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Impacto da terapia neoadjuvante na diminuição do estádio no adenocarcinoma de reto baixo: papel da ressonância magnética da pelve na determinação do estádio

RESUMO

Objetivo:

avaliar o efeito da terapia neoadjuvante, nos pacientes portadores de adenocarcinoma de reto, sobre o estádio (TNM) e validar o emprego da ressonância magnética como método de determinação do estádio locorregional.

Métodos:

estudo retrospectivo de 157 pacientes com diagnóstico de adenocarcinoma de reto baixo, que foram divididos em dois grupos: Grupo 1, 81 pacientes (52%), submetidos ao tratamento cirúrgico de princípio, cuja finalidade foi analisar a acurácia da determinação do estádio locorregional pela ressonância magnética da pelve, através da comparação entre os achados radiológicos e os achados anatomopatológicos; Grupo 2, 76 pacientes (48%), encaminhados à terapia neoadjuvante (quimioterapia e radioterapia), antes do tratamento cirúrgico definitivo, com o intuito de avaliar seus efeitos sobre o estádio, através da comparação dos achados clínico-radiológicos com os anatomopatológicos.

Resultados:

no grupo 1, a acurácia da determinação da profundidade da lesão (T) e do comprometimento linfonodal (N), foram de 91,4% e 82,7%, respectivamente. No grupo 2, a terapia neoadjuvante diminuiu o estádio T, estádio N e o estádio TNM em 51,3%, 21% e 48,4% dos casos, respectivamente.

Conclusão:

a terapia neoadjuvante nos pacientes com adenocarcinoma de reto é efetiva na diminuição do estádio e a ressonância magnética da pelve é eficaz na determinação do estádio locorregional.

Descritores:
Adenocarcinoma; Neoplasias Retais; Terapia Neoadjuvante; Imagem por Ressonância Magnética; Estadiamento de Neoplasias.

ABSTRACT

Objective:

to evaluate the effect of neoadjuvant therapy on the stage (TNM) of patients with rectal adenocarcinoma and validate the use of MRI as a method of determining locoregional stage.

Methods:

we conducted a retrospective study of 157 patients with lower rectum adenocarcinoma, whom we divided into two groups: Group 1, 81 patients (52%) who had undergone surgical treatment initially, with the purpose to analyze the accuracy of locoregional staging by pelvic magnetic resonance imaging throug the comparison of radiological findings with pathological ones; Group 2, 76 patients (48%), who had been submitted to neoadjuvant therapy (chemotherapy and radiation) prior to definitive surgical treatment, so as to evaluate its effects on the stage by comparing clinical and radiological findings with pathology.

Results:

In group 1, the accuracy of determining tumor depth (T) and lymph node involvement (N) was 91.4% and 82.7%, respectively. In group 2, neoadjuvant therapy decreased the T stage, N stage and TNM stage in 51.3%, 21% and 48.4% of cases, respectively.

Conclusion:

neoadjuvant therapy in patients with rectal adenocarcinoma is effective in decreasing disease stage, and pelvic magnetic resonance imaging is effective for locoregional staging.

Keywords:
Adenocarcinoma; Rectal Neoplasms; Neoadjuvant Therapy; Magnetic Resonance Imaging; Neoplasm Staging.

INTRODUÇÃO

A ressecção cirúrgica do câncer de reto ainda é a única possibilidade de cura e continua sendo considerada como a principal forma de tratamento por muitos autores11. Lange MM, Martz JE, Ramdeen B, Brooks V, Boachie-Adjei K, van de Velde CJ, et al. Long-term results of rectal cancer surgery with a systematical operative approach. Ann Surg Oncol. 2013;20(6):1806-15.,22. Kosinski L, Habr-Gama A, Ludwig K, Perez R. Shifting concepts in rectal cancer management: a review of contemporary primary rectal cancer treatment strategies. CA Cancer J Clin. 2012;62(3):173-202.. A evolução da técnica operatória, excetuando-se as vias de acesso, atingiu o seu ponto máximo após a constatação de que a excisão total do mesorreto e a ressecção da margem circunferencial diminuem de forma significativa a recidiva local33. Heald RJ, Ryall RD. Recurrence and survival after total mesorectal excision for rectal cancer. Lancet. 1986;1(8496):1479-82..

