Acessibilidade / Reportar erro

Preditores Clínicos e Histopatológicos de Tumor Trofoblástico Gestacional pós-Mola Hidatiforme Completa

Clinical and Histopathological Predictors of Gestational Trophoblastic Tumor +after Complete Hydatidiform Mole

Resumos

Objetivo: definir os preditores clínicos e histopatológicos mais eficientes da evolução da mola hidatiforme completa (MHC) para tumor trofoblástico gestacional (TTG). Métodos: estudo prospectivo clínico e histopatológico de todas as portadoras de MHC, atendidas entre 1990 e 1998 no Hospital das Clínicas de Botucatu -- UNESP. A avaliação clínica pré-esvaziamento molar classificou a gravidez molar em: MHC de alto risco e MHC de baixo risco. Foram analisados os preditores clínicos para TTG, estabelecidos por Goldstein et al.¹ e por outros autores2--10. A avaliação histopatológica incluiu a determinação do diagnóstico de MHC, segundo os critérios de Szulman e Surti11, e o reconhecimento dos fatores de risco para TTG, de Ayhan et al.8. Os preditores clínicos e histopatológicos foram correlacionados com o desenvolvimento de TTG pós-molar. Resultados: em 65 portadoras de MHC, cistos do ovário maiores que 6 cm e tamanho uterino maior que 16 cm foram os preditores clínicos mais eficientes de TTG. A proliferação trofoblástica, a atipia nuclear, a necrose/hemorragia, a maturação trofoblástica e a relação cito/sinciciotrofoblasto não foram preditores significativos para TTG. A correlação entre preditor clínico e histopatológico para o desenvolvimento de TTG não foi possível porque nenhum parâmetro histopatológico foi significativo. Conclusões: mais estudos são necessários para avaliar possíveis preditores de persistência (TTG) e sua aplicação no contexto clínico das MHC. Enquanto isso, a determinação seriada de hCG sérico permanece o único indicador prognóstico seguro para TTG pós-MHC.

Doença trofoblástica gestacional; Gonadotrofinas coriônicas; Cisto de ovário


Purpose: to determine the most efficient clinical and histopathological predictors of complete hydatidiform mole (CHM) after gestational trophoblastic tumors (GTT). Methods: a prospective clinical and histopathological study was performed on all patients with CHM treated at the University Hospital of Botucatu between 1990 and 1998. Preevacuation clinical evaluation allowed the classification of molar pregnancy into high risk and low risk CHM. The author analyzed the clinical predictors of GTT established by Goldstein et al.¹ and by other authors2--10. The histopathological evaluation included the confirmation of CHM diagnosis based on the criteria by Szulman and Surti11 and the understanding of risk factors for GTT by Ayhan et al.8. The clinical and histopathological predictors were correlated with the postmolar GTT. Results: ovarian cysts larger than 6 cm and uterus size larger than 16 cm were the most efficient clinical predictors of GTT in 65 patients with CHM. Trophoblastic proliferation, nuclear atypia, necrosis/hemorrhage, trophoblastic maturation, and the ratio cytotrophoblast to syncytiotrophoblast were not significant predictors of GTT. The correlation between the clinical and histopathological predictors for the development of GTT was not possible, as no histopathological parameter was significant. Conclusion: additional investigations could evaluate other predictors for persistent disease, and its usefulness in a clinical context. The sequential determination of plasmatic beta-hCG remains the only safe predictor for persistent disease.

Complete hydatidiform mole; Gestational trophoblastic disease; Chorionic gonadotrophins; Ovarian cysts


Trabalhos Originais

Preditores Clínicos e Histopatológicos de Tumor Trofoblástico Gestacional pós-Mola Hidatiforme Completa

Clinical and Histopathological Predictors of Gestational Trophoblastic Tumor +after Complete Hydatidiform Mole

Izildinha Maestá, Marilza V. C. Rudge, Eliane S. Abreu, Ivete Dalben, José C. Peraçoli

RESUMO

Objetivo: definir os preditores clínicos e histopatológicos mais eficientes da evolução da mola hidatiforme completa (MHC) para tumor trofoblástico gestacional (TTG).

