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Características das Curvas de Regressão da Gonadotrofina Coriônica Pós-mola Hidatiforme Completa

Characteristics of b-hCG Regression Curves Following Complete Hydatidiform Mole

Resumos

Objetivos: construir a curva de regressão do b-hCG pós-mola hidatiforme completa (MHC) com remissão espontânea e comparar com a curva de regressão pós-MHC com tumor trofoblástico gestacional (TTG). Análise comparativa da curva de regressão do b-hCG das portadoras de MHC, acompanhadas no Serviço, com a curva de regressão observada por outros autores1-3. Métodos: foi realizada avaliação clínica e laboratorial (dosagem sérica de b-hCG), na admissão e no segmento pós-molar, de todas as pacientes com MHC, atendidas entre 1990 e 1998 no Hospital das Clínicas de Botucatu - Unesp. O resultado da determinação seriada do b-hCG foi analisado em curvas log de regressão. A evolução da curva de regressão do b-hCG foi analisada e comparada em MHC com remissão espontânea e MHC com TTG numa curva log de regressão, com intervalo de confiança de 95%. A curva log de regressão do grupo de remissão espontânea foi comparada com curvas consideradas padrão1,2. Foram construídas curvas log individuais de todas as pacientes e classificadas de acordo com os quatro tipos de curva (I, II, III e IV), propostos para o seguimento pós-molar³. Resultados: 61 pacientes com MHC tiveram seguimento pós-molar completo, 50 (82%) apresentaram remissão espontânea e 11 (18%) desenvolveram TTG. No grupo de pacientes com MHC e remissão espontânea, o tempo para alcançar a normalização dos níveis do b-hCG, após o esvaziamento molar, foi até 20 semanas. As pacientes que desenvolveram TTG apresentaram desvio precoce da curva de regressão normal do b-hCG, 4 a 6 semanas após o esvaziamento molar. Nestas pacientes, a quimioterapia foi introduzida em média na 9ª semana pós-esvaziamento molar. Conclusões: a curva de regressão do b-hCG pós-MHC com remissão espontânea apresentou declínio log exponencial, semelhante ao observado por outros autores1,2, e diferente das MHC com TTG. Foram identificados três tipos de curvas de regressão do b-hCG, semelhantes aos de Goldstein³, I, II e IV, e outros dois tipos diferentes de regressão do b-hCG: V (regressão normal) e VI (regressão anormal).

Doença trofoblástica gestacional; Gonadotrofina coriônica; Quimioterapia; Dopplerfluxometria


Purpose: to construct a b-human chorionic gonadotropin (b-hCG) regression curve following complete hydatidiform mole (CHM) of patients with spontaneous remission, and then compare it to that of CHM patients with gestational trophoblastic tumor (GTT). Also, to compare the b-hCG regression curve of CHM patients followed-up at the Service to the regression curve of other authors1-3. Methods: clinical and laboratory evaluations (serum determinations of b-hCG) were performed on admission and during post-molar follow-up of CHM patients treated at the University Hospital of Botucatu between 1990 and 1998. The result of the serial b-hCG determinations was analyzed using log regression curves. The evolution of the b-hCG regression curve was analyzed and compared between cases of CHM with spontaneous remission and with GTT using a log regression curve, with 95% confidence interval. The log regression curve of the spontaneous remission group was compared to those of other authors1,2. Individual log curves for each patient were constructed and classified according to the four curve types (I, II, III, and IV) proposed by Goldstein³ for post-molar follow-up. Results: sixty-one patients received complete post-molar follow-up, 50 (82%) showing spontaneous remission and 11 (18%) developing GTT. In the group of patients with CHM and spontaneous remission, the time to return to normal b-hCG levels after mole emptying was 20 weeks. The patients who developed GTT showed early deviation from normal b-hCG regression curve 4 to 6 weeks after mole emptying. These patients received chemotherapy normally starting during the 9th post-mole emptying week. Conclusions: the regression curve of post-CHM b-hCG in patients with spontaneous remission showed a log-exponential decline similar to that observed by other authors1,2, but different from that of CHM patients who developed GTT. Three types of b-hCG regression curves similar to Goldstein's³, I, II, and IV, were identified, as well as two other different types: V (normal regression) and VI (abnormal regression).

