora de cirrose pós viral C e colecistolitíase. O segundo, masculino, 63 anos, com cirrose pós-viral B. Ambos eram Child Pugh A, sem sinais de hipertensão porta significativos e sem critérios para o transplante hepático. Apresentavam lesão no segmento VI do fígado que media 7cmx5cm e 5cmx4cm, respectivamente. Em ambos, a tomografia de abdome com contraste endovenoso e a ressonância nuclear magnética foram compatíveis com carcinoma hepatocelular (Figuras 1a e 1b). A dosagem sérica de alfafetoproteina estava normal. Um deles tinha comorbidade (bócio mergulhante que atingia a bifurcação da traquéia).


Realizou-se ressecção laparoscópica utilizando-se o dispositivo laparoscópico, que é formado por um arranjo de quatro agulhas dispostas de forma retangular e que utilizam a energia de radiofreqüência 1,3. Após anestesia geral o paciente foi colocado em decúbito lateral esquerdo. Realizou-se punção e pneumoperitônio que foi mantido com CO2 numa pressão de 12mmHg. Foram colocados três portais de 10mm e dois de 5mm.

Após secção do ligamento hepatorrenal, demarcou-se com o eletrocautério, uma linha na superfície superior e inferior do fígado delimitando-se a área do segmento VI a ser ressecada (Figura 2a). Aplicou-se o dispositivo, perpendicularmente, ao longo desta linha em ambas as superfícies marcadas (Figuras 2a e 2b). Realizou-se uma segunda linha de ablação no parênquima, correspondente ao lado da lesão, que levou à completa isquemia do segmento VI. Em seguida, o dispositivo foi, sucessivamente, aplicado paralelamente às linhas de ablação perpendicular (Figura 2c), à medida que o parênquima isquêmico foi seccionado com tesoura laparoscópica (Figura 2d). Ao término do procedimento, a área de secção do parênquima ficou completamente regular, sem extravazamento de bile ou sangue (Figura 2e). Colocou-se dreno tubular pelo orifício de um dos portais laterais (Figura 2f).


 






Durante todo o procedimento, não houve necessidade de exclusão vascular hepática. Colecistectomia foi realizada em um dos pacientes. A peça cirúrgica foi colocada em bolsa plástica e retirada através do portal umbilical, que teve a sua incisão ampliada.

A duração do procedimento cirúrgico foi em média 120 minutos. A perda sanguínea média foi de 50 ml nos dois pacientes. Nenhum deles necessitou de hemotransfusão.

Ambos evoluíram sem complicações e receberam alta hospitalar no quarto dia pós-operatório. O exame anatomopatológico mostrou carcinoma hepatocelular bem diferenciado, com invasão vascular e margens cirúrgicas livres.

DISCUSSÃO

Recomenda-se uma cuidadosa seleção dos pacientes candidatos à ressecção laparoscópica do fígado. Apesar de resseções maiores já terem sido descritas por laparoscopia5, esta técnica é idealmente considerada para ressecção de tumores menores localizados perifericamente em segmentos inferiores ou laterais do fígado. Tumores grandes localizados profundamente ou próximos à bifurcação porta ou, ainda, nos segmentos posteriores não são usualmente selecionados para ressecção laparoscópica 1,2,4.

O dispositivo laparoscópico"Habib Sealer 4X" ( LHS, Angiodynamics, Queensbury, NY), mede 45cm de comprimento com uma parte isolada que permite a aplicação de radiofreqüência numa extensão de 5cm. Um botão de controle no cabo permite ao cirurgião escolher a profundidade da ablação. O aparelho pode ser introduzido através de portal de 10mm 1,3.

Algumas vantagens da ressecção laparoscópica incluem menor dor pós-operatória, mobilização precoce e menor permanência hospitalar 1-5. No presente relato os dois pacientes receberam alta hospitalar no quarto dia pós-operatório.

Recomenda-se a realização de ultrassom laparoscópico intra-operatório para a demarcação da margem cirúrgica1,4, porém, este aparelho ainda é indisponível em nossa Instituição. Entretanto, a identificação macroscópica do tumor na superfície do segmento VI permitiu a delimitação da linha de secção com segurança. O exame anatomopatológico da peça cirúrgica confirmou a inexistência de neoplasia no tecido hepático adjacente à linha de coagulação (margem cirúrgica de 2cm). Uma vantagem da ressecção hepática laparoscópica por meio de radiofreqüência é que, além da margem alcançada na peça cirúrgica, esta se estende à superfície de ressecção que sofre ablação 1,3,4.

Dificuldades técnicas ou sangramento intra-operatório são motivos frequentes de conversão para cirurgia aberta 2-4. Com o dispositivo laparoscópico por radiofreqüência a perda sanguínea intra-operatória foi mínima o que tornou a cirurgia facilmente exequível e rápida. O procedimento, entretanto, deve ser realizado por equipe com experiência em cirurgia hepatobiliopancreática e videolaparoscópica, para dimimuir morbidade e mortalidade 6.

A seleção apropriada dos pacientes e técnica cirúrgica refinada foram primordiais para o sucesso da ressecção hepática laparoscópica, utilizando-se o dispositivo de radiofrequência.

Recebido em 15/03/2012

Aceito para publicação em 10/04/2012

Conflito de interesse: nenhum

Fonte de financiamento: nenhuma.

Trabalho realizado no Instituto Alfa de Gastroenterologia do Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Minas Gerais-MG-BR.

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  • 3. Pai M, Navarra G Ayav A, Sommerville C, Khorsandi SK, Damrah O, et al. Laparoscopic Habib 4X: a bipolar radiofrequency device for bloodless laparoscopic liver resection. HPB. 2008;10(4):261-4.
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  • Endereço para correspondência:

    Vivian Resende
    E-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      07 Jun 2013
    • Data do Fascículo
      Abr 2013

    Histórico

    • Recebido
      15 Mar 2012
    • Aceito
      10 Abr 2012
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