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Adaptação para o português de questionário de avaliação da informação científica em saúde na imprensa (Index of Scientific Quality)

An adaptation of the Index of Scientific Quality for use in Brazilian Portuguese to evaluate the scientific quality in the press

Resumos

OBJETIVO: Adaptação para a língua portuguesa e avaliação da aplicabilidade do questionário Index of Scientific Quality (ISQ) em textos sobre saúde da mulher, apresentados por revistas brasileiras. MÉTODOS: O estudo é de corte transversal. Foram coletados textos publicados entre agosto de 2005 e julho de 2006 nas principais revistas semanais: Veja, Época e Isto É. O questionário utilizado possui oito itens, que variam de um a cinco, e medem a aplicabilidade, o grau de opinião, a validade e o alcance da descoberta, precisão, coerência e consequência dos dados, além de um item global, que resume os outros itens. O ISQ foi traduzido, retrotraduzido e submetido à prova piloto até a versão definitiva, utilizada por dois médicos e dois jornalistas. Após a análise dos textos, foi verificada a consistência interna dos itens do questionário pelo coeficiente alfa de Cronbach e a concordância inter e intraobservador para cada item por meio do índice Kappa. RESULTADOS: A amostra conteve 80 textos. A consistência interna dos itens variou entre 0,81 e 0,96. A concordância interavaliadores foi de -0,03 a 0,48 e a intraobservador variou entre 0,27 e 0,34. (IC 95%). CONCLUSÃO: Os itens do questionário mensuraram de forma adequada a qualidade científica, porém a baixa concordância inter e intraobservadores indica a necessidade de novos estudos para se avaliar a versão brasileira do ISQ.

Saúde da mulher; Jornalismo científico; Publicações científicas e técnicas; Comunicação em saúde


PURPOSE: The adaptation into Portuguese and evaluation of the Index of Scientific Quality (ISQ) questionnaire applicability's in texts presented by Brazilian magazines on woman's health. METHODS: A transversal cohort study. Texts published from August 2005 to July 2007, in the main weekly magazines Veja, Época and Isto é, were collected. The questionnaire used is composed of eight items, with five alternatives each, measuring the applicability, opinion degree, validity and implications of the finding, precision, coherence and relevance of the data, besides a global item summarizing all the other items. ISQ was translated, retro-translated and submitted to a pilot test till the final version, which was used by two medical doctors and two journalists. After the texts analysis', the internal consistency of the questionnaire items was checked through Cronbach's alpha coefficient, and the inter and intra-observer agreement, for each item, by Kappa's index. RESULTS: The sample was composed by 80 articles. The internal consistency of items has varied from 0.81 to 0.96. The inter-evaluators' agreement ranged from -0.03 to 0.48, and the intra-observer varied from 0.27 to 0.34 (CI 95%). CONCLUSION: The questionnaire items have adequately measured the scientific quality of the texts, but the low agreement inter and intra-observers points to the need for further studies to assess the Brazilian version of ISQ.

Women's health; Scientific journalism; Scientific and technical publications; Health communication


ARTIGO ORIGINAL

Adaptação para o português de questionário de avaliação da informação científica em saúde na imprensa (Index of Scientific Quality)

An adaptation of the Index of Scientific Quality for use in Brazilian Portuguese to evaluate the scientific quality in the press

Mariella Silva de OliveiraI; Lucia Helena Costa PaivaII; José Vilton CostaIII; Aarão Mendes Pinto NetoIV

IMestranda do Programa de Pós-graduação do Departamento de Tocoginecologia da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Estadual de Campinas - UNICAMP - Campinas (SP), Brasil

IIProfessora-associada do Departamento de Tocoginecologia e Coordenadora da Subcomissão de Pós-Graduação em Tocoginecologia da Universidade Estadual de Campinas - UNICAMP - Campinas (SP), Brasil

IIIEstatístico do Centro de Atenção Integral à Saúde da Mulher (CAISM) da Universidade Estadual de Campinas - UNICAMP - Campinas (SP), Brasil

