Acessibilidade / Reportar erro

Estudo comparativo da resposta inflamatória sistêmica no pós-operatório precoce entre pacientes idosos e não idosos submetidos à colecistectomia vídeo-laparoscópica

RESUMO

Objetivo:

avaliar e comparar a resposta inflamatória sistêmica no pós-operatório precoce de pacientes idosos e não idosos submetidos à colecistectomia vídeo-laparoscópica, realizando, sobretudo, análise quantitativa de interleucina-6 (IL-6), que representa um marcador de atividade inflamatória sistêmica.

Métodos:

estudo de série de casos, comparativo, realizado num período de seis meses, no Hospital Universitário Gaffrée e Guinle da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro, envolvendo 60 pacientes com indicação de colecistectomia laparoscópica eletiva. Amostragem não probabilística por conveniência foi utilizada, selecionando, a partir dos critérios de inclusão, os primeiros 30 pacientes com idades entre 18 e 60 anos, que compuseram o grupo I e os 30 pacientes com idade igual ou maior que 60 anos, que formaram o grupo II.

Resultados:

os 60 pacientes envolvidos foram acompanhados por no mínimo 30 dias após o término da cirurgia e não houve complicações. Não houve conversão para cirurgia aberta. Os valores das medianas encontrados nas dosagens da IL-6, nos grupos I e II, para cada momento analisado (pré-operatório, três horas após e 24 horas após) foram, respectivamente: 3,1 x 4,7 pg/ml no pré-operatório, 7,3 x 14,1 pg/ml após três horas do procedimento e 4,4 x 13,3 pg/ml na 24a hora do pós-operatório.

Conclusão:

pacientes idosos responderam de forma mais exacerbada ao trauma cirúrgico e apresentaram elevação dos níveis de IL-6 por um período maior do que o grupo de não idosos.

Descritores:
Colecistectomia Laparoscópica; Síndrome de Resposta Inflamatória Sistêmica; Interleucina-6.

ABSTRACT

Objective:

to evaluate and compare the early postoperative period systemic inflammatory response between elderly and non-elderly patients submitted to laparoscopic cholecystectomy, mainly performing a quantitative analysis of interleukin-6 (IL-6), a marker of inflammatory activity systemic.

Methods:

we compared a series of cases over a period of six months at the Gaffrée and Guinle University Hospital of the Federal University of the State of Rio de Janeiro, involving 60 patients submitted to elective laparoscopic cholecystectomy. We used non-probabilistic sampling for convenience, selecting, from the inclusion criteria, the first 30 patients aged 18-60 years, who comprised group I, and 30 patients with age equal to or greater than 60 years, who formed group II.

Results:

the 60 patients involved were followed for at least 30 days after surgery and there were no complications. There was no conversion to open surgery. The values ​​of the medians found in the IL-6 dosages for the preoperative period, three hours after the procedure and 24 hours after surgery were, respectively, 3.1 vs. 4.7 pg/ml, 7.3 vs. 14.1 pg/ml and 4.4 vs 13.3 pg/ml.

Conclusion:

Elderly patients were more responsive to surgical trauma and had elevated IL-6 levels for a longer period than the non-elderly group.

Keywords:
Cholecystectomy, Laparoscopic; Systemic Inflammatory Response Syndrome; Interleukin-6.

INTRODUÇÃO

O Brasil vem apresentando um processo de envelhecimento populacional rápido e intenso. Nos EUA, a população com idade maior ou igual a 65 anos era de 8,1%, em 2000, e chegou a 12,4%, em 2015. A estimativa para 2020 é que cerca de 88,5 milhões (20,2%) de americanos tenham 65 anos ou mais11 Halaweish I, Alam HB. Changing demographics of the American population. Surg Clin N Am. 2015;95(1):1-10.. No Brasil, estima-se que a população idosa alcance a ordem dos 30 milhões em 202022 Rego RE, Campos T, Moricz A, Silva RA, Pacheco Júnior AM. Tratamento cirúrgico da litíase vesicular no idoso: análise dos resultados imediatos da colecistectomia aberta e laparoscópica. Rev Assoc Med Bras. 2003;49(3):293-9.. Consequentemente, o número de idosos que são submetidos a procedimentos cirúrgicos vem aumentando consideravelmente33 Uecker J, Adams M, Skipper K, Dunn E. Cholecystitis in the octagenarian: is laparoscopic cholecystectomy the best approach? Am Surg. 2001;67(7):637-40.,44 Lujan JA, Sanchez-Bueno F, Parrilla P, Robles R, Torralba JA, Gonzalez-Costea R. Laparoscopic vs. open cholecystectomy in patients aged 65 and older. Surg Laparosc Endosc. 1998;8(3):208-10.. A colelitíase é a doença cirúrgica abdominal mais comum nestes indivíduos55 Coelho JC, Bonilha R, Pitaki SA, Cordeiro RM, Salvalaggio PR, Bonin EA, et al. Prevalence of gallstones in a Brazilian population. Int Surg.1999;84:25-8. e diversos estudos descrevem o aumento das colecistectomias em octagenários66 González González JJ, Sanz Alvarez L, Graña López JL, Bermejo Abajo G, Navarrete Guijosa F, Martínez Rodríguez E. Litiasis biliar en pacientes mayores de 80 años. ¿cirugía o tratamiento conservador? Rev Esp Enferm Dig. 1997;89(3):196-205.

