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Tratamento de tumor gastrointestinal estromal (GIST) durante cirurgia bariátrica

Resumos

O tumor estromal gastrointestinal (GIST) é um tumor mesenquimal raro. Deve-se ter atenção especial quando o GIST apresenta-se em pacientes obesos durante o ato operatório. As ressecções laparoscópicas com técnicas padronizadas, como o bypass gástrico, têm sido descritos com bons resultados. Porém, a ressecção de GIST associada à gastrectomia vertical para o tratamento para a obesidade é rara, mas pode ser feito com segurança, dependendo da localização do tumor.

Obesidade; Obesidade Mórbida; Cirurgia Bariátrica; Gastrectomia; Complicações Pós-Operatórias; Tumores do Estroma Gastrointestinal


The gastrointestinal stromal tumor (GIST) is a rare mesenchymal tumor. One should pay special attention when the GIST comes in obese patients during surgery. The laparoscopic resections with standard techniques, such as gastric bypass, have been described with good results. However, GIST resection associated sleeve gastrectomy for the treatment of obesity is rare, but can be done safely, depending on the location of the tumor.

Obesity; Obesity, Morbid; Bariatric Surgery; Gastrectomy; Postoperative Complications; Gastrointestinal Stromal Tumors


INTRODUÇÃO

O tumor do estroma gastrointestinal (GIST - Gastrointestinal Stromal Tumor) é um tumor mesenquimal raro, porém o mais comum do aparelho digestivo11. Graadt van Roggen JF, van Velthuysen ML, Hogendoorn PC. The histopathological differential diagnosis of gastrointestinal stromal tumours. J Clin Pathol. 2001;54(2):96-102.. A apresentação clínica deste tipo de tumor depende da sua localização, que pode ser do esôfago ao ânus, sendo mais comum no estomago (60%). O tratamento cirúrgico é o padrão ouro e deve ser indicado assim que é feito o diagnóstico22. Saund MS, Demetri GD, Ashley SW. Gastrointestinal stromal tumors (GIST). Curr Opin Gastrointerol.2004;20(2):89-94..

Os GIST podem ser assintomáticos, diagnosticados acidentalmente com exames de rotina ou, ainda, reconhecidos durante a laparoscopia. As ressecções laparoscópicas com técnicas já padronizadas, como o bypass gástrico, já foram descritas, apresentando bons resultados33. Sanchez BR, Morton JM, Curet MJ, Alami RS, SafadiBY. Incidental finding of gastrointestinal stromal tumors (GISTs) during laparoscopic gastric bypass. Obes Surg. 2005;15(10):1384-8.. Porém a ressecção de um GIST gástrico durante a gastroplastia vertical é raro44. Beltran MA, Pujado B, Meìndez PE, Gonzaìles FJ, Margulis DI, Contreras MA, CrucesKS. Gastric gastrointestinal stromal tumor (GIST) incidentally found and resected during laparoscopic sleeve gastrectomy.Obes Surg. 2010;20(3):393-6..

TÉCNICA

Relatamos aqui uma tática operatória alternativa para tratar pacientes com GIST que precisam ser submetidos ao tratamento cirúrgico da obesidade. A técnica utilizada foi a gastroplastia vertical em um paciente de 54 anos de idade, sexo masculino, obeso mórbido (peso: 109kg, altura: 1,59m, IMC: 43), diabético tipo II, hipertenso e com acentuada esteatose hepática. Durante a endoscopia digestiva pré-operatória encontramos uma tumoração submucosa, hipervascularizada, localizada na parede posterior do fundo gástrico, medindo aproximadamente quatro centímetros de diâmetro. Os resultados de quatro biópsias foram inconclusivos. A tomografia computadorizada do abdômen não evidenciou outras anormalidades.

No inventário laparoscópico não encontramos o tumor. Optamos, então, por uma endoscopia digestiva peroperatória para marcação da lesão com injeção perilesional de azul de metileno. Iniciamos pela liberação da grande curvatura do estômago com a selagem dos vasos gastroepiplóicos esquerdos para maior mobilização do estômago e visualização da lesão posterior. Seguimos com a liberação gástrica até identificarmos com segurança a marcação na parede posterior ao redor da lesão (Figura 1). Ressaltamos que fazemos de rotina o grampeamento do sleeve primeiro, e só depois de dividir completamente o estômago, liberamos a sua vascularização, de acordo com a padronização da técnica já descrita. No entanto, no caso descrito optamos pela variação da tática operatória para melhor visualização do tumor. Introduzimos a sonda gástrica tipo Fouchet número 32 para calibragem do sleeve (Figura 2). Realizamos os primeiros dois disparos com carga, de 45cm, para tecido espesso mantendo a distância de três centímetros do piloro. Esta distância é importante para evitar o estreitamento da incisura angularis e, consequentemente, a fístula gástrica. Prosseguimos a gastroplastia com carga de 60cm para tecido normal. Os últimos dois disparos foram realizados com cargas de 45cm para tecido fino, englobando totalmente a lesão sob visão direta (Figura 1). Testada a integridade do sleeve com a introdução azul de metileno pela sonda de Fouchet. A peça foi retirada e colocado dreno de silicone 19FR na cavidade abdominal.

