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Freqüência de realização e acurácia do auto-exame das mamas na detecção de nódulos em mulheres submetidas à mamografia

Frequency of performance and accuracy of breast self-examination in the detection of breast lumps in women who underwent mammographic examination

Resumos

Realizamos um estudo transversal prospectivo cujo objetivo foi avaliar a acurácia do auto-exame de mamas (AEM) na detecção de nódulos mamários palpáveis e a relação com sua freqüência. Foram entrevistadas 2672 mulheres que realizaram mamografia na Região do Vale dos Sinos/RS no período de janeiro de 94 a julho de 97, questionando-se quanto à freqüência da realização de AEM. As mulheres foram divididas em dois grupos: grupo I (mensalmente), grupo II (quase nunca). As mulheres que relataram realizar o AEM ocasionalmente foram excluídas da análise principal. Foi perguntado à paciente se ela ou seu médico haviam palpado alguma lesão mamária. Comparou-se os achados de palpação da paciente com os do médico (relatados pela paciente). A sensibilidade do AEM foi maior no grupo I comparado ao II (57,4% versus 33,3%; P <0,05). Concluímos que existe uma associação entre a realização mensal de AEM e uma maior sensibilidade na detecção de nódulos mamários palpáveis.

Auto-exame de mamas; Rastreamento; Doenças benignas de mama; Câncer de mama


We conducted a prospective cross-sectional study to evaluate the accuracy of the breast self-examination (BSE) in the detection of palpable breast lumps and the relation to its frequency of performance. Two thousand six hundred and seventy two women who have had a mammogram in a private clinic in Vale dos Sinos-RS between January 1994 and July 1997 were asked about BSE performance frequency. They were divided in two groups: group I (monthly), group II (almost never). The women who referred performing BSE on a occasional basis were excluded from the main analysis. The woman was asked wheter she or her physician had palpated something in her breasts. The patient's BSE findings were compared with those of her physician (based on the patients' report). The sensitivity of the BSE was higher in group I compared to group II (57.4% versus 33.3%; rho<0.05). We concluded that there is an association between frequency of performance and sensitivity of BSE to detect breast lumps.

Breast self-examination; Screening; Benign breast diseases; Breast neoplasms


Trabalhos Originais

Freqüência de Realização e Acurácia do Auto-Exame das Mamas na Detecção de Nódulos em Mulheres Submetidas à Mamografia.

Frequency of Performance and Accuracy of Breast Self-Examination in the Detection of Breast Lumps in Women Who Underwent Mammographic Examination.

Álvaro A. Borba, Rafael M. de Souza, Anderson R. Lazzaron Rafael Defferrari, Luciana Scherer, Antônio L. Frasson

RESUMO

Realizamos um estudo transversal prospectivo cujo objetivo foi avaliar a acurácia do auto-exame de mamas (AEM) na detecção de nódulos mamários palpáveis e a relação com sua freqüência. Foram entrevistadas 2672 mulheres que realizaram mamografia na Região do Vale dos Sinos/RS no período de janeiro de 94 a julho de 97, questionando-se quanto à freqüência da realização de AEM. As mulheres foram divididas em dois grupos: grupo I (mensalmente), grupo II (quase nunca). As mulheres que relataram realizar o AEM ocasionalmente foram excluídas da análise principal. Foi perguntado à paciente se ela ou seu médico haviam palpado alguma lesão mamária. Comparou-se os achados de palpação da paciente com os do médico (relatados pela paciente). A sensibilidade do AEM foi maior no grupo I comparado ao II (57,4% versus 33,3%; P <0,05). Concluímos que existe uma associação entre a realização mensal de AEM e uma maior sensibilidade na detecção de nódulos mamários palpáveis.

PALAVRAS-CHAVE: Auto-exame de mamas. Rastreamento. Doenças benignas de mama. Câncer de mama.

