Acessibilidade / Reportar erro

Qualidade de vida de gestantes infectadas pelo vírus da imunodeficiência humana (HIV) na cidade de São Paulo

Quality of life of pregnant women infected with the human immunodeficiency virus (HIV) in the city of São Paulo

Resumos

OBJETIVO:

Avaliar a qualidade de vida (QV) de gestantes infectadas pelo HIV, utilizando o questionário HIV/AIDS - Targeted Quality of Life (HAT-QoL).

MÉTODOS:

Estudo descritivo que incluiu 60 gestantes atendidas no Núcleo Multidisciplinar de Patologias Infecciosas na Gestação (NUPAIG) - UNIFESP/EPM e na rede de referência da Secretaria Municipal de São Paulo. Foi realizado no período de fevereiro de 2011 a outubro de 2012. Foram coletadas variáveis sociodemográficas e clínicas de 60 gestantes infectadas pelo HIV, que responderam o questionário HAT-QoL, o qual incluiu 34 questões sobre qualidade de vida.

RESULTADOS:

A média de idade foi 30 anos e o tempo médio de infecção pelo HIV foi de 5,7 anos. Somente 8,3% das pacientes tinham contagem de células CD4 ≤200 células mm³ e 45% apresentavam carga viral indetectável. Os escores médios dos domínios variaram entre 47,5 e 83,7. Os domínios com escores mais baixos foram preocupações financeiras e preocupações com o sigilo. Os domínios com escores mais altos e menor impacto na qualidade de vida foram preocupações com a medicação e confiança no profissional.

CONCLUSÃO:

Neste estudo inicial, com 60 grávidas, concluímos que o HAT-QOL poderá contribuir para a avaliação da qualidade de vida na população de gestantes infectadas pelo HIV no Brasil.

Qualidade de vida ; Gestantes ; HIV; Cuidado pré-natal ; Questionários


PURPOSE:

It was to assess the quality of life (QOL) of HIV-infected pregnant women using the HIV/AIDS - Targeted Quality of Life (HAT-QoL) questionnaire.

METHODS:

A descriptive study of 60 pregnant women attended at the Multidisciplinary Nucleus of Infectious Diseases During Pregnancy (NUPAIG) - UNIFESP/EPM and in the referral network of the Municipal Office of São Paulo, conducted from February 2011 to October 2012. Sociodemographic and clinical variables were collected from 60 HIV-infected pregnant women who answered the HAT-QoL questionnaire, which included 34 questions about quality of life.

RESULTS:

The average age was 30 years and the average period of HIV infection was 5.7 years. Only 8.3% of patients had a CD4 cell score of ≤200 cells/mm³ and 45% showed undetectable viral load. The average domain scores ranged from 47.5 to 83.7. The domains with the lowest scores were financial concerns and concerns about secrecy. The domains with the highest scores and lower impact on quality of life were concerns about medication and confidence in the professional.

CONCLUSION:

In this initial study with 60 pregnant women, we concluded that the HAT-QOL can contribute to the assessment of quality of life in the population of HIV-infected pregnant women in Brazil.

Quality of life ; Pregnant women ; HIV ; Prenatal care ; Questionnaires


Introdução

O advento de medicamentos cada vez mais potentes, desenvolvidos na tentativa de reverter a imunoincompetência causada pelo HIV-1 aos indivíduos infectados pelo HIV, oferece, na atualidade, maior sobrevida e melhor qualidade de vida para o paciente, o que foi um grande avanço para essa população11. Samuel R, Bettiker R, Suh B. Antiretroviral therapy 2006: pharmacology, applications, and special situations. Arch Pharm Res. 2006;29(6):431-58..

No entanto, ainda é crescente a preocupação com as estratégias de enfrentamento da epidemia mundialmente22. Joint United Nations Programme on HIV/AIDS (UNAIDS). Global report: UNAIDS report on the global AIDS epidemic 2013. Geneva: WHO; 2013.. Nesse contexto, foram notificados no município de São Paulo, de janeiro de 2000 a junho de 2012, 6.107 casos de gestantes com HIV positivo, dos quais a realização de pré-natal manteve-se acima de 93%. Além disso, houve uma melhora acentuada no desempenho dos medicamentos antirretrovirais nesse período, e a porcentagem das gestantes infectadas pelo vírus que fizeram uso desses fármacos chegou a 89,6% em 201233. Transmissão vertical do HIV. Bol Epidemiol AIDS/DST e Hepatites B e C do Município de São Paulo [Internet]. 2012;15(16):52-4 [citado 2013 Out 11]. Disponível em: http://www10.prefeitura.sp.gov.br/dstaids/novo_site/images/fotos/boletim2012.pdf
Disponível em: http://www10.prefeitura.s...
.

