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Comprimento do colo uterino e dilatação do orifício interno avaliados pela ultra-sonografia bidimensional e tridimensional

Cervical length and internal cervical os dilatation evaluated by two-dimensional and three-dimensional ultrasound

Resumos

OBJETIVO: comparar as medidas do comprimento da cérvice e afunilamento, obtidas por ultra-sonografia transvaginal bidimensional e tridimensional na gestação. MÉTODOS: estudo descritivo, prospectivo, com comparação de grupos realizado no período de abril de 2004 a fevereiro de 2005. Foram incluídas 74 gestantes com idade gestacional entre a 19ª e a 24ª semana, independente da presença ou não de fatores de risco para parto prematuro. O exame ultra-sonográfico da cérvice foi efetuado uma única vez na mesma paciente e por único observador. As medidas aferidas por ultra-sonografia bidimensional foram feitas no momento da realização dos exames, e pela tridimensional, com intervalo de 7 a 15 dias do exame bidimensional. A medição do comprimento da cérvice, diâmetro e comprimento do funil cervical foi realizada por ultra-sonografia bidimensional no plano sagital e tridimensional nos planos sagital e coronal. Para testar a diferença estatística entre os resultados médios das medidas do comprimento cervical obtidas nos exames bi e tridimensional, foi utilizado o teste t pareado. Também foi calculado para essas medidas o coeficiente de correlação de Pearson. RESULTADOS: objetivando-se determinar associação linear entre elas encontramos diferença significante entre as medidas aferidas no plano sagital por meio da ultra-sonografia bidimensional e plano coronal da USG 3D (p=0,009), e na ultra-sonografia tridimensional entre os cortes sagital e coronal (p=0,001), sendo as médias das medidas do comprimento cervical (±desvio padrão) de 3,9±0,92c; 4,1±0,97 e 3,9±0,88 cm, respectivamente. O número de afunilamento em nossa casuística foi de 9/74 exames (12,1%). As ultra-sonogafias bi- e tridimensional visualizaram o mesmo número de afunilamento (8/9). Na ultra-sonografia tridimensional, o corte coronal detectou número maior de funil cervical que o corte sagital (8/9). Não houve diferença significativa entre as médias das medidas do comprimento do colo aferidas por ultra-sonografia bidimensional e tridimensional no plano sagital (p=0,23), entretanto houve diferença entre as médias das medidas da cérvice mensuradas por ultra-sonografia bidimensional no corte sagital e tridimensional no coronal (p=0,009), e na ultra-sonografia tridimensional entre os planos sagital e coronal (p=0,001). Os exames bidimensional e tridimensional visualizaram o mesmo número de funil cervical, demonstrando concordância entre os métodos (teste kappa=0,86). Na comparação das médias das medidas do afunilamento, não houve diferença estatística (p>0,05). CONCLUSÃO: existem diferenças entre as medidas do comprimento cervical, obtidas por ultra-sonografia bidimensional e tridimensional, testando o plano coronal do exame tridimensional.

Colo do útero; Gravidez; Ultra-sonografia


PURPOSE: to compare the uterine cervix measurements and funneling obtained by two- and three-dimensional transvaginal sonography during pregnancy. METHODS: a prospective, descriptive study, with group comparison, was carried out between April 2004 and February 2005 in 74 pregnant women, who were between the 19th and 24th week of pregnancy, regardless of risk factors for premature delivery. The ultrasound examination of the cervix was carried out only once in the same patient and by only one observer. The measurements of the cervix by two-dimensional ultrasound were made at the time of the test and by three-dimensional ultrasound at intervals of 7 to 15 days after the two-dimensional ultrasound. The measurements of cervical length, funnel width and length were taken by two-dimensional ultrasound in the sagittal plane and by three-dimensional in the sagittal plane as well as in coronal plane. RESULTS: there was no significant difference between the averages of the measurements of the cervix obtained by two- and three-dimensional ultrasound in the sagittal plane (p=0.23); however, there was a difference in the averages of the measurements of the cervix obtained by two-dimensional ultrasound in sagittal plane and three-dimensional ultrasound in the coronal plane (p=0.009) and between three-dimensional ultrasound in the sagittal and coronal planes (p=0.001). The kappa test (0.86) showed no superiority of either the two-dimensional and three-dimensional ultrasound in the visualization of the cervical funnel. No statistically significant difference was observed between the methods when the average of the measurements of funneling was compared (p>0.05). CONCLUSION: there were differences between two-dimensional and three-dimensional ultrasound of cervical length, only using the coronal plane of the three-dimensional ultrasound.

