Acessibilidade / Reportar erro

Conduta atual em pólipos endometriais

Current management in endometrial polyps

EDITORIAL

Conduta atual em pólipos endometriais

Current management in endometrial polyps

Lucia Costa-Paiva; Armando Antunes Junior; Aarão Mendes Pinto-Neto

Departamento de Tocoginecologia, Faculdade de Ciências Médicas, Universidade Estadual de Campinas – UNICAMP – Campinas (SP), Brasil

Correspondência Correspondência: Lucia Costa-Paiva Departamento de Tocoginecologia, Faculdade de Ciências Médicas, Universidade Estadual de Campinas Rua Alexander Fleming, 101 – Cidade Universitária "Zeferino Vaz" – Barão Geraldo CEP: 13083-881. Campinas (SP), Brasil

Devido ao uso rotineiro da ultrassonografia pélvica transvaginal, o diagnóstico de pólipo tem sido cada vez mais frequente. Uma vez diagnosticado, a polipectomia por histeroscopia tem sido realizada quase que rotineiramente em todos os casos. Esta conduta de "ver-e-tratar" é questionável, porque é baseada na opinião de especialistas e em poucos dados de estudos com nível I de evidência. A questão é: a remoção é sempre necessaria1?

Pólipos endometriais são, por definição, projeções localizadas do tecido endometrial, onde se observa uma distribuição irregular das glândulas endometriais, estroma hipercelular denso e vasos sanguíneos com paredes espessadas, recobertas por epitélio pseudoestratificado ativo ou, na pós-menopausa, por epitélio plano e inativo2.

A prevalência dos pólipos endometriais varia de 7,8 a 34%, em mulheres com sangramento uterino anormal, sendo mais comuns em mulheres na peri e pós-menopausa. Entretanto, sua real frequência não é conhecida pela diversidade das populações avaliadas nos diversos estudos e por serem muitas vezes completamente assintomáticos, podendo ser diagnosticados em cerca de 12% de mulheres assintomáticas, ou seja, sem nenhum sangramento anormal. Na pré-menopausa são menos comuns, mas podem ser encontrados em 10 a 40% das mulheres com sangramento anormal3-6 causando menorragia, menstruações irregulares, sangramento pós-coito ou sangramento intermenstrual5.

Os pólipos endometriais são frequentemente benignos, mas podem apresentar alterações histológicas pré-malignas e malignas; porém, essa taxa é baixa1. Uma revisão sistemática conduzida por Lieng et al. em 2010 incluindo mulheres submetidas à polipectomia com posterior confirmação histológica mostrou que os pólipos malignos estiveram presentes em 0 a 12,9% das mulheres, e as lesões pré-malignas em 0,2 a 23,8% dos pólipos endometriais7. Estudo realizado por Antunes et al. em 2007 com mulheres brasileiras observou uma prevalência de 1,0% de pólipos com hiperplasia endometrial atípica e 2,7% de pólipos carcinomatosos8.

Alguns fatores de risco para malignidade dos pólipos são bem reconhecidos como a idade, presença de sangramento anormal e estado pós-menopausa. Estudo de meta-análise mostra que a prevalência de malignidade foi de 5,4% em mulheres com pólipo endometrial que estavam na pós-menopausa em comparação com 1,7% na pré-menopausa. Com relação ao sangramento a prevalencia foi de 4,1% nas mulheres com sangramento anormal em comparação com 2,1% das mulheres sem sangramento anormal1.

Outros fatores como obesidade, hipertensão arterial, distúrbios hormonais associados como diabetes mellitus e o tratamento com tamoxifeno em pacientes com câncer de mama também têm sido relatados3,4. Muitos estudos demonstraram que o uso de tamoxifeno, um modelador seletivo de receptor estrogênico usado como tratamento coadjuvante do câncer da mama, aumenta o risco de malignidade dos pólipos endometriais9, relatando uma prevalência que varia de 30 a 60% e maior associação desses pólipos com carcinomas10.

