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Fatores de risco para a gravidez na adolescência em uma maternidade-escola da Paraíba: estudo caso-controle

Risk factors for pregnancy in adolescence in a teaching maternity in Paraíba: a case-control study

Resumos

OBJETIVO: identificar os fatores associados à gestação na adolescência em um Estado do nordeste do Brasil. MÉTODOS: realizou-se um estudo de caso-controle na proporção de uma adolescente entre 10 e 19 anos (caso) para duas mulheres entre 20 e 35 anos (controles), totalizando 168 casos e 337 controles. As variáveis reprodutivas analisadas foram: escolaridade, situação marital, procedência, renda familiar per capita em reais, trabalho remunerado, escolaridade da mãe, presença do pai da adolescente em casa. Foram também incluídas na análise variáveis reprodutivas: idade do primeiro coito, história materna de gravidez na adolescência, consulta ginecológica antes da gravidez, conhecimento, uso e acesso a métodos contraceptivos. RESULTADOS: verificou-se associação de gestação na adolescência com as seguintes variáveis: escolaridade menor que oito anos, ausência do companheiro e história materna de gestação na adolescência. Observou-se que a idade na primeira relação foi significativamente mais baixa entre as adolescentes, que tiveram menor frequência de consultas ginecológicas. Conhecimento dos métodos hormonais e acesso aos métodos anticoncepcionais foram menos frequentes entre as adolescentes. Os fatores de risco para a gravidez na adolescência, após análise de regressão logística múltipla, foram: baixa escolaridade (OR=2,3; IC95%=1,3-3,8), idade do primeiro coito menor que 15 anos (OR=3,6; IC95%=2,2-5,7), história materna de gravidez na adolescência (OR=2,6; IC95%=1,7-3,4). A história de consultas ginecológicas prévias (OR=0,3; IC95%=0,2-0,4) e uso de métodos hormonais (OR=0,6; IC95%=0,4-0,9) foram variáveis protetoras. CONCLUSÕES: os principais fatores associados à gravidez na adolescência observados foram: baixa escolaridade da adolescente, história materna de gestação na adolescência, ausência de consultas ginecológicas prévias e falta de acesso aos métodos anticoncepcionais.

Gravidez na adolescência; Anticoncepção; Fatores de risco


PURPOSE: to identify factors associated with gestation in adolescence in a State of the northeast of Brazil. METHODS: a case-control study in the ratio of one 10 to 19-year-old adolescent (case) for two 20 to 35-year-old women (controls), with a total of 168 cases and 337 controls. The variables analyzed were: schooling, marital status, origin, family income per capita in Brazilian currency, paid job, mother's schooling, and presence of adolescent's father at home. Reproductive variables such as age at the first intercourse, mother's history of adolescence pregnancy, gynecological appointments before the pregnancy, knowledge, access and use of contraceptive methods were also included in the analysis. RESULTS: the following variables were associated with gestation in adolescence: schooling lower than eight years, lack of a regular mate, and maternal history of adolescence gestation. Also, the age at the first intercourse was significantly lower among the adolescents and that they had a lower rate of gynecological appointments. Knowledge of hormonal methods and access to contraceptive methods were also less frequent among the adolescents. After the multiple logistic regression analysis, risk factors for pregnancy at adolescence were: low schooling (OR=2.3; CI95%=1.3-3.8), age at the first intercourse lower than 15 years old (OR=3.6; CI95%=2.2-5.7), history of maternal pregnancy at adolescence (OR=2.6; CI95%=1.7-3.4). The history of previous gynecological appointments (OR=0.3; CI95%=0.2-0.4) and the use of hormonal methods (OR=0.6; CI95%=0.4-0.9) were protecting variables. CONCLUSIONS: the main factors associated with pregnancy in adolescence were: the adolescent's low schooling, maternal history of adolescence gestation, lack of previous gynecological appointments and lack of access to contraceptive methods.

