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Transplante de microbiota fecal no tratamento da infecção por Clostridium difficile: estado da arte e revisão de literatura

RESUMO

A infecção por Clostridium difficile é uma complicação comum após a disbiose intestinal ocasionada pelo uso abusivo de antibióticos. Apresenta elevada importância médica devido às altas taxas de recorrência e morbidade. O transplante de microbiota fecal é uma alternativa eficaz para o tratamento da infecção recorrente e refratária pelo C. difficile e consiste na introdução da microbiota intestinal de um doador saudável em um paciente portador desta infecção. O mecanismo fisiológico exato pelo qual o transplante de microbiota fecal altera a microbiota intestinal não está tão bem estabelecido, mas é evidente que restaura a diversidade e a estrutura da microbiota promovendo aumento da resistência à colonização pelo C.difficile. Diversas vias de administração do transplante estão sendo estudadas e utilizadas de acordo com as vantagens apresentadas. Todas as formas de aplicação apresentaram elevada taxa de cura, sendo a via colonoscópica a mais utilizada. Não foram documentados complicações e efeitos adversos relevantes, e seu custo benefício em relação ao tratamento convencional se mostrou vantajoso. Apesar da sua eficácia é pouco utilizado como terapia inicial, sendo necessários mais estudos para firmar essa terapêutica como primeira opção no caso de infecção por Clostridium difficile refratária e recorrente.

Descritores:
Transplante de Microbiota Fecal; Clostridium difficile; Enterocolite Pseudomembranosa; Antibacterianos.

ABSTRACT

Clostridium difficile infection is a common complication following intestinal dysbiosis caused by abusive antibiotic use. It presents medical importance due to the high rates of recurrence and morbidity. Fecal microbiota transplantation is an effective alternative for the treatment of recurrent and refractory C. difficile infection and consists of introducing the intestinal microbiota from a healthy donor into a patient with this infection. The exact physiological mechanism by which fecal microbiota transplantation alters the intestinal microbiota is not well established, but it is clear that it restores the diversity and structure of the microbiota by promoting increased resistance to colonization by C. difficile. Several routes of transplant administration are being studied and used according to the advantages presented. All forms of application had a high cure rate, and the colonoscopic route was the most used. No relevant complications and adverse events have been documented, and the cost-effectiveness over conventional treatment has proven advantageous. Despite its efficacy, it is not commonly used as initial therapy, and more studies are needed to establish this therapy as the first option in case of refractory and recurrent Clostridium difficileinfection.

Keywords:
Fecal Microbiota Transplantation; Clostridium difficile; Enterocolitis, Pseudomembranous; Anti-BacterialAgents.

INTRODUÇÃO

Clostridium difficileé um bacilo gram-positivo anaeróbio obrigatório que faz parte da microbiota intestinal, tanto do homem como de outros animais11 Rocha MFG, Sidrim JJC, Lima AAO. O Clostridium difficile como agente indutor de diarréia inflamatória. Rev Soc Bras Med Trop. 1999;32(1):47-52.. Foi isolado pela primeira vez em 1935 e assim denominado devido às dificuldades encontradas para realização de sua cultura. Em 1978, foi identificado como principal agente causador da colite pseudomembranosa, sendo o sigmoide e o reto os principais locais de acometimento22 Cookson B. Hypervirulent strains of Clostridium difficile. Postg Med J. 2007;83(979):291-5.. Os principais fatores de virulência são suas exotoxinas, a enterotoxina A e a citotoxina B. Elas são responsáveis pela destruição do epitélio intestinal e lesão da mucosa33 Zanella Terrier MC, Simonet ML, Bichard P, Frossard JL. Recurrent Clostridium difficile infections: the importance of the intestinal microbiota. World J Gastroenterol. 2014;20(23):7416-23..

Nos últimos anos houve uma dramática mudança na epidemiologia da infecção causada peloClostridium difficile (ICD) . Atualmente é considerada como um problema global de saúde pública. No início do ano 2000, foi reportado um aumento nos casos de infecção severa porC. difficile, com alta taxa de mortalidade. Esse incremento na taxa de mortalidade se deve principalmente ao acometimento de idosos e ao aumento do uso de antibióticos da classe das fluoroquinolonas. A epidemia foi ocasionada pelo surgimento de uma cepa hipervirulenta, que é altamente resistente aos antibióticos mais comumente utilizados no ambiente hospitalar, a NAP1/BI/02744 Korman TM. Diagnosis and management of Clostridium difficile infection. Semin Respir Crit Care Med. 2015;36(1):31-43..

A infecção causada peloC. difficile é a forma mais comum de diarreia nosocomial associada ao uso de antibióticos, em pacientes idosos e internados. A maioria dos pacientes hospitalizados infectados são portadores assintomáticos e servem como reservatório silencioso para a continuação da disseminação no ambiente hospitalar55 Cammarota G, Masucci L, Ianiro G, Bibbò S, Dinoi G, Costamagna G, et al. Randomised clinical trial: faecal microbiota transplantation by colonoscopy vs. vancomycin for the treatment of recurrent Clostridium difficile infection. Aliment Pharmacol Ther. 2015;41(9):835-43.. A transmissão do C. difficile ocorre por via fecal-oral, pessoa-pessoa, através de fômites e de instrumentos do mobiliário hospitalar. Os esporos bacterianos permanecem no ambiente por períodos prolongados e resistem à maioria dos desinfetantes comercializados66 Blondeau JM. What have we learned about antimicrobial use and the risks for Clostridium difficile-associated diarrhoea? J Antimicrob Chemother. 2009;63(2):238-42..