Complete hydatidiform mole; b-hCG regression curve; Gestational trophoblastic tumor; Chorionic gonadotrophin


Trabalhos Originais

Características das Curvas de Regressão da Gonadotrofina Coriônica Pós-mola Hidatiforme Completa

Characteristics of b-hCG Regression Curves Following Complete Hydatidiform Mole

Izildinha Maestá, Marilza V. C. Rudge, José Raimundo S. Passos, Iracema M. P. Calderon, Nádia R. Carvalho, Marcos Consonni

RESUMO

Objetivos: construir a curva de regressão do b-hCG pós-mola hidatiforme completa (MHC) com remissão espontânea e comparar com a curva de regressão pós-MHC com tumor trofoblástico gestacional (TTG). Análise comparativa da curva de regressão do b-hCG das portadoras de MHC, acompanhadas no Serviço, com a curva de regressão observada por outros autores1-3.

Métodos: foi realizada avaliação clínica e laboratorial (dosagem sérica de b-hCG), na admissão e no segmento pós-molar, de todas as pacientes com MHC, atendidas entre 1990 e 1998 no Hospital das Clínicas de Botucatu - Unesp. O resultado da determinação seriada do b-hCG foi analisado em curvas log de regressão. A evolução da curva de regressão do b-hCG foi analisada e comparada em MHC com remissão espontânea e MHC com TTG numa curva log de regressão, com intervalo de confiança de 95%. A curva log de regressão do grupo de remissão espontânea foi comparada com curvas consideradas padrão1,2. Foram construídas curvas log individuais de todas as pacientes e classificadas de acordo com os quatro tipos de curva (I, II, III e IV), propostos para o seguimento pós-molar3.

Resultados: 61 pacientes com MHC tiveram seguimento pós-molar completo, 50 (82%) apresentaram remissão espontânea e 11 (18%) desenvolveram TTG. No grupo de pacientes com MHC e remissão espontânea, o tempo para alcançar a normalização dos níveis do b-hCG, após o esvaziamento molar, foi até 20 semanas. As pacientes que desenvolveram TTG apresentaram desvio precoce da curva de regressão normal do b-hCG, 4 a 6 semanas após o esvaziamento molar. Nestas pacientes, a quimioterapia foi introduzida em média na 9a semana pós-esvaziamento molar.

Conclusões: a curva de regressão do b-hCG pós-MHC com remissão espontânea apresentou declínio log exponencial, semelhante ao observado por outros autores1,2, e diferente das MHC com TTG. Foram identificados três tipos de curvas de regressão do b-hCG, semelhantes aos de Goldstein3, I, II e IV, e outros dois tipos diferentes de regressão do b-hCG: V (regressão normal) e VI (regressão anormal).

PALAVRAS-CHAVE: Doença trofoblástica gestacional. Gonadotrofina coriônica. Quimioterapia. Dopplerfluxometria.

Introdução

A gonadotrofina coriônica humana (hCG) é um hormônio glicoprotéico, de alto peso molecular (46.000 dáltons), produzido pelo tecido trofoblástico normal e tumoral. De relevância para a prática clínica, a hCG apresenta propriedades químicas, biológicas e imunológicas4.

Tem na sua estrutura química duas cadeias de polipeptídeos, alfa e beta, ligadas por carboidratos. A subunidade alfa é semelhante a dos outros hormônios glicoprotéicos - hormônios luteinizantes (LH), hormônio folículo-estimulante (FSH) e hormônio liberador de tirotropina (TSH). Em contraste, a subunidade beta é que determina a atividade biológica e a especificidade imunoquímica da molécula da hCG4. Concentrações de b-hCG no soro de mulheres saudáveis, não-grávidas, são menores ou iguais a 5 mUI/ml, que são consideradas o nível de corte5.