Introdução

O câncer de mama é um problema de saúde pública importante. Estima-se que 12,2% das mulheres americanas terão câncer de mama ao longo da vida11. Dessas, 3,5% irão morrer vítimas da doença14.

Os três principais métodos de rastreamento do câncer de mama são o exame mamográfico (MMG), o exame clínico das mamas (ECM) e o auto-exame das mamas (AEM). Vários ensaios clínicos demonstraram uma redução da mortalidade em mulheres entre 50-74 anos de idade com a realização anual de MMG, associada ou não ao exame físico realizado pelo médico, como método de rastreamento13. Entretanto, esse método possui um custo considerável, não sendo economicamente viável em certas populações.

O AEM, por sua vez, possui um custo direto extremamente reduzido, podendo ser realizado regularmente pelas mulheres em menores intervalos. Entretanto, dois fatores muito importantes relacionam-se ao possível benefício de seu uso: acurácia na detecção de lesões palpáveis e freqüência de realização do exame.

O objetivo deste estudo foi avaliar a acurácia do auto-exame de mamas na detecção de nódulos mamários palpáveis e sua relação com a freqüência de realização do mesmo.

Material e métodos

Efetuamos um estudo transversal prospectivo no qual estabeleceu-se a associação entre a freqüência de realização de AEM e o rendimento diagnóstico (sensibilidade, especificidade e valores preditivos positivo e negativo) desse exame na detecção de nódulos mamários palpáveis, independente do caráter benigno ou maligno.

Mulheres que realizaram MMG em Serviço Privado de Radiodiagnóstico no Vale dos Sinos/RS, no período de janeiro de 94 a julho de 97 foram entrevistadas previamente à realização do exame, respondendo a um questionário padronizado que incluía questões específicas sobre a presença de fatores de risco para câncer de mama, freqüência de realização do AEM (mensalmente, ocasionalmente ou quase nunca) e realização prévia de MMG ou de procedimento cirúrgico nas mamas. Também foi questionado se o motivo da realização do exame atual era dor na mama, achado palpatório da paciente, achado palpatório do médico responsável, secreção mamilar ou outros. Cada um desses ítens foi questionado especificamente para cada mama. Nas mulheres que relataram ter encontrado alguma alteração em suas mamas, não tentamos estabelecer uma distinção entre os achados do auto-exame regular e os achados encontrados casualmente.

As mulheres foram divididas em dois grupos quanto à freqüência de realização do auto-exame das mamas: grupo I (mensalmente) e grupo II (quase nunca). As mulheres que relataram realizar o AEM ocasionalmente foram excluídas da análise principal. Foi avaliada, então, a acurácia do auto-exame de mamas na detecção de lesões mamárias palpáveis, independente do caráter benigno ou maligno, em ambos os grupos. Para tal, avaliamos os resultados do AEM relatados pela paciente, utilizando como método palpatório padrão os resultados encontrados pelo médico responsável. Os dados referentes à palpação realizada pelo médico responsável na consulta que antecedeu a mamografia foram referidos pela paciente. Cada mama examinada foi analisada individualmente.

A sensibilidade foi estabelecida através da razão entre o número de mamas corretamente identificadas pela paciente como contendo alterações palpatórias e o número de mamas identificadas pelo examinador padrão (médico responsável) como contendo alterações palpatórias. A especificidade foi estabelecida através da razão entre o número de mamas corretamente identificadas pela paciente como não contendo alterações palpatórias e o número de mamas identificadas pelo examinador padrão como não contendo alterações palpatórias. O valor preditivo positivo (VPP) foi calculado pela razão entre o número de mamas corretamente identificadas pela paciente como contendo nódulos palpáveis (segundo a palpação padrão do médico) e o número total de mamas identificadas pela paciente como contendo nódulos palpáveis. O valor preditivo negativo (VPN) foi calculado mediante a razão entre o número de mamas corretamente identificadas pela paciente como não contendo nódulos palpáveis (segundo a palpação padrão do médico) e o número total de mamas identificadas pela paciente como não contendo nódulos palpáveis.