IVProfessor-associado da Universidade Estadual de Campinas - UNICAMP - Campinas (SP); Chefe do Departamento de Tocoginecologia da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Estadual de Campinas - UNICAMP - Campinas (SP), Brasil

Correspondência Correspondência: Aarão Mendes Pinto-Neto Departamento de Tocoginecologia da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Estadual de Campinas Rua Alexandre Fleming, 101 - Barão Geraldo Cidade Universitária CEP 13083-970 - Campinas (SP), Brasil E-mail: mariellajornalista@gmail.com

RESUMO

OBJETIVO: Adaptação para a língua portuguesa e avaliação da aplicabilidade do questionário Index of Scientific Quality (ISQ) em textos sobre saúde da mulher, apresentados por revistas brasileiras.

MÉTODOS: O estudo é de corte transversal. Foram coletados textos publicados entre agosto de 2005 e julho de 2006 nas principais revistas semanais: Veja, Época e Isto É. O questionário utilizado possui oito itens, que variam de um a cinco, e medem a aplicabilidade, o grau de opinião, a validade e o alcance da descoberta, precisão, coerência e consequência dos dados, além de um item global, que resume os outros itens. O ISQ foi traduzido, retrotraduzido e submetido à prova piloto até a versão definitiva, utilizada por dois médicos e dois jornalistas. Após a análise dos textos, foi verificada a consistência interna dos itens do questionário pelo coeficiente alfa de Cronbach e a concordância inter e intraobservador para cada item por meio do índice Kappa.

RESULTADOS: A amostra conteve 80 textos. A consistência interna dos itens variou entre 0,81 e 0,96. A concordância interavaliadores foi de -0,03 a 0,48 e a intraobservador variou entre 0,27 e 0,34. (IC 95%).

CONCLUSÃO: Os itens do questionário mensuraram de forma adequada a qualidade científica, porém a baixa concordância inter e intraobservadores indica a necessidade de novos estudos para se avaliar a versão brasileira do ISQ.

Palavras-chave: Saúde da mulher; Jornalismo científico; Publicações científicas e técnicas; Comunicação em saúde

ABSTRACT

PURPOSE: The adaptation into Portuguese and evaluation of the Index of Scientific Quality (ISQ) questionnaire applicability's in texts presented by Brazilian magazines on woman's health.

METHODS: A transversal cohort study. Texts published from August 2005 to July 2007, in the main weekly magazines Veja, Época and Isto é, were collected. The questionnaire used is composed of eight items, with five alternatives each, measuring the applicability, opinion degree, validity and implications of the finding, precision, coherence and relevance of the data, besides a global item summarizing all the other items. ISQ was translated, retro-translated and submitted to a pilot test till the final version, which was used by two medical doctors and two journalists. After the texts analysis', the internal consistency of the questionnaire items was checked through Cronbach's alpha coefficient, and the inter and intra-observer agreement, for each item, by Kappa's index.

RESULTS: The sample was composed by 80 articles. The internal consistency of items has varied from 0.81 to 0.96. The inter-evaluators' agreement ranged from -0.03 to 0.48, and the intra-observer varied from 0.27 to 0.34 (CI 95%).

CONCLUSION: The questionnaire items have adequately measured the scientific quality of the texts, but the low agreement inter and intra-observers points to the need for further studies to assess the Brazilian version of ISQ.

Keywords: Women's health; Scientific journalism; Scientific and technical publications; Health communication

Introdução

A divulgação de temas de saúde na imprensa é importante, pois pode contribuir para que as pessoas previnam doenças e melhorem a qualidade de vida, e por isso mesmo é um assunto que atrai a audiência1. Os meios de comunicação são importantes fontes de informação sobre avanços médicos2, porém nem toda mensagem repassada por eles tem qualidade3.

Isso é notável na cobertura em saúde da mulher, avaliada por meio de diferentes métodos. Em uma análise de dez anos, de revistas femininas norte-americanas, descobriu-se que a maior parte delas focava os temas relacionados à saúde em exercícios e nutrição, em detrimento de temas relevantes na epidemiologia daquele país4. A imprensa muitas vezes reserva pouco espaço para temas importantes em saúde, como os das principais revistas médicas, e apresenta informações que divergem até das próprias preocupações femininas5.

