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Prevalência de coilocitose em biópsias penianas de parceiros de mulheres com lesões genitais induzidas pelo HPV

Prevalence of koilocytosis in penile biopsies of partners of women with HPV-induced genital lesions

Resumos

OBJETIVO: determinar a prevalência de coilocitose em biópsias penianas de parceiros de mulheres com lesões genitais induzidas pelo HPV e analisar os fatores de risco envolvidos com a infecção peniana. MÉTODOS: foram incluídos neste estudo de coorte transversal 80 parceiros de mulheres com lesões induzidas pelo HPV no período de maio de 2002 a junho de 2003. A média de idade dos pacientes foi de 34,1 anos (variando de 16 a 63). Todos os pacientes negavam ou desconheciam qualquer tipo de lesão genital. Foram submetidos à anamnese específica quanto a presença de sintomas uretrais, passado de doenças sexualmente transmissíveis (DST), número de parceiras sexuais, uso de preservativos e postectomia. Posteriormente foram submetidos à peniscopia com a utilização de soluções de ácido acético e azul de toluidina, tendo sido colhido material para biópsia das lesões de aspecto morfológico sugestivo de contaminação por HPV. A análise estatística foi realizada pelo teste do chi2. RESULTADOS: o exame foi considerado negativo em 24 pacientes (30%). Todos os outros 56 pacientes (70%) apresentaram lesões acetobrancas e azul de toluidina positivas. Destes, 53 foram biopsiados, e 41 pacientes (77,3%) apresentaram biópsia com alterações histológicas sugestivas de infecção pelo HPV. CONCLUSÕES: a prevalência da infecção genital masculina pelo HPV foi de 51,2%, e nenhum fator de risco analisado foi associado com uma maior prevalência da infecção genital pelo vírus.

Condiloma acuminado; HPV; Peniscopia


PURPOSE: to determine the prevalence of koilocytosis in penile biopsies of partners of women with HPV-induced genital lesions, and to analyze the risk factors associated with the penile viral infection. METHODS: a total of 80 partners of HPV-infected women with genital lesions were included in this transversal cohort study. The study was carried out between May 2002 and June 2003. The mean age was 34.1 years (16 to 63). No patient reported any kind of genital lesion. They answered questions regarding the presence of urethral symptoms, history of sexually transmitted diseases, number of sexual partners, use of condoms, and circumcision. The patients were submitted to peniscopy with acetic acid and toluidine blue solutions and finally to biopsy of the suspected lesions. Data were analyzed statistically by the chi2 test. RESULTS: the examination was considered negative in 24 patients (30%). All remaining 56 patients (70%) showed white lesions and toluidine blue-positive lesions. Of these, 53 were submitted to biopsy and 41 (77.3%) presented histological changes suggestive of HPV infection. CONCLUSIONS: the prevalence of the male genital infection was 51.2% and no risk factor analyzed was associated with an increased prevalence of HPV genital infection.

Condyloma acuminatum; HPV; Peniscopy


TRABALHOS ORIGINAIS

Prevalência de coilocitose em biópsias penianas de parceiros de mulheres com lesões genitais induzidas pelo HPV

Prevalence of koilocytosis in penile biopsies of partners of women with HPV-induced genital lesions

Alberto Azoubel Antunes; Ricardo Lyra; Adriano Almeida Calado; Mabel Azoubel Antunes; Evandro Falcão

Serviço de Urologia – Hospital Getúlio Vargas – Recife-PE

Endereço para correspondência Endereço para correspondência Alberto Azoubel Antunes Rua Três de Maio 17, apto. 31 – Vila Clementino 04044020 – São Paulo – SP e mail: betoazoubel@yahoo.com.br

RESUMO

OBJETIVO: determinar a prevalência de coilocitose em biópsias penianas de parceiros de mulheres com lesões genitais induzidas pelo HPV e analisar os fatores de risco envolvidos com a infecção peniana.

MÉTODOS: foram incluídos neste estudo de coorte transversal 80 parceiros de mulheres com lesões induzidas pelo HPV no período de maio de 2002 a junho de 2003. A média de idade dos pacientes foi de 34,1 anos (variando de 16 a 63). Todos os pacientes negavam ou desconheciam qualquer tipo de lesão genital. Foram submetidos à anamnese específica quanto a presença de sintomas uretrais, passado de doenças sexualmente transmissíveis (DST), número de parceiras sexuais, uso de preservativos e postectomia. Posteriormente foram submetidos à peniscopia com a utilização de soluções de ácido acético e azul de toluidina, tendo sido colhido material para biópsia das lesões de aspecto morfológico sugestivo de contaminação por HPV. A análise estatística foi realizada pelo teste do c2.