Pregnancy in adolescence; Contraception; Risk factors


ARTIGO ORIGINAL

Fatores de risco para a gravidez na adolescência em uma maternidade-escola da Paraíba: estudo caso-controle

Risk factors for pregnancy in adolescence in a teaching maternity in Paraíba: a case-control study

Melania Maria Ramos AmorimI; Lidiane de Araújo LimaII; Camila Vigolvino LopesIII; Daniele Kelle Lopes de AraújoIV; Jéssica Guimarães Gomes SilvaV; Larissa Cynthia CésarVI; Adriana Suely de Oliveira MeloVII

IProfessora Doutora de Ginecologia e Obstetrícia da Universidade Federal de Campina Grande - UFCG - Campina Grande (PB), Brasil; Pesquisadora do Instituto de Pesquisa Professor Joaquim Amorim Neto - IPESQ - Campina Grande (PB), Brasil

IIAcadêmica de Medicina da Universidade Federal de Campina Grande - UFCG - Campina Grande (PB), Brasil

IIIAcadêmica de Medicina da Universidade Federal de Campina Grande - UFCG - Campina Grande (PB), Brasil

IVAcadêmica de Medicina da Universidade Federal de Campina Grande - UFCG - Campina Grande (PB), Brasil

VAcadêmica de Medicina da Universidade Federal de Campina Grande - UFCG - Campina Grande (PB), Brasil

VIAcadêmica de Medicina da Universidade Federal de Campina Grande - UFCG - Campina Grande (PB), Brasil

VIIPós-graduanda (Doutorado) do Programa de Pós-Graduação do Instituto de Medicina Integral Professor Fernando Figueira - IMIP - Campina Grande (PB), Brasil; Pesquisadora do Instituto de Pesquisa Professor Joaquim Amorim Neto - IPESQ - Campina Grande (PB), Brasil

Correspondência Correspondência: Melania Maria Ramos de Amorim Instituto de Pesquisa Professor Joaquim Amorim Neto Rua Duque de Caxias, 330 - Prata CEP: 058010-820 - Campina Grande (PB), Brasil Fone: (83) 3321-0607 E-mail: melamorim@uol.com.br

RESUMO

OBJETIVO: identificar os fatores associados à gestação na adolescência em um Estado do nordeste do Brasil.

MÉTODOS: realizou-se um estudo de caso-controle na proporção de uma adolescente entre 10 e 19 anos (caso) para duas mulheres entre 20 e 35 anos (controles), totalizando 168 casos e 337 controles. As variáveis reprodutivas analisadas foram: escolaridade, situação marital, procedência, renda familiar per capita em reais, trabalho remunerado, escolaridade da mãe, presença do pai da adolescente em casa. Foram também incluídas na análise variáveis reprodutivas: idade do primeiro coito, história materna de gravidez na adolescência, consulta ginecológica antes da gravidez, conhecimento, uso e acesso a métodos contraceptivos.

RESULTADOS: verificou-se associação de gestação na adolescência com as seguintes variáveis: escolaridade menor que oito anos, ausência do companheiro e história materna de gestação na adolescência. Observou-se que a idade na primeira relação foi significativamente mais baixa entre as adolescentes, que tiveram menor frequência de consultas ginecológicas. Conhecimento dos métodos hormonais e acesso aos métodos anticoncepcionais foram menos frequentes entre as adolescentes. Os fatores de risco para a gravidez na adolescência, após análise de regressão logística múltipla, foram: baixa escolaridade (OR=2,3; IC95%=1,3-3,8), idade do primeiro coito menor que 15 anos (OR=3,6; IC95%=2,2-5,7), história materna de gravidez na adolescência (OR=2,6; IC95%=1,7-3,4). A história de consultas ginecológicas prévias (OR=0,3; IC95%=0,2-0,4) e uso de métodos hormonais (OR=0,6; IC95%=0,4-0,9) foram variáveis protetoras.

CONCLUSÕES: os principais fatores associados à gravidez na adolescência observados foram: baixa escolaridade da adolescente, história materna de gestação na adolescência, ausência de consultas ginecológicas prévias e falta de acesso aos métodos anticoncepcionais.

Palavras-chave: Gravidez na adolescência, Anticoncepção, Fatores de risco.

ABSTRACT

PURPOSE: to identify factors associated with gestation in adolescence in a State of the northeast of Brazil.

METHODS: a case-control study in the ratio of one 10 to 19-year-old adolescent (case) for two 20 to 35-year-old women (controls), with a total of 168 cases and 337 controls. The variables analyzed were: schooling, marital status, origin, family income per capita in Brazilian currency, paid job, mother's schooling, and presence of adolescent's father at home. Reproductive variables such as age at the first intercourse, mother's history of adolescence pregnancy, gynecological appointments before the pregnancy, knowledge, access and use of contraceptive methods were also included in the analysis.