7 Maxwell JG, Tyler BA, Maxwell BG, Brinker CC, Covington DL. Laparoscopic cholecystectomy in octagenarians. Am Surg. 1998;64(9):826-31; discussion 831-2.
-88 Maxwell JG, Tyler BA, Rutledge R, Brinker CC, Maxwell BG, Covington DL, et al. Cholecystectomy in patients aged 80 and older. Ann Surg. 1998;176(6):627-31.. A alta prevalência da colelitíase, faz com que a colecistectomia seja um dos procedimentos cirúrgicos mais realizadas no mundo99 Kuy S, Sosa JA, Roman SA, Desai R, Rosenthal RA. Age matters: a study of clinical and economic outcomes following cholecystectomy in elderly Americans. Am J Surg. 2011;201(6):789-96.,1010 Festi D, Dormi A, Capodicasa S, Staniscia T, Attili AF, Loria P, et al. Incidence of gallstone disease in Italy: results from a multicenter population-based Italian study (the MICOL Project). World J Gastroenterol. 2008;14(34):5282-9..

Com o advento da cirurgia minimamente invasiva, a colecistectomia vídeo-laparoscópica passou a ser o tratamento padrão ouro para a litíase biliar e, comprovadamente, o procedimento laparoscópico está associado a uma recuperação mais rápida e à menor resposta inflamatória sistêmica1111 Glaser F, Sannwald GA, Buhr HJ, Kuntz C, Mayer H, Klee F, et al. General stress response to convencional and laparsocopic cholecystectomy. Ann Surg. 1995;221(4):372-80.,1212 Biffi WL, Moore EE, Moore FA, Peterson VM. Interleukin-6 in the injured patient. Marker of injury or mediator of inflammation? Ann Surg. 1996;224(5):647-64.. Diversos estudos populacionais têm demonstrado que a incidência de colelitiase e de colecistite aguda aumenta com a idade. A prevalência de colelitíase é de 9,3% para a população em geral, de 21,4% para indivíduos entre 60 e 69 anos e de 27,5% para indivíduos com 70 anos ou mais55 Coelho JC, Bonilha R, Pitaki SA, Cordeiro RM, Salvalaggio PR, Bonin EA, et al. Prevalence of gallstones in a Brazilian population. Int Surg.1999;84:25-8.. Alguns trabalhos têm evidenciado que a litíase biliar se comporta de maneira particular na população idosa, já que existe uma aproximação da incidência entre os sexos, maior incidência de coledocolitiase e outras formas complicadas da doença (colecistite, pancreatite, fístulas biliares), maior incidência de câncer de vesícula e maior mortalidade associada à cirurgia de urgência66 González González JJ, Sanz Alvarez L, Graña López JL, Bermejo Abajo G, Navarrete Guijosa F, Martínez Rodríguez E. Litiasis biliar en pacientes mayores de 80 años. ¿cirugía o tratamiento conservador? Rev Esp Enferm Dig. 1997;89(3):196-205.,1313 Kahng KU, Roslyn JJ. Surgical issues for the elderly patients with hepatobiliary disease. Surg Clin North Am. 1994;74(2):345-73.