RESULTADOS: o exame foi considerado negativo em 24 pacientes (30%). Todos os outros 56 pacientes (70%) apresentaram lesões acetobrancas e azul de toluidina positivas. Destes, 53 foram biopsiados, e 41 pacientes (77,3%) apresentaram biópsia com alterações histológicas sugestivas de infecção pelo HPV.

CONCLUSÕES: a prevalência da infecção genital masculina pelo HPV foi de 51,2%, e nenhum fator de risco analisado foi associado com uma maior prevalência da infecção genital pelo vírus.

Palavras-chave: Condiloma acuminado. HPV. Peniscopia.

ABSTRACT

PURPOSE: to determine the prevalence of koilocytosis in penile biopsies of partners of women with HPV-induced genital lesions, and to analyze the risk factors associated with the penile viral infection.

METHODS: a total of 80 partners of HPV-infected women with genital lesions were included in this transversal cohort study. The study was carried out between May 2002 and June 2003. The mean age was 34.1 years (16 to 63). No patient reported any kind of genital lesion. They answered questions regarding the presence of urethral symptoms, history of sexually transmitted diseases, number of sexual partners, use of condoms, and circumcision. The patients were submitted to peniscopy with acetic acid and toluidine blue solutions and finally to biopsy of the suspected lesions. Data were analyzed statistically by the c2 test.

RESULTS: the examination was considered negative in 24 patients (30%). All remaining 56 patients (70%) showed white lesions and toluidine blue-positive lesions. Of these, 53 were submitted to biopsy and 41 (77.3%) presented histological changes suggestive of HPV infection.

CONCLUSIONS: the prevalence of the male genital infection was 51.2% and no risk factor analyzed was associated with an increased prevalence of HPV genital infection.

Keywords: Condyloma acuminatum. HPV. Peniscopy.

Introdução

O condiloma acuminado, também conhecido como verruga venérea, é causado por infecção pelo papilomavírus humano (HPV)1. O HPV é um vírus com DNA de dupla hélice com aproximadamente 8000 pares de bases nitrogenadas que codificam todas as funções do vírus. Não possui envelope lipídico e mede aproximadamente 55 nanômetros de diâmetro2.

O epitélio da pele e mucosas são seletivamente infectados, e no homem, as lesões são predominantemente encontradas na região genital, perineal e perianal1. Evidências experimentais, clínicas e epidemiológicas mostram que o HPV é vírus de transmissão predominantemente sexual3. Atualmente, a infecção genital pelo HPV é uma das doenças sexualmente transmissíveis (DST) mais comuns, e acomete cerca de 30% da população sexualmente ativa4.

As principais alterações histológicas indicativas de infecção pelo HPV são as alterações nucleares como aumento do volume, do número, hipercromasia (discariose), disceratose e, principalmente, a coilocitose, que se caracteriza pela presença de grandes vacúolos perinucleares5. Utilizando os critérios histológicos e métodos de detecção do DNA do vírus, um estudo revelou o DNA do HPV em 89% dos tecidos com as características histológicas citadas6.

A infecção genital pelo HPV pode ser clínica, subclínica e latente2. Enquanto sua forma clínica é facilmente detectada, nas formas subclínica e latente é necessário recorrer a métodos como colposcopia ou peniscopia, citologia, histologia ou ainda a métodos de detecção do DNA do vírus7-10. Nos Estados Unidos, enquanto a presença do condiloma visível ocorre em torno de 1% dos adultos sexualmente ativos, a infecção subclínica detectada pela pesquisa do DNA viral está presente em 10 a 15% (26 a 39 milhões de homens)11, constituindo, portanto, a forma mais freqüente de apresentação. A faixa etária responsável pelas maiores taxas de infecção está entre os 18 e 28 anos12.

A infecção genital masculina em parceiros de mulheres contaminadas é pouco relatada na literatura7. No entanto, análises histopatológicas em tecidos de biópsia realizadas com o auxílio da peniscopia confirmam a presença de alterações sugestivas de infecção pelo HPV em 30 a 65% dos parceiros4,13.

Devido a sua alta prevalência, principalmente nas formas subclínicas e assintomáticas, e a sua elevada infectividade, a disseminação do HPV tende a ser universal entre os indivíduos sexualmente ativos, podendo o homem ser considerado importante propagador da infecção entre as mulheres14,15. Aliado a esses fatores, os altos índices de recidiva, confundindo e dificultando o tratamento, e a marcante associação entre o HPV e o carcinoma de colo uterino têm aumentado ainda mais a preocupação e o interesse na avaliação dos parceiros das mulheres contaminadas pelo vírus.