Na década de 90, tornou-se consenso que, o tratamento do adenocarcinoma do reto estádios II e III demandaria além da operação, a realização de quimioterapia e radioterapia complementar, após a constatação dos seus efeitos benéficos tanto na diminuição da recidiva da doença, como no aumento das taxas de sobrevivência no longo prazo44. NIH consensus conference. Adjuvant therapy for patients with colon and rectal cancer. JAMA. 1990;264(11):1444-50.. Apesar dessa evolução, o tratamento do câncer de reto permanece ainda desafiador, já que a sobrevivência em longo prazo ainda não evoluiu de forma consistente55. O'Connell JB, Maggard MA, Ko CY. Colon cancer survival rates with the new American Joint Committee on Cancer sixth edition staging. J Natl Cancer Inst. 2004;96(19):1420-5.. Foram publicadas oito grandes séries clínicas que analisaram a terapia neoadjuvante no câncer de reto. Todos estes estudos evidenciaram uma superioridade desta modalidade terapêutica quando comparada à cirurgia realizada de forma exclusiva, assim como também, em relação à terapia adjuvante22. Kosinski L, Habr-Gama A, Ludwig K, Perez R. Shifting concepts in rectal cancer management: a review of contemporary primary rectal cancer treatment strategies. CA Cancer J Clin. 2012;62(3):173-202..

Dentre os benefícios da radio e quimioterapia neoadjuvante, podemos citar: maior radiossensibilidade dos tecidos no pré-operatório, devido à ausência de fibrose cirúrgica, menor exposição do intestino delgado à radiação, menor toxicidade sistêmica, e diminuição do tamanho das lesões, que aumentam a ressecabilidade e a taxa de preservação esfincteriana66. Willett CG, Warland G, Coen J, Shellito PC, Compton CC. Rectal cancer: the influence of tumor proliferation on response to preoperative irradiation. Int J Radiat Oncol Biol Phys. 1995;32(1):57-61.. Com relação às desvantagens, temos: a potencial deficiência na determinação acurada do estádio anatomopatológico, o que pode acarretar em uma falha no planejamento pós-operatório, a prorrogação da realização do tratamento cirúrgico definitivo, e um possível aumento dos índices de morbidade e letalidade operatória77. Holm T, Singnomklao T, Rutqvist LE, Cedermark B. Adjuvant preoperative radiotherapy in patients with rectal carcinoma. Adverse effects during long term follow-up of two randomized trials. Cancer. 1996;78(5):968-76.. Atualmente, pacientes que apresentam neoplasias retais baixas ressecáveis em estádios II e III, desde que não tenham contraindicações clínicas, devem ser submetidos à terapia neoadjuvante88. National Comprehensive Cancer Network. NCCN Practice Guidelines for Colon and Rectal Cancer. NCCN Version 2010. Washington, DC; 2010..

Dessa forma, é essencial a determinação precisa do estádio (TNM), para que o tratamento seja bem indicado22. Kosinski L, Habr-Gama A, Ludwig K, Perez R. Shifting concepts in rectal cancer management: a review of contemporary primary rectal cancer treatment strategies. CA Cancer J Clin. 2012;62(3):173-202.. Como regra geral temos a tomografia computadorizada do tórax e do abdome, com excelentes resultados na detecção de doença metastática (M) e a ressonância da pelve ou a ultrassonografia endorretal, para a determinação do estádio locorregional (T e N)99. Samee A, Selvasekar CR. Current trends in staging rectal cancer. World J Gastroenterol. 2011;17(7):828-34.. Conceitualmente, o exame ultrassonográfico é superior na análise de tumores menores e mais superficiais, quando comparado à ressonância, que apresenta melhor acurácia em tumores mais volumosos, que se estendem além da margem circunferencia1010. Ceelen WP. Progress in rectal cancer treatment. ISRN Gastroenterol. 2012;2012:648183.,1111. Marohn MRI. Endorectal ultrasound. Postgradute course syllabus. SAGES; 1997:126-53..

Os objetivos do presente estudo foram avaliar o efeito da terapia neoadjuvante sobre o estádio nos pacientes portadores de adenocarcinoma de reto baixo e validar o emprego da ressonância magnética como método de determinação do estádio locorregional.

MÉTODOS

Foi realizada uma análise retrospectiva de 157 prontuários de pacientes com diagnóstico de adenocarcinoma de reto baixo, durante o período de fevereiro de 2005 a outubro de 2012. Este estudo teve a aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa em Seres Humanos da Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo sob o parecer número - 109.338.

