Bloqueio do receptor AT₁ da Angiotensina II reduz o número de folículos antrais em ratas com obesidade induzida por dieta de cafeteria

Blockade of AT₁ receptor of Angiotensin II reduces the number of antral follicles in female rats with obesity induced by cafeteria diet

Resumos

OBJETIVO:

Avaliar o desenvolvimento folicular em ratas Wistar com obesidade induzida por dieta de cafeteria (DCAF) submetidas à administração de losartan (LOS), um antagonista do receptor AT₁ da Angiotensina II.

MÉTODOS:

Aos 21 dias de vida, as ratas foram separadas aleatoriamente em dois grupos: controle (CTL), que recebeu ração padrão, e cafeteria (CAF), que recebeu a DCAF, altamente palatável e calórica. Aos 70 dias de vida, início da idade reprodutiva, animais do grupo CAF foram subdivididos em dois grupos (n=15/grupo): CAF, que recebeu água, e CAF+LOS, que recebeu 30 mg/kg de peso corporal (PC) de LOS por gavagem durante 30 dias. O grupo CTL também recebeu água por gavagem. Aos 100 dias de vida foi realizada a eutanásia dos animais e o PC e das gorduras retroperitoneal, perigonadal e subcutânea foi avaliado. Os ovários direitos foram retirados para contagem do número dos diferentes tipos de folículos ovarianos. As concentrações plasmáticas dos hormônios folículo-estimulantes (FSH), luteinizante (LH), prolactina (PRL) e progesterona foram avaliadas. Os resultados foram expressos como média±erro padrão da média. Para análise estatística, foi utilizado one-way ANOVA, seguido pelo pós-teste de Newman-Keuls (p<0,05).

RESULTADOS:

O PC e das gorduras, assim como o número de folículos antrais, foi elevado no grupo CAF em relação ao CTL. Todavia, as concentrações de FSH e LH foram mais baixas entre os animais CAF. A administração de LOS reduziu o PC e das gorduras retroperitoneal e subcutânea, bem como o número de folículos antrais. O tratamento com LOS atenuou a redução das concentrações de FSH e de LH. As concentrações de progesterona e PRL foram semelhantes entre os grupos estudados.

CONCLUSÃO:

O uso de LOS pode favorecer o desenvolvimento folicular em fêmeas obesas e pode possibilitar sua utilização como fármaco coadjuvante no tratamento da infertilidade associada à obesidade.

Obesidade; Infertilidade; Losartan; Folículo ovarianano/crescimento & desenvolvimento; Ratos Wistar

PURPOSE:

To evaluate the follicular development of female Wistar rats with obesity induced by the cafeteria diet, submitted to the administration of losartan (LOS), an antagonist of the AT₁ receptor of Angiotensin II.

METHODS:

At weaning (21 days of age), female Wistar rats were randomly divided, into two groups: control (CTL) that received standard chow and cafeteria (CAF) that received a cafeteria diet, a highly palatable and highly caloric diet. At 70 days of age, at the beginning of the reproductive age, animals of the CAF group were subdivided into two groups (n=15/group): CAF, that received water, and CAF+LOS, that received LOS for 30 days. The CTL group also received water by gavage. At 100 days of age, the animals were euthanized and body weight (BW) as well as the retroperitoneal, perigonadal and subcutaneous fat weights were analyzed. The right ovaries were isolated for counting the number of primary, secondary, antral and mature follicles. Plasma levels of FSH, LH, prolactin and progesterone hormones were analyzed. The results were expressed as mean±standard error of the mean. Data were analyzed statistically by one-way ANOVA followed by the Newman-Keuls post-test (p<0.05).

RESULTS:

BW and fat weight, as well as the number of antral follicles, were higher in the CAF group compared to the CTL group. However, FSH and LH levels were lower in CAF animals compared to CTL animals. LOS administration attenuated the reduction of FSH and LH levels. Progesterone and PRL levels were similar among groups.

CONCLUSION:

LOS could improve follicular development in obese females and could be used as an adjunctive drug in the treatment of infertility associated with obesity.