O nível da hCG é o parâmetro mais importante para o acompanhamento de pacientes, após o esvaziamento molar6. Marcador biológico do tumor trofoblástico gestacional (TTG), detecta a persistência de trofoblasto ativo nas paredes do útero, ou em outros locais, e fornece dados para a intervenção terapêutica precoce. Nenhum dos métodos de imagem é tão confiável para este propósito como é o marcador tumoral-hCG, conforme salientam três dos maiores grupos de estudo sobre doença trofoblástica gestacional (DTG)6-8.

O papel da dosagem de hCG no diagnóstico e no manejo da DTG foi estabelecido por Delfs9 e Brewer et al.10.

Antes da década de 70, utilizava-se para a determinação da hCG o teste imunológico semiquantitativo, em urina de 24 horas, pelo método da aglutinação do látex, complementado pelo teste biológico quantitativo do peso do útero do camundongo10. O custo e as dificuldades deste método limitavam sua ampla adoção na prática médica.

Em 1972, Vaitukaitis et al.11 desenvolveram a técnica de radioimunoensaio (RIE), para dosagem quantitativa da hCG e de sua subunidade b no soro ou plasma. Muitos investigadores empregaram este método sensível e econômico2,12-14. Foram desenvolvidos outros métodos sensíveis e específicos, que utilizam anticorpos monoclonais para a determinação da b-hCG total (molécula intacta de hCG + subunidade b livre), no soro ou plasma4: dentre estes, o ELISA, que é um ensaio imunoenzimático, e o MEIA, que é um ensaio imunoenzimático por micropartículas5.

O recente sucesso clínico no manejo da DTG está relacionado aos avanços das técnicas de dosagem de hCG, que permitem intervenção terapêutica oportuna6. A detecção precoce do TTG, seguida de adequada quimioterapia, promove cura completa, com preservação da capacidade reprodutiva15.

O diagnóstico de gravidez molar identifica a paciente que necessita de seguimento clínico e laboratorial (b-hCG), e a determinação seriada da gonadotrofina coriônica, no seguimento pós-molar, reconhece as pacientes que necessitam de quimioterapia.

A Sociedade Brasileira de NTG recomenda dosagem de b-hCG com intervalos semanais, pós-esvaziamento molar, até a obtenção de três dosagens consecutivas normais. Prosseguir com intervalo quinzenal e, a seguir, mensal até completar seis meses após o primeiro resultado negativo. Considera-se doença residual ou persistente, se os níveis séricos de hCG, após o esvaziamento molar, apresentam regressão anormal, com níveis oscilantes e, muitas vezes, crescentes. É também indicativo de doença residual o nivelamento, durante o seguimento pós-molar, da hCG, por três dosagens consecutivas ou seu aumento nesse período15,16.

A curva de regressão da b-hCG, pós-esvaziamento molar, identifica o grupo de pacientes com seqüela maligna, isto é, com risco futuro de desenvolver complicações locais (TTG não-metastático) ou metastáticas (TTG metastático), mais do que a mudança histológica da lesão. O diagnóstico precoce permite a cura da maioria das pacientes, com regime quimioterápico de agente único, que é de baixa toxicidade6.

A incidência de TTG pós-molar é variável, em decorrência dos diferentes protocolos utilizados para o início da quimioterapia em cada centro de tratamento e da dificuldade para se estabelecer o diagnóstico histopatológico correto de gravidez molar17. Na Europa e nos Estados Unidos, a incidência de pacientes tratadas é diferente: cerca de 25%, nos Estados Unidos, e em torno de 10%, nos centros europeus6. No Instituto Nacional de Perinatologia do México18, estudo realizado no período de 1988 a 1994 observou incidência de 18% de TTG pós-molar. No Brasil, vários estudos mostram variação na incidência de TTG pós-molar entre 13 e 31%19-21.