As gestantes com HIV positivo devem ser acompanhadas visando a cobrir diferentes necessidades do ciclo gravídico puerperal, contando com atuação conjunta de equipe multiprofissional (médicos ginecologistas e obstetras, infectologistas, enfermeiros, psicólogos, nutricionistas e assistentes sociais), o que dará à paciente melhor qualidade de vida e, consequentemente, diminuirá a morbidade e mortalidade do binômio mãe-concepto44. Lindsey PC, Amed AM. Acompanhamento da mulher HIV positivo no ciclo gravídico puerperal. In: Bortoletti FF, Moron AF, Bortoletti Filho J, Nakamura UM, Santana RM, Mattar R. Psicologia na prática obstétrica: abordagem interdisciplinar. Barueri: Manole; 2007. p. 289-90. .

A compreensão da qualidade de vida das pessoas que vivem com o HIV/AIDS é fundamental, considerando a cronicidade da infecção, o tratamento, a maior sobrevida e o aspecto estigmatizante da doença, conforme trabalho desenvolvido em dois ambulatórios da rede SUS do interior de São Paulo com mulheres55. Gaspar J, Reis RK, Pereira FMV, Neves LAS, Castrighini CC, Gir E. Qualidade de vida de mulheres vivendo com HIV/Aids de um município do interior de paulista. Rev Esc Enferm USP. 2011;45(1):230-6. .

Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), qualidade de vida envolve o bem-estar físico, mental, psicológico e emocional do indivíduo66. World Health Organization. Constitution. Geneva: WHO; 1946.. Contudo, não é fácil aferi-la.

Entre vários instrumentos, optamos por utilizar o questionário de qualidade de vida direcionado para HIV/AIDS, traduzido, adaptado e validado para pacientes HIV no Brasil HAT-QoL77. De Soárez PC, Castelo A, Abrão P, Holmes WC, Ciconelli RM. Tradução e validação de um questionário de avaliação de qualidade de vida em AIDS no Brasil. Rev Panam Salud Pública. 2009;25(1):69-76..

O objetivo desse trabalho foi avaliar a qualidade de vida de gestantes infectadas pelo HIV atendidas em centros de referência para esse tipo de intercorrência no município de São Paulo.

Métodos

Trata-se de um estudo descritivo que incluiu gestantes infectadas pelo HIV atendidas no Núcleo Multidisciplinar de Patologias Infecciosas na Gestação (NUPAIG) da Universidade Federal de São Paulo e na rede de referência da Secretaria Municipal da Saúde de São Paulo. O levantamento foi realizado no período de fevereiro de 2011 a outubro de 2012.

A população do estudo era uma amostra de conveniência composta por gestantes infectadas pelo HIV, após passarem pela admissão do pré-natal e fazerem a primeira contagem de células CD4+ e quantificação da carga viral. Foram excluídas as analfabetas, menores de idade, pacientes comprovadamente psiquiátricas e gestantes vivendo com privação de liberdade.

A coleta de dados foi realizada em sala privativa dos ambulatórios, o que permitiu sigilo. Para melhor caracterização da população, foram estabelecidas as seguintes variáveis sociodemográficas: idade, estado civil, raça, grau de instrução, profissão, renda familiar e hábitos de vida (tabagismo, etilismo e consumo de drogas), bem como dados clínicos: CD4 (mm³) e carga viral.