Métodos: estudo prospectivo clínico e histopatológico de todas as portadoras de MHC, atendidas entre 1990 e 1998 no Hospital das Clínicas de Botucatu ¾ UNESP. A avaliação clínica pré-esvaziamento molar classificou a gravidez molar em: MHC de alto risco e MHC de baixo risco. Foram analisados os preditores clínicos para TTG, estabelecidos por Goldstein et al.1 e por outros autores2¾10. A avaliação histopatológica incluiu a determinação do diagnóstico de MHC, segundo os critérios de Szulman e Surti11, e o reconhecimento dos fatores de risco para TTG, de Ayhan et al.8. Os preditores clínicos e histopatológicos foram correlacionados com o desenvolvimento de TTG pós-molar.

Resultados: em 65 portadoras de MHC, cistos do ovário maiores que 6 cm e tamanho uterino maior que 16 cm foram os preditores clínicos mais eficientes de TTG. A proliferação trofoblástica, a atipia nuclear, a necrose/hemorragia, a maturação trofoblástica e a relação cito/sinciciotrofoblasto não foram preditores significativos para TTG. A correlação entre preditor clínico e histopatológico para o desenvolvimento de TTG não foi possível porque nenhum parâmetro histopatológico foi significativo.

Conclusões: mais estudos são necessários para avaliar possíveis preditores de persistência (TTG) e sua aplicação no contexto clínico das MHC. Enquanto isso, a determinação seriada de hCG sérico permanece o único indicador prognóstico seguro para TTG pós-MHC.

PALAVRAS-CHAVE: Doença trofoblástica gestacional. Gonadotrofinas coriônicas. Cisto de ovário.

Introdução

A identificação dos fatores de risco da gravidez molar para o desenvolvimento de tumor trofoblástico gestacional (TTG) é importante para a introdução do tratamento quimioterápico precoce, nos casos em que a curva do marcador biológico (hCG) não segue a regressão normal pós-esvaziamento molar. Os fatores prognósticos da mola hidatiforme completa (MHC) que têm sido estudados envolvem suas características clínicas1¾8 e histológicas9-12.

Goldstein et al.1 desenvolveram um escore prognóstico para identificar as pacientes com MHC de alto risco para malignização, que, na sua opinião, deveriam ser tratadas com quimioterapia profilática, no momento do esvaziamento molar. Entretanto, o uso da quimioterapia profilática no esvaziamento molar permanece controverso na literatura9,13.

A influência do método de esvaziamento uterino (curetagem, vácuo-aspiração, indução com ocitócicos), como fator de risco para TTG após MHC, mostrou que o uso de ocitócico prévio ao esvaziamento uterino foi fator agravante do risco de desenvolver TTG6. Park et al.9, utilizando dilatação-curetagem, vácuo-aspiração ou histerectomia, como métodos de esvaziamento molar, não verificaram porém interferência com a evolução para TTG.

Em 1983, a OMS alertou para o aumento do risco de desenvolver TTG, quando a paciente com mola hidatiforme (MH) apresenta útero maior que a idade gestacional, cistos do ovário e níveis elevados de hCG14.

A análise da literatura mostra vários estudos que indicam fatores prognósticos que caracterizam a MHC de alto risco: útero maior para a idade gestacional, nível de hCG maior que 100.000 mUI/ml, cistos tecaluteínicos com diâmetro maior que 6 cm e complicações médicas, como pré-eclâmpsia, embolização trofoblástica e hipertiroidismo1¾3. A MHC de alto risco, nesses estudos, evoluiu para TTG em cerca de 40 a 50% dos casos.

O impacto clínico da presença de cada fator de risco, no manejo dos casos de MH, não está definido. A análise simultânea da função discriminante linear, associando vários fatores prognósticos (idade, antecedente de gravidez molar, sangramento genital e tamanho uterino maior que a idade gestacional) classificou corretamente apenas 69% dos casos de mola hidatiforme15.

A evolução para TTG, segundo vários autores, ocorre, predominantemente, após os 40¾45 anos de idade9,10,15. Entretanto, no estudo de Yazaki-Sun et al.16, no Brasil, a média de idade em que ocorreu evolução para TTG foi de 29 anos, e, no grupo com remissão completa, foi de 25 anos. Não houve diferença significativa da idade nestes dois grupos.