RESULTS: the following variables were associated with gestation in adolescence: schooling lower than eight years, lack of a regular mate, and maternal history of adolescence gestation. Also, the age at the first intercourse was significantly lower among the adolescents and that they had a lower rate of gynecological appointments. Knowledge of hormonal methods and access to contraceptive methods were also less frequent among the adolescents. After the multiple logistic regression analysis, risk factors for pregnancy at adolescence were: low schooling (OR=2.3; CI95%=1.3-3.8), age at the first intercourse lower than 15 years old (OR=3.6; CI95%=2.2-5.7), history of maternal pregnancy at adolescence (OR=2.6; CI95%=1.7-3.4). The history of previous gynecological appointments (OR=0.3; CI95%=0.2-0.4) and the use of hormonal methods (OR=0.6; CI95%=0.4-0.9) were protecting variables.

CONCLUSIONS: the main factors associated with pregnancy in adolescence were: the adolescent's low schooling, maternal history of adolescence gestation, lack of previous gynecological appointments and lack of access to contraceptive methods.

Keywords: Pregnancy in adolescence, Contraception, Risk factors.

Introdução

Desde meados da década de 1970, observa-se uma importante mudança no panorama da fecundidade no Brasil, com uma redução da taxa de fecundidade entre as gestantes adultas e um aumento entre as adolescentes1. Segundo dados do Ministério da Saúde, 22% das parturientes no Brasil, em 2003, eram adolescentes e em 28 mil de aproximadamente 668 mil partos ocorridos neste ano em todo o país, a idade das mulheres variou entre 10 e 14 anos2. Apesar de se notar uma pequena tendência a uma redução no percentual de gravidez na adolescência nas Regiões Centro-Oeste, Sul e Sudeste, entre 2000 e 2005, nas regiões Norte e Nordeste observou-se uma relativa estabilidade3.

Embora alguns estudos tenham sugerido aumento da frequência de complicações maternas e perinatais, como pré-eclâmpsia, restrição do crescimento fetal e prematuridade4,5, os estudos mais recentes sugerem que, depois de controladas as variáveis potencialmente confundidoras, principalmente a primiparidade, a gestação na adolescência não eleva o risco gestacional do ponto de vista biológico6. O maior impacto envolve a dimensão psicológica e socioeconômica, uma vez que a gravidez na adolescência interfere negativamente no estilo de vida das adolescentes e de seus familiares, resultando muitas vezes em abandono escolar e diversas outras consequências que perpetuam o ciclo da pobreza. Ficam adiadas ou limitadas as possibilidades de desenvolvimento e engajamento dessas jovens na sociedade7,8.

Dentre os fatores que têm contribuído para o aumento da gravidez na adolescência, destacam-se o início precoce da vida sexual associado à ausência do uso de métodos contraceptivos, além da dificuldade de acesso a programas de planejamento familiar7. Outro fator de risco é a idade da primeira gravidez da mãe da adolescente, uma vez que as adolescentes gestantes, geralmente, vêm de famílias cujas mães também iniciaram a vida sexual precocemente ou engravidaram durante a adolescência8,9.

O reconhecimento dos fatores associados à frequência de gestação na adolescência em nosso meio é fundamental para o planejamento de políticas em saúde, principalmente nas regiões onde persiste uma frequência elevada. Portanto, este estudo foi realizado com o objetivo de identificar os principais fatores associados à gestação na adolescência no Instituto de Saúde Elpídio de Almeida (ISEA) em Campina Grande (PB).

Métodos

Realizou-se um estudo epidemiológico observacional, analítico, de base hospitalar, do tipo caso-controle, no Instituto de Saúde Elpídio de Almeida (ISEA), em Campina Grande (PB), no período de fevereiro a julho de 2006. O ISEA é uma maternidade pública municipal que desenvolve atividades de assistência e ensino e atende à comunidade do município e regiões próximas. O estudo foi previamente aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa local e todas as mulheres concordaram voluntariamente em participar, assinando o termo de consentimento livre e esclarecido.

O tamanho da amostra foi calculado no programa Epi-Info 6.04d, prevendo-se uma frequência de exposição nos casos de 20% e nos controles de 10%, com um poder de 80%, nível de confiança de 95% e uma relação casos: controles de 1: 2. Foram incluídos, portanto, 168 casos e 337 controles (total de 505 puérperas). Para o cálculo da frequência de partos em adolescentes, recorreu-se ao núcleo de epidemiologia e estatísticas hospitalares do ISEA, obtendo-se o total de partos no período do estudo.