No mesmo encontro, na forma de entrevista, foi aplicado o instrumento HIV/AIDS - Targeted Quality of Life (HAT-QoL)77. De Soárez PC, Castelo A, Abrão P, Holmes WC, Ciconelli RM. Tradução e validação de um questionário de avaliação de qualidade de vida em AIDS no Brasil. Rev Panam Salud Pública. 2009;25(1):69-76., específico para avaliação de qualidade de vida em pacientes infectados pelo HIV. O HAT-QoL foi adaptado culturalmente e teve as propriedades psicométricas da versão em português do Brasil avaliadas. É compreensível e de fácil aplicação, tendo apresentado boa validade de construto e excelente confiabilidade. É composto por 34 itens, divididos em nove domínios (função geral, contentamento com a vida, preocupações com a saúde, preocupações financeiras, preocupações com a medicação, aceitação do HIV, preocupações com o sigilo, confiança no profissional e função sexual). Para responder a cada item, as grávidas eram conduzidas a refletir sobre sua qualidade de vida nas últimas quatro semanas. As respostas têm formato de escala do tipo Likert de cinco pontos ("todo o tempo", "a maior parte do tempo", "parte do tempo", "pouco tempo" e "nunca").

Em cada domínio, zero era o menor escore possível e cem o maior. Quanto maior o escore, menor o impacto da infecção pelo HIV sobre a qualidade de vida da gestante; ao contrário, quanto menor o escore, mais comprometida se encontrava a paciente no que se refere a cada um dos domínios relacionados anteriormente.

Para a análise, os dados foram organizados em planilha Excel, com dupla digitação, para evitar erros de transcrição. Os dados foram tabulados e transferidos para o software estatístico Minitab, versão 16.0.

Para as variáveis de natureza quantitativa (numérica), foram calculadas algumas medidas-resumo, como média, mediana, valor mínimo, valor máximo e desvio padrão; para as variáveis categóricas, foram usados números absolutos e relativos (n e %). Em conformidade com as variáveis sociodemográficas e clínicas, fizemos uma exposição descritiva.

Este estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética Institucional da Escola Paulista de Medicina da Universidade Federal de São Paulo em 24 de setembro de 2010 (1358/10) e pela Secretaria Municipal de Saúde (Comitê de Ética em Pesquisa), conforme parecer 026/12 - CEP/SMS de 7 de fevereiro de 2012.

Resultados

Os resultados foram estabelecidos a partir de um total de 60 gestantes infectadas pelo HIV. No serviço do NUPAIG, quatro pacientes foram excluídas (um parto prematuro sem resultado de CD4 e carga viral nas últimas quatro semanas, dois casos de aborto espontâneo também sem tipagem recente e um caso psiquiátrico). Nos centros de referência da rede municipal da cidade de São Paulo, apenas um caso foi excluído (paciente presidiária).

A idade das gestantes variou de 18 a 45 anos, com média de 30 anos. A idade gestacional das pacientes apresentou média de 26 semanas. O tempo médio de infecção pelo vírus foi de 68,3 meses (5,7 anos) - no mínimo 2 e no máximo 252 meses. Somente 2 haviam contraído o vírus por transmissão vertical; 44 já tinham conhecimento da infecção pelo HIV antes daquela gestação. Da amostra, apenas 8,3% apresentaram CD4 ≤200 mm³. Quanto à carga viral, foi avaliada entre detectável (33 casos) e indetectável (27). Apenas 7 gestantes não estavam sob uso do antirretroviral para HIV positivo; 48 gestantes utilizaram esse medicamento nos dois meses anteriores.

Além desses dados, duas tabelas foram confeccionadas. A Tabela 1 apresenta alguns dados sociodemográficos e clínicos para caracterização da população. A Tabela 2apresenta a descrição dos escores de cada domínio do HAT-QoL.

Tabela 1
Dados sociodemográficos e clínicos das 60 gestantes infectadas pelo HIV

Tabela 2
Escores dos domínios do HIV/Aids - Targeted Quality of Life

Discussão

Na nossa revisão internacional de literatura, não encontramos trabalhos com gestantes para as quais tenha sido usado o HAT-QoL, portanto nos restringimos a citar apenas dois estudos, que utilizaram outros instrumentos. Esses trabalhos foram desenvolvidos com grávidas em Portugal e na África do Sul88. Nuwagaba-Biribonwoha H, Mayon-White RT, Okong P, Carpenter LM, Jenkinson C. The impact of HIV on maternal quality of life in Uganda. AIDS Care. 2006;18(6):614-20. , 99. Pereira M, Canavarro MC. Quality of life and emotional distress among HIV-positive women during transition to motherhood. Span J Psychol. 2012;15(3):1303-14., países onde, apesar das diferenças intercontinentais, as grávidas infectadas pelo HIV mantinham menores escores de qualidade de vida perante as soronegativas.