Os pacientes foram divididos em dois grupos distintos de acordo com a abordagem terapêutica inicial empregada: Grupo 1, pacientes encaminhados para tratamento cirúrgico de princípio, em caráter eletivo, após determinação pré-operatória do estádio; Grupo 2, pacientes que foram, após a determinação do estádio, encaminhados para terapia neoadjuvante, antes do tratamento cirúrgico definitivo. A operação, nestes casos, foi realizada oito semanas após o término da terapia neoadjuvante, sem nova determinação do estádio por métodos de imagem.

A determinação do estádio no pré-operatório foi realizada através de exame físico, proctológico e radiológico. A tomografia do tórax e do abdome superior para avaliação de doença sistêmica (metástases à distância) e a ressonância magnética da pelve para avaliar o acometimento locorregional. O estádio final foi determinado pela análise anatomopatológica dos espécimes cirúrgicos associado aos achados pré e intraoperatórios. Para a descrição do estádio, adotou-se o sistema de determinação descrito pela American Joint Commitee on Cancer1212. American Joint Committee on Cancer. AJCC Cancer staging manual. 6th Chicago, Ill; 2002..

Todos os exames de imagem desta casuística foram realizados pelo Serviço de Radiologia da Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo, utilizando aparelhos de ressonância magnética dos modelos Philips Intera 1.0T ou Philips Achieva 1.5T SE.

Dependendo da localização da lesão e das condições intraoperatórias, as operações realizadas foram a retossigmoidectomia abdominal ou a amputação de reto com excisão total do mesorreto.

O esquema de quimioterapia empregado nos pacientes submetidos à terapia neoadjuvante foi o 5-Fluouracil na dose de 380mg/m2 e Leucovorin 20mg/m2 por cinco dias contínuos (D1 a D5) concomitante com a primeira e a quinta semana de radioterapia. A superfície corpórea era obtida a partir da fórmula: Peso (kg)0,425 x Altura (cm)0,725 x 71,84 /10.000.

A radioterapia consistia de 28 sessões em cinco semanas e três dias de 180cGy por sessão, totalizando 5040 cGy.

Foram excluídos desta casuística os pacientes com antecedentes de cirurgia colorretal oncológica, aqueles operados no serviço de emergência ou submetidos à cirurgia paliativa; e os que abandonaram o tratamento.

Foram analisadas as variáveis sexo, idade na ocasião do diagnóstico, profundidade da invasão tumoral na parede retal (T), acometimento linfonodal (N), presença de metástases (M), estádio pré-operatório e final (TNM).

Para a análise estatística dos resultados foram empregados os testes de Wilcoxon e McNemar com o intuito de verificar possíveis diferenças entre as variáveis T, N, M e estádio de ambos os grupos. Não se realizou comparação entre os grupos 1 e 2. Foi utilizada planilha eletrônica para a organização dos dados e o pacote estatístico IBM SPSS (Statistical Package for Social Sciences), em sua versão 21.0, para a obtenção dos resultados.

RESULTADOS

Dos 157 pacientes, 81 (52%) correspondem ao grupo 1 em que a cirurgia foi realizada de princípio e 76 (48%) ao grupo 2 em que se realizou a terapia neoadjuvante precedendo à operação.

A média etária dos pacientes do grupo 1 foi 58,27 anos (±13,15 anos), enquanto que no grupo 2 foi 59,96 anos (±11,81 anos).

Com relação ao sexo dos pacientes do grupo 1, 33 eram mulheres (41%), com média etária de 58,63 anos (±13,44 anos) e 48 homens (59%), média etária de 58,02 anos (±13,09 anos).

Quanto ao sexo dos pacientes do grupo 2, 37 eram mulheres (49%), com média etária de 59,56 anos (±12,62 anos) e 39 homens (51%), média etária de 60,33 anos (±11,15 anos).

Resultados Grupo 1

A análise da correlação radiológica e anatomopatológica da variável T não detectou variação estatisticamente significante, revelando uma acurácia de 91% (Figura 1).

Figura 1
Correlação radiológica e anatomopatológica das alterações na variável T nos 81 pacientes do grupo 1. Fonte: ISCMSP, 2013.

A análise da correlação radiológica e anatomopatológica da variável N não detectou variação estatisticamente significante, revelando uma acurácia de 83% (Figura 2).