14 Magnuson TH, Ratner LE, Zenilman ME, Bender JS. Laparoscopic cholecystectomy: applicability in the geriatric population. Am Surg. 1997;63(1):91-5.
-1515 Casaroli AA, Bevilacqua RG, Rasslan S. Análise multivariada dos fatores de risco no tratamento cirúrgico da colecistite aguda no idoso. Rev Col Bras Cir. 1996;23(1):1-7..

Outros estudos demonstram maior morbidade na evolução pós-operatória da colecistectomia vídeo-laparoscópica na população idosa (em especial acima de 80 anos de idade). Estes indivíduos apresentam maior taxa de complicação, maior índice de conversão para a cirurgia aberta e tempo maior de permanência hospitalar77 Maxwell JG, Tyler BA, Maxwell BG, Brinker CC, Covington DL. Laparoscopic cholecystectomy in octagenarians. Am Surg. 1998;64(9):826-31; discussion 831-2.,1616 Yetkin G, Uludag M, Oba S, Citgez B, Paksoy I. Laparoscopic cholecystectomy in elderly patients. JSLS. 2009;13(4):587-91.,1717 Kirshtein B, Bayme M, Bolotin A, Mizrahi S, Lantsberg L. Laparoscopy cholecystectomy for acute cholecystitis in the elderly: is it safe? Surg Laparosc Endosc Percutan Tech. 2008;18(4):334-9.. Não existe um motivo único que explique a maior morbidade cirúrgica encontrada na população idosa. Provavelmente esta causa é multifatorial. Algumas séries demostraram que o grande número de comorbidades existentes nesta população, associada à baixa reserva cardiopulmonar, influenciam negativamente na recuperação pós-operatória77 Maxwell JG, Tyler BA, Maxwell BG, Brinker CC, Covington DL. Laparoscopic cholecystectomy in octagenarians. Am Surg. 1998;64(9):826-31; discussion 831-2.,1818 Hazzan D, Geron N, Golijanin D, Reissman P, Shiloni E. Laparoscopic cholecystectomy in octagenarians. Surg Endosc. 2003;17(5):713-76.. Somado a isto, outros autores já demostraram haver diferenças na resposta inflamatória sistêmica entre indivíduos jovens e idosos em determinadas situações1919 Pawelec G, Adibzadeh M, Pohla H, Schauadt K. Immunosenescence: ageing of the imune system. Immunol Today. 1995;16(9):420-2.,2020 O'Mahony L, Holland J, Jackson J, Feighery C, Hennessy TP, Mealy K. Quantitative intracellular cytokine measurement: age-related changes in proinflammatory cytokine production. Clin Exp Immunol. 1998;113(2):213-9..

O objetivo deste estudo foi avaliar e comparar a resposta inflamatória sistêmica no paciente idoso e não idoso submetido à colecistectomia vídeo-laparoscópica eletiva.

MÉTODOS

Trata-se de estudo de série de casos, realizado num período de seis meses, no Hospital Universitário Gaffrée e Guinle (HUGG), envolvendo 60 pacientes com indicação de colecistectomia vídeo-laparoscópica eletiva. Os critérios utilizados para indicação cirúrgica foram a história clínica (litíase biliar ou pólipo sintomático) e achados ultrassonográficos, como microcálculos, cálculo maior ou igual a 3cm, pólipo associado a cálculo biliar e pólipo maior ou igual a 1cm, em pacientes assintomáticos.

Os critérios de inclusão foram: idade igual ou maior que 18 anos, ambos os sexos, colelitíase não complicada, pacientes sem comorbidades (ASA-I) ou com comorbidades clinicamente compensadas (ASA-II). Já os critérios de exclusão foram: necessidade de conversão para cirurgia aberta, achado intraoperatório de litíase biliar complicada (colecistite aguda, coledocolitíase e pancreatite aguda), pacientes em uso de drogas imunossupressoras (corticosteroides e imunomoduladores), com síndrome da imunodeficiência adquirida, com neoplasia maligna em atividade, e aqueles que não assinaram o termo de consentimento livre e esclarecido.

Amostragem não probabilística por conveniência foi utilizada, selecionando, a partir dos critérios de inclusão, os primeiros 30 pacientes com idades entre 18 e 60 anos, que compuseram o grupo I e os 30 pacientes com idade igual ou maior que 60 anos, que formaram o grupo II.