A Organização Mundial da Saúde (OMS) recomenda que o seguimento pós-molar ideal deve ser feito com dosagem seriada de b-hCG a cada duas semanas, até que os níveis se normalizem, e a cada mês, no primeiro ano. Este trabalho, seguindo as recomendações da OMS7, tem como objetivo construir a curva de regressão da b-hCG pós-mola hidatiforme completa (MHC) com remissão espontânea e comparar com a curva de regressão pós-MHC com TTG. Outro objetivo é o de verificar as semelhanças ou diferenças da curva de regressão da b-hCG das portadoras de MHC, acompanhadas no Serviço, com a curva de regressão observada por outros autores1-3.

Pacientes e Métodos

Em 1990, foi criado o Centro de Referência da DTG no Hospital das Clínicas de Botucatu - Unesp. Todos os casos foram registrados e o seguimento pós-molar é feito seguindo as recomendações da OMS7.

Este estudo clínico prospectivo do seguimento pós-molar incluiu pacientes portadoras de MHC que foram diagnosticadas, tratadas e acompanhadas no Hospital das Clínicas de Botucatu - Unesp, no período de 1990 a 1998.

O seguimento pós-molar foi clínico e laboratorial. O seguimento clínico consistiu no estudo das características do ciclo menstrual e no exame ginecológico, analisando a involução do útero e dos cistos do ovário e a orientação para contracepção hormonal, durante um ano. O seguimento laboratorial foi feito pela dosagem sérica de b-hCG (ELISA/MEIA) pré-esvaziamento molar, e depois, quinzenal até a normalização (<5 mUI/ml), seguindo-se com dosagens mensais, nos primeiros seis meses, e bimestrais, até completar um ano. A determinação da b-hCG total (molécula intacta de hCG + subunidade beta livre) foi realizada no Laboratório de Sorologia do Serviço, com o uso do método ELISA, no período de 1990 a 1993, e do método MEIA, a partir de 1994.

Com base na evolução clínico-laboratorial, as pacientes foram classificadas em duas categorias: remissão espontânea ou TTG. Em ambas as condições, foi registrado o número de semanas necessário para a normalização da b-hCG. Também foi anotado o número de semanas após o esvaziamento molar, para o início da quimioterapia nas pacientes que desenvolveram TTG. Considerava-se a paciente em remissão espontânea após três dosagens consecutivas da b-hCG <5 mUI/ml. TTG foi diagnosticado por alteração da curva de regressão do b-hCG, após o esvaziamento molar, seja pela manutenção dos níveis de b-hCG (platô) por, pelo menos, três dosagens consecutivas, seja pela elevação (ascensão) de seus títulos.

Após isto, as pacientes foram avaliadas quanto à presença de doença metastática, antes do início da quimioterapia, com os seguintes exames: a) exame ginecológico, com procura de lesão vinhosa nos órgãos genitais externos e na vagina; avaliação do tamanho do útero e da sua consistência e procura de cistos tecaluteínicos; b) ultra-som pélvico com dopplervelocimetria da circulação uterina, para avaliação do volume do útero e dos ovários (cistos tecaluteínicos) e do acometimento miometrial; c) radiografia de tórax, para investigar metástases pulmonares. Esses três exames rastrearam e classificaram os casos com TTG. Depois do tratamento quimioterápico, todas as pacientes foram acompanhadas com dosagens mensais dos níveis da b-hCG pelo período de dois anos.

O estudo da curva logarítmica exponencial de regressão da b-hCG pós-MHC foi feito considerando-se a média e os intervalos de confiança de 95%22, em cada momento estudado. Para sua construção, utilizou-se, no eixo x, o tempo zero (pré-esvaziamento) e o tempo em intervalos quinzenais (pós-esvaziamento molar), e, no eixo y, os valores do b-hCG (mUI/ml), em potências de 10. A curva log de regressão da b-hCG das MHC com remissão espontânea foi comparada com a curva de regressão das MHC que tiveram TTG, e com as curvas log de regressão normal observadas por outros autores1,2. Foram construídas as curvas log individuais de todas as pacientes com MHC, tanto com remissão espontânea como com evolução para TTG. A seguir, foram analisadas individualmente e classificadas de acordo com os quatro tipos de curva (I, II, III e IV), propostos por Goldstein3, para o seguimento pós-molar: o tipo I, caracterizada por queda rápida dos níveis de hCG e ausência de seqüela maligna; o tipo II, padrão de regressão mais lento da hCG e remissão espontânea; o tipo III, com normalização dos títulos de hCG, seguida de ascensão e seqüela maligna em todas as pacientes; o tipo IV, com pequena diminuição inicial dos níveis de hCG, seguida de ascensão e TTG também em todas as pacientes.