Cervix uteri; Pregnancy; Ultrasonography


ARTIGOS ORIGINAIS

Comprimento do colo uterino e dilatação do orifício interno avaliados pela ultra-sonografia bidimensional e tridimensional

Cervical length and internal cervical os dilatation evaluated by two-dimensional and three-dimensional ultrasound

Rosieny Souza BrandãoI; Carlos Geraldo Viana MurtaII; Antonio Fernandes MoronIII; Rosiane MattarIV; Claudio Rodrigues PiresV; Eduardo Almeida GuerzetVI

IMestre pela Universidade Federal de São Paulo - UNIFESP - São Paulo (SP), Brasil; Médica Ultra-Sonografista do Centro de Diagnóstico por Imagem - Vitória (ES), Brasil

IIProfessor do Departamento de Ginecologia e Obstetrícia da Universidade Federal do Espírito Santo - UFES - Vitória (ES), Brasil

IIIProfessor Titular do Departamento de Obstetrícia da Universidade Federal de São Paulo - UNIFESP - São Paulo (SP), Brasil

IVProfessor Adjunto do Departamento de Obstetrícia e coordenadora do programa de pós-graduação da Universidade Federal de São Paulo - UNIFESP - São Paulo (SP), Brasil

VProfessor pela Universidade Federal de São Paulo - UNIFESP - São Paulo (SP), Brasil; Diretor do Centro de Treinamento de Ultra-sonografia - São Paulo (SP), Brasil

VIProfessor Adjunto do Departamento de Tocoginecologia da Escola de Medicina da Santa Casa de Misericórdia de Vitória - EMESCAM - Vitória (ES), Brasil

Correspondência Correspondência: Rosieny Souza Brandão Av: Champagnat 501 sala 403/ - Praia da Costa 29100-010 - Vila Velha - ES Fonefax: (27) 3299-5303 (27) 92944400 e-mail: rosienysbrandao@terra.com.br

RESUMO

OBJETIVO: comparar as medidas do comprimento da cérvice e afunilamento, obtidas por ultra-sonografia transvaginal bidimensional e tridimensional na gestação.

MÉTODOS: estudo descritivo, prospectivo, com comparação de grupos realizado no período de abril de 2004 a fevereiro de 2005. Foram incluídas 74 gestantes com idade gestacional entre a 19ª e a 24ª semana, independente da presença ou não de fatores de risco para parto prematuro. O exame ultra-sonográfico da cérvice foi efetuado uma única vez na mesma paciente e por único observador. As medidas aferidas por ultra-sonografia bidimensional foram feitas no momento da realização dos exames, e pela tridimensional, com intervalo de 7 a 15 dias do exame bidimensional. A medição do comprimento da cérvice, diâmetro e comprimento do funil cervical foi realizada por ultra-sonografia bidimensional no plano sagital e tridimensional nos planos sagital e coronal. Para testar a diferença estatística entre os resultados médios das medidas do comprimento cervical obtidas nos exames bi e tridimensional, foi utilizado o teste t pareado. Também foi calculado para essas medidas o coeficiente de correlação de Pearson.

RESULTADOS: objetivando-se determinar associação linear entre elas encontramos diferença significante entre as medidas aferidas no plano sagital por meio da ultra-sonografia bidimensional e plano coronal da USG 3D (p=0,009), e na ultra-sonografia tridimensional entre os cortes sagital e coronal (p=0,001), sendo as médias das medidas do comprimento cervical (±desvio padrão) de 3,9±0,92c; 4,1±0,97 e 3,9±0,88 cm, respectivamente. O número de afunilamento em nossa casuística foi de 9/74 exames (12,1%). As ultra-sonogafias bi- e tridimensional visualizaram o mesmo número de afunilamento (8/9). Na ultra-sonografia tridimensional, o corte coronal detectou número maior de funil cervical que o corte sagital (8/9). Não houve diferença significativa entre as médias das medidas do comprimento do colo aferidas por ultra-sonografia bidimensional e tridimensional no plano sagital (p=0,23), entretanto houve diferença entre as médias das medidas da cérvice mensuradas por ultra-sonografia bidimensional no corte sagital e tridimensional no coronal (p=0,009), e na ultra-sonografia tridimensional entre os planos sagital e coronal (p=0,001). Os exames bidimensional e tridimensional visualizaram o mesmo número de funil cervical, demonstrando concordância entre os métodos (teste kappa=0,86). Na comparação das médias das medidas do afunilamento, não houve diferença estatística (p>0,05).

