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Análise comparativa dos efeitos do óleo-resina de Copaifera multijuga e da nitrofurazona na cicatrização de ferida cutânea

RESUMO

Objetivo:

avaliar histologicamente e macroscopicamente a influência do óleo-resina de Copaifera multijuga no processo de cicatrização de feridas cutâneas, comparando com o grupo submetido ao uso da nitrofurazona.

Métodos:

foram utilizados 36 ratos, divididos em três grupos de 12 animais, conforme o tratamento a ser administrado. Grupo SF (controle, recebeu soro fisiológico sobre a lesão), Grupo ÓLEO (tratamento tópico com óleo de Copaíba), Grupo NITRO (tratamento tópico com Nitrofurazona). Foi confeccionada uma ferida circular de 8mm de diâmetro no dorso de cada animal. Cada um dos três grupos de 12 animais foi subdividido em três subgrupos, de acordo com o tempo de tratamento e de eutanásia (7, 14 e 21 dias). Todos os animais receberam o tratamento proposto diariamente. As lesões foram fotografadas para mensuração de sua área, bem como, avaliados aspectos macroscópicos. As cicatrizes foram ressecadas e coradas, para quantificar e qualificar as fibras elásticas, colágenas, grau de epitelização, neovascularização e inflamação.

Resultados:

embora o soro fisiológico tenha proporcionado um fechamento mais rápido da ferida em sua fase inicial, a partir de 14 dias o tamanho das feridas dos três grupos testados se equivaleu. Níveis de inflamação e neovascularização foram semelhantes nos três grupos. A quantidade de fibras colágenas e elásticas foi maior nos grupos Nitrofurazona e Óleo de Copaíba.

Conclusão:

em ratos machos da linhagem Wistar, o óleo-resina de Copaifera multijuga influencia positivamente no processo de cicatrização, porém é menos eficaz que a nitrofurazona na cicatrização por segunda intenção.

Descritores:
Cicatrização; Plantas Medicinais; Colágeno; Colágeno Tipo I; Colágeno Tipo III.

ABSTRACT

Objectives:

to evaluate, histologically and macroscopically, the influence of Copaifera multijuga (Copaíba) oil-resin on the healing process of cutaneous wounds, comparing it with nitrofurazone.

Methods:

we divided 36 rats into three groups of 12 animals, according to the treatment to be administered. Group SL (control) received saline on the lesion; the Group OIL received topical treatment with Copaíba oil; and the Group NITRO was treated with Nitrofurazone. We inflicted a circular wound of 8mm in diameter on the back of each animal. We subdivided each of the three groups of 12 animals into three subgroups, according to treatment time and euthanasia (7, 14 and 21 days). All animals received the proposed treatment daily. We photographed the lesions for area measurement, as well as for evaluation of macroscopic aspects. We resected and stained the scars to quantify and qualify elastic fibers, collagen, degree of epithelization, neovascularization and inflammation.

Results:

although the saline solution provided a faster wound closure in its initial phase, after 14 days the wound size of the three groups tested was the same. Levels of inflammation and neovascularization were similar in all three groups. The amount of collagen and elastic fibers was higher in the Nitrofurazone and Copaíba oil groups.

Conclusion:

in male Wistar rats, Copaifera multijuga oil-resin positively influences the healing process, but it is less effective than nitrofurazone in healing by secondary intention.

Keywords:
Wound Healing. Plants; Medicinal. Collagen. Collagen Type I. Collagen Type III

INTRODUCTION

Nos últimos anos, tem-se verificado um crescente interesse pela medicina popular, com a utilização de produtos naturais para o controle de enfermidades11. Barbosa MH, Zuffi FB, Maruxo HB, Loamí L, Jorge LLR. Therapeutic properties of propolis for treatment of skin lesions. Acta Paul Enferm. 2009; 22(3):318-22.. Como consequência disso, houve um aumento no número de pesquisas com fitoterápicos, de modo a obter-se medicamentos mais baratos e com efeitos semelhantes aos medicamentos tradicionais22. Cavalcanti Neto AT, Arruda TEP, Arruda TTP, Pereira SLS, Turatti E. Análise comparativa entre o óleo-resina de copaíba e o digluconato de clorexidina no processo de cicatrização tecidual. Estudo histológico em dorso de ratos. Rev Odontol UNESP. 2005;34(2):107-12..

