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Técnica de inserção de portocath: estudo retrospectivo & descrição cirúrgica do passo a passo sem tunelização em serviço de alta complexidade

RESUMO

Objetivo:

demonstrar que a utilização da técnica de implantação do portocath sem a etapa de tunelização não está associado a maior taxa de complicações a curto ou longo prazo. Além disso, almeja-se aperfeiçoar a técnica da implementação do dispositivo portocath, com a apresentação de um guia passo a passo para conduzir os cirurgiões em formação.

Métodos:

trata-se de um estudo retrospectivo descritivo, com componentes analíticos. Os dados foram analisados por meio das informações extraídas dos prontuários eletrônicos vinculados código do procedimento SUS entre 2019-2020.

Resultados:

nenhum dos 94 procedimentos culminou em complicações no dia de sua realização. Foram registradas complicações após sete dias do procedimento em apenas dois pacientes (2,13%). A radioscopia intraoperatória havia sido realizada em ambos os casos. Após 30 dias do procedimento, foram observadas complicações em dois pacientes entre os 92 restantes (2,17%), ambos submetidos ao implante do cateter sem tunelização. Não houve complicações seis meses após o implante do portocath em 57,4% dos pacientes e não há informação acerca dos outros 42,6%.

Conclusão:

a técnica inserção do portocath sem tunelização é um procedimento ambulatorial seguro, de baixo risco de complicação, podendo ser adotada como forma de abreviar tempo de procedimento e desconforto ao paciente, sem prejuízos funcionais ou de segurança. Não houve associação entre não tunelizar o cateter, lateralidade da veia puncionada e realização de radioscopia no transoperatório com a taxa de complicações.

Palavras-chave:
Cirurgia Geral; Oncologia; Cateteres; Dispositivos de Acesso Vascular; Oncologia Cirúrgica

ABSTRACT

Objective:

to demonstrate that the use of the portocath implantation technique without tunneling the catheter is not associated with a higher rate of complications in the short or long term. In addition, we aim to improve the implantation technique of the portocath device, with the presentation of a step-by-step guide for surgeons in training.

Methods:

this is a retrospective descriptive study, with analytical components. Data were analyzed using information extracted from electronic medical records linked to the National Health Care procedure code between the years 2019-2020.

Results:

none of the 94 procedures resulted in complications on the day they were performed. Complications were recorded seven days after the procedure in only two patients (2.13%). Intraoperative radioscopy had been performed in both cases. Thirty days afters the procedure, complications were observed in two patients among the remaining 92 (2.17%), both undergoing catheter implantation without tunneling. There were no complications in the six months after portocath implantation in 57.4% of patients and there is no information about the other 42.6%.

Conclusion:

the portocath insertion technique without tunneling is a safe outpatient procedure, with a low risk of complications, and can be adopted to shorten procedure time and patient discomfort, without functional or safety impairments. There was no association of not tunneling the catheter, laterality of the punctured vein and performing radioscopy in the transoperative period with the rate of complications.

Keywords:
General Surgery; Medical Oncology; Surgical Oncology; Catheters; Vascular Access Devices

INTRODUÇÃO

O sistema sanguíneo é tema de estudo desde a Grécia antiga, com descrições das teorias humorais por Hipócrates e Gales, evoluindo substancialmente a partir da descrição da fisiologia dos vasos sanguíneos por William Harvey no século XVII. Apenas no século XX, em contexto de pós-guerra, o cirurgião militar francês Aubaniac descreveu a primeira inserção de cateteres não implantáveis na veia subclávia em 195211 Zerati AE, Wolosker N, Luccia N, Puech-Leão P. Cateteres venosos totalmente implantáveis: histórico, técnica de implante e complicações. J. Vasc. Bras. 2017;16(02):128-39. doi: 10.1590/1677-5449.008216.
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. No ano seguinte, o radiologista sueco Seldinger, publicou a técnica inovadora de inserção de cateteres intravasculares por punção com auxílio de fio guia, que leva seu nome até hoje11 Zerati AE, Wolosker N, Luccia N, Puech-Leão P. Cateteres venosos totalmente implantáveis: histórico, técnica de implante e complicações. J. Vasc. Bras. 2017;16(02):128-39. doi: 10.1590/1677-5449.008216.
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2 Seldinger SI. Catheter Replacement of the Needle in Percutaneous Arteriography: a new technique. Acta Radiol. 1953;39(5):368-76. doi: 10.3109/00016925309136722.
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-33 Walser EM. Venous Access Ports: indications, implantation technique, follow-up, and complications. Cardiovasc Intervent Radiol. 2012;35(4):751-64. doi: 10.1007/s00270-011-0271-2.
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.