Estudo brasileiro realizado por Costa-Paiva et al.11 com análise de 870 pólipos endometriais ressecados por histeroscopia e diagnosticados histologicamente mostrou que os únicos fatores associados ao maior risco de malignidade foram o sangramento pós-menopausa e idade superior a 60 anos, com razão de prevalência de 3,6 (IC95% 1,6–7,9) e 1,05 (IC95% 1,01–1,09), respectivamente, comparado a mulheres assintomáticas.

O tamanho dos pólipos também parece estar associado ao risco de malignidade. Estudos mostram que pólipos com mais de 15 mm têm maior risco de estar associados à hiperplasia atípica e carcinoma endometrial comparados a pólipos menores3,12,13.

Em relação a métodos disponíveis para o diagnóstico, a ultrassonografia pélvica transvaginal fornece informação confiável para a detecção do pólipo endometrial e deve ser o método de escolha para investigação inicial. Para mulheres em que a ultrassonografia isolada mostra achados incertos, a utilização de contraste intrauterino na histerossonografia também melhora a capacidade diagnóstica dessas lesões endometriais. Entretanto, a histeroscopia com retirada da lesão continua sendo o padrão-ouro para o diagnóstico e tratamento dos pólipos5.

A histeroscopia diagnóstica tem alta acurácia para o diagnóstico dos pólipos endometriais, mas a estimativa de lesões hiperplásicas e pré-malignas é baixa. A especificidade do diagnóstico visual, na histeroscopia, para detectar câncer endometrial em pólipos endometriais é baixa, e mesmo com biópsias nem todas as lesões malignas endometriais associadas aos pólipos são detectadas. Portanto seria mais prudente, ao se encontrar um pólipo endometrial durante a realização de uma histeroscopia diagnóstica, ressecar toda a estrutura encontrada para, assim, obtermos uma avaliação histológica fidedigna. O pedículo e o endométrio adjacente devem estar livres de câncer para excluir pólipos invadidos por câncer de endométrio, ou para excluir um câncer primário do pólipo que se propagou para o endométrio adjacente14.

Para decidir a melhor conduta a ser tomada na presença de pólipos endometriais deve-se considerar a necessidade de excluir malignidade, a presença de sangramento ou se existe infertilidade. Meta-análises mostram claramente que mulheres na pós-menopausa e a presença de sangramento são dois fatores cruciais de maior risco para malignidade1,7. Esses dados trouxeram um pouco mais de clareza sobre quais pólipos poderiam esperar e quais exigem atenção imediata. As opções terapêuticas incluem tratamento conservador, ressecção cirúrgica por histeroscopia e a histerectomia como uma opção terapêutica radical.

Quanto ao tratamento conservador, pouco se conhece sobre a evolução natural dos pólipos endometriais, mas alguns estudos mostram que os pólipos podem regredir espontaneamente em aproximadamente 25% dos casos, principalmente os pólipos pequenos com menos de 10 mm cujo risco de malignidade é menor7,15,16.

Assim, para mulheres na pré-menopausa assintomáticas sem fatores de risco para malignidade existe a opção de tratamento expectante. A remoção cirúrgica estaria indicada naquelas com: pólipos maiores de 15 mm, pólipos múltiplos e nas com infertilidade, para melhorar as taxas de gravidez7,15,17.

Em relação ao tratamento cirúrgico é importante ressaltar que a remoção cirúrgica às cegas por curetagem é incompleta em cerca de metade dos casos16,18,19, e por isso não deve ser usada para tratamento. Quando existe indicação cirúrgica e a histeroscopia não estiver disponível, a paciente deve ser referenciada para serviços em que é possível o tratamento histeroscópico adequado6.

Para mulheres pré-menopausa sintomáticas a polipectomia histeroscópica é recomendada para controle do sangramento, mostrando bons resultados em 75 a 100% dos casos20. O resultado da polipectomia parece melhorar principalmente o sangramento intermenstrual; entretanto, naquelas com sangramento menstrual muito abundante pode não ser suficiente para resolução completa do sintoma. A histeroscopia cirúrgica é geralmente considerada de fácil realização em mãos de ginecologistas treinados, sendo o risco de complicações baixo, menor que 0,5%21.