O valor do exame histopatológico para o prognóstico da MHC não está definido, embora venha merecendo discussão, desde os estudos de Hertig e Sheldon17. Estes autores estudaram 200 casos de MH e elaboraram um sistema de graduação histológica, baseado no grau de atipia trofoblástica. De acordo com este sistema, a proliferação trofoblástica atípica foi agrupada em seis categorias, variando de benigna a maligna. Encontraram correlação positiva entre o aspecto histopatológico original da MH e o subseqüente desenvolvimento de TTG.

Hertig e Mansell18 modificaram o sistema de graduação histológica e obtiveram igual significância prognóstica. Este método de gradua-ção histológica foi útil para o prognóstico e para selecionar pacientes para a histerectomia.

Em 1983, a OMS colocou o grau histológico da MH como fator de risco para TTG, assunto ainda controverso na literatura14. Vários autores relataram a correlação entre o grau histológico e o potencial de malignidade da MHC8,17. Outros autores têm sugerido que o resultado histopatológico não tem importância na detecção do potencial maligno da MHC14,19.

As características histológicas da MHC mais freqüentemente associadas com o desenvolvimento de TTG persistente são: hiperplasia acentuada, atipia nuclear, excessiva proliferação do citotrofoblasto, presença de necrose e hemorragia8,17.

Ayhan et al.8 examinaram parâmetros histopatológicos para predição de TTG, por análise estatística univariada, e observaram que o grau de proliferação trofoblástica, marcada atipia nuclear e presença de necrose e hemorragia foram preditores significantes de TTG. Entretanto, outros critérios histológicos, como maturação trofoblástica, camada fibrinóide e relação sincicio/citotrofoblasto, não apresentaram significância estatística para o aumento do risco de TTG, após MHC.

O que se depreende da análise da literatura é que, ao longo dos anos, houve mudança no enfoque sobre a avaliação da MHC de alto risco. Na década de 60, os autores precisavam identificar o grau histológico de suposta malignidade para indicar histerectomia18,19. Nas décadas de 70 e 80, foi dada maior ênfase aos critérios clínicos para identificação da mola de alto risco para evolução para TTG, visando à quimioterapia profilática1¾3. Em anos recentes, a identificação da mola de alto risco procura utilizar critérios clínicos e histopatológicos, com o objetivo de indicar seguimento pós-molar mais estrito para introdução precoce de quimioterapia7,8. Dessa forma, a proposição deste estudo é definir os preditores clínicos e histopatológicos mais eficientes de evolução de MHC para TTG, para estabelecer o diagnóstico e o tratamento precoce de seqüela maligna, no seguimento pós-molar.

Pacientes e Métodos

Efetuamos um estudo prospectivo clínico e histopatológico de todas as pacientes com MHC diagnosticadas, tratadas e acompanhadas no Hospital das Clínicas de Botucatu - UNESP, no período de 1990 a 1998.

A avaliação das características clínicas pré-esvaziamento molar envolveu a análise dos seguintes dados: idade materna, idade gestacional no diagnóstico de mola, tamanho uterino (menor, apropriado ou maior para idade gestacional), presença e diâmetro de cistos tecaluteínicos, ocorrência de hiperemese, hipertensão/pré-eclâmpsia, acometimento pulmonar (deportação trofoblástica/edema agudo de pulmão) e nível sérico de b-hCG.

O esvaziamento uterino foi realizado utilizando-se as técnicas de vácuo-aspiração, dilatação-curetagem ou histerectomia, de acordo com as suas respectivas indicações. Após o esvaziamento molar, as pacientes foram monitorizadas no programa de seguimento pós-molar, sendo observadas quanto à evolução clínica e laboratorial (dosagem seriada de b-hCG). Com base na evolução clínico-laboratorial, as pacientes foram classificadas em duas categorias: remissão espontânea ou TTG.