O primeiro cateter totalmente implantável foi descrito em 1972 por Belin e colegas, sendo utilizado para nutrição parenteral total. Cerca de 10 anos depois, o uso destes dispositivos foi ampliado para outros fins, incluindo a administração de quimioterapia no tratamento de câncer (um dos maiores problemas de saúde pública), em que se mostrou seguro e confortável. Ademais, dá liberdade para os pacientes executarem suas atividades diárias e melhora a qualidade de vida dos mesmos, sem necessidade de múltiplas punções para cada quimioterapia realizada11 Zerati AE, Wolosker N, Luccia N, Puech-Leão P. Cateteres venosos totalmente implantáveis: histórico, técnica de implante e complicações. J. Vasc. Bras. 2017;16(02):128-39. doi: 10.1590/1677-5449.008216.
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,33 Walser EM. Venous Access Ports: indications, implantation technique, follow-up, and complications. Cardiovasc Intervent Radiol. 2012;35(4):751-64. doi: 10.1007/s00270-011-0271-2.
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4 An H, Ryu C, Jung E, Kang H, Paik J, Yang J, et al. Insertion of Totally Implantable Central Venous Access Devices by Surgeons. Ann Coloproctol. 2015;31(2):63-7. doi: 10.3393/ac.2015.31.2.63.
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5 Biffi R, Toro A, Pozzi S, Carlo I. Totally implantable vascular access devices 30 years after the first procedure. What has changed and what is still unsolved? Support Care Cancer. 2014;22(6):1705-14. doi: 10.1007/s00520-014-2208-1.
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-66 West H, Jin J. Portacaths. Jama Oncol. 2(1):152. doi: 10.1001/jamaoncol.2015.3488.
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.

O port-a-cath (portocath), um tipo de cateter totalmente implantável usado para quimioterapia, tem diâmetro menor do que 10 Fr. Para a instalação, punciona-se uma veia central (jugular interna ou subclávia, com ou sem visualização ecoguiada direta do vaso) e conecta-se o cateter flexível - inserido por meio da técnica de Seldinger - ao reservatório alojado sobre a fáscia muscular do local designado para a confecção da loja, de modo geral, na região infraclavicular55 Biffi R, Toro A, Pozzi S, Carlo I. Totally implantable vascular access devices 30 years after the first procedure. What has changed and what is still unsolved? Support Care Cancer. 2014;22(6):1705-14. doi: 10.1007/s00520-014-2208-1.
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-66 West H, Jin J. Portacaths. Jama Oncol. 2(1):152. doi: 10.1001/jamaoncol.2015.3488.
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. A literatura advoga que a tunelização do subcutâneo entre o local de punção e a loja do reservatório confere maior durabilidade ao cateter de longa permanência por ser fator protetor contra infecções11 Zerati AE, Wolosker N, Luccia N, Puech-Leão P. Cateteres venosos totalmente implantáveis: histórico, técnica de implante e complicações. J. Vasc. Bras. 2017;16(02):128-39. doi: 10.1590/1677-5449.008216.
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,33 Walser EM. Venous Access Ports: indications, implantation technique, follow-up, and complications. Cardiovasc Intervent Radiol. 2012;35(4):751-64. doi: 10.1007/s00270-011-0271-2.
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.

A inserção de portocath é contraindicada em vigência de infecção ativa, alterações graves da coagulação e lesões na região onde seria feito o procedimento (cervical-torácica)33 Walser EM. Venous Access Ports: indications, implantation technique, follow-up, and complications. Cardiovasc Intervent Radiol. 2012;35(4):751-64. doi: 10.1007/s00270-011-0271-2.
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. Quanto aos riscos da técnica, as complicações precoces mais temidas são o pneumo e hemotórax, sendo as tardias relacionadas à infecção e trombose no local do procedimento44 An H, Ryu C, Jung E, Kang H, Paik J, Yang J, et al. Insertion of Totally Implantable Central Venous Access Devices by Surgeons. Ann Coloproctol. 2015;31(2):63-7. doi: 10.3393/ac.2015.31.2.63.
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.