Em mulheres pós-menopáusicas assintomáticas, apesar do baixo risco de malignidade, a falta de conhecimento da etiopatogenia dessas lesões polipoides ainda não nos permite uma conduta expectante com tranquilidade na pós-menopausa, mesmo na ausência de fatores de risco conhecidos. Assim, o tratamento deve ser individualizado em função da concomitância de outros fatores de risco para malignidade como pólipos maiores de 15 mm, presença de HAS, DM, obesidade, uso de tamoxifeno e o estado geral da paciente com ampla discussão e esclarecimento da paciente5,6. Quando se optar por um tratamento conservador, um estreito acompanhamento dessas pacientes deverá ser realizado com ultrassonografias pélvicas periódicas ou histeroscopia diagnóstica; entretanto, não existe na literatura recomendação sobre qual o intervalo ideal para realização desse acompanhamento. O aparecimento de sangramento ou alterações ultrassonográficas implica mudança para remoção cirúrgica imediata.

Mulheres pós-menopáusicas sintomáticas apresentam maior risco de malignidade e devem ter os pólipos removidos por histeroscopia cirúrgica para tratamento e para excluir malignidade5-7.

A histerectomia é uma conduta de exceção devido a sua natureza invasiva, riscos cirúrgicos e custos, devendo ser reservada para casos excepcionais6. Ainda assim, quando existe indicação de histerectomia, deve-se ter uma avaliação histológica endometrial prévia para afastar malignidade antes da histerectomia.

Embora os pólipos endometriais sejam comuns e a polipectomia histeroscópica amplamente realizada, não existe consenso na literatura sobre o tratamento dos pólipos e é importante lembrar que as evidências são baseadas principalmente em estudos observacionais, retrospectivos ou série de casos, o que limita a força dessas recomendações.

Recebido 27/09/2012

Aceito com modificações 14/12/2012

Trabalho realizado no Departamento de Tocoginecologia, Faculdade de Ciências Médicas, Universidade Estadual de Campinas – UNICAMP – Campinas (SP), Brasil.