Em todos os pacientes pesquisados, foram coletadas amostras de sangue para análise quantitativa de interleucina-6 (IL-6), que representa um marcador de atividade inflamatória sistêmica. Esta coleta ocorreu em três momentos distintos: na indução anestésica, três horas e 24 horas após o término da colecistectomia vídeo-laparoscópica. Outros parâmetros estudados foram leucometria plasmática (dosada antes e depois da intervenção cirúrgica), tempo cirúrgico (iniciamos a contagem do tempo operatório no momento da primeira incisão e finalizamos após a confecção da última sutura cutânea), presença de comorbidades, índice de massa corpórea (IMC), variação na contagem de plaquetas no pré e pós-operatório e proteína C-reativa (PCRT) dosada 24 horas após o procedimento cirúrgico.

Todos os pacientes foram submetidos à anestesia geral, sem bloqueio peridural e sem uso de corticoides ou opioides.

Foram construídas tabelas com o intuito de descrever as medidas de tendência central (média e mediana) e de dispersão (valores mínimos e máximos, amplitude, percentis e desvio-padrão) das variáveis quantitativas contínuas do estudo. A diferença entre as médias foi avaliada por meio do teste t de Student para amostras independentes, teste One-way ANOVA para comparação das variâncias para amostras pareadas, teste de Wilcoxon para comparação entre as medianas de amostras pareadas e teste Mann-Whitney para comparar medianas de amostras não pareadas. Para a realização das análises foram utilizados o software Excel 2016 e o pacote estatístico SPSS 21.0 (Statistical Package for Social Science - Chicago, IL, 2008). Foram considerados estatisticamente significativos resultados com p<0,05.

Este trabalho foi aprovado pelo Comitê de Ética do HUGG, protocolo número 03297312800005258, e o termo de consentimento livre e esclarecido foi assinado por todos os pacientes envolvidos no presente estudo.

RESULTADOS

Todos os 60 pacientes envolvidos neste estudo foram acompanhados por no mínimo 30 dias após o término da cirurgia e não houve complicações ou óbito neste período. Em nenhum paciente deste estudo a conversão para a cirurgia aberta ou a necessidade de introdução de trocateres extras foi necessária.

Quanto ao sexo, no grupo I seis indivíduos pertenciam ao sexo masculino (20%) e no grupo II cinco indivíduos eram homens (16,7%). A maior parte dos participantes, portanto, eram do sexo feminino, 80 e 83,3%, respectivamente (Tabela 1).

Tabela 1
Pacientes submetidos à colecistectomia por sexo segundo o grupo de idade .

Em relação ao risco cirúrgico (Tabela 2), 66,7% dos indivíduos do grupo I era ASA 1, e no grupo II, 80% dos indivíduos foi classificado como ASA 2, verificando-se, assim, que quanto maior a idade maior o número de comorbidades.

Tabela 2
Pacientes submetidos à colecistectomia pelo ASA segundo os grupos de idade.

A comparação do índice de massa corpórea (IMC) revelou uma média semelhante entre os grupos, 23,1kg/m2 no grupo I e de 23,2kg/m2 no grupo II. A duração média das colecistectomias foi de aproximadamente uma hora para ambos os grupos, verificando assim, que o tempo cirúrgico foi muito próximo entre os dois grupos, com uma média de 68,3 minutos para o grupo I e 68,1 para o grupo II.