Figura 1 -
Gastroplastia com ressecção da lesão.

Figura 2 -
Aspecto final do sleeve.

No dia seguinte, por via oral, o paciente iniciou a dieta com ingestão de líquidos claros e obteve alta hospitalar no segundo dia de pós-operatório. O histopatológico confirmou GIST sem atividade mitótica (index 0x50 no campo de grande aumento). O exame imunoistoquímico evidenciou células positivas para CD117 e CD34. Seis meses após a operação o peso corporal do paciente diminuiu 23kg. Foram suspensas as medicações (insulina, captopril e hidroclotiazida), usadas previamente à ressecção gástrica.

DISCUSSÃO

A incidência de doenças não diagnosticadas previamente e encontradas durante a operação para tratar a obesidade é estimada em cerca de 2% e GIST gástricos em 0,8% dos pacientes55. Finnell CW, Madan AK, Ternovits CA, Menachery SJ, Tichansky DS. Unexpected pathology during laparoscopic bariatric surgery. Surg Endosc.2007;21(6):867-9.. No caso de GIST, por se tratar de uma lesão na submucosa e/ou muscular do trato digestório, o exame endoscópico pode ser falso negativo. Quando se encontra um GIST em paciente obeso temos que dar especial atenção ao estudo gástrico, pois, durante derivação gástrica, existe a possibilidade de permanecer doença não diagnosticada no estômago excluso, que ficará sem acesso aos exames de rotina22. Saund MS, Demetri GD, Ashley SW. Gastrointestinal stromal tumors (GIST). Curr Opin Gastrointerol.2004;20(2):89-94.. Durante a realização do sleeve, apesar de haver ressecção e continuidade do trânsito normal, devemos ter atenção para a localização exata da lesão para que possamos ver a possibilidade e viabilidade de empregar tal técnica com segurança sem causar estenoses ou tortuosidades na linha de grampeamento (Figura 2). A estenose da incisura angularis, possibilita a existência da fistula no ângulo de His que pode ser gravíssima acarretando, inclusive, a morte do paciente66. Stol A, Gugelmin G, Lampa-Júnior VM, Frigulha C, Selbach RA. Complicações e óbitos nas operações para tratar a obesidade mórbida. ABCD, arq bras cir dig. 2011;24(4):282-4. .

De acordo com os critérios estabelecidos pelo National Institutes of Health, o nosso caso de GIST pode ser considerado um tumor benigno. Portanto, a ressecção foi considerada curativa com margens de segurança e, por isso, o tratamento com imatinibe não foi considerado.

REFERENCES

  • 1
    Graadt van Roggen JF, van Velthuysen ML, Hogendoorn PC. The histopathological differential diagnosis of gastrointestinal stromal tumours. J Clin Pathol. 2001;54(2):96-102.
  • 2
    Saund MS, Demetri GD, Ashley SW. Gastrointestinal stromal tumors (GIST). Curr Opin Gastrointerol.2004;20(2):89-94.
  • 3
    Sanchez BR, Morton JM, Curet MJ, Alami RS, SafadiBY. Incidental finding of gastrointestinal stromal tumors (GISTs) during laparoscopic gastric bypass. Obes Surg. 2005;15(10):1384-8.
  • 4
    Beltran MA, Pujado B, Meìndez PE, Gonzaìles FJ, Margulis DI, Contreras MA, CrucesKS. Gastric gastrointestinal stromal tumor (GIST) incidentally found and resected during laparoscopic sleeve gastrectomy.Obes Surg. 2010;20(3):393-6.
  • 5
    Finnell CW, Madan AK, Ternovits CA, Menachery SJ, Tichansky DS. Unexpected pathology during laparoscopic bariatric surgery. Surg Endosc.2007;21(6):867-9.
  • 6
    Stol A, Gugelmin G, Lampa-Júnior VM, Frigulha C, Selbach RA. Complicações e óbitos nas operações para tratar a obesidade mórbida. ABCD, arq bras cir dig. 2011;24(4):282-4.
  • Fonte de financiamento: nenhuma

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jan-Feb 2015

Histórico

  • Recebido
    15 Fev 2014
  • Aceito
    10 Maio 2014
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