O presente trabalho foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Faculdade de Medicina de Botucatu - Unesp.

Resultados

Da série de 61 pacientes com MHC e seguimento pós-molar completo, 50 (82%) apresentaram remissão espontânea e 11 (18%) tiveram TTG.

No grupo de pacientes com MHC e remissão espontânea, o tempo necessário para alcançar a normalização dos níveis de b-hCG, após o esvaziamento molar, foi variável: 43 pacientes (86%) até 14 semanas, 47 pacientes (94%) até 16 semanas e 50 pacientes (100%) até 20 semanas. O número total de amostras utilizadas para dosagem de b-hCG, neste grupo de pacientes foi de 550, tendo sido feitas, em média, 11 determinações por paciente.

No grupo de pacientes que desenvolveram TTG, o número total de amostras utilizadas para dosagem de b-hCG foi de 118, tendo sido feitas 11 determinações por paciente.

Na Figura 1 está a curva de regressão da b-hCG das pacientes com remissão espontâna e das que desenvolveram TTG. A curva de regressão da b-hCG das pacientes com MHC e remissão espontânea foi construída considerando-se a média e o intervalo de confiança de 95% em cada momento estudado. A queda dos níveis de b-hCG seguiu um declínio log-exponencial.


A análise comparativa da curva log de regressão normal (remissão espontânea) com a curva de regressão das pacientes que tiveram TTG mostra que, no momento zero (pré-esvaziamento) e na 2a semana pós-molar, não existe diferença entre os grupos com remissão espontânea e com evolução para TTG. Entretanto, nas pacientes com TTG, os valores da b-hCG aumentaram, acima do limite superior do intervalo de confiança a 95% da curva normal de regressão, na 4a e 6a semanas seguintes (Figura 1).

A quimioterapia foi introduzida em média na 9a semana pós-esvaziamento molar, no grupo de pacientes com TTG. Os valores de b-hCG, nestas pacientes, continuaram elevados e só são comparáveis ao grupo com remissão espontânea, na 14a semana pós-esvaziamento molar (Figura 1).

Do total de 11 pacientes que desenvolveram TTG não-metastático, foi observada curva de regressão de b-hCG em platô em cinco pacientes, e em ascensão, em seis (Figura 2). Destas 11 pacientes, dez foram tratadas e obtiveram remissão completa da doença e uma paciente recusou tratamento quimioterápico, pois os níveis de b-hCG estavam em platô prolongado, persistente e baixo (<1000 mUI/ml). Observa-se, nos casos de TTG com ascensão dos títulos de b-hCG, início mais precoce da quimioterapia, em torno da 6a a 8a semana pós-esvaziamento molar. Em contraste, houve maior tempo de observação, antes do início do tratamento, nas pacientes com níveis de b-hCG em platô baixo (Figura 2).


Nas Figuras 3 e 4 foram analisadas e comparadas as curvas de regressão das b-hCG das pacientes com remissão espontânea do Hospital das Clínicas de Botucatu, com as de outros autores1,2. Observa-se que os intervalos de confiança confluem, em todos os momentos, na curva de Schlaerth et al.2 (Figura 3). Só não há superposição na 4a semana pós-esvaziamento molar, na curva de regressão de Morrow et al.1 (Figura 4). Portanto, estas três curvas de regressão da b-hCG podem ser consideradas semelhantes, quando analisadas no intervalo de confiança a 95%.