Quanto aos valores da proteína C-reativa (PCR) dosada 24 horas após o procedimento cirúrgico, a média foi de 6,3 para o grupo I e de 1,4 para o grupo II, porém, pelo desvio-padrão foi possível observar uma alta variabilidade entre as observações (Tabela 3). Em relação à leucometria pré e pós-operatória, a média teve resultados semelhantes. Foi observado no pré-operatório do grupo I o valor de 6.581,9/mm33 Uecker J, Adams M, Skipper K, Dunn E. Cholecystitis in the octagenarian: is laparoscopic cholecystectomy the best approach? Am Surg. 2001;67(7):637-40. contra 6.678,1/mm33 Uecker J, Adams M, Skipper K, Dunn E. Cholecystitis in the octagenarian: is laparoscopic cholecystectomy the best approach? Am Surg. 2001;67(7):637-40. do grupo II e no pós-operatório, 11.246,1/mm33 Uecker J, Adams M, Skipper K, Dunn E. Cholecystitis in the octagenarian: is laparoscopic cholecystectomy the best approach? Am Surg. 2001;67(7):637-40. contra 10.864,3/mm33 Uecker J, Adams M, Skipper K, Dunn E. Cholecystitis in the octagenarian: is laparoscopic cholecystectomy the best approach? Am Surg. 2001;67(7):637-40. para os grupos I e II, respectivamente. A mesma semelhança esteve presente na média da análise das plaquetas. No pré-operatório do grupo I o valor foi de 266,9mil/mm33 Uecker J, Adams M, Skipper K, Dunn E. Cholecystitis in the octagenarian: is laparoscopic cholecystectomy the best approach? Am Surg. 2001;67(7):637-40. contra 260,5mil/mm33 Uecker J, Adams M, Skipper K, Dunn E. Cholecystitis in the octagenarian: is laparoscopic cholecystectomy the best approach? Am Surg. 2001;67(7):637-40. e no pós-operatório o valor foi de 255,9mil/mm33 Uecker J, Adams M, Skipper K, Dunn E. Cholecystitis in the octagenarian: is laparoscopic cholecystectomy the best approach? Am Surg. 2001;67(7):637-40. contra 241,3mil/mm33 Uecker J, Adams M, Skipper K, Dunn E. Cholecystitis in the octagenarian: is laparoscopic cholecystectomy the best approach? Am Surg. 2001;67(7):637-40. para os grupos I e II, respectivamente (Tabela 3).

Tabela 3
Perfil epidemiológico e laboratorial.

Quanto aos valores das medianas encontrados nas dosagens da Interleucina 6 (IL-6), no que se refere à comparação dentro de cada grupo, nos três momentos analisados (pré-operatório, três horas após e 24 horas após a cirurgia) foram observados valores medianos com diferenças estatisticamente significativas para o grupo I, 3,1, 7,3 e 4,4 pg/ml, respectivamente, assim como para o grupo II, 4,7, 14,1 e 13,3 pg/ml (Tabela 4).

Tabela 4
Comparação entre os grupos para a dosagem de IL-6 pré-operatório, três horas e 24 horas.

Quanto aos valores das medianas encontrados nas dosagens da IL-6, no que se refere à comparação entre os grupos, para cada momento analisado, foi observado, respectivamente: 3,1 x 4,7 pg/ml no pré-operatório, 7,3 x 14,1 pg/ml após três horas do procedimento e 4,4 x 13,3 pg/ml na 24a hora do pós-operatório. Apenas as comparações de três horas e 24 horas apresentaram diferenças estatisticamente significativas quando comparadas as medianas (Tabela 5).

Tabela 5
Comparação entre os tempos avaliados para dosagem de IL-6 pré-operatório, três horas e 24 horas .