Os principais fatores de risco são idade maior do que 65 anos, uso de laxativos, inibidores da bomba de prótons ou histamina, quimioterapia, cirurgias gastrointestinais, hospitalização prolongada e principalmente o uso de antibióticos. Historicamente a clindamicina, as cefalosporinas, as penicilinas e mais recentemente as fluoroquinolonas são os antibióticos mais implicados nessa infecção77 Silva Júnior M. Recentes mudanças da infecção por Clostridium difficile. Einstein. 2012;10(1):105-9.. Entretanto, qualquer antibiótico pode predispor à colonização pelo C. difficile, inclusive o metronidazol e a vancomicina, medicações de primeira linha no seu tratamento88 Efron PA, Mazuski JE. Clostridium difficile colitis. Surg Clin North Am. 2009;89(2):483-500..

O quadro clínico típico é de diarreia aquosa com vários episódios ao dia (>3 evacuações/dia), dor abdominal que melhora após a evacuação, febre baixa e leucocitose. Os casos mais graves podem evoluir com megacólon tóxico e perfuração intestinal, dessa maneira elevando muito a taxa de mortalidade. As complicações incluem: hipoalbuminemia, desidratação e desnutrição77 Silva Júnior M. Recentes mudanças da infecção por Clostridium difficile. Einstein. 2012;10(1):105-9.. O diagnóstico é baseado na apresentação clínica (presença de diarreia ou íleo) e na detecção microbiológica do C. difficile nas fezes (detecção das toxinas A e B por PCR ou coprocultura)33 Zanella Terrier MC, Simonet ML, Bichard P, Frossard JL. Recurrent Clostridium difficile infections: the importance of the intestinal microbiota. World J Gastroenterol. 2014;20(23):7416-23.. Para a escolha do tratamento correto, é importante classificar a gravidade da doença (Tabela 1)99 Bagdasarian N, Rao K, Malani PN. Diagnosis and treatment of Clostridium difficile in adults: a systematic review. JAMA. 2015;313(4):398-408..

Tabela 1
Classificação da Infecção por Clostridium difficile baseada na severidade da doença.

A maioria dos trabalhos e guidelines estabelecem os esquemas terapêuticos com base no quadro clínico, severidade, risco de recorrência e complicações. Os dois medicamentos mais utilizados são o metronidazol e a vancomicina. A tabela 2 ilustra o esquema atualmente utilizado1010 Burke KE, Lamont JT. Clostridium difficile infection: a worldwide disease. Gut Liver. 2014;8(1):1-6.

Tabela 2
Tratamento da Infecção por Clostridium difficile.

No Brasil são escassos os estudos sobre a infecção por C. difficile , geralmente atribuído à dificuldade de acesso aos exames para detecção da bactéria, principalmente no sistema público de saúde, tratando-se, portanto, de uma doença subdiagnosticada em nosso país1111 Pereira NG. Infecção pelo Clostridium difficile. JBM. 2014;102(5):27-49..

Em recente guideline da European Society of Clinical Microbiology and Infectious Diseases (ESCMID)1212 Ganc AJ, Ganc RL, Reimão SM, Frisoli JA Jr, Pasternak J. Transplante de microbiota fecal por enteroscopia alta para o tratamento da diarreia causada por Clostridium difficile. Einstein. 2015;13(2):338-9., os autores mantiveram a recomendação para o metronidazol como medicação de primeira escolha e a vancomicina como segunda opção. A fidaxomicina (Fid) foi acrescentada como opção terapêutica, porém com o mesmo grau de recomendação que a vancomicina. Nos EUA, a Fid também é aceita como opção no tratamento. A medicação ainda não é comercializada no Brasil1111 Pereira NG. Infecção pelo Clostridium difficile. JBM. 2014;102(5):27-49.. A resposta precária ao tratamento padrão com vancomicina oral ou metronidazol acarreta altas taxas de recorrência, girando em torno de 30%. Após dois ou mais episódios de infecção porC. difficile o risco estimado de recorrência com a terapia antimicrobiana aumenta em até 60%1212 Ganc AJ, Ganc RL, Reimão SM, Frisoli JA Jr, Pasternak J. Transplante de microbiota fecal por enteroscopia alta para o tratamento da diarreia causada por Clostridium difficile. Einstein. 2015;13(2):338-9..