Este estudo tem por objetivo revisar e apresentar os dados referentes à implementação de portocath entre 2019-2020 no serviço de Cirurgia Geral e do Aparelho Digestivo de hospital de alta complexidade e analisar os dados conforme as perguntas: o procedimento sem tunelização está associado a maior taxa de complicações? A lateralidade da punção da veia associa-se com complicações no procedimento? O uso da radioscopia está associado à diminuição das taxas de complicações? Além disso, almeja-se apresentar, de forma ilustrativa, a técnica cirúrgica realizada neste serviço.

MÉTODO

Trata-se de estudo retrospectivo descritivo, com componentes analíticos. Os dados foram analisados por meio das informações extraídas dos prontuários eletrônicos vinculados ao procedimento SUS 04.06.02.007-8 (Implantação de cateter de longa permanência semi ou totalmente implantável) entre 2019-2020. Foram excluídos os procedimentos que não corresponderam à implantação de portocath, apesar da presença do código.

As variáveis observadas foram: idade do paciente na data da operação, sexo, tipo de neoplasia, veia escolhida, lado puncionado, realização de radioscopia transoperatória, radiografia de controle no dia, bem como complicações no dia, uma semana, um mês e seis meses após o procedimento. Ademais, foi descrito e ilustrado guia original passo a passo demonstrando a técnica de inserção de portocath, sem tunelização, utilizada neste serviço de cirurgia.

As variáveis numéricas foram apresentadas em média e desvio-padrão ou mediana e quartis (25-75%). As variáveis categóricas foram apresentadas em frequências absoluta e relativa. Foram utilizados os testes do qui-quadrado (2x2) ou teste exato de Fisher, além de qui-quadrado (rxc) para avaliação da ocorrência de complicações no dia do implante, 30 e 60 dias após o procedimento, relacionados a não tunelização, lateralidade e uso de radioscopia intraoperatória. A significância foi estipulada em 5%. Todas as análises foram realizadas pelo programa IBM-SPSS versão 27 (IBM SPSS®, Armonk, NY, USA).

Esse estudo segue as condições estabelecidas na Resolução nº 466/12 do Conselho Nacional de Saúde (CNS), foi aprovada pelo Comitê de Ética e Pesquisa da Instituição proponente (número do parecer 4.839.930) e registrada online na Plataforma Brasil (CAAE: 47237421.2.0000.5336).

RESULTADOS

Dos 94 pacientes incluídos, 55,3% eram mulheres. A mediana da idade foi 59 anos (50-67%), intervalo de 19 a 81 anos. Os três tumores mais frequentemente encontrados em pacientes submetidos ao implante de portocath foram: colorretal (41,1%), mama (16%) e pâncreas (10,6%), seguidos de tumores gástricos (6,4%), esofágicos (5,3%), linfomas (4,3%) e de orofaringe (3,2%), conforme registrado na Tabela 1.

Tabela 1
Topografia do câncer.

Na Tabela 2 se encontram as características dos procedimentos. A inserção do cateter se deu mais comumente em veia subclávia (94,7%), sendo o lado direito preferencial (85,1%). O processo de tunelização foi realizado na minoria dos pacientes (11,7%). Foi realizada radioscopia intraoperatória em 89,4% dos procedimentos, não foi realizada em 4,3% dos casos e não havia informação em 6,4% dos prontuários analisados. A radiografia de tórax para verificação da correta implantação do dispositivo foi realizada após 89,4% dos procedimentos, não foi realizada em 2,1% dos mesmos e não havia informação em 8,5% dos prontuários.

Tabela 2
Características dos procedimentos.

Nenhum dos 94 procedimentos culminou em complicações no dia da realização. Foram registradas complicações após sete dias do procedimento em apenas dois pacientes (2,13%), sendo que um havia sido submetido à implantação com tunelização em veia jugular interna esquerda (mau funcionamento) e o outro sem tunelização em veia subclávia direita (infecção no sítio de punção) (P=0,20). A radioscopia intraoperatória havia sido realizada em ambos os casos. Sessenta e nove por cento dos pacientes não apresentaram complicações após esse período (uma semana) e não há informação dos demais 28,7% (P=0,91).