Foram usados os preditores clínicos, estabelecidos por Goldstein et al.1, para a caracterização da gravidez molar de alto risco para TTG. As pacientes foram divididas em dois grupos, de acordo com os critérios de Goldstein1: MHC de alto risco e MHC de baixo risco. Gravidez molar foi considerada de alto risco, quando apresentava os quatro preditores: 1) nível sérico de b-hCG ³100.000 mUI/ml; 2) tamanho uterino maior para a idade da gestação; 3) cistos ovarianos com diâmetro superior a 6 cm; 4) presença de uma ou mais complicações médicas: hiperemese, hipertensão arterial/pré-eclâmpsia e insuficiência respiratória. A gravidez molar foi classificada como de baixo risco, quando apresentava três características: 1) nível sérico de b-hCG <100.000 mUI/ml; 2) tamanho uterino igual ou menor que a idade da gestação; 3) cistos do ovário com diâmetro menor que 6 cm.

Além disso, foram analisados os preditores clínicos para TTG, estabelecidos por outros nove autores2¾10. Esses autores observaram várias características clínicas de MHC que se relacionavam com o aumento do risco para TTG pós-esvaziamento molar: 1) anemia; 2) idade gestacional na data do diagnóstico de MHC; 3) tamanho uterino >16 cm; 4) cistos do ovário; 5) método utilizado para o esvaziamento molar.

O estudo histológico para o diagnóstico da MHC foi feito no material molar, obtido de esvazia-mento uterino, após a confecção de lâminas coradas com hematoxilina e eosina (HE). Observaram-se os critérios histológicos de Szulman e Surti11, para o diagnóstico da MHC.

Os fatores histológicos de risco para TTG, estabelecidos por Ayhan et al.8¾ proliferação trofoblástica, atipia nuclear, necrose/hemorragia, maturação trofoblástica, camada fibrinóide (Nitabuch) e relação cito/sinciciotrofoblasto ¾ foram avaliados por um único patologista e graduados de forma semiquantitativa. A proliferação trofoblástica foi classificada em leve, moderada ou intensa. A atipia nuclear foi subdividida em três categorias: leve, moderada ou severa. Necrose/hemorragia foram avaliadas como mínima, moderada ou extensa. A maturação trofoblástica foi expressada em porcentagem (<20%, entre 20-50% e > 50%) e foi determinada pela presença de núcleos picnóticos e predominância do sinciciotrofoblasto como são observados no terceiro trimestre da gravidez. A relação cito/sinciciotrofoblasto foi dividida em três categorias: <1, = 1 ou >1. Os achados histológicos foram correlacionados com a evolução clínica da MHC.

Os dados, obtidos em protocolo padronizado, foram colocados em planilha do aplicativo Excel for Windows, versão 97. Foram construídas tabelas de contingência entre as variáveis de interesse e efetuados os testes do c2 e teste exato de Fisher, quando aplicável, observando-se um nível de significância de 5% e um intervalo de confiança de 95%. Este estudo foi previamente aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Hospital das Clínicas de Botucatu ¾ UNESP.

Resultados

Da série de 65 pacientes portadoras de MHC, atendidas no Hospital das Clínicas de Botucatu ¾ UNESP, 54 (83,1%) apresentaram remissão espontânea e 11 (16,9%) tiveram TTG.

A MHC de alto risco, classificada de acordo com os critérios clínicos de Goldstein et al.1, aumentou 3,56 vezes o risco de desenvolver TTG, com intervalo de confiança de 95% significativo, variando de 1,30 a 9,73.

A análise dos preditores clínicos, propostos por Goldstein et al.1, mostrou que a presença de cistos do ovário maiores que 6 cm foi o único significativo para o desenvolvimento de TTG. O risco relativo de desenvolver TTG aumentou 5,83 vezes, quando havia cistos ovarianos maiores que 6 cm, com intervalo de confiança de 95%, também significativo (Tabela 1). Apenas sua presença aumentou o risco 4,3 vezes, com intervalo de confiança de 95%, também significativo (Tabela 2). O tamanho do útero maior que a idade gestacional, o nível de b-hCG pré-esvaziamento molar igual ou maior que 100.000 mUI/ml e a presença de complicações médicas aumentaram o risco de desenvolver TTG, mas os intervalos de confiança de 95% não foram significativos (Tabela 1).

Os fatores prognósticos, propostos por outros autores2¾10, significativos para o desenvolvimento de TTG, foram: o tamanho uterino maior que 16 cm e a presença de cistos do ovário (Tabela 2).