Em busca de um tratamento mais eficaz e adequado para os episódios recorrentes e refratários, os pesquisadores retomaram uma prática chinesa datada do quarto século, conhecida como Transplante de Microbiota Fecal (TMF). Apesar de muito antigo, o TMF foi cientificamente relatado pela primeira vez em 1958, época em que foi utilizado com sucesso no tratamento de quatro pacientes com colite pseudomembranosa. Apesar da sua aparente eficácia, o TMF começou a ser largamente estudado e incorporado na prática clínica apenas nos últimos dez anos1313 Rossen NG, MacDonald JK, de Vries EM, D'Haens GR, De Vos WM, Zoetendal EG, et al. Fecal microbiota transplantation as novel therapy in gastroenterology: a systematic review. World J Gastroenterol. 2015; 21(17):5359-71..

O TMF consiste em introduzir a microbiota intestinal de um doador saudável, em um paciente portador de ICD com o objetivo de restaurar a sua microbiota1414 Gough E, Shaikh H, Manges AR. Systematic review of intestinal microbiota transplantation (fecal bacteriotherapy) for recurrent Clostridium difficile infection. Clin Infect Dis. 2011;53(10):994-1002.. Numerosos relatos de casos, estudos retrospectivos e ensaios clínicos randomizados têm demonstrado os benefícios do TMF em pacientes com infecção severa ou recorrente porC. difficile.As taxas de cura podem chegar a 100% em alguns trabalhos, porém com taxa média de 87 a 90% nos mais de 500 casos descritos na literatura1515 Kelly CR, Kahn S, Kashyap P, Laine L, Rubin D, Atreja A, et al. Update on Fecal Microbiota Transplantation 2015: indications, methodologies, mechanisms and outlook. Gastroenterology. 2015;149(1):223-37..

O doador para esse tipo de tratamento geralmente é um familiar ou conhecido que antes de ser escolhido para o transplante passa por uma investigação minuciosa para vários patógenos1616 Broecker F, Kube M, Klumpp J, Schuppler M, Biedermann L, Hecht J, et al. Analysis of the intestinal microbiome of recovered Clostridium difficile patient after fecal transplantation. Digestion. 2013;88(4):243-51.. As vias de administração do TMF podem ser: nasojejunal, nasogástrica, endoscópica, através de enemas ou colonoscópica. A escolha da via depende da viabilidade do local de realização, da experiência do médico e da segurança oferecida ao paciente44 Korman TM. Diagnosis and management of Clostridium difficile infection. Semin Respir Crit Care Med. 2015;36(1):31-43..

O objetivo deste trabalho é caracterizar e discutir as principais formas de aplicação do TMF, suas indicações, as barreiras existentes e a eficácia quando utilizado como alternativa terapêutica para a infecção peloClostridium difficile.

MÉTODOS

Para a elaboração desta revisão foram pesquisados artigos acoplados na base de dados eletrônica PubMed, Lilacs e no portal SciELO. A pesquisa consistiu na utilização dos seguintes descritores: “Enterocolitis, pseudomembranous” “OR” “Clostridium difficile”, “AND” “fecal microbiota transplantation”. A busca foi limitada a estudos realizados em seres humanos maiores de 19 anos de idade e publicados em inglês e português nos últimos cinco anos.

Dois pesquisadores independentes revisaram integralmente os textos e elegeram como necessários para a revisão os que possuíam maior evidência em relação ao tema e excluíram os que não estavam de acordo com o objetivo e/ou que tangenciassem o assunto proposto. As referências bibliográficas dos artigos selecionados para leitura também foram incluídas.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

A microbiota intestinal e seu desequilíbrio, chamado disbiose, têm papel crucial na fisiopatologia da infecção por C. difficile . Durante a última década, a importância da microbiota intestinal tem ganhado relevância, sendo a mesma considerada um órgão44 Korman TM. Diagnosis and management of Clostridium difficile infection. Semin Respir Crit Care Med. 2015;36(1):31-43.. Um estudo longitudinal analisou a microbiota intestinal de doadores e receptores do TMF uma semana após a realização do procedimento e novamente após um ano. Todos os pacientes submetidos ao tratamento foram considerados curados da infecção porC. difficile. Neste estudo também foi observada a redução da diversidade da microbiota intestinal um ano após o TMF em comparação à microbiota do doador saudável e aumento da mesma em relação à microbiota pré-TMF. Foi constatado que houve aumento da microbiota logo após o tratamento e que a mesma manteve-se estável durante o primeiro ano pós-transplante1717 Song Y, Garg S, Girotra M, Maddox C, Von Rosenvinge EC, Dutta A, et al. Microbiota dynamics in patients treated with fecal microbiota transplantation for recurrent Clostridium difficile infection. PloS One. 2013;8(11):1-11..

Em relação aos organismos colonizadores, apenas os filosFirmicutese asProteobacteriasapresentaram mudanças significativas. Dentro dos Firmicutes encontram-se as bactérias da ordem dosClostridiales.Esta ordem de bactéria apresenta-se em quantidade reduzida na microbiota de pacientes com infecção porC. difficile (12,8%), e elevada nos doadores (70%). Após o TMF houve um aumento significativo dessa bactéria (55%) nos receptores. OClostridium difficilepertence a esta ordem, porém em uma microbiota saudável ele não deve estar presente ou, caso presente, deve estar em baixíssima concentração. O que se observa nos pacientes com infecção aguda, é que as espécies não patogênicas dosClostridialesestão em concentração reduzida, facilitando assim a colonização peloC. difficile1717 Song Y, Garg S, Girotra M, Maddox C, Von Rosenvinge EC, Dutta A, et al. Microbiota dynamics in patients treated with fecal microbiota transplantation for recurrent Clostridium difficile infection. PloS One. 2013;8(11):1-11.. No mesmo estudo foi observado o efeito protetor da mucosa realizado por bactérias produtoras de butirato contra a colonização peloC. difficile,e que o número reduzido dessas bactérias na microbiota de pacientes com a infecção recorrente porC. difficile pode ser um dos motivos para as frequentes recorrências.