Foram incluídas as pacientes que tiveram o parto assistido no ISEA, correspondendo os casos às puérperas adolescentes e os controles as puérperas com idade entre 20 e 34 anos. Foi considerada adolescente a puérpera com idade entre 10 e 19 anos10. Foram excluídas as puérperas com estado clínico grave ou incapacidade física e/ou mental assim como as pacientes menores de 18 anos não acompanhadas pelos seus responsáveis.

Os casos eram identificados no livro de registro da sala de parto. A partir do nome e do número de registro, as puérperas foram procuradas na Enfermaria de Puerpério do ISEA. Para seleção dos controles, obedeceu-se ao critério de vizinhança da Enfermaria de Puerpério, identificando-se os leitos com numeração imediatamente inferior e superior, desde que tivessem idade entre 20 e 34 anos e concordassem em participar da pesquisa. Caso não concordassem ou tivessem idade diferente, eram abordadas sucessivamente as numerações de leito consecutivamente menores ou maiores.

A variável dependente foi a idade materna no parto (adolescente ou não) e as variáveis independentes foram: escolaridade (menor que oito anos ou maior ou igual a oito anos), situação marital (presença ou não de companheiro), procedência (Campina Grande ou outras cidades), renda familiar per capita em reais, trabalho remunerado, escolaridade da mãe e presença do pai da adolescente em casa) e variáveis reprodutivas (idade no primeiro coito, história materna de gravidez na adolescência, consulta ginecológica antes da gravidez, conhecimento, acesso e uso de métodos contraceptivos). Foi considerado acesso aos métodos contraceptivos a disponibilidade na rede de Saúde Pública, avaliada através de questionamento à puérpera sobre a disponibilidade dos métodos contraceptivos na Unidade de Saúde e a facilidade de agendamento de consulta.

Os dados foram coletados utilizando-se um formulário-padrão pré-codificado e digitados no programa de domínio público Epi-Info 3.3.2. Esse mesmo programa foi utilizado para todas as fases da análise estatística.

Inicialmente, realizou-se análise bivariada para testar a associação da idade materna no parto (variável dependente) com as diversas variáveis sociodemográficas e reprodutivas. Foram utilizados os testes χ2 de associação e exato de Fisher, quando necessário, considerando-se o nível de significância de 5%. Para determinação da força da associação, calculou-se a Odds Ratio (OR) e o seu intervalo de confiança a 95% (IC95%). Em uma segunda etapa, realizou-se análise de regressão logística múltipla através de um modelo hierarquizado para se identificarem os principais fatores associados à gravidez na adolescência. Inicialmente, foram consideradas as variáveis sociodemográficas e, dentre estas, selecionaram-se aquelas que persistiam significativamente associadas ao desfecho (parto na adolescência) com nível de significância de 5%. Depois, foram incluídas no modelo as variáveis reprodutivas que também apresentaram associação significativa com o desfecho em outro modelo de regressão. No final, obteve-se uma tabela das variáveis que persistiram significativamente associadas com o parto na adolescência, ao nível de significância de 5%.

Resultados

Durante o período da coleta de dados (fevereiro a julho de 2006), foram atendidos no ISEA 1.966 partos, sendo que 27,2% corresponderam a partos de adolescentes.

No presente estudo, foram incluídas 168 adolescentes (casos) e 337 mulheres com idade entre 20 e 35 anos (controles). A idade das adolescentes variou entre 12 e 19 anos, com média de 17,2±1,6 anos, enquanto a média dos controles foi de 25,9±4,5 anos. Doze adolescentes tinham idade entre 12 e 14 anos (7,1%) e 156 tinham 15 anos ou mais (92,9%). Apenas 22,6% das adolescentes estavam frequentando a escola.

Analisando-se a associação entre gestação na adolescência e variáveis sociodemográficas, verificou-se um risco aumentado para as seguintes variáveis: escolaridade menor que oito anos (OR=3,3; IC95%=2,0-5,3), ausência do companheiro (OR=1,9; IC95%=1,2-3,1) e história materna de gestação na adolescência (OR=2,2; IC95%-1,4-3,4). Não houve associação entre gestação na adolescência e as variáveis: procedência, renda familiar, escolaridade materna, exercício de atividade remunerada e presença paterna (Tabela 1).