No Brasil, o quadro não é muito diferente. O tema ocupa, em média, 14% do total das matérias sobre saúde veiculadas nas revistas semanais de atualidades, com predomínio de textos superficiais (notas) e enfoque prioritário para os aspectos reprodutivos, em detrimento de outros temas da saúde das mulheres6. A saúde da mulher é tema importante, pois ela representa mais da metade da população nacional (50,7%)7, 43,1% da população economicamente ativa8 e 57% do público consumidor de revistas9. Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), saúde da mulher é o principal determinante de saúde infantil, logo, a qualidade da saúde no futuro depende em grande parte dos investimentos em saúde da mulher e do conhecimento de novidades na área, por parte da população, que vai discernir sobre os rumos de sua saúde.

Não há conhecimento de pesquisa nacional realizada com índice específico para avaliar a informação em saúde. Isto justifica a realização deste estudo, pois existe um instrumento desenvolvido no Canadá que mede a informação em saúde nos textos da mídia, conhecido como Index of Scientific Quality (ISQ)10. Ele foi validado para o idioma espanhol11 e analisa tópicos relevantes no que se refere à informação em saúde. Uma vez que não foi encontrada publicação brasileira que a ele se referisse, o ISQ foi escolhido para ser traduzido e adaptado ao português. Além da relevância do tema e escassez de trabalhos na literatura nacional, é importante destacar a possibilidade de difundir uma ferramenta já utilizada em outros países e que pode ser aliada às metodologias já consolidadas no Brasil para que tanto os jornalistas, como os profissionais da saúde da mulher possam dele se apropriar e fazer uso.

Métodos

Em estudo de corte transversal foram coletados textos sobre saúde da mulher, publicados entre agosto de 2005 a julho de 2006 nas principais revistas semanais de circulação nacional, ou seja, Veja, Época e IstoÉ. A revista Veja é a maior revista semanal de atualidades e a quarta mais vendida no mundo. Sob a responsabilidade da Editora Abril, sua tiragem foi, em média, no ano de 2006, de 1,1 milhão de exemplares por edição. O perfil de seu leitor é feminino em sua maioria (53%), grande parte tem entre 20 e 39 anos (41%) e 70% pertence às classes A e B12. Editada pelas organizações Globo, a revista Época, também tem maioria de mulheres entre o seu público leitor (51%); 24% têm entre 25 a 34 anos e 19% entre 18 a 24 anos. Em relação à classe social, os leitores classe A e B correspondem a 62% e sua tiragem semanal gira em torno dos 433,6 mil exemplares13. A revista IstoÉ, da Editora Três, possui tiragem média de 351,2 mil exemplares por edição e 53% dos leitores são homens; 67% da classe AB e 39% têm entre 30 e 49 anos14.

A coleta de todos os textos foi feita manualmente pela pesquisadora em duas bibliotecas públicas e os textos informativos, que apresentavam aspectos referentes a problemas de saúde, doença ou bem-estar da mulher foram fotocopiados e incluídos na análise. Os conteúdos em saúde da mulher nas revistas analisadas no período tratavam em sua maioria da saúde reprodutiva (22,5%). Outros temas em saúde da mulher observados na amostra foram beleza e estética (13,7%); temas de saúde geral (infertilidade, doenças de tireoide, distúrbios alimentares, compulsão por compras, hipertensão pulmonar, problemas com a libido na velhice etc.), cuja prevalência é maior em mulheres (13,7%); sexualidade (11,2%), prevenção, riscos e cuidados (11,2%); políticas e direito à saúde (8,7%); menopausa (8,7%); violência (6,2%) e saúde mental (3,7%)15.

Todos os textos da amostra foram ilustrados, e a maior parte das fontes que deram informações aos repórteres é mista (58,7%). Em segundo lugar estão os textos com fonte científica (26,2%). O governo e as fontes empresariais são pouco citados como fonte, obtendo 5 e 6,2%, respectivamente. Em 3,7% dos textos há voz de cidadãos comuns, organizações não-governamentais ou profissionais da saúde não ligados à pesquisa científica, classificados como outras. Quanto à região geográfica de origem da informação, tem-se que a maioria é nacional (47,5%) (Tabela 1).