A anemia materna, verificada na admissão, e a idade gestacional, no momento do diagnóstico, aumentaram o risco de desenvolver TTG, mas os intervalos de confiança de 95% não foram significativos (Tabela 2).

O estudo histopatológico dos 65 casos incluiu a avaliação de 355 lâminas (número médio de 5 lâminas por paciente), confirmando o diagnóstico de MHC, de acordo com os critérios de Szulman e Surti11. Também foram avaliados os fatores de risco para TTG, de Ayhan et al.8. Foi excluído o estudo da camada fibrinóide (Nitabuch) pela dificuldade de se obter sua integridade, porque a curetagem fragmentou os tecidos entre o cório e a decídua.

Presença de necrose extensa e ausência de trofoblasto na vilosidade18 prejudicaram a avaliação em algumas amostras de tecido molar.Nenhum dos critérios histológicos avaliados apresentou resultado com significância estatística por análise univariada (Tabela 3).

O risco relativo de desenvolver TTG foi aumentado na atipia nuclear severa (2,80) e na relação cito/sinciciotrofoblasto maior que 1 (2,06), porém, os intervalos de confiança de 95% não foram significativos (Tabela 3, Figuras 1 e 2).



Não foi possível calcular o risco de desenvolver TTG nas pacientes com preditor clínico e histopatológico, porque nenhum critério histológico foi significativo quanto ao aumento do risco para TTG.

Discussão

A incidência de TTG pós-MHC é variável e relacionada aos critérios diagnósticos utilizados. Neste estudo, a incidência de TTG pós-MHC foi de 16,9%. Na era pré-quimioterapia, Hertig e Mansell18 e Delfs20 encontraram incidência de 16% de TTG pós-molar. Atualmente, considera-se incidência em torno de 15% como mais próxima da verdadeira21.

A identificação clínico-laboratorial da MHC de alto risco para malignização, proposta nas décadas de 70 e 80, continua atual1¾3. Isto pode ser evidenciado porque as pacientes com MHC de alto risco tiveram risco de desenvolver TTG aumentado 3,56 vezes, em comparação com as de baixo risco.

Antes do advento da quimioterapia, efetuava-se histerectomia nas pacientes com molas de alto risco18,19. A prática da quimioterapia profilática, concomitante ou subseqüente ao esvaziamento molar, foi implementada a partir de 1965 pelo "National Institutes of Health" (NIH)13. Entretanto, permanece controversa sua aplicação nas pacientes com molas de alto risco: reduz a incidência de TTG para menos da metade; no entanto, aumenta a morbidade e a resistência à quimioterapia, caso a paciente desenvolva TTG13. Esforços para o reconhecimento de um subgrupo de molas, biologicamente agressivas e que malignizam, são justificados porque auxiliam na decisão da introdução precoce da quimioterapia, no seguimento pós-molar8.

A análise de cada um dos preditores clínicos, propostos por Goldstein et al.1 mostrou significância estatística apenas para os cistos ovarianos maiores que 6 cm. A sua ocorrência aumentou 5,83 vezes o risco de desenvolver TTG, com intervalo de confiança significativo. A avaliação volumétrica dos cistos do ovário é dado de relevo no estabelecimento do fator prognóstico1. A correlação entre cistos do ovário maiores que 6 cm e TTG pós-MHC é observada por vários autores1¾3. Expressão da atividade gonadotrófica de mola, os cistos ovarianos são considerados um bioensaio in vivo de hCG22. Apesar da correlação fisiopatológica entre b-hCG e o aparecimento de cistos do ovário, o nível inicial de b-hCG foi quase significativo como preditor clínico, pois o valor de p foi 0,06. Quando o valor inicial de b-hCG foi menor que 100.000 mUI/ml, apenas uma em 21 pacientes desenvolveu TTG.

Outros autores identificaram diferentes preditores clínicos para TTG pós-MHC2¾10. A análise comparativa com esses outros critérios mostrou que a simples presença de cistos do ovário foi significativa e aumentou 4,3 vezes o risco de desenvolver TTG, com intervalo de confiança de 95% significativo.