No Hospital das Clínicas de Botucatu foram identificados vários tipos de curva de b-hCG, no seguimento pós-molar (Figura 5). Os tipos I e II são semelhantes aos observados por Goldstein3: regressão rápida, por volta da 10a semana pós-esvaziamento molar, no tipo I, e padrão de regressão mais lento, em torno de 16 a 18 semanas pós-esvaziamento molar, no tipo II. Não foi observada nenhuma curva de regressão tipo III. As pacientes que desenvolveram TTG apresentaram, na maioria das vezes, curva de regressão tipo IV semelhante ao de Goldstein: pequena queda inicial, seguida de ascensão dos valores do hCG. Foi verificado o tipo V da curva de regressão da b-hCG com nível oscilatório baixo (<1000 mUI/ml e menos de 3 valores alterados) e as pacientes obtiveram remissão espontânea até 20 semanas pós-esvaziamento molar. Outro tipo de curva de regressão da b-hCG foi encontrado em duas pacientes (tipo VI), caracterizado por diminuição inicial dos níveis de b-hCG e depois níveis estacionários, formando um platô persistente e baixo (<1000 mUI/ml) e mais de 3 valores alterados. Uma destas pacientes foi tratada para TTG com 24 semanas pós-esvaziamento molar e a outra recusou tratamento (Figura 2).


A curva de Goldstein3 tipo I foi encontrada em 50,8% dos casos; a curva tipo II, em 26,2%; a curva tipo III, em 0%; a curva tipo IV, em 14,8%; a tipo V, em 4,9%, e a curva tipo VI, em 3,3% (Figura 5).

Discussão

Utilizando a curva log de regressão da b-hCG no seguimento pós-molar, observamos uma incidência de 18% de TTG pós-MHC (11 casos). A "Society of Gynecologic Oncologists"6 refere incidência de seqüela maligna pós-MHC entre 10 a 25% dos casos. Entretanto, os autores que utilizaram a curva de regressão da b-hCG para o diagnóstico de TTG observaram incidência aumentada, variando de 26 a 36%1,2,14.

A maioria das pacientes com MHC e remissão espontânea apresentou normalização da curva de regressão da b-hCG na 14a semana pós-esvaziamento molar, o que também foi observado por outros autores1,2,12,14. Todas as pacientes com remissão espontânea obtiveram normalização da b-hCG até 20 semanas após o esvaziamento molar. Bagshawe et al.23 observaram normalização da b-hCG em 4.066 pacientes (96,7%), até 20 semanas após o esvaziamento molar. O intervalo de tempo para a obtenção de níveis normais de b-hCG pós-MHC com remissão espontânea é variável, e, se a paciente está bem e os títulos de b-hCG estão caindo, nenhum tratamento adicional é necessário8.

Neste estudo, os dados de 50 pacientes com MHC e remissão espontânea permitiram a elaboração de uma curva de regressão de b-hCG, caracterizada por uma distribuição log normal. Nenhuma dessas pacientes teve aumento subseqüente da b-hCG e nenhuma recebeu quimioterapia para TTG. Esta observação permite a análise individual dos valores de b-hCG, no seguimento pós-molar, e serve para orientar o clínico: tranqüilidade, quando os títulos declinam dentro do limite de confiança a 95%, ou atenção redobrada, se os títulos desviam da curva normal. Portanto, a curva de regressão normal da b-hCG é útil para o reconhecimento precoce de TTG e de regressão espontânea de MHC e deverá ser utilizada no seguimento pós-molar das pacientes atendidas no Serviço.

A análise comparativa do padrão da curva de regressão da b-hCG de 11 pacientes que não tiveram queda progressiva até a normalização assinala um grupo separado, que pode ser identificado em torno de 4 a 6 semanas após esvaziamento molar. Neste grupo, as pacientes apresentaram títulos de b-hCG desviando do padrão de regressão normal, mostrando a persistência de atividade trofoblástica e a necessidade de avaliação e tratamento para TTG. Vários autores também identificaram desvio precoce da curva de regressão normal da b-hCG, em torno de 4 a 6 semanas após o esvaziamento molar, em pacientes que desenvolveram TTG1,2,13.