O instrumento utilizado nesta pesquisa, o ISQ, possui oito itens com respostas, em formato Escala de Likert, que variam de um (baixa qualidade) a cinco pontos (alta qualidade). As características medidas pelos itens são aplicabilidade, relacionada ao grau de clareza da informação relatada e seu público alvo; opinião versus fato, que analisa se há distinção clara entre opiniões e informações; validade, que mede o nível de evidência e credibilidade das fontes utilizadas no texto; alcance, que avalia se o texto explicita o impacto da descoberta; precisão, que mostra se no texto há bom fundamento em relação a estimativas e probabilidades; coerência, que indaga se o texto faz referência a outros estudos; consequência, que procura no texto os benefícios, riscos e custos do fato relatado. O último item, denominado global, baseado nas pontuações anteriores, resume os outros sete itens e dá uma avaliação geral do texto como sendo de boa, moderada ou baixa qualidade científica. Este questionário é de origem canadense, está validado para o idioma espanhol e seu autor não se opôs à adaptação e utilização no Brasil. Sua versão preliminar já foi utilizada em estudo sobre as drogas na imprensa espanhola16.

Na fase de adaptação do questionário à língua portuguesa, foram realizadas de forma independente duas traduções iniciais do idioma original, por tradutores brasileiros. As diferenças entre as duas traduções foram avaliadas pelos pesquisadores principais e foi obtida a primeira versão em português. Em seguida, uma pesquisadora cuja língua-mãe é o inglês, fez uma nova tradução (backtranslation) desta versão para o inglês, a qual foi comparada com a versão canadense e a espanhola, e foram resolvidas entre os pesquisadores principais, obtendo assim uma versão preliminar em português, submetida à prova piloto.

Nesta etapa, dois pesquisadores da área da saúde, com experiência em investigação clínica e questionários, avaliaram de forma independente seis artigos sobre saúde da mulher. Quando concluída a avaliação piloto, os pesquisadores analisaram as dificuldades na utilização do instrumento e foi definida a versão definitiva do ISQ em língua portuguesa.

Em seguida, dois médicos pesquisadores em saúde da mulher e dois jornalistas, com experiência na área de saúde, receberam este questionário de forma individual, e a amostra de 80 textos sobre saúde da mulher, para que, em tabelas individuais, sem consulta aos outros avaliadores, fizessem a avaliação. Para o teste-reteste, um dos pesquisadores refez a avaliação com os mesmos textos.

Esses dados foram alocados em banco específico no Excel para verificação da consistência e limpeza do arquivo. Após esta etapa, foram transportados para o software SAS, versão 9.1.3 (SAS Institute Inc., Cary, USA), no qual foi medida a consistência interna dos itens pelo coeficiente alfa de Crombach17, e as concordâncias entre os avaliadores e intraobservadores (teste-reteste) pelo índice Kappa18, ambas para avaliar a aplicabilidade da versão brasileira do ISQ. Valores menores que zero indicam concordância pobre; entre zero e 0,2, concordância leve; entre 0,2 e 0,4, concordância razoável; entre 0,4 e 0,6, moderada; entre 0,6 e 0,8, boa concordância e entre 0,8 e 1, concordância quase perfeita19. Para a avaliação da qualidade científica dos textos, foi considerado o item oito do questionário e sua mediana.

Não foi encontrado outro questionário que pudesse ser comparado à versão desenvolvida na pesquisa, nem foram utilizados seres humanos como sujeitos de pesquisa. Os dados foram extraídos de fonte documental jornalística que contém informações já difundidas e de domínio público. O protocolo de pesquisa foi aprovado pela Comissão de Pesquisa do Departamento de Tocoginecologia e pelo Comitê de Ética da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP).