A definição mais aprimorada do tamanho uterino, ou seja, não apenas classificada em relação à idade gestacional, mas muito mais em relação ao tamanho da massa molar, foi parâmetro significativo para TTG. Porém, do ponto de vista metodológico, foi impossível calcular o risco relativo para o tamanho uterino maior que ou igual a 16 cm, pois, quando foi menor que 16 cm, nenhuma paciente (0/24) desenvolveu TTG. Este resultado contrasta com o de Tangtrakul et al.10, que obtiveram significância estatística para TTG pós-MH, quando o tamanho uterino foi maior que o esperado para a idade gestacional e não observaram correlação, quando o tamanho uterino foi maior que o equivalente 16 semanas. Nosso estudo não observou influência de útero maior que a idade gestacional nas pacientes que desenvolveram TTG. Entretanto, outros autores verificaram aumento do risco de seqüela maligna, quando o tamanho do útero é maior que a idade gestacional2,3,5,7,9.

Anemia materna e idade gestacional tardia aumentaram a incidência de TTG, porém de forma não-significativa. Em relação à idade gestacio-nal no momento do diagnóstico, vários autores observaram maior incidência de TTG em gravidez molar inicial3,4,10. Isto pode ser explicado pela gravidade da doença molar, que favoreceu a procura mais precoce da consulta médica pela paciente.

Os métodos utilizados para o esvaziamento molar (vácuo-aspiração, dilatação-curetagem e histerectomia) não influenciaram a incidência de TTG pós-MHC. Tangtrakul et al.10 e Park et al.9 utilizaram estes métodos para o esvaziamento molar e também não observaram diferença significativa na incidência de TTG pós-molar. Entretanto, no nosso meio, Belfort23 propõe o uso de vácuo-aspiração como a melhor forma de esvaziamento de molas, sem porém relacionar com o prognóstico.

As dificuldades em caracterizar o trofoblasto molar são referidas desde estudos iniciais de Hertig e Sheldon17: o seu protótipo benigno é invasivo, penetra nos vasos sanguíneos e, em conseqüência, é deportado para os pulmões. A OMS14, através do grupo científico da DTG, considerou controverso o valor da histopatologia na evolução da gravidez molar, e dúvidas persistem até os dias de hoje8,12.

Antes do advento da quimioterapia, a graduação histológica era considerada de valor para indicar histerectomia, nos casos de molas malignas18,19. A maioria dos estudos17,18 relacionando o grau histológico como fator prognóstico foram realizados antes de 1977, ou seja, ainda sem o reconhecimento das síndromes MHC e MHP (mola hidatiforme parcial) como entidades clínicas distintas11. E mais, consideravam apenas o critério hiperplásico atípico do trofoblasto e, muitas vezes, não acompanhavam o período pós-esvaziamento com determinação dos níveis de hCG19.

Vários autores orientam avaliação de múltiplos parâmetros histopatológicos da MHC: proliferação do trofoblasto, presença de necrose/hemorragia, atipia nuclear, maturação trofoblástica, relação cito/sinciciotrofoblasto e camada fibrinóide (Nitabuch). Nesses estudos7,8, houve associação com progressão para TTG, quando as pacientes portadoras de MHC apresentaram os seguintes parâmetros histológicos: proliferação trofoblástica acentuada, necrose extensa e hemorragia, atipia nuclear, diminuição da maturação trofoblástica e excesso de citotrofoblasto. Todas essas características são relacionadas com atividade proliferativa anormal do trofoblasto neoplásico. A capacidade de destruição do trofoblasto é ilustrada por necrose extensa e hemorragia, com ausência da camada fibrinóide de Nitabuch. O aumento na relação cito/sinciciotrofoblasto e a proliferação trofoblástica acentuada são reflexos do crescimento agressivo. O citotrofoblasto é o precursor do sinciciotrofoblasto e seu excesso em MHC reflete alta atividade proliferativa e falta de diferenciação. No presente estudo, nenhuma destas características histológicas mostrou correlação significativa com o desenvolvimento de TTG pós-MHC.

Os resultados negativos do grau histológico5,12,19, associados ao uso de métodos sensíveis e específicos de hCG pós-esvaziamento molar, têm dado menor importância ao estudo histopatológico das MH. Entre nós, Belfort23 considera MHC de risco, quando o exame histopatológico apresenta trofoblasto compacto e presença de infiltrado linfoplasmocitário. No entanto, no estudo de Murad et al.7, não se obteve associação desses parâmetros histológicos com TTG pós-molar.