Figura 2:
Correlação radiológica e anatomopatológica das alterações na variável N, nos 81 pacientes do grupo 1. Fonte: ISCMSP, 2013.

A variável M manteve-se constante, tanto no pré quanto no pós-operatório.

A correlação do estádio clínico e o estádio final constatou que houve concordância em 84% dos casos. Em 11% dos casos, o estádio foi inicialmente subestimado e em 4% superestimado. Ocorreu um caso em que a lesão não foi detectada (Figura 3).

Figura 3:
Correlação do estádio clínico e final em 81 pacientes do grupo 1. Fonte: ISCMSP, 2013.

Resultados Grupo 2

A análise do efeito da terapia neoadjuvante na variável T demonstra que em 51% dos casos houve regressão, sendo que a resposta patológica (T0) ocorreu em 17% dos casos (Tabela 1).

Tabela 1:
Comparação entre a variável T determinada radiologicamente e após análise histopatológica no grupo 2

A análise do efeito da terapia neoadjuvante na variável N demonstra que em 21% dos casos houve regressão (Tabela 2).

Tabela 2:
Comparação entre a variável N determinada radiologicamente e após análise histopatológica no grupo 2

A análise do efeito da terapia neoadjuvante, sobre a variável M demonstrou que houve um avanço na ocorrência de metástases à distância da ordem de 7%, sem significância estatística.

A análise do efeito da terapia neoadjuvante sobre o estádio demonstra uma regressão de 48,5% e um avanço de 20%. Observou-se uma taxa de resposta patológica completa de 14,5% que corresponde a 11 casos (Tabela 3). A exclusão dos estádios I e IV revela que a regressão do estádio ocorre em 56% dos casos, com resposta patológica completa de 16%.

Tabela 3:
Comparação entre o estádio clínico e final no grupo 2

DISCUSSÃO

O primeiro grande estudo prospectivo e randomizado, que demonstrou a efetividade da quimioterapia e da radioterapia neoadjuvante, veio da Alemanha, em 2004. Foram randomizados 823 pacientes, de modo a receberem quimio e radioterapia no pré-operatório (421 casos) e pós-operatório (402 casos). Os autores verificaram que a incidência de recidiva local em cinco anos foi 6% versus 13%, respectivamente. Não se observou aumento significativo da sobrevivência em cinco anos entre os grupos1313. Sauer R, Becker H, Hohenberger W, Rödel C, Wittekind C, Fietkau R, et al. Preoperative versus postoperative chemoradiotherapy for rectal cancer. N Engl J Med. 2004;351(17):1731-40..

Embora não esteja ainda bem definido o regime ideal de tratamento neoadjuvante, não há dúvida da sua eficácia, principalmente no controle da recidiva local, e, consequentemente, no aumento do intervalo livre de doença22. Kosinski L, Habr-Gama A, Ludwig K, Perez R. Shifting concepts in rectal cancer management: a review of contemporary primary rectal cancer treatment strategies. CA Cancer J Clin. 2012;62(3):173-202.. Nota-se uma polarização entre as instituições europeias e as norte-americanas. Nas publicações europeias, a preferência se dá principalmente por ciclos curtos de radioterapia neoadjuvante, por apresentarem menores índices de morbidade. Nos estudos norte-americanos, à semelhança do que foi realizado no presente trabalho, dá-se preferência aos ciclos com duração mais prolongada, defendendo que, a redução das dimensões tumorais é mais eficiente.

A intenção deste estudo foi analisar, de forma estratificada, os efeitos da terapia neoadjuvante sobre o estádio (TNM) e suas variáveis individuais, nos pacientes do grupo 2. Essas variáveis foram determinadas em dois momentos pontuais: no pré-operatório, com o auxílio da ressonância magnética da pelve (para a determinação do estádio locorregional - T e N) e da tomografia de tórax e abdome (para detecção de metástases à distância - M); e no pós-operatório, pelos dados da análise histopatológica.