Apesar de amplamente comercializado e utilizado pela população com as mais variadas finalidades, o óleo de copaíba ainda deixa dúvidas quanto à sua eficácia e segurança. Há problemas no uso do óleo, tais como a contaminação, a autenticidade e a mistura deste com outros óleos de origem vegetal, o que além de alterar o possível efeito terapêutico desejado, pode se traduzir em um prejuízo para a saúde dos consumidores33. Vieira RC, Bombardiere E, Oliveira JJ, Lino Jr RS, Brito LAB, Junqueira-Kipnis AP. Influência do óleo de Copaifera langsdorffii no reparo de ferida cirúrgica em presença de corpo estranho. Pesq Vet Bras. 2008;28(8):358-66..

Encontrada principalmente nos biomas da bacia amazônica e no cerrado, a "copaibeira", como é conhecida popularmente, é uma árvore pertencente ao gênero Copaifera, família das leguminosas, sendo as principais a C. officinaliis, C. reticulata, C. langsdorffii, C. guyanensis e C. multijuga, de cujos troncos se extrai um óleo-resina ou bálsamo22. Cavalcanti Neto AT, Arruda TEP, Arruda TTP, Pereira SLS, Turatti E. Análise comparativa entre o óleo-resina de copaíba e o digluconato de clorexidina no processo de cicatrização tecidual. Estudo histológico em dorso de ratos. Rev Odontol UNESP. 2005;34(2):107-12.,44. Brito NMB, Kulay Jr L, Simões MJ, Mora AO, Diniz JA, Lamarão LG. Estudo ultraestrutural do colo uterino de ratas ooforectomizadas após aplicação de óleo de copaíba. Acta Cir Bras. 2000;15(4):201-6.,55. Muniz JWC, Bozza PT, Nascimento JL, Reis PA. Atividade anti-inflamatória do óleo-resina da copaífera reticulata em modelo inflamatório de edema de pata. Rev Para Med. 2009;23(1).. Utilizado desde o Século XVI para fins medicinais22. Cavalcanti Neto AT, Arruda TEP, Arruda TTP, Pereira SLS, Turatti E. Análise comparativa entre o óleo-resina de copaíba e o digluconato de clorexidina no processo de cicatrização tecidual. Estudo histológico em dorso de ratos. Rev Odontol UNESP. 2005;34(2):107-12.,66. Arroyo-Acevedo J, Quino-Florentini M, Martínez-Heredia J, Almora-Pinedo Y, Alba-González A, Condorhuamán-Figueroa M. Efecto cicatrizante del aceite de Copaifera officinalis (copaiba), en pacientes con úlcera péptica. An Fac Med. 2011;72(2):113-7. o óleo de copaíba é descrito na literatura como antiedêmico55. Muniz JWC, Bozza PT, Nascimento JL, Reis PA. Atividade anti-inflamatória do óleo-resina da copaífera reticulata em modelo inflamatório de edema de pata. Rev Para Med. 2009;23(1)., anti-inflamatório33. Vieira RC, Bombardiere E, Oliveira JJ, Lino Jr RS, Brito LAB, Junqueira-Kipnis AP. Influência do óleo de Copaifera langsdorffii no reparo de ferida cirúrgica em presença de corpo estranho. Pesq Vet Bras. 2008;28(8):358-66.,77. Comelli Jr E, Skinovski J, Sigwalt MF, Branco AB, Luz SR, Baulé Cde P. Rupture point analysis of intestinal anastomotic healing in rats under the action of pure Copaíba (Copaifera Iangsdorfii) oil. Acta Cir Bras . 2010; 25(4):362-7.,88. Pieri FA, Mussi MC, Fiorini JE, Moreira MA, Schneedorf JM. Bacteriostatic effect of copaiba oil (Copaifera officinalis) against Streptococcus mutans. Braz Dent J. 2012;23(1):36-8., antibacteriano88. Pieri FA, Mussi MC, Fiorini JE, Moreira MA, Schneedorf JM. Bacteriostatic effect of copaiba oil (Copaifera officinalis) against Streptococcus mutans. Braz Dent J. 2012;23(1):36-8.,99. Santos AO, Ueda-Nakamura T, Dias Filho BP, Veiga Jr VF, Pinto AC, Nakamura CV. Antimicrobial activity of Brazilian copaiba oils obtained from different species of the Copaifera genus. Mem Inst Oswaldo Cruz. 2008; 103(3):277-81., insetífugo55. Muniz JWC, Bozza PT, Nascimento JL, Reis PA. Atividade anti-inflamatória do óleo-resina da copaífera reticulata em modelo inflamatório de edema de pata. Rev Para Med. 2009;23(1).,66. Arroyo-Acevedo J, Quino-Florentini M, Martínez-Heredia J, Almora-Pinedo Y, Alba-González A, Condorhuamán-Figueroa M. Efecto cicatrizante del aceite de Copaifera officinalis (copaiba), en pacientes con úlcera péptica. An Fac Med. 2011;72(2):113-7.,88. Pieri FA, Mussi MC, Fiorini JE, Moreira MA, Schneedorf JM. Bacteriostatic effect of copaiba oil (Copaifera officinalis) against Streptococcus mutans. Braz Dent J. 2012;23(1):36-8., antifúngico1010. Deus RJA, Alves CN, Arruda MSP. Avaliação do efeito antifúngico do óleo resina e do óleo essencial de copaíba (Copaifera multijuga Hayne). Rev Bras Plantas Med. 2011;13(1):1-7. e cicatrizante88. Pieri FA, Mussi MC, Fiorini JE, Moreira MA, Schneedorf JM. Bacteriostatic effect of copaiba oil (Copaifera officinalis) against Streptococcus mutans. Braz Dent J. 2012;23(1):36-8.,1111. Mendonça DE, Onofre SB. Atividade antimicrobiana do óleo-resina produzido pela copaiba - Copaifera multijuga Hayne (Leguminosae). Rev Bras Farmacog. 2009;19(2):577-81.. É popularmente adotado no tratamento de diversas enfermidades como cistites, bronquites, diarreias crônicas, reumatismo, psoríase, antitumor99. Santos AO, Ueda-Nakamura T, Dias Filho BP, Veiga Jr VF, Pinto AC, Nakamura CV. Antimicrobial activity of Brazilian copaiba oils obtained from different species of the Copaifera genus. Mem Inst Oswaldo Cruz. 2008; 103(3):277-81. e antiblenorrágico44. Brito NMB, Kulay Jr L, Simões MJ, Mora AO, Diniz JA, Lamarão LG. Estudo ultraestrutural do colo uterino de ratas ooforectomizadas após aplicação de óleo de copaíba. Acta Cir Bras. 2000;15(4):201-6..