Matéria de debate, a identificação das molas de alto risco é sujeita a diversas investigações e controvérsias, desde o estudo original de Hertig e Sheldon17. Atualmente, as pesquisas anunciam importância para os preditores clínicos, associados aos histopatológicos7,8, curva laboratorial de b-hCG24 e subtipos genéticos de molas25. Mais estudos são necessários para avaliar possíveis preditores de persistência (TTG) e sua aplicação no contexto clínico das MHC. Enquanto isso, a determinação seriada de hCG sérico permanece o único indicador prognóstico seguro para TTG pós-MHC.

SUMMARY

Purpose: to determine the most efficient clinical and histopathological predictors of complete hydatidiform mole (CHM) after gestational trophoblastic tumors (GTT).

Methods: a prospective clinical and histopathological study was performed on all patients with CHM treated at the University Hospital of Botucatu between 1990 and 1998. Preevacuation clinical evaluation allowed the classification of molar pregnancy into high risk and low risk CHM. The author analyzed the clinical predictors of GTT established by Goldstein et al.1 and by other authors2¾10. The histopathological evaluation included the confirmation of CHM diagnosis based on the criteria by Szulman and Surti11 and the understanding of risk factors for GTT by Ayhan et al.8. The clinical and histopathological predictors were correlated with the postmolar GTT.

Results: ovarian cysts larger than 6 cm and uterus size larger than 16 cm were the most efficient clinical predictors of GTT in 65 patients with CHM. Trophoblastic proliferation, nuclear atypia, necrosis/hemorrhage, trophoblastic maturation, and the ratio cytotrophoblast to syncytiotrophoblast were not significant predictors of GTT. The correlation between the clinical and histopathological predictors for the development of GTT was not possible, as no histopathological parameter was significant.

Conclusion: additional investigations could evaluate other predictors for persistent disease, and its usefulness in a clinical context. The sequential determination of plasmatic b-hCG remains the only safe predictor for persistent disease.

KEY WORDS: Complete hydatidiform mole. Gestational trophoblastic disease. Chorionic gonadotrophins. Ovarian cysts.

Referências

Departamento de Ginecologia e Obstetrícia Faculdade de Medicina de Botucatu-UNESP