O objetivo do presente estudo é relatar a prevalência de coilocitose em biópsias penianas de parceiros de mulheres com lesões genitais induzidas pelo HPV no nosso meio e analisar os principais fatores de risco envolvidos com a infecção peniana pelo mesmo.

Paciente e Métodos

Durante o período de maio de 2002 a julho de 2003, foram estudados prospectivamente um total de 80 parceiros de mulheres com lesões induzidas pelo HPV, diagnosticadas por colposcopia, histopatologia e citologia cérvico-vaginal. O projeto de pesquisa foi aprovado pelo Comitê de Ética e Pesquisa do Hospital Getúlio Vargas. As parceiras apresentavam lesões atípicas ao exame colposcópico, como epitélio acetobranco, mosaico e pontilhados. A idade média dos pacientes foi de 34,1 anos (variando de 16 a 63 anos), sendo que a maioria dos pacientes estudados (70%) se encontravam entre a terceira e a quarta décadas da vida.

Todos os pacientes negavam ou desconheciam qualquer tipo de lesão genital. Os pacientes foram submetidos a uma anamnese detalhada quanto à presença de sintomas uretrais, passado de DST, número de parceiras sexuais, uso de preservativos e passado de postectomia. Apenas seis de 54 pacientes questionados (11,1%) referiam algum tipo de sintoma uretral atual (ardência ou corrimento), ao passo que a grande maioria 48 (88,9%) era assintomática. Cinqüenta e um pacientes responderam a respeito de passado de DST. Enquanto 26 (51%) negavam, 25 (49%) referiam história de corrimento uretral prévio ou verrugas genitais. Quanto ao número de parceiras sexuais, dos cinqüenta e um pacientes questionados, 26 (51%) referiram ter tido mais de 10 parceiras, ao passo que 10 (19,6%) referiram menos de 5, e 15 pacientes (29,4%) entre 5 e 10. Quarenta e oito pacientes responderam quanto ao uso freqüente de preservativos, e destes, 30 (62,5%) referiram não usar preservativos com freqüência. Cinqüenta e oito (92%) de 63 pacientes observados não haviam realizado postectomia prévia.

Após a anamnese, o pênis, a uretra distal e a bolsa escrotal foram submetidas a exame com lente de aumento de 6X (peniscopia), seguido da utilização de solução de ácido acético a 5% com o uso de gazes embebidas, durante um período de 5 minutos. O exame foi completado com a utilização de solução de azul de toluidina a 1% para melhorar a sensibilidade da avaliação.

Após essas etapas foram realizadas biópsias sistemáticas de todas as lesões que apresentaram acidofilia restrita e foram azul de toluidina positivas, auxiliando no diagnóstico diferencial com outras doenças. As biópsias foram realizadas sob anestesia local e com a utilização de pinças e tesouras delicadas. O critério utilizado neste estudo para o diagnóstico histológico foi a presença de coilocitose. Realizamos então análise da influência dos fatores de risco citados na prevalência da infecção genital pelo vírus. A análise estatística foi realizada com a utilização do teste do c2. Consideramos um limite de significância de 5%.

Resultados

O exame foi considerado negativo em 24 (30%) dos 80 pacientes. Todos os 56 pacientes restantes (70%) apresentaram algum tipo de alteração, ou seja, lesões acetobrancas e azul de toluidina positivas, sendo a grande maioria delas múltiplas e localizadas na região prepucial.

Desse grupo, 53 pacientes foram biopsiados. As biópsias foram bem toleradas pelos pacientes e não apresentaram complicações. Quarenta e um pacientes (77,3%) apresentaram alterações histológicas sugestivas de infecção pelo HPV (coilocitose), ou seja, em 51,2% dos 80 pacientes, observamos prevalência de coilocitose. Nenhum paciente apresentou atipias celulares ou lesões consideradas pré-malignas.

Não houve relação entre a idade dos pacientes e a detecção das lesões por meio das biópsias (p = 0,72). Trinta e nove dos 53 pacientes biopsiados (74%) estavam entre os 20 e 40 anos de idade. A análise dos fatores de risco também não demonstrou associação com maior prevalência de infecção genital pelo HPV nos homens estudados. Quatro, 12, 14, 18 e 32 pacientes com sintomas uretrais, DST prévia, mais de 10 parceiras, sem uso de preservativos e sem história de postectomia prévia apresentaram biópsias positivas (67, 48, 54, 60 e 55%, respectivamente). A Tabela 1 resume a relação dos fatores de risco com a positividade das mesmas.