Estes efeitos terapêuticos se devem à presença de diterpenos e sesquiterpenos1212. Pieri FA, José RM, Galvão NN, Nero LA, Moreira MAS. Antimicrobial activity of autoclaved and non-autoclaved copaiba oil on Listeria monocytogenes. Ciênc Rural. 2010;40(8):1797-801., como o ácido copálico e os sesquiterpenos β-cariofileno e o α-copaeno1111. Mendonça DE, Onofre SB. Atividade antimicrobiana do óleo-resina produzido pela copaiba - Copaifera multijuga Hayne (Leguminosae). Rev Bras Farmacog. 2009;19(2):577-81.. Segundo o modelo de Paiva1313. Paiva LA, Gurgel LA, Silva RM, Tomé AR, Gramosa NV, Silveira ER, et al. Anti-inflammatory effect of kaurenoic acid, a diterpene from Copaifera langsdorffi on acetic acid-induced colitis in rats. Vascul Pharmacol. 2002; 39(6):303-7., em que foi induzida a formação de colite através da aplicação de ácido acético em ratos, o óleo de copaíba se mostrou um potente agente anti-inflamatório, o que foi, nesta ocasião, atribuído ao fato de o diterpeno inibir a atividade de transcrição do Fator Nuclear - Kb (FN-kB)1111. Mendonça DE, Onofre SB. Atividade antimicrobiana do óleo-resina produzido pela copaiba - Copaifera multijuga Hayne (Leguminosae). Rev Bras Farmacog. 2009;19(2):577-81., uma importante molécula envolvida no processo de ativação celular na resposta imune inata1313. Paiva LA, Gurgel LA, Silva RM, Tomé AR, Gramosa NV, Silveira ER, et al. Anti-inflammatory effect of kaurenoic acid, a diterpene from Copaifera langsdorffi on acetic acid-induced colitis in rats. Vascul Pharmacol. 2002; 39(6):303-7..