DISCUSSÃO

Quando ocorre lesão tecidual, é deflagrada uma resposta inflamatória sistêmica2121 Marks J, Tacchino R, Roberts K, Onders R, Denoto G, Paraskeva P, et al. Prospective randomized controlled trial of traditional laparoscopic cholecystectomy versus single-incision laparoscopic cholecystectomy: report of preliminary data. Am J Surg. 2011;201(3):369-72; discussion 372-3., influenciada por diversos fatores como volume de lesão tecidual e intensidade do trauma. Isto já foi descrito ao se comparar a colecistectomia aberta com a vídeo-laparoscópica, esta última com resposta inflamatória atenuada, provavelmente por menor lesão tecidual associada1111 Glaser F, Sannwald GA, Buhr HJ, Kuntz C, Mayer H, Klee F, et al. General stress response to convencional and laparsocopic cholecystectomy. Ann Surg. 1995;221(4):372-80.,2222 Vittimberga FJ Jr, Foley DP, Meyers WC, Callery MP. Laparoscopy surgery and the systemic immune response. Ann Surg. 1998;227(3):326-34.,2323 Bruce DM, Smith M, Walker CB, Heys SD, Binnie NR, Gough DB, et al. Minimal access surgery for cholelithiasis induces an attenuated acute phase response. Am J Surg. 1999;178(3):232-4.. Como consequência da lesão tecidual do trauma cirúrgico, diferentes elementos celulares responsáveis pela resposta imune, como macrófagos, neutrófilos e células natural killer (NK), são ativadas. Uma vez ativadas, estas células iniciam a produção de citocinas, como a interleucina-6, que participa diretamente da resposta inflamatória sistêmica2424 Decker D, Tolba R, Springer W, Lauschke H, Hirner A, von Ruecker A. Abdominal surgical interventions: local and systemic consequences for the immune system--a prospective study on elective gastrointestinal surgery. J Surg Res. 2005;126(1):12-8.. Riese et al. demonstraram que durante as cirurgias abdominais o peritônio reage rapidamente aumentando a produção de interleucina-62525 Riese J, Schoolmann S, Beyer A, Denzel C, Hohenberger W, Haupt W. Production of IL-6 and MCP1 by the human peritoneum in vivo during major abdominal surgery. Shock. 2000;14(2):91-4.. Já foi demonstrado com clareza em diversos estudos1212 Biffi WL, Moore EE, Moore FA, Peterson VM. Interleukin-6 in the injured patient. Marker of injury or mediator of inflammation? Ann Surg. 1996;224(5):647-64.,2424 Decker D, Tolba R, Springer W, Lauschke H, Hirner A, von Ruecker A. Abdominal surgical interventions: local and systemic consequences for the immune system--a prospective study on elective gastrointestinal surgery. J Surg Res. 2005;126(1):12-8.,2525 Riese J, Schoolmann S, Beyer A, Denzel C, Hohenberger W, Haupt W. Production of IL-6 and MCP1 by the human peritoneum in vivo during major abdominal surgery. Shock. 2000;14(2):91-4. que a IL-6 pode ser utilizada como um marcador inflamatório, pois tem seus níveis elevados precocemente frente ao dano tecidual. Por isso, as dosagens de interleucina-6 e da proteína C-reativa têm sido utilizadas por diversos autores como método de escolha para avaliação e comparação da resposta inflamatória sistêmica em diferentes grupos2626 Luna RA, Nogueira DB, Varela PS, Rodrigues Neto Ede O, Norton MJ, Ribeiro Ldo C, et al. A prospective, randomized comparison of pain, inflammatory response, and short-term outcomes between single-port and laparoscopic cholecystectomy. Surg Endosc. 2013;27(4):1254-9.,2727 Madureira FA, Manso JE, Madureira Filho D, Iglesias AC. Inflammation in laparoscopic single-site surgery versus laparoscopic cholecystectomy. Surg Innov. 2013;21(3):263-6.. Assim como a IL-6, a proteína C-reativa também pode ser utilizada como marcador de inflamação22 Rego RE, Campos T, Moricz A, Silva RA, Pacheco Júnior AM. Tratamento cirúrgico da litíase vesicular no idoso: análise dos resultados imediatos da colecistectomia aberta e laparoscópica. Rev Assoc Med Bras. 2003;49(3):293-9..

Do conjunto de pacientes estudados nota-se um predomínio do sexo feminino, lembrando que a litíase biliar é mais prevalente neste sexo55 Coelho JC, Bonilha R, Pitaki SA, Cordeiro RM, Salvalaggio PR, Bonin EA, et al. Prevalence of gallstones in a Brazilian population. Int Surg.1999;84:25-8.,99 Kuy S, Sosa JA, Roman SA, Desai R, Rosenthal RA. Age matters: a study of clinical and economic outcomes following cholecystectomy in elderly Americans. Am J Surg. 2011;201(6):789-96.. Em relação ao risco cirúrgico, foi verificado um predomínio de indivíduos com comorbidades no grupo II. No entanto, apenas pacientes com comorbidades controladas foram incluídos neste estudo, a fim de minimizar seus efeitos no comportamento dos marcadores inflamatórios. Também analisamos os dois grupos no que diz respeito ao índice de massa corpórea (IMC) e tempo operatório, já que o IMC mais elevado poderia representar maior dificuldade técnica e maior tempo cirúrgico. Portanto, verificou-se que a média entre os IMC e o tempo operatório foi muito próxima entre os dois grupos, ressaltando a homogeneidade da amostra. Em diversos estudos2626 Luna RA, Nogueira DB, Varela PS, Rodrigues Neto Ede O, Norton MJ, Ribeiro Ldo C, et al. A prospective, randomized comparison of pain, inflammatory response, and short-term outcomes between single-port and laparoscopic cholecystectomy. Surg Endosc. 2013;27(4):1254-9.,2727 Madureira FA, Manso JE, Madureira Filho D, Iglesias AC. Inflammation in laparoscopic single-site surgery versus laparoscopic cholecystectomy. Surg Innov. 2013;21(3):263-6. a IL-6 foi utilizada como o principal marcador de resposta inflamatória pós trauma cirúrgico.