Resultados

Foram coletados 80 textos sobre saúde da mulher, publicados no período de 12 meses. A Tabela 2 mostra a consistência interna dos itens do questionário, com índice Alfa de Crombach global variando de 0,8 a 0,9. A Tabela 3 mostra que a concordância intraobservadores obteve valores razoáveis, com menor pontuação no item referente ao grau de opinião explícito no texto: 0,2 e maior pontuação no item global: 0,3. A concordância entre os avaliadores pode ser classificada de baixa a moderada, pois o valor de Kappa variou de -0,03, encontrado no item validade, a 0,48 no item referente à opinião. A mediana dos itens da qualidade científica total do conjunto dos avaliadores dos textos variou de dois a quatro em sete itens do questionário.

Discussão

O objetivo deste estudo foi adaptar para o português e avaliar a aplicabilidade do questionário ISQ. Seus itens apresentaram homogeneidade e mensuraram de forma satisfatória a escala de intensidade proposta, de acordo com a consistência interna apresentada pelo alfa de Crombach. Esta medida variou entre 0,8 e 0,9 e é compatível com os resultados na validação para o espanhol, que tiveram consistência interna variando entre 0,81 e 0,8811. Embora a pesquisa argentina não tenha como foco de estudo a saúde da mulher, e sim saúde em geral, foram utilizadas a metodologia e a análise estatística semelhantes a este estudo e por isso pode ser comparável. Valores acima de 0,9 indicam excelente consistência20,17 e, portanto, há boa consistência interna da versão brasileira do ISQ. Já a concordância entre os avaliadores foi de pobre a moderada. No estudo de validação para o espanhol, foram atingidos índices maiores de confiabilidade, mas não ideais, pois a concordância interobservador variou entre 0,48 e 0,6711.

Em relação à avaliação intraobservador, no questionário argentino, a concordância foi superior que a encontrada neste estudo e variou entre 0,51 e 0,95. Um fato que, em geral, justificaria a baixa concordância é o tempo decorrido entre a primeira avaliação e o reteste, o qual neste caso foi de nove meses e pode ser considerado uma das limitações do estudo. Em investigações epidemiológicas, a recomendação é de que o período não seja nem muito curto, para que as pessoas não se lembrem como responderam da primeira vez, e ao mesmo tempo não muito longo para que as variáveis não sofram alterações21. Porém, uma vez que se trata de estudo com textos, um período longo a priori não faria com que as variáveis ou os objetos de estudo se modificassem, como aconteceria em estudos com pacientes e sua saúde. Ao contrário, permitiria que o avaliador não se recordasse das marcações anteriores ou por elas fosse influenciado na segunda avaliação. Cabe informar que o tempo entre a primeira e a segunda avaliação foi de nove meses, o que poderia ser uma limitação do estudo. De qualquer forma, a concordância intraobservador foi razoável.

Na avaliação de Oxman et al.10, a concordância foi boa em cinco itens (incluindo o item global), moderada em dois e razoável em um. Os pesquisadores canadenses avaliaram o questionário também por meio de outro, preenchido por jornalistas e pesquisadores que relataram que o ISQ poderia servir também como uma lista de verificação no preparo das reportagens. Essa etapa foi suprimida da presente avaliação, uma vez que a análise interobservador e o teste-reteste já cumprem o papel de avaliar a aplicabilidade do instrumento.

Em relação à qualidade científica da informação em saúde, a mediana total do item global dos quatro avaliadores foi três, o que denota qualidade científica moderada15. O item que obteve maior pontuação foi o referente à aplicabilidade, com valor quatro, o qual demonstra que os textos mostram claramente a qual público se destinam, de acordo com os avaliadores. Os itens precisão e coerência tiveram a menor pontuação, de valor dois. De fato, detalhes como a significância estatística dos dados e o tamanho da amostra ou o fato de serem ainda estudos experimentais não impedem que a mídia divulgue os eventos, pois o que importa é a novidade, mesmo que se tenha sido testado em poucos pacientes, ou seja, ainda estudo em andamento apresentado em congressos, por exemplo. O que é preocupante, pois pode alarmar a população sem necessidade22. Em relação à coerência, boa parte dos textos se concentra em só um estudo, sem que o jornalista se preocupe em avaliar estudos anteriores sobre o mesmo tema ou até mesmo discutir o estudo. Este baixo valor da mediana nos dois itens também pode ser justificável pela própria autoridade do discurso científico, que faz com que o jornalista acredite e aceite o que o pesquisador afirma, sem buscar outras fontes ou o contraditório23.