O questionário HAT-QoL, desenvolvido por Holmes e Shea1010. Holmes WC, Shea JA. Performance of a new, HIV/AIDS-targeted quality of life (HAT-QoL) instrument in asymptomatic seropositive individuals. Qual Life Res. 1997;6(6):561-71. e traduzido por De Soárez et al.77. De Soárez PC, Castelo A, Abrão P, Holmes WC, Ciconelli RM. Tradução e validação de um questionário de avaliação de qualidade de vida em AIDS no Brasil. Rev Panam Salud Pública. 2009;25(1):69-76. para o português, adaptado culturalmente e avaliado em suas propriedades psicométricas (validade e confiabilidade) em pacientes infectadas pelo HIV, se mostrou o mais adequado para as gestantes dessa amostra, por ser destinado especificamente a essa população e também porque a literatura internacional é escassa quanto a grávidas HIV positivo que tenham utilizado tal questionário. Faltava assim um instrumento de atuação clínica que pudesse fundamentar essa assistência na realidade da cidade de São Paulo em centros de referência.

No que tange aos nove domínios do HAT-Qol, os mais comprometidos foram os de preocupações com o sigilo e financeiras, o que coincide com a análise bibliográfica sobre indivíduos (não gestantes) portadores do vírus em alguns trabalhos no Brasil1010. Holmes WC, Shea JA. Performance of a new, HIV/AIDS-targeted quality of life (HAT-QoL) instrument in asymptomatic seropositive individuals. Qual Life Res. 1997;6(6):561-71.

11. Galvão MTG, Cerqueira ATAR, Machado-Marcondes J. Avaliação da qualidade de vida de mulheres com HIV/AIDS através do HAT-QoL. Cad Saúde Pública. 2004;20(2):430-7.
- 1212. Reis RK, Santos CB, Dantas RAS, Gir E. Qualidade de vida, aspectos sociodemográficos e de sexualidade de pessoas vivendo com HIV/AIDS. Texto Contexto Enferm. 2011;20(3):565-75.. Ainda assim, esses escores estão um pouco abaixo de 50, não sendo tão ruins quando comparados aos de pacientes sul-africanas1313. Makin JD, Forsyth BW, Visser MJ, Sikkema KJ, Neufeld S, Jeffery B. Factors affecting disclosure in South African HIV-positive pregnant women. AIDS Patient Care STDS. 2008;22(11):907-16. .

Com referência ao domínio função sexual, não podemos afirmar que as gestantes tenham refletido ao responder sobre esse aspecto, que terá que ser mais pesquisado. Segundo alguns autores, a sexualidade é um fenômeno de grande significado existencial. Seu padrão de normalidade ou anormalidade sofre muita influência dos valores socioculturais. A imagem do mal associado à infecção pelo HIV faz com que a sexualidade possa ser vista como anormal. Com o advento da terapia antirretroviral, houve um estímulo à sexualidade normal, o que poderia justificar o escore encontrado nessa pesquisa1414. Souto BGA, Kiyota LS, Bataline MP, Borges MF, Korkischko N, Carvalho SBB, et al. O sexo e a sexualidade em portadores do vírus da imunodeficiência humana. Rev Bras Clin Méd. 2009;7(3):188-91..

Outro domínio a ser destacado é o de contentamento com a vida, no qual o escore para qualidade de vida (67) corresponde a quanto a gestante está no controle de sua vida (satisfeita por estar saudável, com bom nível de atividades sociais). A satisfação na vida pode estar relacionada ao coping (enfrentamento da doença). Alguns autores que discorreram sobre esse aspecto referem bons resultados na qualidade de vida de 107 homens em clínicas especializadas em HIV/AIDS em Toronto (Canadá). Estes, em sua maioria, apresentaram apoio social positivo e bons recursos para enfrentamento da doença1515. Friedland J, Renwick R, McColl M. Coping and social support as determinants of quality of life in HIV/AIDS. AIDS Care. 1996;8(1):15-31.. Em pesquisa nacional1212. Reis RK, Santos CB, Dantas RAS, Gir E. Qualidade de vida, aspectos sociodemográficos e de sexualidade de pessoas vivendo com HIV/AIDS. Texto Contexto Enferm. 2011;20(3):565-75., o índice encontrado para o gênero feminino foi próximo ao nosso.