CONCLUSÃO: existem diferenças entre as medidas do comprimento cervical, obtidas por ultra-sonografia bidimensional e tridimensional, testando o plano coronal do exame tridimensional.

Palavras chave: Colo do útero/ultrasonografia; Gravidez; Ultra-sonografia

ABSTRACT

PURPOSE: to compare the uterine cervix measurements and funneling obtained by two- and three-dimensional transvaginal sonography during pregnancy.

METHODS: a prospective, descriptive study, with group comparison, was carried out between April 2004 and February 2005 in 74 pregnant women, who were between the 19th and 24th week of pregnancy, regardless of risk factors for premature delivery. The ultrasound examination of the cervix was carried out only once in the same patient and by only one observer. The measurements of the cervix by two-dimensional ultrasound were made at the time of the test and by three-dimensional ultrasound at intervals of 7 to 15 days after the two-dimensional ultrasound. The measurements of cervical length, funnel width and length were taken by two-dimensional ultrasound in the sagittal plane and by three-dimensional in the sagittal plane as well as in coronal plane.

RESULTS: there was no significant difference between the averages of the measurements of the cervix obtained by two- and three-dimensional ultrasound in the sagittal plane (p=0.23); however, there was a difference in the averages of the measurements of the cervix obtained by two-dimensional ultrasound in sagittal plane and three-dimensional ultrasound in the coronal plane (p=0.009) and between three-dimensional ultrasound in the sagittal and coronal planes (p=0.001). The kappa test (0.86) showed no superiority of either the two-dimensional and three-dimensional ultrasound in the visualization of the cervical funnel. No statistically significant difference was observed between the methods when the average of the measurements of funneling was compared (p>0.05).

CONCLUSION: there were differences between two-dimensional and three-dimensional ultrasound of cervical length, only using the coronal plane of the three-dimensional ultrasound.

Keywords: Cervix uteri/ultrasonography; Pregnancy; Ultrasonography

Introdução

Desde a década de 70, a ultra-sonografia bidimensional (USG 2D) foi utilizada no estudo do colo uterino durante a gestação, para identificar as modificações estruturais da cérvice no transcorrer da gravidez1,2.A princípio, os exames eram realizados pela via abdominal1 e perineal3. Entretanto, no final dos anos 80, a evolução dos transdutores e o advento da sonda ultra-sonográfica endovaginal de alta freqüência e utilizada próxima ao colo possibilitaram avaliação cervical detalhada de forma mais precisa do que pela via abdominal4,5.

O comprimento do colo uterino mantém-se inalterado até o final do segundo trimestre, diminuindo, a partir desde momento, lenta e progressivamente até o termo6. Em decorrência disso, a detecção precoce de encurtamento da cérvice é considerado marcador de risco de parto prematuro7, sendo o risco de parto pré-termo inversamente proporcional à medida do comprimento cervical aferido por USG (ultra-sonografia) endovaginal8-10.

No final dos anos 90 a USG tridimensional (USG 3D) foi introduzida no estudo da cérvice durante a gravidez11. Alguns pesquisadores publicaram pela primeira vez resultados referentes à análise da biometria cervical por ecografia 2D e 3D, em gestantes, comparando ambas as técnicas de exames12. A seguir, outros autores também avaliaram as medidas do comprimento da cérvice com tecnologia 3D, demonstrando as vantagens da USG 3D em relação à 2D no estudo da morfologia cervical13 e a existência de diferenças entre as medidas do comprimento do colo aferidas por exame 2D e 3 D14.

De acordo com estes estudiosos12,13, nas gestantes com variação anatômica da cérvice (colo curvo), a USG 2D pode sub ou superestimar a medida do verdadeiro comprimento cervical, principalmente pela dificuldade de ampla mobilização da sonda no canal vaginal, não sendo possível a identificação fiel do plano sagital do colo.

Os objetivos deste estudo foram: comparar as medidas do comprimento cervical e do afunilamento, durante a gestação, obtidas por meio da USG transvaginal 2D e 3D.