Comparou-se, então, os achados em ambos os grupos quanto à sensibilidade, especificidade, VPP e VPN do AEM na detecção de lesões mamárias palpáveis, independente do caráter benigno ou maligno.

A comparação entre os grupos visa estabelecer, primariamente, a acurácia do AEM na detecção de nódulos palpáveis. Por isso, não utilizamos como padrão-ouro o resultado da MMG, que comprovadamente é mais sensível do que a palpação do médico, pois isso subestimaria a acurácia do AEM. Se assim o fizéssemos, esperaríamos que as mulheres fossem capazes de palpar todas as lesões mamárias, o que é tecnicamente impossível devido ao reduzido tamanho, à profundidade e à consistência de alguns nódulos.

Uma segunda análise estabeleceu a acurácia do AEM no que se refere à identificação de neoplasias malignas, independente de serem palpáveis ou não. A comparação utilizou como método padrão uma avaliação global realizada pelo mastologista (MMG e ECM, acrescidos de ecografia e exame anátomo-patológico quando necessários). Nessa análise, cada mama não foi computada individualmente.

O protocolo foi aprovado pelo Comitê de Ética da instituição onde foi realizado o estudo. As pacientes foram informadas da natureza do estudo, consentindo em participar.

As características dos grupos foram comparadas pela análise de variância por meio do teste ANOVA (distribuição normal/paramétrico) ou Kruskal-Wallis (distribuição não-normal/não-paramétrico). Os grupos foram considerados homogêneos para os fatores avaliados quando o teste estatístico utilizado apresentou P³0,05. A partir das proporções utilizadas para definição dos parâmetros de acurácia do auto-exame, foram obtidos intervalos de confiança de 95% utilizando-se o teste quadrático de Fleiss. A comparação dos resultados, quanto às medidas de acurácia entre os grupos, foi estabelecida pelos intervalos de confiança, utilizando-se o teste qui quadrado.

Resultados

Duas mil seiscentas e setenta e duas mulheres participaram do estudo, sendo 1260 (47,2%) no grupo I e 748 (28%) no grupo II. Seiscentos e sessenta e quatro mulheres relataram realizar o AEM de mamas ocasionalmente, sendo excluídas da análise principal devido a possível variabilidade inter-indivíduo na avaliação desse parâmetro. Foram, então, incluídas apenas na análise secundária da acurácia do AEM em relação à faixa etária. As características dos grupos foram semelhantes quanto aos outros fatores avaliados, exceto pela idade, paridade, status menopáusico e realização de mamografia prévia (Tabela 1).

Os dados referentes à acurácia do AEM na detecção de lesões palpáveis estão descritos na Tabela 2. A sensibilidade na detecção de nódulos mamários foi significativamente maior nas mulheres que realizavam mensalmente o AEM (grupo I) quando comparadas às mulheres que quase nunca o realizavam (grupo II) (r<0,001). Isso, entretanto, não implicou em um menor VPP do teste no grupo I, pois não houve diferença significativa entre os dois grupos quanto a essa medida (r >0,05). A Tabela 3 especifica a acurácia do AEM na detecção de neoplasias malignas. Não houve diferença entre os grupos. O pequeno número de neoplasias identificadas nesses dois grupos (n=56) limitou o poder estatístico da análise, não sendo possível descartar um erro estatístico aleatório do tipo II. A Tabela 4 especifica a acurácia do AEM na detecção de neoplasias malignas de acordo com o grupo etário . Nessa análise, como não se avaliou a freqüência de realização do AEM, todas as 2672 pacientes forma incluídas. O VPP e a especificidade foram significativamente maiores nas mulheres com 50 anos ou mais quando comparadas às mulheres com menos de 50 anos (r <0,0001).