Após 30 dias do procedimento, foram observadas complicações em dois pacientes dentre os 92 (2,17%), ambos submetidos ao implante do cateter sem tunelização; um havia sido puncionado à direita (sinais de infecção) e o outro à esquerda (não funcionante) (P=0,34). A radioscopia intraoperatória havia sido realizada em ambos os casos.

Quanto a associação entre lateralidade do sítio de punção e as complicações (tanto no dia, como após 30 e 60 dias) também não foram encontradas diferenças com significância entre essas variáveis (P=0,99; P=0,87 e P=0,54). O mesmo resultado se repete quando se observa a realização da radioscopia intraoperatória e a ocorrência de complicações (P=0,98; P=0,24 e P=0,74). Na Tabela 3 há as análises dos desfecho de todos os procedimentos realizados.

Tabela 3
Características dos procedimentos.

Guia passo a passo de implantação do portocath

Avaliação pré-cirúrgica

Este é um procedimento eletivo. Antes do preparo é fundamental determinar a indicação e descartar contraindicações, como sepse atual ou coagulopatias. Caso contraindicado, esperar otimização clínica33 Walser EM. Venous Access Ports: indications, implantation technique, follow-up, and complications. Cardiovasc Intervent Radiol. 2012;35(4):751-64. doi: 10.1007/s00270-011-0271-2.
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. A implementação do portocath pode ser realizada com anestesia local combinada com sedação ou com anestesia geral - a depender das condições clínicas e recursos disponíveis no local. É necessário jejum no dia do procedimento, conforme as guias vigentes no Brasil. Não é necessária antibioticoprofilaxia.

Passo 1: preparo

Separe os materiais que serão utilizados (uma bandeja para punção, o kit do portocath e os fios que serão utilizados para fixação do cateter, fechamento do subcutâneo e da pele). Coloque os aventais de chumbo em região cervical e torácico/abdominal para proteção da radioscopia que será realizada. Realize a lavagem das mãos conforme protocolo institucional, vista o capote e coloque as luvas estéreis. O paciente estará sedado ou sob anestesia geral endovenosa, em posição supina, em Trendelenburg, com a face virada para o lado contralateral do sítio de punção; os braços devem ser mantidos fechados e ao longo do corpo. Realize assepsia, antissepsia com clorexidina alcoólica no local da punção e, ao redor, proceda com a colocação de campos esterilizados.

Passo 2: punção da veia subclávia

Posicione dois dedos paralelos abaixo do terço médio-distal da clavícula e, com seringa acoplada a agulha, realize infiltração neste local com anestésico (a solução utilizada nesta instituição é mistura de 20mL lidocaína 2% com vasoconstritor, 20mL de ropivacaína 7.5% e 20mL de soro fisiológico 0.9%). Anestesie o local onde será puncionado em direção à clavícula e imediatamente abaixo do sítio de punção, onde será feito o reservatório para a ogiva. Após, com a agulha de punção do kit conectada a seringa com 3mL de SF 0.9%, puncione em direção cranial e à fúrcula, em angulação de 30 graus. Cuidado para não verticalizar a agulha pelo risco aumentado de punção inadvertida de estruturas adjacentes. Com a veia subclávia puncionada, passe o fio guia, retire agulha (neste momento, pode-se visualizar no monitor arritmia cardíaca - que corresponde a presença do fio guia no átrio direito - se presente, tracione o fio guia até à normalização do ritmo). Fixe o fio guia no campo com uma pinça. Realize a radioscopia para certificar-se de que o fio guia está corretamente posicionado.

Passo 3: confecção da loja para o reservatório

Feita a radioscopia e confirmada a posição, realize a confecção da loja para o reservatório paralelamente ao fio guia puncionado, na região infra-clavicular. Utilize o sítio de punção como mediana entre os pontos distais a serem seccionados. Você pode usar o reservatório para medir as pontas, deixando marcado na pele com pinça com dente. Com o bisturi, faça a incisão longitudinal na pele de ponta a ponta. Com o eletrocautério - muito cuidado nesta etapa para não encostar o aparelho no fio guia, resultando em descarga elétrica no paciente - siga a linha já previamente incisada na função coagular, abrindo o subcutâneo até à fáscia muscular em direção caudal, desfazendo as traves fibróticas, alternando entre o cautério e a dissecção romba com o dedo. Este procedimento pode ser realizado apenas com o cirurgião ou com auxiliar, que ajudará a expor o campo e cuidará da hemostasia. Realize essa etapa com firmeza, porém gentilmente. Introduza uma gaze umedecida no local onde será o reservatório - se couber toda dentro do espaço, esta etapa está concluída.