Métodos

Trata-se de estudo descritivo, prospectivo, com comparação de grupos realizado no período entre abril de 2004 e fevereiro de 2005. Este trabalho foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal de São Paulo, e anteriormente à realização dos exames, sua metodologia foi explicada a todas as pacientes a fim de que autorizassem sua execução mediante assinatura do termo de consentimento.

Adotamos como critérios de inclusão na pesquisa as gestantes com feto vivo e período gestacional entre 19 a 24 semanas, datadas por USG de primeiro trimestre. Foram excluídas as pacientes com amniorrexe prematura, sangramento vaginal, malformação fetal e placenta prévia. A pesquisadora questionou e apurou estes dados anteriormente à realização dos exames. Foram examinadas 75 grávidas e uma paciente foi excluída da amostra por apresentar placenta prévia, restando então 74 gestantes compondo nossa casuística.

Das 74 gestantes incluídas, 58% tinham curso superior, 56,4% eram nulíparas e 88% casadas. A idade gestacional média no momento da realização dos exames foi de 21,5±1,7 semanas e a idade das pacientes, 29,0±4,6 anos.

A USG cervical foi efetuada uma única vez na mesma paciente e por um único observador. As aferições das medidas do colo, no método 2D, foram efetuadas no momento da realização dos exames, enquanto, no modo 3D, a biometria da cérvice foi aferida com intervalo mínimo de 7 e máximo de 15 dias da USG 2D, evitando-se dessa forma influência dos valores encontrados no exame ecográfico 2D e garantindo a fidelidade das medidas. Todos os exames 2D foram fotografados, e os 3D gravados em CD.

Primeiramente foi efetuada a USG cervical transvaginal 2D, após esvaziamento vesical, com a paciente em decúbito dorsal e pernas flexionadas. O equipamento utilizado foi o Voluson 730D (Kretztechnik, Áustria), o qual possui ambos os módulos, 2D e 3D com transdutor vaginal multifreqüencial 5,0-9,0 MHz.

O transdutor foi introduzido delicadamente na vagina em direção ao lábio anterior do colo. A seguir, a sonda era recuada até o ponto de perda da nitidez da imagem e reintroduzida em direção ao lábio anterior do colo, a fim de obter visibilidade total do orifício interno, externo e do canal endocervical. O canal endocervical foi identificado como linha hipoecogênica, rodeado pela área das glândulas endocervicais, estendendo-se do orifício interno ao externo.

A aferição do comprimento cervical foi efetuada no corte sagital após ampliação da imagem, ocupando em média 75% da tela do monitor, e mediante locação de calipers eletrônicos (marcadores), traçando uma reta pontilhada entre o orifício cervical externo e o interno.

Na presença de canal endocervical curvilíneo (colo uterino curvo), a biometria foi efetuada de forma combinada (soma de duas retas). O exame durou no mínimo 5 min e duas medições foram efetuadas. A medida selecionada foi a de menor valor.

Neste estudo, foi caracterizado afunilamento a medida da dilatação e comprimento do orifício interno cervical maior ou igual a 5 mm. Sua ocorrência foi documentada, e o mesmo foi mensurado em diâmetro (largura) e comprimento no plano sagital no modo 2D.

A seguir à realização da USG transvaginal 2D do colo uterino, utilizando-se a mesma sonda endovaginal, foi acionado o modo 3D do equipamento de ultra-som (US) para aquisição dos dados e construção da imagem 3D.

A imagem do colo exposta na tela do monitor no plano sagital foi inserida no interior de um box (dispositivo eletrônico geométrico que seleciona a estrutura a ser examinada), e a captura dos dados realizada por meio de varredura mecânica automática. As informações adquiridas foram armazenadas, processadas e, a seguir, estas foram expostas na tela do aparelho de US em organização multiplanar (MP), que possibilita a visualização da cérvice nos três cortes distintos que podem ser obtidos simultaneamente com a tecnologia 3D: sagital, axial e coronal.

A biometria do colo foi realizada por USG 3D com a imagem exposta no monitor em organização MP, e após manipulação digital, nos planos sagital e coronal, empregando técnica semelhante à aplicada no exame 2D. Vale mencionar que a exibição do corte coronal é exclusiva da tecnologia 3D. O afunilamento, quando detectado, também foi documentado e mensurado tanto em comprimento quanto em diâmetro, no plano sagital e coronal em exposição MP.