Em outro estudo, foi realizada a análise da composição fecal da microbiota e dos ácidos biliares de 12 pacientes com infecção recorrente porC. difficile antes e depois do tratamento com o transplante de microbiota fecal. Foi observado que o uso de antibióticos extermina parte da microbiota responsável pela metabolização dos ácidos biliares primários em secundários no intestino. Os ácidos biliares secundários são responsáveis pela inibição da germinação e colonização doC. difficilena mucosa intestinal e a ausência deles facilita o processo infeccioso. O TMF causa rápida restauração da microbiota metabolizadora do ácido biliar primário, normalizando a quantidade disponível de ácido biliar secundário, sugerindo assim a razão da eficácia do transplante1818 Weingarden AR, Chen C, Bobr A, Yao D, Lu Y, Nelson VM, et al. Microbiota transplantation restores normal fecal bile acid composition in recurrent Clostridium difficile infection. Am J Physiol Gastrointest Liver Physiol. 2014;306(4):G310-9..

Em 2010, membros de várias sociedades médicas especializadas, formaram um grupo de trabalho com o objetivo de elaborar um consenso sobre o tratamento1515 Kelly CR, Kahn S, Kashyap P, Laine L, Rubin D, Atreja A, et al. Update on Fecal Microbiota Transplantation 2015: indications, methodologies, mechanisms and outlook. Gastroenterology. 2015;149(1):223-37.. Conforme descrito pelo grupo de trabalho as principais indicações de tratamento para o TMF são:

  1. Infecção recorrente porC. difficile:
    • A) Três ou mais episódios de infecção porC. difficile leves a moderados e falha de um ciclo de seis a oito semanas com vancomicina com ou sem um antibiótico alternativo, por exemplo, rifaximina, nitazoxanida ou fidaxomicina.

    • B) Ao menos dois episódios de infecção porC. difficile resultando em hospitalização e associados com morbidade significativa.

  2. Infecção porC. difficile moderada que não responde à terapia padrão (vancomicina ou fidaxomicina) durante ao menos uma semana.

  3. Infecção porC. difficile grave (mesmo fulminante) sem resposta à terapia padrão após 48 horas.

As diretrizes de tratamento doC. difficiledo American College of Gastroenterology de 2013, também recomendam o TMF como uma alternativa terapêutica para casos recorrentes de infecção porC. difficile que não responderam a um regime de tratamento com vancomicina1919 Surawicz CM, Brandt LJ, Binion DG, Ananthakrishnan AN, Curry SR, Gilligan PH, et al. Guidelines for diagnosis, treatment, and prevention of Clostridium difficile infections. Am J Gastroenterol. 2013;108(4):478-98..

As evidências que comprovam o TMF para tratamento de doença grave e complicada (megacólon tóxico) são menos amplas e com menos casos clínicos publicados, porém, relatos de casos sugerem que pode ser seguro e efetivo mesmo em pacientes críticos. Pacientes com infecção grave porC. difficile têm maior risco de resultados negativos e decidir entre TMF e cirurgia, ou outra modalidade terapêutica, deve ser realizado com cautela1515 Kelly CR, Kahn S, Kashyap P, Laine L, Rubin D, Atreja A, et al. Update on Fecal Microbiota Transplantation 2015: indications, methodologies, mechanisms and outlook. Gastroenterology. 2015;149(1):223-37..

Um aspecto essencial do sucesso do transplante de microbiota fecal é a identificação de um doador saudável. Diversas sociedades médicas disponibilizam diretrizes para seleção de doadores. A maioria não estipula um limite de idade, porém, a grande maioria dos selecionados está entre 18 e 60 anos de idade. O doador pode ser um parceiro íntimo de longa data, amigo ou voluntário não relacionado2020 Anand R, Song Y, Garg S, Girotra M, Sinha A, Sivaraman A, et al. Effect of aging on the composition of fecal microbiota in donors for FMT and its impact on clinical outcomes. Dig Dis Sci. 2017;62(4):1002-8.. Um único estudo prospectivo faz considerações sobre as características do doador e as diferentes composições da sua microbiota fecal. Esse estudo conclui que a microbiota intestinal humana sofre mudanças com o passar dos anos, ocorrendo um decréscimo no número de firmicutes e actinobactérias e um acréscimo na quantidade de bacterioides além de uma redução da diversidade global. Apesar dessas mudanças, não foram encontradas alterações clínicas significativas nos resultados dos TMF realizados com amostras de diferentes idades2020 Anand R, Song Y, Garg S, Girotra M, Sinha A, Sivaraman A, et al. Effect of aging on the composition of fecal microbiota in donors for FMT and its impact on clinical outcomes. Dig Dis Sci. 2017;62(4):1002-8.. Como não existem diferenças, podemos considerar a elegibilidade de um doador em qualquer idade, desde que tenha o screening efetuado corretamente e não apresente contraindicações para a doação2020 Anand R, Song Y, Garg S, Girotra M, Sinha A, Sivaraman A, et al. Effect of aging on the composition of fecal microbiota in donors for FMT and its impact on clinical outcomes. Dig Dis Sci. 2017;62(4):1002-8..