Discussão

A questão mais importante referente à utilização em massa de um teste de rastreamento é se o tratamento disponível é realmente efetivo. Ou seja, o diagnóstico e tratamento precoces do câncer de mama implicam em uma redução da mortalidade em pacientes submetidas ao rastreamento? Caso isso não ocorra, estaríamos apenas aumentando o tempo de vida com a doença, não o tempo real de vida. Grandes ensaios clínicos randomizados estabeleceram que o tratamento precoce em pacientes cuja neoplasia foi diagnosticada por mamografia está associado a uma significativa redução de 26% na mortalidade em mulheres entre 50 e 74 anos13. Em mulheres mais jovens ou mais idosas, entretanto, esse benefício ainda pode ser considerado controverso7,13. Quanto ao efeito do AEM utilizado como método de rastreamento, ensaios não-randomizados, estudos de coorte ou caso-controle evidenciaram que há uma relação inversa entre freqüência de realização do AEM e taxa de mortalidade8,15. Há dois grandes estudos randomizados em andamento com o intuito primário de avaliar o efeito do AEM na mortalidade por câncer de mama. O estudo realizado na Rússia, após 9 anos de acompanhamento, não demonstrou diferença significativa quanto à mortalidade entre o grupo que realizava AEM e o grupo controle18. O outro estudo, realizado na China, após 5 anos de acompanhamento, não encontrou redução significativa da mortalidade cumulativa por câncer de mama no grupo que realizava AEM19.

Um fator importante é determinar se o AEM poderia ser utilizado como um teste de rastreamento primário ou deveria ser complementar à MMG e ECM. Nos países onde a difusão do uso da MMG é economicamente viável, o AEM possuiria a função de detectar aqueles tumores que desenvolvem-se entre os exames mamográficos e tumores não detectados pela MMG ou ECM. No estudo BCDDP (Breast Cancer Detection Demonstration Project), 9% das neoplasias foram detectadas pelo exame clínico sem terem sido detectadas pela mamografia3. Porém, mesmo em países desenvolvidos como nos EUA, o AEM poderia desempenhar um papel primário no rastreamento do câncer, pois um recente estudo demonstrou que das mulheres americanas acima dos 55 anos, apenas 58% referiram ter realizado um exame mamográfico em toda sua vida, e apenas 45% tiveram suas mamas examinadas por um médico no ano anterior17.

As características importantes de um teste de rastreamento são a acurácia (principalmente a sensibilidade e o VPP), a aceitabilidade do teste pelas pacientes, a segurança, a simplicidade e o custo. Todas essas características devem ser avaliadas em conjunto na análise da qualidade de um teste.

Neste estudo, sensibilidade foi considerada a habilidade de um teste de detectar um nódulo mamário quando esse existisse. Em estudos realizados em modelos de silicone, a sensibilidade do exame realizado por voluntárias tem variado de 25% a 57%6,10,16. Os programas de treinamento em AEM sabidamente aumentam essa sensibilidade, podendo até dobrá-la10. A sensibilidade estimada do AEM na detecção de lesões malignas no estudo BCDDP foi de apenas 26%, comparada a 71% da mamografia3. A mamografia apresenta uma sensibilidade inferior em mulheres jovens quando comparadas a mulheres mais velhas1,3. Em nosso estudo, a sensibilidade do auto-exame de mamas na detecção de nódulos variou entre 33,3% no grupo II até 57,4% no grupo I.