A nitrofurazona é um agente bactericida da família dos furanos, que tem como mecanismo de ação a inativação de proteínas ribossomais e outras macromoléculas, com consequente inibição da síntese de proteínas, DNA, RNA e síntese de parede celular, bloqueando o metabolismo aeróbico das células bacterianas. Pode ser empregado como adjuvante no processo de cicatrização de feridas cutâneas, uma vez que além da atividade antimicrobiana, interfere na formação de tecido de granulação. Seu uso tópico é adequado pelo fato de que não sofre absorção significativa através de pele íntegra ou queimada, nem através de mucosas1414. Johnson JR, Delavari P, Azar M. Activities of a nitrofurazone-containing urinary catheter and a silver hydrogel catheter against multidrug-resistant bacteria characteristic of catheter-associated urinary tract infection. Antimicrob Agents Chemother.1999;43(12):2990-5.,1515. Diogo-Filho A, Lazarini BCM, Vieira-Junyor F, Silva GJ, Gomes HL. Avaliação das aderências pós-operatórias em ratos submetidos a peritoniostomia com tela de polipropileno associada à nitrofurazona. Arq Gastroenterol. 2004;41(4):245-9.. É encontrada comercialmente na forma de pomada (30mg), na concentração de 2mg/g.

O objetivo desta pesquisa foi avaliar histologicamente e macroscopicamente a influência do óleo-resina de Copaifera multijuga na cicatrização em dorso de ratos, comparando seus resultados com os obtidos através do uso da nitrofurazona.

MÉTODOS

Foram utilizados 36 ratos, da mesma idade, Rattus norvegicus albinus rodentia mammalia, da linhagem Wistar, machos adultos, procedentes do Biotério TECPAR. Todos os animais foram aclimatados e mantidos no biotério da Faculdade Evangélica do Paraná (FEPAR), recebendo água e ração própria para a espécie ad libitum, e respeitados os princípios éticos de manuseio e experimentação animal definidos pela Comissão de Ética de Experimentação Animal e a Legislação Brasileira de Animais de Experimentação, Lei Federal no 6638, de 1979. O projeto da pesquisa foi submetido à apreciação e aprovação pela Comissão de Ética no Uso de Animais da Faculdade Evangélica do Paraná (sob protocolo de aprovação número 004988/2012).

A amostra foi dividida em três grupos de 12 animais cada, conforme o tratamento proposto: Grupo controle (Grupo SL) - recebeu apenas soro fisiológico 0,9% sobre a lesão; Grupo teste (Grupo ÓLEO) - recebeu tratamento tópico com óleo de Copaíba puro, na dose de 0,3ml ao dia; e Grupo de comparação (grupo NITRO) - recebeu tratamento tópico com Nitrofurazona (2mg/ml) 0,3ml ao dia.

Todos os animais foram pesados, identificados e divididos em grupos de 12 animais. Cada um destes grupos foi subdividido em três gaiolas, cada uma com quatro animais, de acordo com o tempo a que serão submetidos à eutanásia, sendo estes sete, 14 e 21 dias1616. Martins NLP, Malafaia O, Ribas-Filho JM, Heibel M, Baldez RN, Vasconcelos PRL, et al. Análise comparativa da cicatrização da pele com o uso intraperitoneal de extrato aquoso de Orbignya phalerata (babaçu). Estudo controlado em Ratos. Act Cir Bras. 2006;21(Suppl 3):66-75..

Com o animal devidamente anestesiado com o uso de isofluorane inalatório em campânula anestésica, até o plano profundo, foi feita a tricotomia do dorso do animal preso em uma prancha em decúbito ventral, com tesoura e lâmina de barbear descartável22. Cavalcanti Neto AT, Arruda TEP, Arruda TTP, Pereira SLS, Turatti E. Análise comparativa entre o óleo-resina de copaíba e o digluconato de clorexidina no processo de cicatrização tecidual. Estudo histológico em dorso de ratos. Rev Odontol UNESP. 2005;34(2):107-12.. Em seguida foi feita a antissepsia do local com álcool 70%3 e confeccionada uma ferida circular com o uso de um punch dermatológico, medindo 8mm de diâmetro, retirando-se pele e subcutâneo, sem lesar a aponeurose subjacente. A hemostasia foi feita por compressão digital com gazes1616. Martins NLP, Malafaia O, Ribas-Filho JM, Heibel M, Baldez RN, Vasconcelos PRL, et al. Análise comparativa da cicatrização da pele com o uso intraperitoneal de extrato aquoso de Orbignya phalerata (babaçu). Estudo controlado em Ratos. Act Cir Bras. 2006;21(Suppl 3):66-75..