A preparação do material ainda não é uniforme e diferentes estudos têm como objetivo encontrar a melhor opção para o paciente. Em geral o material deve ser diluído, homogeneizado (usando misturador, esforço manual, ou outro método) e filtrado quando necessário (por exemplo, gaze, filtro de café, filtro comum) até uma forma que possa ser administrada. Este espécime processado pode ser tanto infundido diretamente no trato gastrointestinal, como ser centrifugado, colocado em cápsulas de gelatina e engolido. Diversas séries de estudos descreveram o congelamento da microbiota fecal para seu uso em outro momento1515 Kelly CR, Kahn S, Kashyap P, Laine L, Rubin D, Atreja A, et al. Update on Fecal Microbiota Transplantation 2015: indications, methodologies, mechanisms and outlook. Gastroenterology. 2015;149(1):223-37..

Como não há um consenso claro sobre a melhor forma de preparação das fezes. As vias de administração são bem variadas e incluem o trato gastrointestinal superior (por endoscopia, cateter nasogástrico ou nasojejunal ou por ingestão de pílulas)2121 Hirsch BE, Saraiya N, Poeth K, Schwartz RM, Epstein ME, Honig G. Effectiveness of fecal-derived microbiota transfer using orally administered capsules for recurrent Clostridium difficile infection. BMC Infect Dis. 2015;15:191.

22 Staley C, Hamilton MJ, Vaughn BP, Graiziger CT, Newman KM, Kabage AJ, et al. Successful resolution of recurrent Clostridium difficile infection using freeze- dried, encapsulated fecal microbiota; pragmatic cohort study. Am J Gastroenterol. 2017;112(6):940-7.

23 Youngster I, Russell GH, Pindar C, Ziv-Baran T, Sauk J, Hohmann EL. Oral, capsulized, frozen fecal microbiota transplantation for relapsing Clostridium difficile infection. JAMA. 2014;312(17):1172-8.
-2424 Youngster I, Sauk J, Pindar C, Wilson RG, Kaplan JL, Smith MB, et al. Fecal Microbiota Transplant for relapsing Clostridium difficile infection using a frozen inoculum from unrelated donors: a randomized, open-label, controlled pilot study. Clin Infect Dis. 2014;58(11):1515-22.e o trato gastrointestinal inferior (por colonoscopia no cólon proximal, por enema e retossigmoidoscopia no cólon distal, ou abordagem combinada)55 Cammarota G, Masucci L, Ianiro G, Bibbò S, Dinoi G, Costamagna G, et al. Randomised clinical trial: faecal microbiota transplantation by colonoscopy vs. vancomycin for the treatment of recurrent Clostridium difficile infection. Aliment Pharmacol Ther. 2015;41(9):835-43.,2525 Khan MA, Sofi AA, Ahmad U, Alaradi O, Kahn AR, Hammad T, et al. Efficacy and safety of, and patient satisfaction with, colonoscopic-administered fecal microbiota transplantation in relapsing and refractory community- and hospital-acquired Clostridium difficile infection. Can J Gastroenterol Hepatol. 2014;28(8):434-8.

26 van Nood E, Vrieze A, Nieuwdorp M, Fuentes S, Zoetendal EG, de Vos WM, et al. Duodenal infusion of donor feces for recurrent Clostridium difficile. N Engl J Med. 2013;368(5):407-15.

27 Satokari R, Mattila E, Kainulainen V, Arkkila PE. Simple faecal preparation and efficacy of frozen inoculum in faecal microbiota transplantation for recurrent Clostridium difficile infection--an observational cohort study. Aliment Pharmacol Ther. 2015;41(1):46-53.

28 Allegretti JR, Korzenik JR, Hamilton MJ. Fecal microbiota transplantation via colonoscopy for recurrent C. difficile infection. J Vis Exp. 2014;(94):52154.

29 Lee CH, Belanger JE, Kassam Z, Smieja M, Higgins D, Broukhanski G, et al. The outcome and long-term follow-up of 94 patients with recurrent and refractory Clostridium difficile infection using single to multiple fecal microbiota transplantation via retention enema. Eur J Clin Microbiol Infect Dis. 2014;33(8):1425-8.

30 Lee CH, Steiner T, Petrof EO, Smieja M, Roscoe D, Nematallah A, et al. Frozen vs fresh fecal microbiota transplantation and clinical resolution of diarrhea in patients with recurrent clostridium difficile infection: a randomised clinical study. JAMA. 2016;315(2):142-9.