Embora possa ser questionada a manutenção da variável M neste estudo, já que a terapia neoadjuvante apresenta efeitos essencialmente locorregionais, a análise da variável M se deu principalmente pelo fato de que a determinação correta do estádio depende fundamentalmente das três variáveis (T, N e M). Além disso, apesar de seus efeitos sistêmicos, serem ainda pouco citados, alguns autores demonstram que a quimioterapia neoadjuvante pode iniciar precocemente o tratamento sistêmico das metástases e ser utilizado como um marcador de resposta tumoral, o que poderia aprimorar o tratamento posterior1414. Martin LK, Bekaii-Saab T. Optimizing neoadjuvant therapy for rectal cancer with oxaliplatin. J Natl Compr Canc Netw. 2013;11(3):298-307..

O grupo 1 corresponde a um período em que a terapia neoadjuvante ainda não estava instituída no serviço. A partir do final de 2007, os pacientes que se apresentavam em estádio clínico II ou III (T3 N0 M0 ou T1,2,3 N1,2 M0), passaram a ser encaminhados para a terapia neoadjuvante.

O motivo para analisar os pacientes do grupo 1, de tratamento distinto, se deu principalmente, para avaliar a qualidade na determinação do estádio clínico em nosso serviço, já que foi o mesmo em toda a amostra desta série, tanto no grupo 1 como no grupo 2. Dessa forma, o viés do fenômeno superestadiamento ou subestadiamento, que a ressonância pode eventualmente apresentar, foi eliminado. No grupo 1 desta série, houve uma significativa concordância entre o estádio clínico e o estádio histopatológico, que ocorreu em 91% dos casos para a variável T e 83% para a variável N.

Para muitos autores, a ressonância da pelve é considerada a técnica mais adequada para determinar o estádio locorregional, uma vez que apresenta uma alta sensibilidade e especificidade na análise das estruturas adjacentes ao reto, incluindo a fáscia mesorretal1515. Brown G, Radcliffe AG, Newcombe RG, Dallimore NS, Bourne MW, Williams GT. Preoperative assessment of prognostic factors in rectal cancer using high-resolution magnetic resonance imaging. Br J Surg. 2003;90(3):355-64.. Da mesma forma, é a única técnica disponível, para a avaliação adequada da margem circunferencial, considerada um dos fatores prognósticos de recidiva local mais importantes na atualidade. Em recente publicação americana, concluiu-se que a margem circunferencial (CRM≤1mm) é um fator de risco independente para a recidiva local, equivalendo à margem cirúrgica comprometida; já CRM≤2mm, está associada à ocorrência de metástases à distância, independentemente da profundidade da lesão tumoral (T) e do comprometimento linfonodal (N)1616. Trakarnsanga A, Gonen M, Shia J, Goodman KA, Nash GM, Temple LK, et al. What is the significance of the circumferential margin in locally advanced rectal cancer after neoadjuvant chemoradiotherapy? Ann Surg Oncol. 2013;20(4):1179-84..

Segundo Mortensen et al.1717. Mortensen LA, Leffers AM, Holck S, Bülow S, Achiam M. Magnetic resonance imaging in the preoperative staging of rectum cancer. Ugeskr Laeger. 2009;171(35):2476-81., a acurácia da ressonância em relação à determinação da profundidade tumoral varia de acordo com o nível de comprometimento na parede do reto, da seguinte maneira: lesões T1 - 75%, T2 - 54%, T3 - 87%, T4 - 86%. Com relação ao envolvimento linfonodal, a ressonância apresenta acurácia de até 85%1515. Brown G, Radcliffe AG, Newcombe RG, Dallimore NS, Bourne MW, Williams GT. Preoperative assessment of prognostic factors in rectal cancer using high-resolution magnetic resonance imaging. Br J Surg. 2003;90(3):355-64..

Uma meta-análise publicada em 1997, envolvendo 26 publicações com 1976 pacientes, constatou que a ultrassonografia endorretal tem acurácia de 88% para a determinação do estádio1717. Mortensen LA, Leffers AM, Holck S, Bülow S, Achiam M. Magnetic resonance imaging in the preoperative staging of rectum cancer. Ugeskr Laeger. 2009;171(35):2476-81.. Dentre as desvantagens relacionadas ao exame ultrassonográfico, podemos citar que é um exame operador-dependente; apresenta baixa sensibilidade em distinguir espessamentos inflamatórios, da extensão tumoral transmural propriamente dita; lesões volumosas e estenosantes são tecnicamente difíceis de serem avaliadas; sua aplicação em pacientes submetidos à terapia neoadjuvante, ainda està sendo determinada, entretanto os dados iniciais são favoráveis à ressonância da pelve99. Samee A, Selvasekar CR. Current trends in staging rectal cancer. World J Gastroenterol. 2011;17(7):828-34..