Passo 4: inserindo o cateter

Volte sua atenção ao fio guia, passe o introdutor no meio desse até o fim e depois retire o meio. Com o cateter cortado em 30cm, insira-o cerca de 20cm dentro do fio guia no introdutor, enquanto abre as laterais do mesmo. Após, pode-se retirar o fio guia com ou sem radioscopia. Corte 10cm do cateter, passe a peça de plástico com linha preta em um dos lados voltado cranialmente ao cateter, conecte o meio do cateter ao reservatório, acople-o à peça de plástico próxima à ogiva até sentir o clique entre as duas. O dispositivo está montado. Com a agulha que vem no kit, puncione a câmara e faça breve teste de fluxo e refluxo sanguíneo. Injete 3mL de SF 0,9% para limpar a base da ogiva. Após, repita o procedimento com 4mL de heparina diluída (em seringa de 10mL com 9mL de SF 0.9% e 1mL de heparina 5.000UI/mL). Revise a hemostasia antes de ir para a próxima etapa.

Passo 5: fixação do reservatório & fechamento

Nesta última etapa, a ogiva será fixada na fáscia muscular para não haver risco de rotação ou “kink”, inviabilizando o uso do dispositivo. Fixe um lado da ogiva, depois o outro com Vycril 2-0. Ainda é possível fazer um ponto em X para ancorar a conexão ogiva-cateter no subcutâneo. Após, aproxime o tecido subcutâneo com pontos simples Vycril 3-0. Por fim, finalize com ponto simples Mononylon 4-0 ou intradérmico com Monocryl 3-0, conforme a preferência. Pode-se usar hypafix na ferida operatória ou curativo com gaze e micropore.

Passo 6: finalização

Solicite radiografia de controle do procedimento, a ser realizada na sala de recuperação. Pacientes submetidos a este procedimento poderão receber alta no mesmo dia, após recuperação da sedação/anestesia e preencherem demais critérios de alta hospitalar. Na figura 1, ilustramos a sequência do passo a passo na veia subclávia direita e inserção de portocath infraclavicular à direita, sem a realização de tunelização do cateter.

Figura 1
Sequência do passo a passo da punção na veia subclávia direita e inserção de Portocath infraclavicular à direita, sem a realização de tunelização do cateter.

DISCUSSÃO

No presente estudo, as perguntas formuladas foram respondidas com a não associação entre taxas de complicações e não tunelizar o cateter, a lateralidade da veia puncionada e a realização de radioscopia no transoperatório.

As complicações possíveis deste procedimento são divididas em imediatas e de longo termo, sendo entre as primeiras as mais temidas o hemotórax e pneumotórax; destaca-se que não foram encontradas neste estudo. Em longo termo foram descritas como: necrose da pele, inflamação, hematoma, dor crônica, mal funcionamento do dispositivo - sendo então necessária a remoção (2,13% em 7 dias e em 2,17% em 30 dias após o procedimento). Em estudo realizado na Coreia do Sul, de 397 pacientes analisados após punção de subclávia ou jugular interna, 8.3% tiveram alguma das complicações acima, exceto hemo ou pneumotórax, o que está de acordo com os achados deste estudo44 An H, Ryu C, Jung E, Kang H, Paik J, Yang J, et al. Insertion of Totally Implantable Central Venous Access Devices by Surgeons. Ann Coloproctol. 2015;31(2):63-7. doi: 10.3393/ac.2015.31.2.63.
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. Em outro estudo, canadense, sobre inserção de cateter venoso central, com 6.875 pacientes incluídos, 23 pacientes (0,33%; IC 95% [0,22-0,5]) tiveram pneumotórax e 131 (1,91%; IC 95% [1,61;2,26]) colocação inadequada do cateter77 Chui J, Saeed R, Jakobowski L, Wang W, Eldeyasty Basem, Zhu F, et al. Is Routine Chest X-Ray After Ultrasound-Guided Central Venous Catheter Insertion Choosing Wisely? Chest. 2018;154(1):148-156. doi: 10.1016/j.chest.2018.02.017.
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.