31 Hamilton MJ, Weingarden AR, Sadowsky MJ, Khoruts A. Standardized frozen preparation for transplantation of fecal microbiota for recurrent Clostridium difficile infection. Am J Gastroenterol. 2012;107(5):761-7.

32 Costello SP, Conlon MA, Vuaran MS, Roberts-Thomson IC, Andrews JM. Faecal microbiota transplant for recurrent Clostridium difficile infection using long-term frozen stool is effective: clinical efficacy and bacterial viability data. Aliment Pharmacol Ther. 2015;42(8):1011-8.

33 Dutta SK, Girotra M, Garg S, Dutta A, von Rosenvinge EC, Maddox C, et al. Efficacy of combined jejunal fecal microbiota transplantation for recurrent Clostridium difficile infection. Clin Gastroenterol Hepatol. 2014;12(9):1572-6.
-3434 Brandt LJ, Aroniadis OC, Mellow M, Kanatzar A, Kelly C, Park T, et al. Long-term follow-up of colonoscopic fecal microbiota transplant for recurrent Clostridium difficile infection. Am J Gastroenterol 2012; 107(7):1079-87.. Ensaios clínicos foram realizados comparando as diversas formas de aplicação do TMF, seus resultados, vantagens e desvantagens. O importante é que todas as formas estudadas foram mais eficientes do que o tratamento com antibióticos1515 Kelly CR, Kahn S, Kashyap P, Laine L, Rubin D, Atreja A, et al. Update on Fecal Microbiota Transplantation 2015: indications, methodologies, mechanisms and outlook. Gastroenterology. 2015;149(1):223-37.. A via por enema apresentou alta taxa de resolução dos sintomas, entretanto, foi necessário na maioria dos casos a repetição do procedimento por diversas vezes até obtenção da melhora clínica. A severidade da infecção foi um fator decisivo para o desfecho. Casos mais graves foram mais refratários ao tratamento. Não foram observados efeitos adversos, a aplicação é simples e segundo alguns relatos pode ser realizado pelo próprio paciente em ambiente domiciliar2929 Lee CH, Belanger JE, Kassam Z, Smieja M, Higgins D, Broukhanski G, et al. The outcome and long-term follow-up of 94 patients with recurrent and refractory Clostridium difficile infection using single to multiple fecal microbiota transplantation via retention enema. Eur J Clin Microbiol Infect Dis. 2014;33(8):1425-8..

A via nasogástrica é eficaz e segura para pacientes com contraindicações para a via colonoscópica, e possui boa aceitação apesar dos pacientes com idade avançada apresentarem certa repugnância. A maior preocupação é o vômito e a aspiração do conteúdo infundido1212 Ganc AJ, Ganc RL, Reimão SM, Frisoli JA Jr, Pasternak J. Transplante de microbiota fecal por enteroscopia alta para o tratamento da diarreia causada por Clostridium difficile. Einstein. 2015;13(2):338-9.. No único estudo brasileiro sobre a realização do TMF, dez pacientes foram submetidos ao tratamento por enteroscopia oral com taxa de cura de 90%. Acredita-se que a via enteroscópica também seja uma opção a se considerar para pacientes com contraindicações para outras formas de aplicação. Devido à necessidade de sedação evita-se o desconforto físico e moral da infusão nasogástrica do material fecal1212 Ganc AJ, Ganc RL, Reimão SM, Frisoli JA Jr, Pasternak J. Transplante de microbiota fecal por enteroscopia alta para o tratamento da diarreia causada por Clostridium difficile. Einstein. 2015;13(2):338-9..

A via colonoscópica é a mais utilizada e possui a vantagem de permitir visualização direta da área acometida, infusão de grande volume de material fecal e melhor retenção do que o enema. O preparo realizado e a necessidade de sedação são prejudiciais em pacientes altamente debilitados, além de existir o risco de perfuração quando a mucosa apresenta uma inflamação abundante. O risco de perfuração pode ser minimizado com a experiência e habilidade do endoscopista55 Cammarota G, Masucci L, Ianiro G, Bibbò S, Dinoi G, Costamagna G, et al. Randomised clinical trial: faecal microbiota transplantation by colonoscopy vs. vancomycin for the treatment of recurrent Clostridium difficile infection. Aliment Pharmacol Ther. 2015;41(9):835-43..

Pensando na melhor forma de restaurar completamente a microbiota de todo o trato gastrointestinal, um estudo prospectivo selecionou 27 pacientes com infecção recorrente porC. difficile para receberem o TMF por via combinada (enteroscopia e colonoscopia). Todos os pacientes selecionados apresentaram redução do número de evacuações e negativação das toxinas doC. difficilena amostra fecal após apenas uma infusão. O tempo médio de resolução foi de três dias. Os autores sugerem alta taxa de resolução quando o procedimento é realizado por via combinada. Um revés do estudo foi o alto custo devido à utilização de duas técnicas, mas pensando no seu elevado potencial curativo torna-se um procedimento com excelente custo-benefício3333 Dutta SK, Girotra M, Garg S, Dutta A, von Rosenvinge EC, Maddox C, et al. Efficacy of combined jejunal fecal microbiota transplantation for recurrent Clostridium difficile infection. Clin Gastroenterol Hepatol. 2014;12(9):1572-6..