Posteriormente à aquisição de todas as medidas, os dados foram transcritos para o programa estatístico SPSS (Statistical Package for Social Sciences), versão 8.0, para Windows. O nível de significância para todos os testes foi estabelecido em p<0,05.

Para testar diferença estatística entre os resultados médios das medidas do comprimento cervical obtidas nos exames 2D e 3D, foi utilizado o teste t pareado. Também foi calculado para essas medidas o coeficiente de correlação de Pearson, objetivando-se determinar associação linear entre elas.

Em relação ao afunilamento, os dados foram categorizados e os resultados foram analisados mediante o coeficiente de concordância kappa. Para comparação das médias das medidas do diâmetro e comprimento do afunilamento nos exames 2D e 3D, foi aplicado o teste t pareado.

Resultados

Testando o coeficiente de correlação de Pearson, entre as medidas do comprimento cervical aferidas por USG 2D e 3D no plano sagital (r =0,92; p<0,001), USG 2D no plano sagital com 3D no coronal (r=0,89; p<0,001) e na USG 3D entre os planos sagital e coronal (r=0,91; p<0,001), detectamos correlação significante entre os métodos, demonstrando associação linear entre as medidas.

O teste t pareado foi calculado para comparação das médias entre os grupos considerados. Avaliando as diferenças entre as médias das medidas do comprimento da cérvice, encontramos diferença significante entre as medidas aferidas no plano sagital por meio da USG 2D e plano coronal da USG 3D (p=0,009), e na USG 3D, entre os cortes sagital e coronal (p=0,001), sendo as médias das medidas do comprimento cervical (±desvio padrão) de 3,9 ± 0,92c; 4,1 ± 0,97 e 3,9 ± 0,88 cm, respectivamente (Tabelas 1 e 2). As maiores medidas (±desvio padrão) do comprimento da cérvice foram obtidas por meio da USG 3D no corte coronal (4,1 ± 0,97 cm).

Comparando-se as médias das medidas do comprimento do colo, aferidas no plano sagital utilizando USG 2D e 3D, não detectamos diferença significativa (p=0,23) entre elas.

O número de afunilamento em nossa casuística foi de 9/74 exames (12,1%). A USG 2D e 3D visualizaram mesmo número de afunilamento (8/9). Na USG 3D, o corte coronal detectou número maior de funil cervical que o corte sagital (8/9).

Testando o coeficiente de concordância kappa, obtivemos valor significante (kappa=0,86; p<0,001), demonstrando concordância entre os métodos 2D e 3D no diagnóstico do funil cervical (Tabela 3). Entretanto, na comparação das médias das medidas do diâmetro e comprimento do afunilamento (teste t pareado), obtidas nos respectivos planos testados pelos métodos 2D e 3D, não encontramos valor estatístico significativo.

As maiores medidas (±desvio padrão) do diâmetro do afunilamento foram detectadas por USG 3D no corte coronal (0,9±0,53 cm), e do comprimento, na USG 2D corte sagital (0,9±0,37 cm).

Discussão

Introduzida na última década, a USG 3D tem atingido êxito nas áreas de ginecologia e obstetrícia, com destaque especial no diagnóstico pré-natal. Desde então, pesquisas científicas comparam a tecnologia 3D com a 2D nas diversas áreas da medicina, testando a sensibilidade de ambos os métodos15-17.

Existem poucos trabalhos na literatura relatando a utilização da USG 3D no estudo do colo uterino, em especial durante a gestação. De acordo com a revisão dos artigos indexados no Medline até março de 2006, oito pesquisas foram encontradas11-14,18-21. Quatro11,19-21 delas relataram a aferição do volume da cérvice em gravidez única ou múltipla; quatro12-14,18 focaram a medida do comprimento cervical.

Alguns pesquisadores12, analisando unicamente gestantes de alto risco de trabalho de parto prematuro (TPP), entre a 11ª e a 32ª semana, mostraram diferença significativa entre as medidas do diâmetro do funil cervical aferidas por USG 2D no plano sagital e 3D no corte coronal, e na USG 3D nos planos sagital e coronal, não evidenciando diferenças entre as medidas do comprimento da cérvice obtidas pelos métodos 2D e 3D. No entanto, outros estudiosos13,14, comparando a USG 2D com o 3D para análise da biometria cervical, em grávidas da população geral, entre o segundo e terceiro trimestre de gestação, detectaram diferença significante.