Discussão

A transmissão sexual das verrugas genitais foi demonstrada em 1954 com a observação de que em aproximadamente dois terços das esposas de trabalhadores coreanos infectados as verrugas genitais se desenvolveram após período de incubação de 4 a 6 semanas16.

Estudos epidemiológicos mais recentes envolvendo mulheres virgens e HPV-negativas indicam claramente que o intercurso sexual é fator necessário para a aquisição do HPV. Atuando como "carreadores" e "vetores" de tipos oncogênicos do HPV, os parceiros masculinos podem de fato contribuir para o desenvolvimento de câncer cervical nas mulheres.

Dados epidemiológicos reforçam a importância da transmissão sexual do HPV17: a segunda mulher dos homens cujas esposas prévias faleceram de carcinoma cervical tem maior risco de desenvolver carcinoma epidermóide de colo de útero. Maridos de mulheres com carcinoma cervical têm maior incidência de câncer de pênis e, finalmente, a mortalidade do carcinoma cervical está relacionada à condição socioeconômica e hábitos sexuais do parceiro masculino18.

Ao contrário do que ocorre entre as mulheres, ainda não há associação significativa entre a infecção pelo HPV e os tumores do trato gênito-urinário masculino. A prevalência do HPV nas lesões cancerosas do pênis situa-se em torno de 40 a 45%19, e o mesmo também não está relacionado com pior prognóstico dos tumores nesses pacientes20. Assim, o homem deve ser visto, principalmente, como reservatório do vírus e perpetuador da infecção em suas parceiras.

A prevalência do HPV nos homens tem sido pouco relatada na literatura7. Um estudo espanhol encontrou prevalência de apenas 3,5% em parceiros de mulheres aleatoriamente selecionadas na população geral21. Entretanto, dados epidemiológicos mostram que, quando parceiros estáveis de mulheres contaminadas pelo HPV são estudados por meio da peniscopia, 30 a 65% apresentam lesões semelhantes no pênis4,13,22. A nossa série está de acordo com os dados relatados, e revelou prevalência de 51,2% entre os parceiros de mulheres com lesões induzidas pelo vírus.

Muitas infecções ocorrem no início da vida sexual dos indivíduos. A grande maioria delas são clareadas espontaneamente e nunca chegam a se manifestar com verrugas ou neoplasias. Alguns hábitos comuns como o tabagismo, múltiplos parceiros sexuais, passado de DST e uso de drogas imunossupressoras promovem a expressão do HPV e causam infecção persistente23.

Muitos estudos têm demonstrado que a promiscuidade sexual é o principal fator de risco para a infecção genital pelo HPV24. Assim, homens com historia de múltiplos parceiros sexuais e passado de DST estão sob maior risco de serem infectados pelo HPV. No presente estudo, maior número de parceiros sexuais e história prévia de DST não foram fatores de risco da infecção genital pelo vírus. Entre os pacientes com passado de DST, 12 (48%) apresentaram biópsias positivas, ao passo que entre os que não tiveram, 15 (58%) apresentaram. Considerando os homens com história de menos de 5 parceiras e mais de 10 parceiras, 6 (60%) e 14 (54%) apresentaram biópsias positivas, respectivamente.

A real associação da postectomia com a prevalência do HPV peniano não é bem conhecida. Aynaud et al.13, estudando 210 parceiros de mulheres com infecção genital pelo vírus, revelaram lesões genitais pelo HPV em 113 (54%) pacientes por meio da peniscopia. Quarenta e oito (23%) pacientes eram postectomizados. Entre esses, 9 (19%) e 11 (23%), apresentaram HPV prepucial e uretral, respectivamente, ao passo que entre os não-postectomizados, 61 (38%) e 32 (20%) o apresentaram, não havendo diferença significativa entre os dois grupos. Entretanto, outros relatos mostram que a postectomia reduz não só o risco de adquirir e transmitir o HPV peniano, como também o risco de câncer de colo nas parceiras3. No presente estudo, a realização de postectomia não teve qualquer relação com a prevalência de infecção genital pelo HPV, e o percentual de biópsias positivas foi semelhante entre o grupo postectomizado e não postectomizado (60 vs 55%).