Um outro fator importante é o VPP do teste. Corresponde à probabilidade de doença em uma paciente com um exame alterado. No caso, a probabilidade de que um nódulo encontrado pela paciente através do AEM realmente exista (quando considerarmos como verdadeiros tanto nódulos benignos quanto malignos) ou seja maligno (quando considerarmos como verdadeiros apenas nódulos malignos). O VPP do AEM na detecção de câncer relatado na literatura tem sido de apenas 4% a 12%1,9,12. Essa taxa é menor em mulheres jovens, já que nessa faixa etária a incidência de câncer de mama é menor, e pelo fato de que essas mulheres estão mais propensas a doenças benignas de mama devido às flutuações hormonais do ciclo menstrual1,4,9,12. Gastrin encontrou uma probabilidade de 88% de que um achado de AEM fosse benigno9. Outro estudo encontrou uma taxa de malignidade de 48% em nódulos encontrados em mulheres com idade superior a 55 anos, comparada a uma taxa de 3% em mulheres com menos de 44 anos1. Em nosso estudo, as mulheres com 50 anos ou mais, apesar de realizarem o AEM em menor freqüência, obtiveram um VPP significativamente superior às mulheres com menos de 50 anos (r <0,0001). Isso poderia ser explicado pelos fatores acima descritos e pela maior lipossubstituição das mamas nessa faixa etária. Portanto, a maioria das mulheres com achados ao auto-exame não tem câncer, sendo que as mulheres jovens parecem ser menos favorecidas pela relação risco/benefício do AEM na detecção de neoplasias malignas. Visto que o AEM é um teste de rastreamento, não-diagnóstico, quaisquer alterações detectadas deverão ser posteriormente investigadas. Portanto, um teste falso-positivo implica em um excesso de custos com procedimentos investigatórios e de ansiedade da paciente até que se tenha um diagnóstico definitivo. Além disso, mulheres que tiveram um ou mais episódios de detecção de nódulos benignos podem adiar a procura ao médico quando detectarem novamente algum nódulo (possivelmente maligno) por acreditarem, baseadas em sua experiência prévia, de que seja benigno. Cabe citar, também, que exames falso-negativos implicariam em maiores custos devido ao retardo no diagnóstico e tratamento.

A maioria das mulheres não realiza o AEM mensalmente. Vários estudos tem demonstrado que apesar de cerca de 90% a 99% das mulheres terem conhecimento do exame, apenas 15-40% realizam-no mensalmente16, sendo essa freqüência maior em mulheres mais jovens8. Em nosso estudo, 49,3% das mulheres com menos de 50 anos realizavam o AEM mensalmente, contra 43,9% das mulheres com 50 anos ou mais (r<0,05). Várias são as possíveis explicações para este achado. A prática regular da técnica pode produzir ansiedade associada à possibilidade de encontrar algo. Muitas mulheres não acreditam em sua capacidade de detectar alterações. Além disso, a freqüência mensal do exame é uma parâmetro arbitrariamente estabelecido, baseado no ciclo menstrual, apesar de a maioria das mulheres atingidas pelo câncer serem pós-menopáusicas.

Alguns estudos encontraram uma maior freqüência de realização8 e proficiência2 do AEM em mulheres com história familiar de câncer de mama em primeiro grau.

É aceitável a idéia de que muitas mulheres considerem o AEM como sendo um comportamento socialmente adequado, podendo haver um "overreport" sobre a freqüência do AEM. Em nosso estudo, esse "overreporting" produziria uma redução no benefício aparente do AEM, pois incluiria no grupo I mulheres com acurácias possivelmente inferiores à media dos grupos, tendendo a reduzir os índices encontrados.

Outro possível viés seria o fato de que as mulheres que quase nunca realizavam o AEM estariam mais propensas a terem como médicos responsáveis profissionais não engajados na importância do exame de mamas, de forma que poderiam realizar exames clínicos menos detalhados do que médicos que julgavam o exame de grande importância. Isso produziria um aumento do benefício do AEM no grupo II.

Mulheres que realizam o AEM mensalmente estão mais propensas a terem recebido instrução do que aquelas que não o fazem, de forma que aquelas que o realizam com maior freqüência seriam mais treinadas e sua habilidade seria melhorada pelo próprio "efeito treinante", não só pela diferente periodicidade da realização.

Não sabemos qual a porcentagem das mulheres em cada grupo que consultava mastologistas, ginecologistas ou clínicos gerais. Supondo que a habilidade na palpação desses médicos fosse diferente, o nosso padrão poderia variar de grupo para grupo, falseando nossas análises. Possivelmente o grupo que realizava auto-exame mensal estaria mais propenso a consultar mastologistas ou ginecologistas, de forma que a habilidade para detecção de lesões destas mulheres seria subestimada em comparação aos outros grupos.