De fato, a ressonância é um excelente método de avaliação da invasão tumoral na parede retal, entretanto o mesmo não se pode dizer com relação ao comprometimento linfonodal, já que os dados na literatura não são tão animadores. Cada vez mais tem se dado importância às características morfológicas dos linfonodos perirretais, tais como a sua heterogeneidade e bordas irregulares, que são mais preditivas do que as suas dimensões1818. Brown G, Richards CJ, Bourne MW, Newcombe RG, Radcliffe AG, Dallimore NS, et al. Morphologic predictors of lymph node status in rectal cancer with use of high-spatial-resolution MR imaging with histopathologic comparison. Radiology. 2003;227(2):371-7.. Devemos ressaltar que 18% das metástases linfonodais ocorrem em linfonodos menores do que 5mm1919. Kim JH, Beets GL, Kim MJ, Kessels AG, Beets-Tan RG. High-resolution MR imaging for nodal staging in rectal cancer: are there any criteria in addition to the size? Eur J Radiol. 2004;52(1):78-83..

Esse tópico ganha relevância ainda maior, no que diz respeito à realização de nova determinação do estádio após o término da terapia neoadjuvante. A literatura revela que os atuais métodos de diagnóstico, tais como a tomografia por emissão de pósitrons2020. Hopkins S, Fakih M, Yang GY. Positron emission tomography as predictor of rectal cancer response during or following neoadjuvant chemoradiation. World J Gastrointest Oncol. 2010;2(5):213-7. e a ressonância de alta resolução2121. Chang GJ, You YN, Park IJ, Kaur H, Hu CY, Rodriguez-Bigas MA, et al. Pretreatment high-resolution rectal MRI and treatment response to neoadjuvant chemoradiation. Dis Colon Rectum. 2012;55(4):371-7., são ainda inconsistentes na avaliação de doença residual, clinicamente indetectável. Nesta série, não se realizou nova determinação do estádio por acreditarmos que o tratamento oncológico ideal deve ser baseado no estádio clínico inicialmente definido, de modo que não haveria alteração no planejamento cirúrgico. Entretanto, constatamos 14,5% de resposta patológica completa, o que nos faz refletir sobre novas perspectivas de tratamento. Outro aspecto, muito relevante, reside na grande dificuldade de se realizar a ressonância magnética no serviço em que foi realizado este estudo, devido a grande demanda e ao seu alto custo.

Encontra-se muita controvérsia na literatura a respeito do intervalo de tempo ideal para realizar a operação. Os que defendem intervalos de tempo mais curto sugerem que as dificuldades operatórias são menores, devido a menor incidência de aderências e fibroses decorrentes da radiação pélvica, possibilitando a realização de uma cirurgia mais radical; defendem também que o risco de disseminação da doença, seria menor. Os que defendem intervalos de tempo mais prolongado acreditam que a incidência de resposta patológica completa é maior. Tulchinsky et al.2222. Tulchinsky H, Shmueli E, Figer A, Klausner JM, Rabau M. An interval >7 weeks between neoadjuvant therapy and surgery improves pathologic complete response and disease-free survival in patients with locally advanced rectal cancer. Ann Surg Oncol. 2008;15(10):2661-7., verificaram taxas de resposta patológica completa de 35%, nos casos operados após sete semanas, ante 17%, nos operados antes deste período. Em nossa casuística, o intervalo de tempo entre o término da terapia neoadjuvante e o procedimento cirúrgico foi oito semanas, sendo que a taxa de resposta patológica completa foi semelhante ao estudo de Rödel et al.2323. Rödel C, Liersch T, Becker H, Fietkau R, Hohenberger W, Hothorn T, et al. Preoperative chemoradiotherapy and postoperative chemotherapy with fluorouracil and oxaliplatin versus fluorouracil alone in locally advanced rectal cancer: initial results of the German CAO/ARO/AIO-04 randomised phase 3 trial. Lancet Oncol. 2012;13(7):679-87., que chegou a 17%. Contudo, a regressão do estádio, no nosso estudo, foi 48,5%, índice este que se assemelha à publicação de Kuriu et al.2424. Kuriu Y, Kokuba Y, Murayama Y, Komatsu S, Shiozaki A, Ikoma H, et al. Neoadjuvant chemoradiotherapy for locally advanced rectal cancer. Gan To Kagaku Ryoho. 2012;39(12):1951-3., com 40%.