Todos os animais receberam diariamente o tratamento tópico proposto para cada grupo, respeitando-se o intervalo de 24 horas entre as aplicações, sendo que em cada uma destas aplicações, foi confeccionado um curativo com gaze, preso ao redor do animal com micropore, de modo que os animais não sofressem limitação das incursões respiratórias e não tivessem contato direto com suas feridas e as feridas dos outros animais da gaiola. O controle da dor no pós-operatório foi feito com o uso de tramadol 50mg/ml na dose de 5mg/dia, por via intramuscular, durante três dias.

Ao término de cada prazo pré-estabelecido (7, 14 e 21 dias), quatro animais de cada grupo foram novamente pesados e mortos através de overdose anestésica com isofluorane inalatório. Os animais foram então presos novamente na prancha do procedimento cirúrgico, onde tiveram as lesões analisadas macroscopicamente por meio de fotografias de alta resolução (8mp), obtidas a partir de uma câmera fixa em um pedestal, com foco de luz auxiliar e uma escala (régua milimetrada) presente no campo. As imagens obtidas foram submetidas à análise de um software (AutoCad 2013), sendo mensurada com precisão a área de cada ferida1616. Martins NLP, Malafaia O, Ribas-Filho JM, Heibel M, Baldez RN, Vasconcelos PRL, et al. Análise comparativa da cicatrização da pele com o uso intraperitoneal de extrato aquoso de Orbignya phalerata (babaçu). Estudo controlado em Ratos. Act Cir Bras. 2006;21(Suppl 3):66-75..

As cicatrizes cutâneas dos animais mortos foram ressecadas respeitando-se uma margem de ao menos 3mm do bordo da lesão, e imediatamente acondicionadas em frascos previamente identificados e fixadas em formalina tamponada. A confecção das lâminas foi realizada no laboratório de Histotécnica da FEPAR com coloração de HE para análise morfométrica (epitelização, classificação e grau de processo inflamatório, e vascularização), coloração de Sirius-red (quantificado e qualificado o colágeno, quanto aos seus tipos I ou III) e coloração de Weigert para análise de fibras elásticas. Para a avaliação das lâminas em HE, o mesmo patologista, por meio de microscopia óptica, observou e laudou todas as lâminas sem tomar conhecimento do grupo pertencente. Na avaliação da quantidade e do tipo de fibra colágena, bem como, na avaliação da quantidade de fibras elásticas, foram capturadas cinco imagens de cada ferida. As imagens foram obtidas com auxílio de um microscópio com câmera acoplada e lente de luz polarizada. Em seguida, as imagens foram submetidas ao software ImagePro 2013, que fez a contagem da quantidade de fibras colágenas tipo I e tipo III em cada lâmina, bem como, a contagem das fibras elásticas1717. Francisco JS, Moraes HP, Dias EP. Evaluation of the Image-Pro Plus 4.5 software for automatic counting of labeled nuclei by PCNA immunohistochemistry. Braz Oral Res. 2004;18(2):100-4..

Para descrição de variáveis quantitativas foram consideradas as estatísticas de média, mediana, valor mínimo, valor máximo e desvio padrão. Já para descrição de variáveis qualitativas foram consideradas frequências e percentuais. Para comparação de grupos independentes (grupos em cada momento e momentos dentro de cada grupo) foi considerado o teste não paramétrico de Kruskal-Wallis. Valores de p menores do que 0,05 indicaram significância estatística. Os dados foram analisados com o programa computacional Statistica v.8.0. Todos os resultados receberam tratamento estatístico, adotando-se p<0,05 como nível de significância.

RESULTADOS

Em cada momento os grupos foram comparados testando-se a hipótese nula de resultados iguais nos três grupos versus a hipótese alternativa de resultados diferentes. Pudemos observar que quando as áreas das feridas foram comparadas entre si, dentro de um mesmo momento do experimento, não houve significância estatística (p>0,05). Embora os grupos SL e ÓLEO tenham obtido um resultado melhor nos primeiros sete dias, ao 14o dia do experimento todos os animais possuíam feridas de área muito semelhante, permanecendo nessa tendência até a cicatrização completa. Na figura 1 são apresentadas as estatísticas da variável área em função de tempo dentro de cada grupo testado.

Figura 1
Área da ferida em função do tempo de experimento

Os critérios inflamação, epitelização e neovascularização foram analisados com base em análise histopatológica das lâminas coradas com HE (Tabelas 1, 2 e 3).