Apesar de os preservativos prevenirem as infecções pelo vírus da imunodeficiência humana (HIV), evidências quanto a sua eficácia contra outras DSTs não são tão consistentes25. Dados da literatura mostram que o uso de preservativos pode acelerar a regressão da neoplasia intra-epitelial cervical (NIC) nas mulheres e das lesões penianas planas associadas ao HPV no homem, provavelmente por bloquear a transmissão viral entre os parceiros26,27. Entretanto, uma meta-análise analisando o efeito dos preservativos na prevenção do HPV subclínico, verrugas genitais, NIC e carcinoma cervical invasivo, concluiu que, apesar de apresentar proteção contra os três últimos, não houve evidência consistente de que os preservativos reduziam o risco do indivíduo se tornar HPV-positivo25. Nosso estudo mostrou que, entre os homens que usavam preservativos, 6 (33%) tiveram biópsia positiva, contra 18 (60%) do grupo que não usava preservativo (p=0,13).

A peniscopia com aplicação do ácido acético na pele da genitália masculina tem sido utilizada como extensão da prática ginecológica para detecção das lesões induzidas pelo HPV no homem, particularmente as subclínicas, que não são visíveis a olho nu. Esta última constitui a forma mais freqüente de apresentação do HPV no homem28. A detecção do HPV no homem apresenta algumas limitações técnicas. Esfregaços penianos recrutam pequeno número de células, fato confirmado quando se observa que um quarto das amostras obtidas são negativas para beta-globulina em virtude da pequena quantidade de DNA do vírus7. Além disso, a higiene do pênis imediatamente antes da consulta pode levar a decréscimo no número de células contaminadas, e finalmente, não se pode excluir contaminação durante a relação sexual com parceira infectada, o que resultaria em exame falso-negativo.

Levine et al.10, em 1984, foram os primeiros pesquisadores a usar o exame magnificado do pênis com o auxílio de soluções reagentes como forma de avaliação dos parceiros das mulheres com condiloma. O ácido acético coagula e precipita as proteínas intracelulares, revelando lesões brancas ou acentuando lesões com relevos. Esta reação é superficial e pode ser revertida com facilidade. A coagulação é visível se a quantidade de proteína na célula for grande, o que ocorre na replicação viral. Nós completamos o exame com a utilização da solução de azul de toluidina a 1%. Este corante vital se fixa nas regiões ricas em DNA.

Um estudo comparou o efeito das duas soluções em 863 biópsias e concluiu que o ácido acético reagiu mais freqüentemente nas lesões coilocitóticas. Posteriormente em 1997, o mesmo autor sugeriu que as duas soluções se complementam, desde que algumas lesões reagiram apenas com uma das soluções1. Em nossa série, 56 pacientes (70%) apresentaram algum tipo de alteração durante a peniscopia, ou seja, lesões acetobrancas ou azul de toluidina positivas. Desses, 41 (77,3%) apresentaram alterações histológicas sugestivas de infecção pelo HPV. Doze pacientes apresentaram biópsias negativas e 3 pacientes não foram biopsiados. Esses achados são atribuídos a processos inflamatórios e infecciosos que provocam balanopostites inespecíficas29. A grande maioria destes pacientes não são circuncisados e têm higiene precária, o que pode favorecer a ocorrência dessas infecções.

As biópsias foram bem toleradas, e a anestesia local foi considerada o momento mais desconfortável pelo paciente. Devido ao pequeno tamanho do fragmento retirado, mais de uma amostra pode ser adquirida do mesmo paciente e o período de cicatrização é geralmente curto.

Concluímos que, no presente estudo, a maioria dos parceiros assintomáticos de mulheres contaminadas pelo HPV (51,2%) possuem lesões sugestivas de infecção genital pelo vírus. As lesões necessitaram do auxílio da peniscopia com o uso das soluções de ácido acético e azul de toluidina para sua detecção, desde que não eram visíveis ao olho nu. Acreditamos que este número possa estar subestimado, pois algumas lesões só podem ser identificadas com estudos de detecção do DNA do vírus. Assim, seria necessário realizar estudos de captura híbrida do DNA para estabelecer a sensibilidade do exame peniscópico neste grupo.

Os fatores de risco analisados não se relacionaram com maior prevalência da infecção genital pelo HPV no homem, entretanto, talvez o pequeno número de pacientes questionados tenha prejudicado análise mais precisa dos resultados.

Novos estudos prospectivos e controlados ainda são necessários para definir o real papel dos fatores de risco envolvidos com a infecção genital pelo HPV no homem, o curso natural da infecção peniana pelo mesmo e seu real significado clínico.

Recebido em: 16/3/2004

Aceito com modificações em: 19/7/2004

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  • Endereço para correspondência

    Alberto Azoubel Antunes
    Rua Três de Maio 17, apto. 31 – Vila Clementino
    04044020 – São Paulo – SP
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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      14 Out 2004
    • Data do Fascículo
      2004

    Histórico

    • Aceito
      19 Jul 2004
    • Recebido
      16 Mar 2004
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