Quanto ao domínio aceitação do HIV, a pesquisa corrobora trabalho nacional1212. Reis RK, Santos CB, Dantas RAS, Gir E. Qualidade de vida, aspectos sociodemográficos e de sexualidade de pessoas vivendo com HIV/AIDS. Texto Contexto Enferm. 2011;20(3):565-75., somado ao fato de que acirradas campanhas governamentais vêm há anos divulgando e promovendo o conhecimento do vírus, com diretrizes claras preconizadas pelo Ministério da Saúde, incluindo aconselhamento para essa população em praticamente todas as redes HIV/AIDS1616. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Programa Nacional de DST e AIDS [Internet]. Recomendações para profilaxia da transmisão vertical do HIV e terapia antirretroviral em gestantes: manual de bolso. Brasília (DF): Ministério da Saúde; 2010 [citado 2013 Out 13]. Disponível em: <http://www.aids.gov.br/sites/default/files/consenso_gestantes_2010_vf.pdf>
Disponível em: <http://www.aids.gov.br/s...
. Diante desse quadro, não nos surpreendeu que tal dimensão obtivesse escore alto para qualidade de vida.

Com referência ao domínio função geral (percepção de dor e atividades gerais), perto de 70% da população evidenciou marcador de boa qualidade de vida. Contudo, é importante lembrar que as pesquisadas tinham por volta de 26 semanas de gravidez, período em que a mulher tende a se adaptar melhor à gestação, o que pode ter interferido na resposta. Nesse momento a grávida já está mais familiarizada com o estado gravídico e seus sinais peculiares1717. Tedesco JJA. A grávida: suas indagações e as dúvidas do obstetra. São Paulo: Atheneu; 1999. (enjoos, cefaleia, modificações da psique, hipersensibilidade das mamas, etc.); alguns desses sintomas estão inclusive mais estáveis. Sem contar com os benefícios de uma assistência de pré-natal mais especializada, na qual se prioriza a manutenção da saúde materna na melhor condição possível e a consequente redução da taxa de transmissão vertical1818. Lindsey PC, Amed AM. Acompanhamento da grávida HIV+. In: Camano L, Souza E, Sass N, Mattar R. Obstetrícia. Barueri: Manole; 2003. p. 593-9. (Guias de Medicina ambulatorial e hospitalar, UNIFESP/Escola Paulista de Medicina). .

Já o domínio relativo às preocupações com a saúde pode estar relacionado à especialização dos serviços de atendimento de pré-natal1818. Lindsey PC, Amed AM. Acompanhamento da grávida HIV+. In: Camano L, Souza E, Sass N, Mattar R. Obstetrícia. Barueri: Manole; 2003. p. 593-9. (Guias de Medicina ambulatorial e hospitalar, UNIFESP/Escola Paulista de Medicina). e ainda ao próprio fato de a gestante preocupar-se com a criança que vai nascer, o que foi perceptível no contato com as grávidas dessa amostra. Tais dados estão em consonância com pesquisa de adesão de gestantes com HIV/AIDS à terapia antirretroviral, que discorre sobre o medo das mães de passarem o vírus ao filho, o que impulsiona essa mulher a se cuidar e a aderir ao tratamento1919. Barros VL, Araújo MAL, Alcântara MNA, Guanabara MAO, Melo SP, Guedes SSS. Fatores que interferem na adesão de gestantes com HIV/AIDS à terapia antirretroviral. Rev Bras Promoç Saúde. 2011;24(4):396-403.. Trabalho recente sobre apego materno fetal em gestante que vive com HIV/AIDS não encontrou diferenças significativas entre grávidas infectadas pelo vírus e soronegativas quanto ao escore total de apego materno fetal. Tais evidências, com base nesses resultados, pressupõem que a presença do vírus não afetaria a capacidade da gestante de se vincular à criança que está para nascer2020. Faria ER, Gonçalves TR, Carvalho FT, Ruschel PP, Lopes RCS, Piccinini CA. Apego Materno Fetal em gestantes que vivem com HIV/AIDS. Estud Psicol (Natal). 2013;18(2):231-9. .

O escore médio do domínio confiança no profissional demonstrou uma relação saudável no binômio médico-paciente, pois interferiu positivamente na qualidade de vida. A relação que a mulher grávida tem com seus cuidadores de saúde, notoriamente os médicos, pode afetar as decisões que ela toma sobre o atendimento no pré-natal e a consequente adesão medicamentosa na prevenção da transmissão do HIV ao filho2121. Barry OM, Bergh AM, Makin JD, Etsane E, Kershaw TS, Forsyth BW. Development of a measure of the patient-provider relationship in antenatal care and its importance in PMTCT. AIDS Care. 2012;24(6):680-6..