Nos resultados ilustrados nas tabelas 4 e 5 é possível notar que ambos os grupos respondem ao trauma cirúrgico com elevação da IL-6. Na população mais jovem esta variação inicial foi menor do que em relação aos idosos. Quando comparados os valores medianos das dosagens de IL-6 dos grupos jovens e idosos em três horas e em 24 horas, observa-se diferença estatística (p<0,01 e p<0,001, respectivamente). Analisando os resultados, pode-se sugerir que há uma resposta inflamatória maior inicial no grupo de idosos, pois houve uma liberação de IL-6 mais exacerbada neste grupo, com diferença estatística entre as medianas. E também observamos que a resposta inflamatória é mais sustentada neste mesmo grupo II.

Em resumo, é possível sugerir que o idoso respondeu de forma mais exacerbada ao trauma cirúrgico e teve esta inflamação mantida por um período mais prolongado, ao contrário dos mais jovens, que responderam ao trauma cirúrgico com uma menor liberação de IL-6 e uma normalização mais rápida de seus níveis.

Apesar da PCR ser amplamente utilizada para acompanhar resposta inflamatória na prática clínica, este marcador não foi sensível para detectar diferenças na resposta inflamatória entre os grupos (jovens e idosos) submetidos a um procedimento minimamente invasivo, diferente da IL-6, que é um marcador mais sensível. A leucometria também se comportou de maneira semelhante entre os grupos I e II. Sua dosagem inicial não apresentou diferença estatística significante, bem com não houve variação significativa entre os grupos no pós-operatório.

Diante dos nossos resultados, pode-se verificar que o paciente idoso respondeu de forma mais exacerbada ao trauma cirúrgico da colecistectomia vídeo-laparoscópica e com a resposta inflamatória mantida por um período mais prolongado.