Este artigo representa um passo na busca de instrumento que avalie a qualidade das informações em saúde apresentadas pela mídia brasileira. O fato de os avaliadores não ter recebido treinamento para utilização do instrumento é uma limitação do estudo que pode ter dado margem à subjetividade na interpretação das questões, por suas diferentes percepções em relação aos textos jornalísticos.

Em virtude da importância da avaliação dos textos sobre saúde que chegam até a população, novos estudos são necessários para aumentar a reprodutibilidade desse instrumento na língua portuguesa, bem como para buscar outros instrumentos que meçam a qualidade científica. Se a imprensa nem sempre cumpre seu papel de promoção da saúde, é preciso avaliar os textos produzidos para melhorar o jornalismo brasileiro. Com eficiente divulgação de saúde, realizada por profissionais da saúde e da comunicação, será possível melhorar a qualidade de vida das mulheres e evitar que sigam com sua saúde debilitada, além de diminuir os gastos do governo com ações curativas e alertar aos governantes e à comunidade científica sobre os temas que merecem atenção.

Conclui-se que os itens do questionário mensuraram adequadamente a qualidade científica, porém a baixa concordância inter e intraobservadores indica a necessidade de novos estudos para aumentar a reprodutibilidade da versão brasileira do ISQ. Uma vez que os itens do questionário são detalhistas em relação a informações para se mensurar a qualidade científica, o resultado com a amostra brasileira mostra uma qualidade científica moderada e a necessidade de melhorar ainda mais os textos sobre saúde na imprensa brasileira. O questionário pode ser utilizado como ferramenta de apoio a estudos que sejam baseados em outras análises. É preciso também desenvolver instrumentos mais objetivos que auxiliem na avaliação da qualidade dos textos sobre saúde veiculados pela mídia.

Esses resultados não podem ser generalizados a outros veículos ou períodos de análise, porém são base para outros estudos que tenham como foco a saúde nos meios de comunicação. O tema saúde da mulher é uma das metas do milênio; portanto, se a mídia é o meio mais frequente de transmissão de informações em saúde à população, cabe a ela disponibilizar um maior número de informações e com qualidade suficiente para apoiar as mulheres e a população em geral na tomada de decisões em saúde. Cabe destacar também, o papel do profissional da saúde da mulher, que deve fornecer informações com validade científica e encarar a mídia como uma aliada na construção da cidadania. O questionário adaptado para o português pode ser solicitado aos pesquisadores por e-mail.

Agradecimentos

À Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), pela concessão de um ano de bolsa no país e ao Banco Santander, pela concessão de seis meses de bolsa de mobilidade internacional, ambas para dedicação exclusiva à pesquisa.

Recebido 16/6/09

Aceito com modificações 9/11/09

Departamento de Tocoginecologia da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Estadual de Campinas - UNICAMP - Campinas (SP), Brasil.

Não há conflito de interesse.

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  • Correspondência:
    Aarão Mendes Pinto-Neto
    Departamento de Tocoginecologia da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Estadual de Campinas
    Rua Alexandre Fleming, 101 - Barão Geraldo Cidade Universitária
    CEP 13083-970 - Campinas (SP), Brasil
    E-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      18 Jan 2010
    • Data do Fascículo
      Dez 2009

    Histórico

    • Aceito
      09 Nov 2009
    • Recebido
      16 Jun 2009
    Federação Brasileira das Sociedades de Ginecologia e Obstetrícia Av. Brigadeiro Luís Antônio, 3421, sala 903 - Jardim Paulista, 01401-001 São Paulo SP - Brasil, Tel. (55 11) 5573-4919 - Rio de Janeiro - RJ - Brazil
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