Quando foi analisada a associação da gestação na adolescência com as variáveis reprodutivas, observou-se que 47% das adolescentes iniciaram atividade sexual com menos de 15 anos, contra 16% dos controles (OR=4,6; IC95%=3,0-7,0). Adolescentes tiveram menor frequência de consultas ginecológicas (31,0%) do que os controles (66,2%), com OR=4,4 (IC95%=2,9-6,5). Não houve diferença entre casos e controles quanto ao conhecimento de qualquer método anticoncepcional. No entanto, 6,5% das adolescentes desconheciam os métodos hormonais contra 2,4% dos controles (OR=2,9; IC95%=1,1-7,6), enquanto o conhecimento a respeito do preservativo não apresentou diferença significativa entre os dois grupos. Aproximadamente 32% das adolescentes referiram acesso aos métodos contraceptivos, contra 50% dos controles (OR=2,18; IC95%=1,48-3,23). Em relação ao uso de qualquer método, 57,1% dos casos tinham usado, contra 77,2% dos controles (OR=2,53; IC95%=1,70-3,77). Não houve diferença em relação ao uso do preservativo, porém o uso de métodos hormonais foi menos frequente entre as adolescentes (33,9%) em relação aos controles (57,0%), com OR=2,57 (IC95%=1,75-3,8) (Tabela 2).

Após a análise de regressão logística múltipla hierarquizada, persistiram significativamente associadas à gestação na adolescência no modelo final as seguintes variáveis: escolaridade da adolescente menor que oito anos (OR=2,3; IC95%=1,3-3,8), idade do primeiro coito menor que 15 anos (OR=3,6; IC95%=2,2-5,7), história de consultas ginecológicas anterior à gestação (OR=0,3; IC95%=0,2-0,4), uso de métodos hormonais (OR=0,6; IC95%=0,4-0,9) e a história materna de gravidez na adolescência (OR=2,6; IC95%=1,7-3,4) (Tabela 3). As variáveis escolaridade <8 anos, idade no primeiro coito <15 anos e história materna de gestação na adolescência foram fator de risco para a gravidez na adolescência, enquanto história de consultas ginecológicas prévias e uso de métodos hormonais foram protetoras.

Discussão

No presente estudo (desenvolvido entre fevereiro e julho de 2006), a frequência de partos de adolescentes foi de 27,2% e os principais fatores de risco associados à gestação na adolescência foram: baixa escolaridade da adolescente, início precoce da atividade sexual (menor que 15 anos) e história materna de gravidez na adolescência. Como fatores protetores observaram-se história de consulta ginecológica prévia e uso de métodos hormonais. A frequência de parto entre as adolescentes foi obtida por meio de dados disponíveis no Núcleo de Epidemiologia e Estatísticas Hospitalares do ISEA.

A escolha do Grupo Controle neste estudo merece ser discutida. Foram selecionadas puérperas, com idade entre 20 e 34 anos, atendidas na mesma maternidade, em detrimento de adolescentes não grávidas. A escolha do controle foi baseada na premissa de que não existe, na realidade, um controle ideal para adolescentes grávidas, uma vez que nada garante que, logo após o estudo, adolescentes não grávidas utilizadas como controle engravidem. Por outro lado, também era objetivo do estudo comparar os desfechos gestacionais entre adolescentes e não adolescentes, o que motivou a seleção do Grupo Controle dentro da própria maternidade. Esses desfechos estão apresentados em outro artigo e não foram incluídos na presente publicação.

Destacamos, igualmente, que constitui exigência do Comitê de Ética que as pesquisas realizadas com adolescentes necessitam da presença de um responsável que permita a sua participação. A ausência no estudo de adolescentes desacompanhadas poderia gerar um viés, pois sugere um maior abandono e talvez esteja associada a piores condições socioeconômicas. Entretanto, no presente estudo, o percentual de exclusões por ausência do responsável foi insignificante.

A frequência de partos de adolescentes observada foi superior à média nacional de 22%2. Este achado está de acordo com os dados do Ministério da Saúde2,3, indicando uma estabilização e até um aumento do número de casos de gravidez na adolescência em regiões mais pobres, como a nossa, onde existe concomitância de diversos fatores de risco. Dentre esses, destacam-se o baixo nível de escolaridade, tanto das adolescentes como dos seus progenitores, e as dificuldades de acesso aos serviços de saúde, principalmente nesta faixa etária, devido à inexistência de programas de saúde direcionados a essa população.