Tabela 1
Epitelização da ferida por grupo conforme o dia de análise

Tabela 2
Presença de inflamação na ferida por grupo conforme dia de análise

Tabela 3
Neovascularização da ferida por grupo conforme dia de análise

Analisando e quantificando as fibras colágenas tipo III e tipo I em cada grupo e comparando com o tempo de análise, obtivemos os dados expostos nas figuras 2 e 3.

Figura 2
Fibras colágenas Tipo III: Área ocupada no campo de microscopia pelas fibras de colágeno tipo III, medido em micrômetros².

Figura 3
Fibras colágenas Tipo I: Área ocupada no campo de microscopia pelas fibras de colágeno tipo I, medido em micrômetros².

Observamos que o soro fisiológico teve o pior desempenho, não estimulando a produção de colágeno na mesma proporção que os outros compostos testados. O Óleo de Copaíba mostrou-se mais capaz de converter o colágeno tipo III (jovem) em colágeno tipo I (maduro), fato este que tem efeito positivo, uma vez que quanto maior a quantidade de colágeno maduro, maior a resistência mecânica da ferida.

Utilizando-se do mesmo método aplicado para a mensuração das fibras colágenas (à exceção da coloração utilizada, que nesse caso se trata da coloração de Weigert), obtivemos a estimativa da quantidade de fibras elásticas em cada ferimento (Figura 4). As fibras elásticas são essenciais na medida em que conferem elasticidade ao tecido, mas conforme este fica mais maduro, a tendência é que algumas delas se juntem ao colágeno, tornando assim o tecido mais resistente.

Figura 4
Fibras elásticas: Área ocupada no campo de microscopia pelas fibras elásticas, medido em micrômetros².

DISCUSSÃO

O Brasil possui uma flora riquíssima em plantas e compostos de uso medicinal, fato que tem despertado cada vez mais o interesse de pesquisadores, instituições e universidades interessadas nos tratamentos fitoterápicos ou em busca de novos compostos. Visto que não só o óleo de copaíba como também outros compostos possuem inúmeras variedades de espécies dentro da natureza, torna-se um desafio para o pesquisador conseguir encontrar estudos que possam ser diretamente comparados com o seu, além da dificuldade de uniformizar os métodos de pesquisa.

A cicatrização cutânea é um processo complexo, influenciado por uma série de fatores, como estado nutricional, doenças sistêmicas, infecção local ou sistêmica concomitante e extensão da ferida entre outros22. Cavalcanti Neto AT, Arruda TEP, Arruda TTP, Pereira SLS, Turatti E. Análise comparativa entre o óleo-resina de copaíba e o digluconato de clorexidina no processo de cicatrização tecidual. Estudo histológico em dorso de ratos. Rev Odontol UNESP. 2005;34(2):107-12.. No presente estudo, foram escolhidos ratos da linhagem Wistar para os ensaios experimentais, devido à riqueza de dados disponíveis na literatura sobre características da pele e do processo cicatricial desses animais, bem como, uma grande resistência a processos infecciosos e a agressões cirúrgicas, além de ser de fácil obtenção e manuseio. Os animais selecionados para o estudo foram obrigatoriamente machos, para que não houvesse interferência da variação hormonal devido ao ciclo estral das fêmeas, o que poderia interferir no processo de reparação tecidual1616. Martins NLP, Malafaia O, Ribas-Filho JM, Heibel M, Baldez RN, Vasconcelos PRL, et al. Análise comparativa da cicatrização da pele com o uso intraperitoneal de extrato aquoso de Orbignya phalerata (babaçu). Estudo controlado em Ratos. Act Cir Bras. 2006;21(Suppl 3):66-75..

Observou-se neste estudo que não houve diferença significativa entre as médias das áreas das feridas, exceto pelo fato de que as feridas do grupo nitrofurazona tiveram uma menor tendência à redução do tamanho no sétimo dia quando comparada aos dois outros grupos, sendo que esta diferença não foi observada aos 14 e 21 dias, fato corroborado por outros estudos22. Cavalcanti Neto AT, Arruda TEP, Arruda TTP, Pereira SLS, Turatti E. Análise comparativa entre o óleo-resina de copaíba e o digluconato de clorexidina no processo de cicatrização tecidual. Estudo histológico em dorso de ratos. Rev Odontol UNESP. 2005;34(2):107-12..