A introdução da quimioterapia, por volta da 9a semana pós-esvaziamento molar, tornou os níveis de b-hCG comparáveis aos do grupo com remissão espontânea, a partir da 14a semana de acompanhamento. Rotmensch et al.12 compararam a regressão de b-hCG pós-molar e pós-TTG não-metastático, tratado com quimioterapia. É interessante que obtiveram curvas de regressão semelhantes nesses dois grupos, caracterizadas por um declínio log exponencial.

O diagnóstico de TTG é uniforme entre os autores, quando existem níveis de b-hCG em ascensão, exame histopatológico de coriocarcinoma, metástases ou hemorragia genital. Entretanto, quando ocorre estabilização dos níveis de b-hCG (platô) no seguimento pós-molar, não há uniformidade no diagnóstico de TTG não-metastático24. Neste estudo, o tempo de observação, antes do início da quimioterapia, quando houve platô na curva de regressão da b-hCG, variou de 6 a mais de 20 semanas. Múltiplos fatores influenciaram o tempo de espera antes do início da quimioterapia: o nível do platô, presença de hemorragia genital, falha na regressão dos cistos do ovário, antecedente de MHC em gravidez gemelar, segurança de a paciente retornar e resultado do ultra-som transvaginal com Doppler colorido.

Vale ressaltar que a alteração da curva de regressão da b-hCG foi o fator fundamental no rastreamento e diagnóstico dos TTG. O intervalo de tempo entre a gravidez molar e o diagnóstico de TTG não-metastático foi menor que 6 meses e classificado entre os de baixo risco6-8. A taxa de cura nessas pacientes foi de 100%, utilizando-se a quimioterapia (metotrexato e/ou actinomicina D). Apenas uma paciente com prole constituída necessitou de histerectomia em decorrência de foco uterino resistente à quimioterapia.

No acompanhamento pós-molar, recomenda-se a comparação dos níveis de b-hCG de determinada paciente com uma curva padrão de regressão de pacientes que obtiveram remissão espontânea2,13,14. Gal e Friedman, em 198725, orientam que a curva de regressão padrão de determinado estudo não pode ser usada de modo universal. Entretanto, quando comparadas as curvas de regressão da b-hCG das pacientes com remissão espontânea do Hospital das Clínicas de Botucatu com as de outros autores1,2, não houve diferença significativa. Isto é justificado porque a curva de regressão normal da b-hCG pós-molar é caracterizada por declínio log exponencial2,12, independente da instituição e/ou população estudadas.

Quando analisadas as curvas log individuais de todas as 61 pacientes, tanto com remissão espontânea como com evolução para TTG, formaram-se grupos de padrão semelhante aos de Goldstein3 - curvas tipo I, tipo II e tipo IV - e grupos de padrão diferente - curvas tipo V e tipo VI. A curva tipo I é o protótipo de normalidade e é verificada na maioria das pacientes com remissão espontânea por vários autores1,2,12-14,23. A curva tipo II, apesar de ser menos observada pelos autores13,23, é considerada de padrão normal e nenhum tratamento adicional é necessário6,8. Não observamos a curva tipo III, em nossas pacientes, mas merecem considerações o método utilizado para dosagem da gonadotrofina e a observação de outros autores. O método utilizado por Goldstein3 para a determinação da hCG, foi o imunoensaio da fixação do látex, complementado pelo método biológico quantitativo do peso uterino de camundongo. Outros autores que utilizaram a dosagem da b-hCG quantitativa também não obtiveram padrão de regressão tipo III1,2,14. A curva de regressão tipo IV é a mais freqüente entre as pacientes que desenvolveram TTG: pequena queda inicial, seguida de ascensão dos valores da hCG, fato observado também por outros autores2,12-14.

O padrão oscilatório dos níveis de b-hCG, representado na curva tipo V, foi observado em apenas 4,9% dos casos de MHC. Não se deve consignar pacientes com elevação ocasional (transitória) de b-hCG como TTG13. Escapes transitórios da curva de regressão normal, com subseqüente normalização sem tratamento quimioterápico, foram observados por outros autores2,13,14.