Nos Estados Unidos, observa-se um panorama semelhante, com uma frequência de 22% de gravidez entre as adolescentes. Entretanto, prevalências bem mais baixas são observadas em outros países desenvolvidos: 15% na Grã-Bretanha, 11% no Canadá, 6% na França e 4% na Suécia11. Como justificativa para esta alta prevalência de gravidez entre adolescentes nos Estados Unidos, Darroch et al.11 citam o início da vida sexual precoce e a existência de múltiplos parceiros. Preocupado com estes dados, o Comitê de Adolescentes da Academia Americana de Pediatria, em publicação recente, recomenda a participação do pediatra no esclarecimento ao adolescente sobre os riscos associados ao comportamento sexual, incluindo gravidez e doenças sexualmente transmissíveis12.

Dentre os fatores de risco para a gravidez na adolescência, ainda não há consenso se o baixo nível de escolaridade, com altas proporções de evasão e de abandono escolar seria uma das causas ou uma consequência da gravidez na adolescência. Em um estudo transversal envolvendo 562 mulheres, os autores observaram associação positiva entre a gravidez na adolescência e o nível de escolaridade4, associação também observada em nosso estudo, com apenas 22,6% das adolescentes frequentando a escola. Estudos sugerem que, à medida que o nível de instrução aumenta, ocorre uma redução no percentual de gravidez na adolescência8,13, embora em países desenvolvidos tenha sido observado um nível de escolaridade semelhante entre adolescentes grávidas e não grávidas14,15. Em nosso meio, todavia, é muito frequente que adolescentes grávidas interrompam os seus estudos, uma vez que a gravidez funciona como um rito de passagem para a idade adulta, e os próprios familiares desencorajam a adolescente a continuar na escola.

Por outro lado, é preciso considerar que o atraso nos estudos e uma educação inadequada contribuem para que essas meninas não tenham projetos de vida articulados ou perspectivas acadêmicas e profissionais, de forma que a gravidez e os cuidados com os filhos acabam por substituir eventuais ambições pessoais16. No presente estudo, com o ponto de corte de oito anos, observou-se uma forte associação entre baixa escolaridade e gravidez na adolescência. Pode-se argumentar que este ponto de corte representaria um viés para as adolescentes com idade inferior a 15 anos, que teriam menor probabilidade de ter cursado oito anos de estudo, porém apenas 7% das adolescentes desta casuística tinham idade inferior a 15 anos.

Quanto às variáveis reprodutivas, a idade no primeiro coito foi significativamente inferior entre as puérperas adolescentes, e bem inferior ao observado em gerações passadas, fato que pode ser explicado pelas mudanças de hábitos culturais e sociais, com uma exploração da sexualidade, pela mídia, associada a uma redução na idade da menarca17. Além disso, destaca-se a imaturidade própria da idade, quando o adolescente não pensa nos riscos e em prevenção, o que muitas vezes resulta no início da atividade sexual com gestações não planejadas. Estes achados são compatíveis com outro estudo no qual se demonstrou que as adolescentes estão iniciando a vida sexual mais precocemente em comparação às gerações passadas, além de não ter sido observada diferença entre o início da vida sexual em relação aos adolescentes do sexo masculino18,19.

Outra variável que mostrou associação significativa com a gravidez na adolescência foi a história materna de gestação na adolescência, corroborando outros estudos realizados no Brasil9,20. Um estudo realizado nos Estados Unidos envolvendo gestantes adolescentes latinas e negras verificou achados semelhantes aos do presente estudo, observando maior chance de gravidez na adolescência quando existia história familiar de mãe e irmã(s)21.

No presente estudo, onze adolescentes desconheciam qualquer método hormonal, provavelmente devido à escolaridade insuficiente e à menor frequência de consultas ginecológicas. Mesmo entre as adolescentes que conheciam os métodos anticoncepcionais, verificou-se baixa frequência de acesso aos métodos contraceptivos e de consultas ginecológicas anteriores, o que foi significativo em relação ao Grupo Controle. Ou seja, apesar de conhecerem os métodos anticoncepcionais, é possível que muitas tenham engravidado por não procurarem orientação quanto ao seu uso. A falta de acesso também pode ter decorrido do não comparecimento aos postos de saúde por parte das adolescentes. Um estudo envolvendo 200 grávidas adolescentes encontrou como justificativas mais comuns para a ausência de consulta ginecológica anterior: a falta de informação (43,8%) e o sentimento de medo ou vergonha (37,0%)22. Outro ponto a ser destacado é a falha do sistema, que mesmo detectando que a procura por consultas ginecológicas por parte desta população é bem inferior à de mulheres de outros grupos etários, não desenvolve campanhas com o intuito de alterar esta casuística.