Correspondência: Izildinha Maestá

Departamento de Ginecologia e Obstetrícia

Faculdade de Medicina de Botucatu ¾ Unesp

Rubião Júnior, s/no

18618-970 ¾ Botucatu ¾ SP

  • 1. Goldstein DP, Berkowitz RS, Bernstein MR. Management of molar pregnancy. J Reprod Med 1981; 26:208-12.
  • 2. Curry SL, Hammond CB, Tyrey L, Creasman WT, Parker RT. Hydatidiform mole: diagnosis management, and long-term follow-up of 347 patients. Obstet Gynecol 1975; 45:1-8.
  • 3. Morrow CP, Kletzky OA, Disaia PJ, Townsend DE, Mishell DR, Nakamura RM. Clinical and laboratory correlates of molar pregnancy and trophoblastic disease. Am J Obstet Gynecol 1977; 128:424-30.
  • 4. Stone M, Bagshawe KD. An analysis of the influences of maternal age, gestational age, contraceptive method, and the mode of primary treatment of patients with hydatidiform moles on the incidence of subsequent chemotherapy. Br J Obstet Gynaecol 1979; 86:782-92.
  • 5. Kohorn EI. Hydatidiform mole and gestational trophoblastic disease in Southern Connecticut. Obstet Gynecol 1982; 59:78-84.
  • 6. Andrade JM, Bighetti S, Kim TYJ, Freitas MMS. Avaliação de diferentes técnicas de esvaziamento uterino como fator de risco para neoplasia trofoblástica invasora e metastática. AMB Rev Assoc Med Bras 1989; 35:175-8.
  • 7. Murad TM, Longley JV, Lurain JR, Brewer JI. Hydatidiform mole: clinicopathologic asso-ciations with the development of postevacuation trophoblastic disease. Int J Gynaecol Obstet 1990;32:359-67.
  • 8. Ayhan A, Tuncer ZS, Halilzade H, Kücükali T. Predictors of persistent disease in women with complete hydatidiform mole. J Reprod Med 1996; 41:591-4.
  • 9. Park TK, Kim SN, Lee SK. Analysis of risk factors for postmolar trophoblastic disease: categorization of risk factors and effect of prophylactic chemotherapy. Yonsei Med J 1996; 37:412-9.
  • 10.Tangtrakul S, Srisupundit S, Linasmita V, Bullangpoti S, Bhamarapravati Y. The risk factors in the development of persistent trophoblastic disease following hydatidiform mole. J Med Assoc Thai 1990; 73 Suppl 1:33-6.
  • 11.Szulman AE, Surti U. The syndromes of hydatidiform mole II. Morphologic evolution of the complete and partial mole. Am J Obstet Gynecol 1978; 132:20-7.
  • 12.Genest DR, Laborde O, Berkowitz RS, Goldstein DP, Bernstein MR, Lage J. A clinicopathologic study of 153 cases of complete hydatidiform mole (1980-1990): histologic grade lacks prognostic significance. Obstet Gynecol 1991; 78:402-9.
  • 13.Goldstein DP, Berkowitz RS. Prophylactic chemotherapy of complete molar pregnancy. Semin Oncol 1995; 22:157-60.
  • 14
    World Health Organization. Scientific Group on Gestational Trophoblastic Disease. Gestational trophoblastic diseases. Geneva: WHO; 1983. (Technical report series, 692).
  • 15.Parazzini F, Mangili G, Belloni C, La Vecchia C, Liati P, Marabini R. The problem of identification of prognostic factors for persistent trophoblastic disease. Gynecol Oncol 1988; 30:57-62.
  • 16.Yazaki-Sun S, Monteleone PPR, Bertini AM, Camano L. A importância da idade da paciente no prognóstico da mola hidatiforme. Ars Curandi 1992; 25:34,36,38.
  • 17.Hertig AT, Sheldon WH. Hydatidiform mole ž a pathologic-clinical correlation of 200 cases. Am J Obstet Gynecol 1947; 53:1-19.
  • 18.Hertig AT, Mansell H. Tumors of the female sex organs. Part I: hydatidiform mole and cho-riocarcinoma. Washington, DC: Armed Forces Institute of Pathology; 1956. p.7-27. (Atlas of Tumor Pathology, section 9, fasc. 33)
  • 19.Tow WSH, Yung RH. The value of histological grading in the prognostication of hydatidiform mole. J Obstet Gynaecol Br Commonw 1967; 74:292-3.
  • 20.Delfs E. Chorionic gonadotropin determinations with hydatidiform mole and choriocarcinoma. Ann N Y Acad Sci 1959; 8:125-39.
  • 21.Newlands ES, Paradinas FJ, Fisher RA. Recent advances in gestational trophoblastic disease. Current therapeutic issues in gynecologic cancer. Hematol Oncol Clin North Am 1999; 13:225-44.
  • 22.Goldstein DP, Berkowitz RS. Current management of complete and partial molar pregnancy. J. Reprod Med 1994; 39:139-46.
  • 23.Belfort P. As síndromes da mola hidatiforme. Ginecol Obstet Atual 1992; 1:20-3.
  • 24.Yedema KA, Verheijen RH, Kenemans P, et al. Identification of patients with persistent trophoblastic disease by means of a normal human chorionic gonadotropin regression curve. Am J Obstet Gynecol 1993; 168:787-92.
  • 25.Sunde L, Mogensen B, Olsen S, Nielsen V, Christensem IJ, Bolund L. Flow cytometric DNA analysis of 105 fresh hydatidiform moles, with correlations to prognosis. Anal Cell Pathol 1996; 12:99-114.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    18 Out 2005
  • Data do Fascículo
    Abr 2000
Federação Brasileira das Sociedades de Ginecologia e Obstetrícia Av. Brigadeiro Luís Antônio, 3421, sala 903 - Jardim Paulista, 01401-001 São Paulo SP - Brasil, Tel. (55 11) 5573-4919 - Rio de Janeiro - RJ - Brazil
E-mail: editorial.office@febrasgo.org.br