Na análise dos resultados os autores concluíram que, a infusão das fezes abaixo do ângulo de Treitz pode reduzir a degradação da microbiota pelo ácido gástrico e pelas enzimas pancreáticas, e que a administração intrajejunal pode promover um contato de bactérias benéficas com a superfície da mucosa intestinal até o ceco. A técnica possibilita a infusão de grande volume de material fecal, sem rápida eliminação pelo reto, além de diminuir o risco de aspiração e regurgitação oral3333 Dutta SK, Girotra M, Garg S, Dutta A, von Rosenvinge EC, Maddox C, et al. Efficacy of combined jejunal fecal microbiota transplantation for recurrent Clostridium difficile infection. Clin Gastroenterol Hepatol. 2014;12(9):1572-6..

Dois estudos realizaram a preparação de cápsulas congeladas de TMF, e administraram em pacientes com infecção recorrente porC. difficile com deglutição preservada. Os dois estudos apresentaram uma taxa de cura próxima dos 90%. As cápsulas orais possuem taxa de resolução similar aos outros meios de administração, porém com maior tempo para obtenção da melhora clínica. O método possui como vantagens: fácil armazenamento, custo reduzido, eficácia comprovada, poucos efeitos adversos, fácil administração, confortável para o paciente, não invasivo e seguro para pacientes gravemente enfermos. A única contraindicação é a incapacidade do paciente em deglutir, aumentando o risco de broncoaspiração2121 Hirsch BE, Saraiya N, Poeth K, Schwartz RM, Epstein ME, Honig G. Effectiveness of fecal-derived microbiota transfer using orally administered capsules for recurrent Clostridium difficile infection. BMC Infect Dis. 2015;15:191.,2323 Youngster I, Russell GH, Pindar C, Ziv-Baran T, Sauk J, Hohmann EL. Oral, capsulized, frozen fecal microbiota transplantation for relapsing Clostridium difficile infection. JAMA. 2014;312(17):1172-8..

O congelamento das amostras permite a triagem dos doadores com antecedência e a facilidade do armazenamento permite a investigação dos doadores para possíveis infecções virais incubadas. Um ensaio clínico realizado com 232 pacientes com recorrência ou refratariedade ao tratamento padrão, dividiu a amostra em dois grupos, uma com 108 pacientes que receberam o transplante resfriado, e outra com 111 pacientes que receberam o transplante fresco por enema. Os resultados demonstraram que não houve diferença clínica entre as duas formas de preparo, ambas possuem boa taxa de resolução. Considerando as vantagens de fornecer o TMF congelado/resfriado, seu uso é uma opção considerável neste cenário3131 Hamilton MJ, Weingarden AR, Sadowsky MJ, Khoruts A. Standardized frozen preparation for transplantation of fecal microbiota for recurrent Clostridium difficile infection. Am J Gastroenterol. 2012;107(5):761-7..

Nos últimos anos foram poucos os relatos de casos publicados em relação à eficácia do TMF nos pacientes imunocomprometidos. No começo do século essa parcela de doentes havia sido excluída dos grandes ensaios clínicos devido ao desconhecimento e temor das complicações dessa nova forma de tratamento, principalmente em relação a possível translocação bacteriana, em um contexto de depressão das defesas da mucosa intestinal3535 Di Bella S, Gouliouris T, Petrosillo N. Fecal microbiota transplantation (FMT) for Clostridium difficile infection: focus on immunocompromised patiens. J Infect Chemother. 2015;21(4):230-7.,3636 Kelly CR, Ihunnah C, Fischer M, Khoruts A, Surawicz C, Afzali A, et al. Fecal microbiota transplant for treatment of Clostridium difficile infection in immunocompromised patients. Am J Gastroenterol. 2014;109(7):1065-71..

O impacto econômico da infecção por Clostridium difficile no Brasil não foi estimado, pela dificuldade de estabelecimento do diagnóstico e pela falta de documentação. Nos EUA estima-se que anualmente a infecção por C. difficile custe para o governo uma quantia entre um e 3,6 bilhões de dólares. Esses custos tão altos são resultado das hospitalizações, gastos com medicamentos e cuidados pós-tratamento3737 Mergenhagen KA, Wojciechowski AL, Paladino JA. A review of the economics of treating Clostridium difficile infection. Pharmacoeconomics 2014;32(7):639-50.. Recentes estudos compararam as diferentes formas de tratamento da infecção recorrente porClostridium difficile com o TMF. Em todos os trabalhos, o TMF foi mais custo-efetivo e clinicamente eficiente do que o tratamento com metronidazol, vancomicina e fidaxomicina (não disponível no Brasil)3838 Konijeti GG, Sauk J, Shrime MG, Gupta M, Ananthakrishnan NA. Cost-effectiveness of competing strategies for management of recurrent Clostridium difficile infection: a decision analysis. Clin Infect Dis. 2014;58(11):1507-14.. Um estudo francês comparou o custo-efetividade do TMF por via colonoscópica, duodenal e enema em relação ao tratamento com vancomicina e fidaxomicina. Os autores concluíram que o TMF em todas as formas é mais custo efetivo que os outros tratamentos e que existe um custo-efetividade melhor pela via colonoscópica do que nas outras. O enema possui característica de resolução da infecção e custo muito próxima da via colonoscópica, e por ser mais seguro para os pacientes os autores concluíram ser a via recomendada no trabalho realizado3939 Baro E, Galperine T, Denies F, Lannoy D, Lenne X, Odou P, et al. Cost-effectiveness analysis of five competing strategies for the management of multiple recurrent commuity-onset Clostridium difficile infection in France. PloS One. 2017;12(1):e0170258..