No presente estudo, a punção da veia foi na maioria dos casos do lado direito (85,1%). Apesar de não ter sido encontrada associação positiva da lateralidade esquerda e complicações, no mesmo estudo no Canadá, a punção da veia subclávia esquerda foi descrita como o local com maior risco de pneumotórax (OR = 6,69 [IC 95% [2,45;18,28]; P<0,001)77 Chui J, Saeed R, Jakobowski L, Wang W, Eldeyasty Basem, Zhu F, et al. Is Routine Chest X-Ray After Ultrasound-Guided Central Venous Catheter Insertion Choosing Wisely? Chest. 2018;154(1):148-156. doi: 10.1016/j.chest.2018.02.017.
https://doi.org/10.1016/j.chest.2018.02....
.

No nosso estudo, a realização da radioscopia intraoperatória não se associou a desfecho negativo ou positivo em termos de complicações. Acredita-se que a importância seja apenas para avaliar se o fio guia está bem-posicionado durante o procedimento, para não haver surpresas, como o mau posicionamento do cateter, fato raro descrito na literatura88 Tomar G, Tiwari A, Jain D, Chawla S, Sinha R. Central venous catheter rotation malposition: an unusual presentation. Indian J Anaesth. 2012;56(4):415-7. doi: 10.4103/0019-5049.100856.
https://doi.org/10.4103/0019-5049.100856...

9 Moeinipour A, Amouzeshi A, Joudi M, Fathi M, Jahanbakhsh S, Hafez S, et al. A Rare Central Venous Catheter Malposition: a case report. Anesth Pain Med. 2012;4(1):e16049. doi: 10.5812/aapm.16049.
https://doi.org/10.5812/aapm.16049...
-1010 Keyal N,Thapa S, Adhikari P, Yadav S. Malposition of Central Venous Catheter Inserted under Ultrasound Guidance in Intensive Care Unit: a case series. JNMA J Nepal Med Assoc. 2020;58(227):515-8. doi: 10.31729/jnma.4655.
https://doi.org/10.31729/jnma.4655...
.

Em estudo italiano, 403 pacientes foram submetidos a inserção de portocath utilizando-se marcos anatômicos para puncionar a veia jugular interna ou valendo-se de ultrassonografia para guiar a punção da subclávia. Não foram encontradas diferenças em termos de taxas de complicações em relação aos diferentes sítios de punção e, a taxas de complicação foram menores quando comparadas ao estudo canadense. Esta publicação advoga o uso da ultrassonografia para punção da veia subclávia, que não faz parte da rotina da instituição de alta complexidade onde a presente revisão foi realizada55 Biffi R, Toro A, Pozzi S, Carlo I. Totally implantable vascular access devices 30 years after the first procedure. What has changed and what is still unsolved? Support Care Cancer. 2014;22(6):1705-14. doi: 10.1007/s00520-014-2208-1.
https://doi.org/10.1007/s00520-014-2208-...
.

Quanto às limitações deste estudo, destaca-se a natureza retrospectiva, o fato de ser limitado a 94 casos, e a ausência do cálculo amostral.

Devido à alta prevalência de câncer e necessidade crescente de implantação dos portocath, justifica-se a necessidade de estudar sobre a técnica cirúrgica deste procedimento. Apesar dos resultados não apresentarem significância estatística, são importantes para fomentar a discussão e conseguir planejar novos estudos sobre o tema. Está lançado o desafio para determinar qual a técnica de inserção mais adequada a fim de minimizar os riscos de complicações imediatas, em curto, médio e longo prazo.

CONCLUSÃO

A técnica inserção do portocath sem tunelização é procedimento ambulatorial seguro, de baixo risco de complicação, podendo ser adotada como forma de abreviar tempo de procedimento e desconforto ao paciente, sem prejuízos funcionais ou de segurança. Não houve associação entre não tunelizar o cateter, lateralidade da veia puncionada e realização de radioscopia no transoperatório com a taxa de complicações.

AGRADECIMENTOS

Um agradecimento especial ao Dr. Jefferson Rosa Cardoso, por sua ajuda com a estatística, revisão do texto e insights que iluminaram o texto, e a Elio Dornelles Andres

Filho, pelas ilustrações deste projeto.

REFERENCES

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  • Fonte de financiamento:

    não.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    21 Mar 2022
  • Data do Fascículo
    2022

Histórico

  • Recebido
    22 Ago 2021
  • Aceito
    25 Out 2021
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