O segundo maior escore médio foi para o domínio das preocupações com a medicação, muito próximo do anterior. Conforme já mencionado, o advento dos medicamentos para o HIV mudou o panorama da doença11. Samuel R, Bettiker R, Suh B. Antiretroviral therapy 2006: pharmacology, applications, and special situations. Arch Pharm Res. 2006;29(6):431-58.. Uma revisão sobre a adesão à terapia antirretroviral em adultos com HIV/AIDS demonstrou que, entre 40 produções científicas com esse enfoque, 72,5% foram originárias da área da Medicina, seguida de Enfermagem (15%), Psicologia (3%) e Farmácia (2%), no período de 2002 a 2011. O Brasil apresentou à época seis pesquisas, ficando atrás apenas dos EUA e da Inglaterra, o que reforça a importância desse tipo de política pública e de bem-estar, que encontra consonância com o resultado satisfatório no domínio (supramencionado)2222. Zuge SS, Padoin SMM, Brum CN, Paula CC, Magnago TSBS, Santos EEP. Adhesión a la terapia antirretroviral en adultos con VIH/SIDA: la naturaleza y la evolución de la producción científica. Enferm Comunitária [Internet]. 2012;8(2) [citado 2014 Abr 14]. Disponible en: http://www.index-f.com/comunitaria/v8n2/ec8032e.php
Disponible en: http://www.index-f.com/co...
.

Pode-se inferir com o nosso estudo que a qualidade de vida das gestantes infectadas pelo HIV atendidas nos centros de referência citados apresentou-se de regular para boa. O HAT-QoL pode contribuir para a avaliação da qualidade de vida na população de gestantes infectadas pelo HIV, apesar de este ser um estudo inicial e não ter abarcado outros serviços públicos e privados, o que poderá ser averiguado por meio de outros trabalhos. Sugere-se que estudos sejam realizados com uma amostragem superior de grávidas, incluindo outras redes de saúde.