  • 1. Lee SC, Kaunitz AM, Sanchez-Ramos L, Rhatigan RM. The oncogenic potential of endometrial polyps: a systematic review and meta-analysis. Obstet Gynecol. 2010;116(5):1197-205.
  • 2. Kim KR, Peng R, Ro JY, Robboy SJ. A diagnostically useful histopathologic feature of endometrial polyp: the long axis of endometrial glands arranged parallel to surface epithelium. Am J Surg Pathol. 2004;28(8):1057-62.
  • 3. Dreisler E, Stampe Sorensen S, Ibsen PH, Lose G. Prevalence of endometrial polyps and abnormal uterine bleeding in a Danish population aged 20-74 years. Ultrasound Obstet Gynecol. 2009;33(1):102-8.
  • 4. Anastasiadis PG, Koutlaki NG, Skaphida PG, Galazios GC, Tsikouras PN, Liberis VA. Endometrial polyps: prevalence, detection, and malignant potential in women with abnormal uterine bleeding. Eur J Gynaecol Oncol. 2000;21(2):180-3.
  • 5. American Association of Gynecologic Laparoscopists. AAGL practice report: practice guidelines for the diagnosis and management of endometrial polyps. J Minim Invasive Gynecol. 2012;19(1):3-10.
  • 6. Salim S, Won H, Nesbitt-Hawes E, Campbell N, Abbott J. Diagnosis and management of endometrial polyps: a critical review of the literature. J Minim Invasive Gynecol. 2011;18(5):569-81.
  • 7. Lieng M, Istre O, Qvigstad E. Treatment of endometrial polyps: a systematic review. Acta Obstet Gynecol Scand. 2010;89(8):992-1002.
  • 8. Antunes A Jr, Costa-Paiva L, Arthuso M, Costa JV, Pinto-Neto AM. Endometrial polyps in pre- and postmenopausal women: factors associated with malignancy. Maturitas. 2007;57(4):415-21.
  • 9. Cohen I. Endometrial pathologies associated with postmenopausal tamoxifen treatment. Gynecol Oncol. 2004;94(2):256-66.
  • 10. Runowicz CD, Costantino JP, Wickerham DL, Cecchini RS, Cronin WM, Ford LG, et al. Gynecologic conditions in participants in the NSABP breast cancer prevention study of tamoxifen and raloxifene (STAR). Am J Obstet Gynecol. 2011;205(6):535.e1-5.
  • 11. Costa-Paiva L, Godoy CE Jr, Antunes A Jr, Caseiro JD, Arthuso M, Pinto-Neto AM. Risk of malignancy in endometrial polyps in premenopausal and postmenopausal women according to clinicopathologic characteristics. Menopause. 2011;18(12):1278-82.
  • 12. Elliott J, Connor ME, Lashen H. The value of outpatient hysteroscopy in diagnosing endometrial pathology in postmenopausal women with and without hormone replacement therapy. Acta Obstet Gynecol Scand. 2003;82(12):1112-9.
  • 13. Hassa H, Tekin B, Senses T, Kaya M, Karatas A. Are the site, diameter, and number of endometrial polyps related with symptomatology? Am J Obstet Gynecol. 2006;194(3):718-21.
  • 14. Sherman ME, Mazur MT, Kurman RJ. Benign diseases of endometrium. In: Kurman RJ (Ed.). Blaustein's pathology of the female genital tract. 5th ed. New York: Springer Verlag; 2002. p. 421-66.
  • 15. Ferrazzi E, Zupi E, Leone FP, Savelli L, Omodei U, Moscarini M, et al. How often are endometrial polyps malignant in asymptomatic postmenopausal women? A multicenter study. Am J Obstet Gynecol. 2009;200(3):235.e1-6.
  • 16. Svirsky R, Smorgick N, Rozowski U, Sagiv R, Feingold M, Halperin R, et al. Can we rely on blind endometrial biopsy for detection of focal intrauterine pathology? Am J Obstet Gynecol. 2008;199(2):115.e1-3.
  • 17. Lieng M, Istre O, Sandvik L, Qvigstad E. Prevalence, 1-year regression rate, and clinical significance of asymptomatic endometrial polyps: cross-sectional study. J Minim Invasive Gynecol. 2009;16(4):465-71.
  • 18. Bettocchi S, Ceci O, Vicino M, Marello F, Impedovo L, Selvaggi L. Diagnostic inadequacy of dilatation and curettage. Fertil Steril. 2001;75(4):803-5.
  • 19. Nathani F, Clark TJ. Uterine polypectomy in the management of abnormal uterine bleeding: A systematic review. J Minim Invasive Gynecol. 2006;13(4):260-8.
  • 20. Pérez-Medina T, Bajo-Arenas J, Salazar F, Redondo T, Sanfrutos L, Alvarez P, et al. Endometrial polyps and their implication in the pregnancy rates of patients undergoing intrauterine insemination: a prospective, randomized study. Hum Reprod. 2005;20(6):1632-5.
  • 21. Jansen FW, Vredevoogd CB, van Ulzen K, Hermans J, Trimbos JB, Trimbos-Kemper TC. Complications of hysteroscopy: a prospective, multicenter study. Obstet Gynecol. 2000;96(2):266-70.
  • Correspondência:
    Lucia Costa-Paiva
    Departamento de Tocoginecologia, Faculdade de Ciências Médicas, Universidade Estadual de Campinas
    Rua Alexander Fleming, 101 – Cidade Universitária "Zeferino Vaz" – Barão Geraldo
    CEP: 13083-881. Campinas (SP), Brasil
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      06 Jun 2013
    • Data do Fascículo
      Abr 2013
    Federação Brasileira das Sociedades de Ginecologia e Obstetrícia Av. Brigadeiro Luís Antônio, 3421, sala 903 - Jardim Paulista, 01401-001 São Paulo SP - Brasil, Tel. (55 11) 5573-4919 - Rio de Janeiro - RJ - Brazil
    E-mail: editorial.office@febrasgo.org.br