Achados semelhantes foram relatados em outro estudo em que, apesar de quase 100% das adolescentes conhecerem pelo menos dois métodos contraceptivos, dois terços (67%) não faziam uso de qualquer forma de anticoncepção23. Por outro lado, um estudo realizado no Rio de Janeiro verificou que 85% das adolescentes faziam uso de algum método anticoncepcional, sendo o contraceptivo oral o principal método usado (76%)24. Provavelmente esta alta frequência se deve a uma melhor qualidade das variáveis sociodemográficas em relação às das nossas adolescentes, com melhor nível de escolaridade, com metade das adolescentes tendo estudado por pelo menos seis anos; melhor renda, com a renda per capita média de 0,9 salários mínimos e, ainda, o fato de nenhuma adolescente estar trabalhando na população estudada.

Como discutido acima, o Comitê de Adolescência da Academia Americana de Pediatria destaca a importância da participação do pediatra neste processo, instruindo a adolescente quanto às consequências emocionais, físicas e econômicas do sexo, aconselhando-as a retardar o início da vida sexual e a fazer uso regular de contraceptivo12.

Cumpre destacar que, quando se debate a prevenção da gravidez na adolescência, há a possibilidade de duas abordagens: recomendação para abstinência sexual, retardando o início da vida sexual (programas "abstinence-only") e orientação para abstinência associada com educação e acesso ao uso de contraceptivos (programas "abstinence-plus"). Várias críticas têm sido feitas ao programa americano que estimula unicamente a abstinência sexual entre as adolescentes até o casamento, tanto pelo alto custo (175 milhões de dólares/ano) como pela baixa eficácia25-27. Outro fato a ser discutido é que esses programas não instruem as adolescentes quanto ao uso de preservativos ou contraceptivos, sendo, portanto, considerados uma violação aos direitos humanos25.

No Brasil, apesar do aumento da cobertura do Programa de Saúde da Família, principalmente em regiões menos favorecidas, observa-se a ausência de políticas públicas voltadas para esta população, com lacunas tanto nos programas educativos como nos preventivos, com estímulo do uso de preservativos e contraceptivos. Programas que objetivem reduzir a prevalência de gravidez na adolescência devem levar em consideração não apenas o início precoce da vida sexual, mas também a dificuldade do acesso aos serviços de saúde e, consequentemente, aos métodos contraceptivos.

Conclui-se que os principais fatores associados à gravidez na adolescência observados foram: baixa escolaridade da adolescente, história materna de gestação na adolescência, ausência de consultas ginecológicas prévias e falta de acesso aos métodos anticoncepcionais. Esses fatores devem ser levados em consideração na elaboração de estratégias para prevenir a gravidez na adolescência no âmbito dos programas de Saúde Pública.

Coautoria

Lidiane de Araújo Lima, Camila Vigolvino Lopes, Daniele Kelle Lopes de Araújo, Jéssica Guimarães Gomes Silva e Larissa Cynthia César participaram da elaboração do projeto de pesquisa, da coleta dos dados e da montagem de bancos de dados. Melania Maria Ramos Amorim coordenou a pesquisa e participou de todas as etapas da elaboração do artigo. Melania Maria Ramos Amorim e Adriana Suely de Oliveira Melo realizaram a análise estatística e a interpretação dos resultados e redação do artigo.

Recebido 12/2/09

Aceito com modificações 16/6/09

Fonte financiadora: Programa Institucional de Iniciação Científica (PIBIC) e Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).

Instituto de Saúde Elpídio de Almeida - ISEA - Campina Grande (PB), Brasil.

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  • Correspondência:

    Melania Maria Ramos de Amorim
    Instituto de Pesquisa Professor Joaquim Amorim Neto
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    CEP: 058010-820 - Campina Grande (PB), Brasil
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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      09 Out 2009
    • Data do Fascículo
      Ago 2009

    Histórico

    • Recebido
      12 Fev 2009
    • Aceito
      16 Jun 2009
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