Todos esse possíveis viéses tenderiam a aproximar os parâmetros de acurácia do AEM nos grupos I e II. Como, entretanto, a sensibilidade foi significativamente diferente, não é afetada por esse fatores de forma importante. Quanto ao VPP, não podemos afirmar com certeza que a similaridade encontrada não seja devido aos viéses acima descritos e ao pequeno número de mulheres que relataram ter palpado algo em suas mamas, pois, devido a isso, existe a possibilidade de que tenhamos incorrido em erro estatístico aleatório do tipo II. Essa possibilidade parece pequena, visto que os intervalos de confiança de 95% sobrepõem-se quase que em sua totalidade. Contudo, não é passível de ser descartada.

Como a população do estudo corresponde a um grupo de mulheres que realizaram mamografia, possivelmente trata-se de uma população com maior grau de preocupação com sua saúde do que a média geral das mulheres. Por isso, talvez a porcentagem de mulheres que realizavam o AEM em nosso estudo seja superestimada. Além disso, a acurácia das mulheres de nosso estudo também poderia ser um pouco superior à da população em geral.

A maioria das neoplasias malignas são encontrados pelas próprias pacientes, havendo, portanto, uma necessidade de estimular meios que otimizem as chances de uma mulher encontrar uma alteração e prontamente consultar um médico quando tal ocorrer1. Em 1995, o US Preventive Health Services Task Force concluiu que não existem evidências suficientes para que se estabeleçam recomendações favoráveis ou desfavoráveis quanto à realização do auto-exame de mamas5.

Essas conclusões concordam com a afirmação de O'Malley et al de que "Atualmente, o que existe em relação ao auto-exame de mamas não é evidência de falta de efeito, mas sim falta de evidência"10. Caso os estudos que estão em andamento não encontrem uma redução da mortalidade por câncer de mama nos grupos que realizam AEM como método de rastreamento primário, talvez o papel dessa prática seja de adjuvante à mamografia e exame clínico, reduzindo adicionalmente a mortalidade.

Podemos concluir que o AEM realizado mensalmente está associado a uma maior sensibilidade na detecção de nódulos mamários em mulheres submetidas à mamografia. Quanto ao VPP, apesar de aparentar ser muito similar entre os dois grupos, nosso estudo não tem poder para afirmar que não existe diferença quanto à esse parâmetro.

SUMMARY

We conducted a prospective cross-sectional study to evaluate the accuracy of the breast self-examination (BSE) in the detection of palpable breast lumps and the relation to its frequency of performance. Two thousand six hundred and seventy two women who have had a mammogram in a private clinic in Vale dos Sinos-RS between January 1994 and July 1997 were asked about BSE performance frequency. They were divided in two groups: group I (monthly), group II (almost never). The women who referred performing BSE on a occasional basis were excluded from the main analysis. The woman was asked wheter she or her physician had palpated something in her breasts. The patient's BSE findings were compared with those of her physician (based on the patients' report). The sensitivity of the BSE was higher in group I compared to group II (57.4% versus 33.3%; r<0.05). We concluded that there is an association between frequency of performance and sensitivity of BSE to detect breast lumps.

KEY WORDS: Breast self-examination. Screening. Benign breast diseases. Breast neoplasms.

Centro de Ecografia e Radiologia - Hospital São Rafael - Novo Hamburgo - RS

Faculdade de Medicina - Universidade Federal do Rio Grande do Sul

Faculdade de Medicina - Pontifícia Universidade Católica de Porto Alegre - RS

Correspondência:

Rafael Marques de Souza

Rua Heller 61/81

CEP 93510-330 - Novo Hamburgo/RS

Telefone: (051) 222 05 23

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    02 Maio 2007
  • Data do Fascículo
    Fev 1998
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