Um grupo de pesquisadores da Califórnia14 evidenciou diferença significativamente maior entre as medidas do comprimento cervical aferidas por USG 2D e 3D no plano sagital. Segundo eles, quanto maior a medida do colo uterino pela USG 3D, maior a diferença entre os dois métodos de exames. É importante mencionar que estes estudiosos14 examinaram gestantes de alto ou baixo risco para parto pré-termo, no total de 34 mulheres, entre a 15ª e a 36ª semana, utilizando dois diferentes equipamentos de US para aquisição das medidas.

Na nossa opinião, a utilização de distintos equipamentos de US e transdutores com sistema 2D e 3D separados reflete na qualidade da imagem, interferindo na medição cervical, dificultando a comparação entre as técnicas. Vale ressaltar que em nosso estudo, semelhante ao de outros autores18, os métodos 2D e 3D demonstraram boa correlação na aquisição das medidas do comprimento cervical. Na comparação das médias das medidas do comprimento do colo, foi detectada diferença estatística testando o plano coronal do exame 3D, não evidenciando diferenças no plano sagital entre os métodos 2D e 3D.

Na nossa casuística, a média das medidas do comprimento cervical, mensuradas por USG 3D (4,1±0,97 cm), foi superior a 2D (3,9±0,92 cm), confirmando outros resultados descritos na literatura12-14,18.

Um dado importante desta pesquisa foi a detecção de variação entre as medidas do comprimento do colo obtidas por meio da USG 2D e 3D. Alguns pesquisadores12-14 descreveram em seus resultados diferença maior que 5 mm entre as medidas do colo uterino aferidas no plano sagital na USG 2D e 3D em 27, 48,5 e 61% dos exames realizados, respectivamente. Em nossa amostra esta variação foi detectada em 14,9% dos casos.

Em relação ao afunilamento, a incidência em nossa casuística foi de 12,1%, semelhante à de outros autores13 (12,6%), entretanto, divergindo dos resultados publicados por Bega et al.12 (56,7%).

Acreditamos que a grande incidência de afunilamento e diferenças significativas entre as médias das medidas do diâmetro presentes no trabalho de Bega et al.12 se relacionem diretamente com o perfil das pacientes examinadas (alto risco de TPP), uma vez que nosso estudo e o grupo de Severi et al.13 avaliaram gestantes da população geral e detectaram a mesma percentagem de dilatação do orifício interno do colo, não evidenciando diferença estatística entre as medidas do funil nos distintos métodos.

A USG 3D do colo uterino, na aferição das medidas no modo multiplanar, permite a manipulação digital das imagens e sua correção, favorecendo a identificação total do canal endocervical, facilitando a biometria12-14.

O advento da terceira dimensão propiciou medida precisa do comprimento e visualização mais detalhada da morfologia cervical. Dessa forma acreditamos que o exame USG 2D da cérvice pode ser complementado com o 3D, pois a medição errônea do colo uterino pode interferir no prognóstico da gestação, visto que atualmente a USG cervical é exame de relevância no rastreamento do TPP, principalmente em gestantes de alto risco de parto pré-termo22.

Diante das diferenças evidenciadas em nossos resultados, na aferição da biometria cervical utilizando a USG 2D e 3D, acreditamos que a USG 3D pode acrescentar-se aos exames da cérvice atualmente empregados no rastreamento do trabalho de parto prematuro; no entanto, o exame 3D do colo encontra-se em fase experimental, sendo necessários, novas publicações para a confirmação desses resultados para implantação do método na prática clínica.

Na nossa opinião, o entusiasmo do emprego da USG 3D em obstetrícia atribui-se à maior precisão diagnóstica das malformações fetais23 e à perspectiva de aumentar o valor preditivo do exame ultra-sonográfico cervical, mediante pesquisa de novos parâmetros biométricos e marcadores morfológicos do colo, que aumentem a sensibilidade do método, visando a prevenção do trabalho de parto pré-termo.

Recebido em: 13/02/2006

Aceito com modificações em: 13/04/2006

Universidade Federal de São Paulo - Escola Paulista de Medicina - UNIFESP - São Paulo (SP), Brasil.

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    Rosieny Souza Brandão
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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      06 Dez 2006
    • Data do Fascículo
      Jul 2006

    Histórico

    • Aceito
      13 Abr 2006
    • Recebido
      13 Fev 2006
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