REFERENCES

  • 1
    Halaweish I, Alam HB. Changing demographics of the American population. Surg Clin N Am. 2015;95(1):1-10.
  • 2
    Rego RE, Campos T, Moricz A, Silva RA, Pacheco Júnior AM. Tratamento cirúrgico da litíase vesicular no idoso: análise dos resultados imediatos da colecistectomia aberta e laparoscópica. Rev Assoc Med Bras. 2003;49(3):293-9.
  • 3
    Uecker J, Adams M, Skipper K, Dunn E. Cholecystitis in the octagenarian: is laparoscopic cholecystectomy the best approach? Am Surg. 2001;67(7):637-40.
  • 4
    Lujan JA, Sanchez-Bueno F, Parrilla P, Robles R, Torralba JA, Gonzalez-Costea R. Laparoscopic vs. open cholecystectomy in patients aged 65 and older. Surg Laparosc Endosc. 1998;8(3):208-10.
  • 5
    Coelho JC, Bonilha R, Pitaki SA, Cordeiro RM, Salvalaggio PR, Bonin EA, et al. Prevalence of gallstones in a Brazilian population. Int Surg.1999;84:25-8.
  • 6
    González González JJ, Sanz Alvarez L, Graña López JL, Bermejo Abajo G, Navarrete Guijosa F, Martínez Rodríguez E. Litiasis biliar en pacientes mayores de 80 años. ¿cirugía o tratamiento conservador? Rev Esp Enferm Dig. 1997;89(3):196-205.
  • 7
    Maxwell JG, Tyler BA, Maxwell BG, Brinker CC, Covington DL. Laparoscopic cholecystectomy in octagenarians. Am Surg. 1998;64(9):826-31; discussion 831-2.
  • 8
    Maxwell JG, Tyler BA, Rutledge R, Brinker CC, Maxwell BG, Covington DL, et al. Cholecystectomy in patients aged 80 and older. Ann Surg. 1998;176(6):627-31.
  • 9
    Kuy S, Sosa JA, Roman SA, Desai R, Rosenthal RA. Age matters: a study of clinical and economic outcomes following cholecystectomy in elderly Americans. Am J Surg. 2011;201(6):789-96.
  • 10
    Festi D, Dormi A, Capodicasa S, Staniscia T, Attili AF, Loria P, et al. Incidence of gallstone disease in Italy: results from a multicenter population-based Italian study (the MICOL Project). World J Gastroenterol. 2008;14(34):5282-9.
  • 11
    Glaser F, Sannwald GA, Buhr HJ, Kuntz C, Mayer H, Klee F, et al. General stress response to convencional and laparsocopic cholecystectomy. Ann Surg. 1995;221(4):372-80.
  • 12
    Biffi WL, Moore EE, Moore FA, Peterson VM. Interleukin-6 in the injured patient. Marker of injury or mediator of inflammation? Ann Surg. 1996;224(5):647-64.
  • 13
    Kahng KU, Roslyn JJ. Surgical issues for the elderly patients with hepatobiliary disease. Surg Clin North Am. 1994;74(2):345-73.
  • 14
    Magnuson TH, Ratner LE, Zenilman ME, Bender JS. Laparoscopic cholecystectomy: applicability in the geriatric population. Am Surg. 1997;63(1):91-5.
  • 15
    Casaroli AA, Bevilacqua RG, Rasslan S. Análise multivariada dos fatores de risco no tratamento cirúrgico da colecistite aguda no idoso. Rev Col Bras Cir. 1996;23(1):1-7.
  • 16
    Yetkin G, Uludag M, Oba S, Citgez B, Paksoy I. Laparoscopic cholecystectomy in elderly patients. JSLS. 2009;13(4):587-91.
  • 17
    Kirshtein B, Bayme M, Bolotin A, Mizrahi S, Lantsberg L. Laparoscopy cholecystectomy for acute cholecystitis in the elderly: is it safe? Surg Laparosc Endosc Percutan Tech. 2008;18(4):334-9.
  • 18
    Hazzan D, Geron N, Golijanin D, Reissman P, Shiloni E. Laparoscopic cholecystectomy in octagenarians. Surg Endosc. 2003;17(5):713-76.
  • 19
    Pawelec G, Adibzadeh M, Pohla H, Schauadt K. Immunosenescence: ageing of the imune system. Immunol Today. 1995;16(9):420-2.
  • 20
    O'Mahony L, Holland J, Jackson J, Feighery C, Hennessy TP, Mealy K. Quantitative intracellular cytokine measurement: age-related changes in proinflammatory cytokine production. Clin Exp Immunol. 1998;113(2):213-9.
  • 21
    Marks J, Tacchino R, Roberts K, Onders R, Denoto G, Paraskeva P, et al. Prospective randomized controlled trial of traditional laparoscopic cholecystectomy versus single-incision laparoscopic cholecystectomy: report of preliminary data. Am J Surg. 2011;201(3):369-72; discussion 372-3.
  • 22
    Vittimberga FJ Jr, Foley DP, Meyers WC, Callery MP. Laparoscopy surgery and the systemic immune response. Ann Surg. 1998;227(3):326-34.
  • 23
    Bruce DM, Smith M, Walker CB, Heys SD, Binnie NR, Gough DB, et al. Minimal access surgery for cholelithiasis induces an attenuated acute phase response. Am J Surg. 1999;178(3):232-4.
  • 24
    Decker D, Tolba R, Springer W, Lauschke H, Hirner A, von Ruecker A. Abdominal surgical interventions: local and systemic consequences for the immune system--a prospective study on elective gastrointestinal surgery. J Surg Res. 2005;126(1):12-8.
  • 25
    Riese J, Schoolmann S, Beyer A, Denzel C, Hohenberger W, Haupt W. Production of IL-6 and MCP1 by the human peritoneum in vivo during major abdominal surgery. Shock. 2000;14(2):91-4.
  • 26
    Luna RA, Nogueira DB, Varela PS, Rodrigues Neto Ede O, Norton MJ, Ribeiro Ldo C, et al. A prospective, randomized comparison of pain, inflammatory response, and short-term outcomes between single-port and laparoscopic cholecystectomy. Surg Endosc. 2013;27(4):1254-9.
  • 27
    Madureira FA, Manso JE, Madureira Filho D, Iglesias AC. Inflammation in laparoscopic single-site surgery versus laparoscopic cholecystectomy. Surg Innov. 2013;21(3):263-6.
  • Fonte de financiamento:

    nenhum.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    2018

Histórico

  • Recebido
    03 Nov 2017
  • Aceito
    14 Dez 2017
Colégio Brasileiro de Cirurgiões Rua Visconde de Silva, 52 - 3º andar, 22271- 090 Rio de Janeiro - RJ, Tel.: +55 21 2138-0659, Fax: (55 21) 2286-2595 - Rio de Janeiro - RJ - Brazil
E-mail: revista@cbc.org.br