Apenas um estudo comparou o TMF (via colonoscopia) como forma de tratamento inicial da infecção por Clostridium difficile em relação aos outros esquemas primários (metronidazol e vancomicina). O TMF foi mais caro e mais efetivo que o metronidazol e mais barato e mais efetivo que a vancomicina. Dessa maneira praticamente excluiu a vancomicina como opção terapêutica para o tratamento inicial da infecção4040 Varier RU, Biltaji E, Smith KJ, Roberts MS, Kyle Jensen M, LaFleur J, et al. Cost-effectiveness analysis of fecal microbiota transplantation for recurrent Clostridium difficile infection. Infect Control Hosp Epidemiol. 2015;36(4):438-44.. Não foram encontrados artigos que avaliassem o custo da ingestão de cápsulas de TMF e da técnica de criopreservação das fezes, o que poderia fornecer dados referentes aos custos financeiros do procedimento, em relação aos tratamentos já consolidados.

São raras as reações adversas ao TMF. A maioria descreve uma sensação de desconforto gastrointestinal e que apresenta resolução em até 12 horas. São poucos os relatos de casos sobre o assunto, porém nenhum atribui diretamente ao transplante as complicações apresentadas. A maioria dos pacientes que apresentaram efeitos adversos eram portadores de doença intestinal pregressa, como doença inflamatória intestinal ou diverticulite4141 De Leon LM, Watson JB, Kelly CR. Transient flare of ulcerative colitis after fecal microbiota transplantation for recurrent Clostridium difficile infection. Clin Gastroenterol Hepatol. 2013;11(8):1036-8.,4242 Mandalia A, Kraft CS, Dhere T. Diverticulitis after fecal microbiota transplant for C. difficile infection. Am J Gastroenterol. 2014;109(12):1956-7..

Apesar da comprovada eficácia do TMF, ainda existe pouca recomendação clínica. Um estudo focou nesta questão e constatou que até 94% dos pacientes estariam dispostos a aceitar o TMF como tratamento caso fosse prescrito pelo seu médico e que existe uma predisposição dos doentes em aceitar o método colonoscópico, sendo que a pílula inodora foi à primeira escolha4343 Zipursky JS, Sidorsky TL, Freedman CA, Sidorsky MN, Kirkland KB. Patient attitudes toward the use of fecal microbiota transplantation in the treatment of recurrent Clostridium difficile infection. Clin Infect Dis. 2012;55(12):1652-8.. Através desta constatação e com objetivo de elucidar o motivo da pouca prescrição do TMF, outro estudo similar, porém agora voltado para a classe médica, aplicou 139 questionários sobre a técnica, em que 65% dos médicos responderam que não indicariam o TMF. A principal justificativa foi desconhecer a indicação e acreditarem na repugnância do paciente ou o fato de não existir um protocolo e uma logística adequada em seu local de trabalho4444 Zipursky JS, Sidorsky TI, Freedman CA, Sidorsky MN, Kirkland KB. Physician attitudes toward the use of fecal microbiota transplantation for the treatment of recurrent Clostridium difficile infection. Can J Gastroenterol Hepatol. 2014;28(6):319-24..

CONCLUSÕES

O transplante de microbiota fecal (TMF) é uma técnica de comprovada eficácia, baixo custo quando comparada ao tratamento convencional e com poucos efeitos adversos. Os casos refratários e graves são as principais indicações do transplante de microbiota fecal. Todas as formas de aplicação apresentaram elevada taxa de cura, sendo que a via colonoscópica foi a mais utilizada.

Em face da gravidade da infecção porClostridium difficilenão é surpreendente que os pacientes considerem o TMF como uma via alternativa de tratamento. A educação e o envolvimento do paciente no processo decisório são fatores cruciais para aceitação da técnica. É perceptível através das pesquisas que o médico possui grande influência na escolha do tratamento a ser realizado e caso prescreva existe alta probabilidade de aceitação. A falta de indicação esbarra no preconceito em relação ao procedimento.

A falta de regulamentação e de protocolos institucionais ocasiona insegurança e é uma barreira que precisa ser ultrapassada. O adequado uso desta técnica só será factível através da divulgação de sua efetividade, conhecimento das vias de administração e aceitação dos profissionais de saúde.

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  • Fonte de financiamento:

    nenhuma.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    2018

Histórico

  • Recebido
    03 Dez 2017
  • Aceito
    25 Jan 2018
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