Clinicamente importantes, embora de pequeno número, são as pacientes que apresentam títulos em platô tardio, persistente e com níveis baixos, como representado na curva de regressão da b-hCG tipo VI. Uma das nossas pacientes, com curva tipo VI, manteve-se, no seguimento pós-molar, com platô em torno de 600 mUI/ml, durante 10 semanas, assintomática, com ultra-som pélvico e radiografia de tórax normais, recusou tratamento e obteve normalização espontânea dos níveis de b-hCG, na 26a semana pós-molar. Outra paciente também apresentou platô na curva de regressão, com valores de b-hCG entre 150-350 mUI/ml, durante 12 semanas de seguimento pós-molar. Esta paciente mantinha-se assintomática, com ultra-som pélvico e raio-X de tórax normais. Tardiamente, apresentou aumento progressivo dos níveis: de 176 mUI/ml, na 18a semana pós-molar, para 1405 mUI/ml, na 24a semana pós-molar, quando foi iniciada a quimioterapia com pronta remissão.

A presença de platô baixo de b-hCG, no seguimento pós-molar, é motivo de inquietação no delineamento da conduta médica, porque pode ou não evoluir para TTG24. No entanto, desde que a decisão pelo diagnóstico de neoplasia é arbitrário e o final, um evento maligno, consideramos mais razoável, para iniciar o tratamento, um tempo de espera curto do que um tempo de espera longo demais.

A curva de regressão da b-hCG é o mais sensível indicador de TTG, e mais estudos com determinação seriada, pós-esvaziamento molar, devem responder questões que ainda inquietam os clínicos que tratam destes raros e tão peculiares tumores.

SUMMARY

Purpose: to construct a b-human chorionic gonadotropin (b-hCG) regression curve following complete hydatidiform mole (CHM) of patients with spontaneous remission, and then compare it to that of CHM patients with gestational trophoblastic tumor (GTT). Also, to compare the b-hCG regression curve of CHM patients followed-up at the Service to the regression curve of other authors1-3.

Methods: clinical and laboratory evaluations (serum determinations of b-hCG) were performed on admission and during post-molar follow-up of CHM patients treated at the University Hospital of Botucatu between 1990 and 1998. The result of the serial b-hCG determinations was analyzed using log regression curves. The evolution of the b-hCG regression curve was analyzed and compared between cases of CHM with spontaneous remission and with GTT using a log regression curve, with 95% confidence interval. The log regression curve of the spontaneous remission group was compared to those of other authors1,2. Individual log curves for each patient were constructed and classified according to the four curve types (I, II, III, and IV) proposed by Goldstein3 for post-molar follow-up.

Results: sixty-one patients received complete post-molar follow-up, 50 (82%) showing spontaneous remission and 11 (18%) developing GTT. In the group of patients with CHM and spontaneous remission, the time to return to normal b-hCG levels after mole emptying was 20 weeks. The patients who developed GTT showed early deviation from normal b-hCG regression curve 4 to 6 weeks after mole emptying. These patients received chemotherapy normally starting during the 9th post-mole emptying week.

Conclusions: the regression curve of post-CHM b-hCG in patients with spontaneous remission showed a log-exponential decline similar to that observed by other authors1,2, but different from that of CHM patients who developed GTT. Three types of b-hCG regression curves similar to Goldstein's3, I, II, and IV, were identified, as well as two other different types: V (normal regression) and VI (abnormal regression).

KEY WORDS: Complete hydatidiform mole. b-hCG regression curve. Gestational trophoblastic tumor. Chorionic gonadotrophin.

Referências

Departamento de Ginecologia e Obstetrícia da Faculdade de Medicina de Botucatu ¾ Unesp

Correspondência: Izildinha Maestá

Departamento de Ginecologia e Obstetrícia

Faculdade de Medicina de Botucatu ¾ Unesp

Rubião Júnior, s/no

18618-970 ¾ Botucatu ¾ SP

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    24 Out 2003
  • Data do Fascículo
    2000
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