Referências

  • 1
    Samuel R, Bettiker R, Suh B. Antiretroviral therapy 2006: pharmacology, applications, and special situations. Arch Pharm Res. 2006;29(6):431-58.
  • 2
    Joint United Nations Programme on HIV/AIDS (UNAIDS). Global report: UNAIDS report on the global AIDS epidemic 2013. Geneva: WHO; 2013.
  • 3
    Transmissão vertical do HIV. Bol Epidemiol AIDS/DST e Hepatites B e C do Município de São Paulo [Internet]. 2012;15(16):52-4 [citado 2013 Out 11]. Disponível em: http://www10.prefeitura.sp.gov.br/dstaids/novo_site/images/fotos/boletim2012.pdf
    » Disponível em: http://www10.prefeitura.sp.gov.br/dstaids/novo_site/images/fotos/boletim2012.pdf
  • 4
    Lindsey PC, Amed AM. Acompanhamento da mulher HIV positivo no ciclo gravídico puerperal. In: Bortoletti FF, Moron AF, Bortoletti Filho J, Nakamura UM, Santana RM, Mattar R. Psicologia na prática obstétrica: abordagem interdisciplinar. Barueri: Manole; 2007. p. 289-90.
  • 5
    Gaspar J, Reis RK, Pereira FMV, Neves LAS, Castrighini CC, Gir E. Qualidade de vida de mulheres vivendo com HIV/Aids de um município do interior de paulista. Rev Esc Enferm USP. 2011;45(1):230-6.
  • 6
    World Health Organization. Constitution. Geneva: WHO; 1946.
  • 7
    De Soárez PC, Castelo A, Abrão P, Holmes WC, Ciconelli RM. Tradução e validação de um questionário de avaliação de qualidade de vida em AIDS no Brasil. Rev Panam Salud Pública. 2009;25(1):69-76.
  • 8
    Nuwagaba-Biribonwoha H, Mayon-White RT, Okong P, Carpenter LM, Jenkinson C. The impact of HIV on maternal quality of life in Uganda. AIDS Care. 2006;18(6):614-20.
  • 9
    Pereira M, Canavarro MC. Quality of life and emotional distress among HIV-positive women during transition to motherhood. Span J Psychol. 2012;15(3):1303-14.
  • 10
    Holmes WC, Shea JA. Performance of a new, HIV/AIDS-targeted quality of life (HAT-QoL) instrument in asymptomatic seropositive individuals. Qual Life Res. 1997;6(6):561-71.
  • 11
    Galvão MTG, Cerqueira ATAR, Machado-Marcondes J. Avaliação da qualidade de vida de mulheres com HIV/AIDS através do HAT-QoL. Cad Saúde Pública. 2004;20(2):430-7.
  • 12
    Reis RK, Santos CB, Dantas RAS, Gir E. Qualidade de vida, aspectos sociodemográficos e de sexualidade de pessoas vivendo com HIV/AIDS. Texto Contexto Enferm. 2011;20(3):565-75.
  • 13
    Makin JD, Forsyth BW, Visser MJ, Sikkema KJ, Neufeld S, Jeffery B. Factors affecting disclosure in South African HIV-positive pregnant women. AIDS Patient Care STDS. 2008;22(11):907-16.
  • 14
    Souto BGA, Kiyota LS, Bataline MP, Borges MF, Korkischko N, Carvalho SBB, et al. O sexo e a sexualidade em portadores do vírus da imunodeficiência humana. Rev Bras Clin Méd. 2009;7(3):188-91.
  • 15
    Friedland J, Renwick R, McColl M. Coping and social support as determinants of quality of life in HIV/AIDS. AIDS Care. 1996;8(1):15-31.
  • 16
    Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Programa Nacional de DST e AIDS [Internet]. Recomendações para profilaxia da transmisão vertical do HIV e terapia antirretroviral em gestantes: manual de bolso. Brasília (DF): Ministério da Saúde; 2010 [citado 2013 Out 13]. Disponível em: <http://www.aids.gov.br/sites/default/files/consenso_gestantes_2010_vf.pdf>
    » Disponível em: <http://www.aids.gov.br/sites/default/files/consenso_gestantes_2010_vf.pdf>
  • 17
    Tedesco JJA. A grávida: suas indagações e as dúvidas do obstetra. São Paulo: Atheneu; 1999.
  • 18
    Lindsey PC, Amed AM. Acompanhamento da grávida HIV+. In: Camano L, Souza E, Sass N, Mattar R. Obstetrícia. Barueri: Manole; 2003. p. 593-9. (Guias de Medicina ambulatorial e hospitalar, UNIFESP/Escola Paulista de Medicina).
  • 19
    Barros VL, Araújo MAL, Alcântara MNA, Guanabara MAO, Melo SP, Guedes SSS. Fatores que interferem na adesão de gestantes com HIV/AIDS à terapia antirretroviral. Rev Bras Promoç Saúde. 2011;24(4):396-403.
  • 20
    Faria ER, Gonçalves TR, Carvalho FT, Ruschel PP, Lopes RCS, Piccinini CA. Apego Materno Fetal em gestantes que vivem com HIV/AIDS. Estud Psicol (Natal). 2013;18(2):231-9.
  • 21
    Barry OM, Bergh AM, Makin JD, Etsane E, Kershaw TS, Forsyth BW. Development of a measure of the patient-provider relationship in antenatal care and its importance in PMTCT. AIDS Care. 2012;24(6):680-6.
  • 22
    Zuge SS, Padoin SMM, Brum CN, Paula CC, Magnago TSBS, Santos EEP. Adhesión a la terapia antirretroviral en adultos con VIH/SIDA: la naturaleza y la evolución de la producción científica. Enferm Comunitária [Internet]. 2012;8(2) [citado 2014 Abr 14]. Disponible en: http://www.index-f.com/comunitaria/v8n2/ec8032e.php
    » Disponible en: http://www.index-f.com/comunitaria/v8n2/ec8032e.php

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Maio 2014

Histórico

  • Recebido
    16 Jan 2014
  • Aceito
    17 Abr 2014
Federação Brasileira das Sociedades de Ginecologia e Obstetrícia Av. Brigadeiro Luís Antônio, 3421, sala 903 - Jardim Paulista, 01401-001 São Paulo SP - Brasil, Tel. (55 11) 5573-4919 - Rio de Janeiro - RJ - Brazil
E-mail: editorial.office@febrasgo.org.br