Esse índice relativamente abaixo da média, no que diz respeito à resposta patológica completa que obtivemos em nossa casuística, pode ser atribuído a algumas discrepâncias de nomenclatura existentes na literatura para descrição do comportamento tumoral à terapia neoadjuvante. Está claro que termos frequentemente usados, como downstaging, downsizing, tumor regression, podem ser erroneamente empregados. Não necessariamente alterações isoladas da variáveis T, N ou M, podem ser interpretadas como uma diminuição de estádio. A regressão do estádio deve obrigatoriamente ser determinada pela análise combinada das variáveis (TNM)22. Kosinski L, Habr-Gama A, Ludwig K, Perez R. Shifting concepts in rectal cancer management: a review of contemporary primary rectal cancer treatment strategies. CA Cancer J Clin. 2012;62(3):173-202.. Cabe ressaltar que por definição, o conceito de resposta patológica completa, deve ser traduzido como T0N0M0, ou seja, sem identificação de neoplasia na peça cirúrgica. Já o conceito de resposta clínica completa é a ausência de doença residual clinicamente detectável após tratamento neoadjuvante2525. Harb-Gama A, Perez RO, Julião GPS. Terapia neoadjuvante e adjuvante no câncer de reto. Conduta na resposta completa. In: Campos FGCM, Regadas FSP, Pinho M, editores. Tratado de Coloproctologia. São Paulo: Atheneu; 2012. cap.30.2, p.455-62..

Observamos, na presente casuística, que a terapia neoadjuvante regrediu o estádio T em 51% dos casos, sendo que na variável N esse índice correspondeu a 21%. Apesar dessa diferença, ambos foram significantes do ponto de vista estatístico. A resposta relativamente baixa do N em relação ao T é um dos responsáveis pela grande discussão gerada em torno da modalidade terapêutica de conduta expectante diante da resposta clínica completa2626. Hiotis SP, Weber SM, Cohen AM, Minsky BD, Paty PB, Guillem JG, et al. Assessing the predictive value of clinical complete response to neoadjuvant therapy for rectal cancer: an analysis of 488 patients. J Am Coll Surg. 2002;194(2):131-5; discussion 135-6.,2727. Habr-Gama A, Perez RO, Nadalin W, Sabbaga J, Ribeiro U Jr, Silva e Sousa AH Jr, et al. Operative versus nonoperative treatment for stage 0 distal rectal cancer following chemoradiation therapy: long-term results. Ann Surg. 2004;240(4):711-7; discussion 717-8..

Não há dúvidas de que a terapia neoadjuvante traz benefícios concretos para os pacientes com adenocarcinoma retal, tais como o aumento da incidência de operações com preservação de esfíncter2828. Habr-Gama A, Perez RO, Kiss DR, Rawet V, Scanavini A, Santinho PM, et al. Preoperative chemoradiation therapy for low rectal cancer. Impact on downstaging and sphincter-saving operations. Hepatogastroenterology. 2004;51(60):1703-7., embora muitos questionamentos ainda estejam longe de serem respondidos. Entre eles, como identificar os não respondedores? Apesar da falta de significância estatística, nesta série de pacientes, constatamos que o estádio apresentou avanço em 20% dos casos. A importância em se identificar precocemente os pacientes que não responderão a essa modalidade de tratamento, provavelmente evitaria a progressão da doença, uma vez que não é desprezível o intervalo de tempo dispensado entre o término da terapia e a cirurgia.

Com a evolução dos métodos diagnósticos de imagem e o avanço na área da biologia molecular, em um futuro próximo, novos protocolos de terapia neoadjuvante emergirão para nortear de modo mais individualizado o tratamento, diminuindo seus efeitos desfavoráveis e não postergando o tratamento cirúrgico que, sem dúvida nenhuma, ainda é a única opção de cura.

Em conclusão, a terapia neoadjuvante, nos pacientes portadores de adenocarcinoma de reto, é efetiva na diminuição do estádio e a ressonância magnética da pelve, como método de determinação locorregional do estádio, é eficaz.

REFERENCES

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  • Fonte de financiamento:

    nenhuma.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Mar-Apr 2016

Histórico

  • Recebido
    01 Out 2015
  • Aceito
    08 Mar 2016
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