Os achados de inflamação, epitelização e neovascularização foram semelhantes em outro estudo, tendo sido possível observar inicialmente maior presença de componente inflamatório no grupo copaíba, com evolução para o desaparecimento do processo inflamatório ao 21o dia em todos os grupos22. Cavalcanti Neto AT, Arruda TEP, Arruda TTP, Pereira SLS, Turatti E. Análise comparativa entre o óleo-resina de copaíba e o digluconato de clorexidina no processo de cicatrização tecidual. Estudo histológico em dorso de ratos. Rev Odontol UNESP. 2005;34(2):107-12.. Todas as feridas mostraram uma excelente capacidade de neoangiogênese e, na microscopia óptica, pôde-se observar uma rica trama capilar com presença de células endoteliais e hemácias, o que vai de encontro ao descrito por Estevão1818. Estevão LRM, Medeiros JP, Scognamillo-Szabó MVR, Baratella-Evêncio L, Guimarães EC, Câmara CAG, et al. Neoangiogênese de retalhos cutâneos em ratos tratados com óleo de copaíba. Pesq Agropec Bras. 2009;44(4):406-12..

Na quantificação de fibras colágenas notou-se que ao sétimo dia o óleo de copaíba mostrou-se mais eficaz do que os outros dois compostos na indução da formação de colágeno, predominantemente do tipo I, o que vai contra o achado de Vieira33. Vieira RC, Bombardiere E, Oliveira JJ, Lino Jr RS, Brito LAB, Junqueira-Kipnis AP. Influência do óleo de Copaifera langsdorffii no reparo de ferida cirúrgica em presença de corpo estranho. Pesq Vet Bras. 2008;28(8):358-66., em que os animais do grupo óleo de copaíba apresentaram menor quantidade de fibras colágenas quando comparados aos animais do grupo soro fisiológico. Essa divergência de dados pode ser devido ao fato de que naquele experimento foi utilizada a Copaifera reticulata ao invés da Copaifera multijuga, empregada neste estudo.

No segundo momento de aferição, aos 14 dias, houve uma alta expressiva na quantidade de colágeno tanto do tipo I quanto do tipo III nas feridas do grupo nitrofurazona, alcançando níveis próximos aos de uma pele saudável (proporção 4:1)1919. Gonçalves RO, Moraes e Silva E, Lopes-Filho GJ. Immunohistochemical evaluation of fibrillar components of the extracellular matrix of transversalis fascia and anterior abdominal rectus sheath in men with inguinal hernia. Rev Col Bras Cir. 2014;41(1):23-9.. Não houve um aumento significativo no número de fibras no grupo copaíba, sendo que o grupo soro fisiológico equiparou-se a este.

Com 21 dias de experimento, pudemos observar que tanto o grupo ÓLEO quanto o NITRO alcançaram bons níveis de fibras colágenas, suficientes para manter a resistência do tecido e a força de retração. O grupo SL não se mostrou um bom agente indutor da formação de fibras colágenas, ficando com aproximadamente 20% a menos de fibras colágenas totais do que os outros grupos.

Pela coloração de Weigert, foi possível mensurar a quantidade de fibras elásticas em cada ferida, que conferem maior elasticidade ao tecido além de se entremearem com o colágeno, conferindo maior resistência. A nitrofurazona foi o composto que mostrou ser o melhor indutor de formação de fibras elásticas, mas foi acompanhado de perto pelos dois outros grupos até o 14o dia. No 21o dia houve uma grande queda nos níveis de fibras elásticas no grupo SF, sendo que os grupos NITRO e ÓLEO terminaram o experimento com níveis muito similares.

Concluímos que em ratos machos da linhagem Wistar, o óleo de Copaíba contribuiu positivamente na cicatrização de ferida cutânea por segunda intenção, porém, devido à dificuldade de obtenção de um óleo-resina com boa procedência, seu uso fica limitado. Os autores sugerem a realização de trabalhos sobre os efeitos sistêmicos do uso do óleo de Copaíba, para que se possa obter mais dados científicos e, além disso, obter bases para o uso desse composto por parte da população.

REFERENCES

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  • Fonte de financiamento: Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica (PIBIC), concedido pelo CNPq ao aluno Carlos Augusto Nunes Martini.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Nov-Dec 2016

Histórico

  • Recebido
    19 Jul 2016
  • Aceito
    26 Set 2016
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