Obesity; Infertility; Losartan; Ovarian follicle/growth & development; Rats, Wistar

Introdução

A obesidade é considerada, atualmente, um dos maiores problemas de saúde pública; os principais fatores responsáveis por essa pandemia são a redução da atividade física, as mudanças na composição das dietas e o aumento na ingestão calórica¹. Tem se observado também aumento no índice de obesidade na infância e na adolescência, e muitas comorbidades associadas com essa doença adquiridas nessa fase podem se estender até a vida adulta².

A obesidade tem efeitos deletérios sobre as funções metabólicas e cardiovasculares e demonstrou-se que há relação entre obesidade e alterações na função reprodutiva, tanto em fêmeas de roedores³ quanto em mulheres⁴. Ratas com obesidade induzida, um modelo de dieta experimental com elevada palatabilidade e altamente calórica (dieta de cafeteria - DCAF) e que reflete a cultura alimentar ocidental associada à pandemia de obesidade, apresentam ausência dos picos pré-ovulatórios de luteinizante (LH) e progesterona, com consequente redução na ovulação⁵. Porém, os mecanismos envolvidos nessas alterações ainda não estão bem-estabelecidos.

Grande parte do conhecimento que possuímos, até o presente, sobre o controle do ciclo ovariano de vários mamíferos é baseada em estudos sobre o ciclo reprodutivo de ratas, que apresentam ovulação espontânea e um perfil de variações de gonadotrofinas e esteroides gonadais semelhantes ao da mulher, além de terem um ciclo reprodutivo de curta duração⁶.

A atividade do sistema renina-angiotensina (SRA) está aumentada na obesidade⁷ e pode ter efeito mediador nas alterações reprodutivas relacionadas com essa doença⁵. O bloqueio do receptor AT₁ da Angiotensina II, desde o desmame, em fêmeas de roedores alimentadas por DCAF previne a hipertrofia do tecido adiposo, melhora a sensibilidade à insulina, restabelece o pico pré-ovulatório de LH e a ovulação, além de melhorar o perfil reprodutivo das ratas⁸.

Diante do exposto, sugere-se que a Angiotensina II possa agir como um mediador nas disfunções reprodutivas associadas com a obesidade. Assim, o objetivo do presente estudo foi avaliar o efeito do tratamento com losartan (LOS), um antagonista do receptor AT₁ da Angiotensina II, sobre o desenvolvimento folicular ovariano de ratas com obesidade induzida por DCAF.

Métodos

O presente estudo consiste em uma análise experimental, utilizando-se rato como modelo animal. Ratas Wistar prenhas, provenientes do Biotério Central da Universidade Estadual do Oeste do Paraná (Unioeste), foram mantidas no Biotério Setorial do Laboratório de Fisiologia Endócrina e Metabolismo, em caixas individuais, em ambiente com ciclo claro-escuro de 12 horas, com temperatura controlada (22±1ºC) e com acesso livre a água e ração. Após o nascimento, no máximo 8 filhotes fêmeas foram mantidos com suas respectivas mães. Os filhotes machos foram descartados. Em todos os experimentos foram seguidas as normas contidas no Council for International Organization of Medical Sciences (CIOMS) e no Ethical Code for Animal Experimentation ⁹ e os preceitos do Colégio Brasileiro de Experimentação Animal (COBEA).

Aos 21 dias de vida, foi realizado o desmame e as ratas foram separadas em dois grupos: controle (CTL), que recebeu ração padrão para ratos (3,8 kcal/g: 70% de carboidratos, 20% de proteínas e 10% de gordura - Biobase, Brasil) e água, e cafeteria (CAF), que recebeu a DCAF, que consiste em alimentos processados, altamente palatáveis, com elevada quantidade de gordura e açúcares, incluindo mortadela, wafer, marshmallow, pão bisnaguinha, salsicha, salame, refrigerante, bolos, bolacha, salgadinhos de queijo e bacon e ração padrão⁸. Todas as manhãs, os componentes das dietas eram repostos; as caixas onde os animais estavam alojados eram trocadas a cada dois dias.

No início da idade reprodutiva das ratas, aos 70 dias de idade, além das respectivas dietas, os animais foram submetidos à administração de LOS ou água por gavagem. O grupo CTL recebeu água e o grupo CAF foi separado em dois subgrupos: CAF, que recebeu água, e CAF+LOS, que recebeu 30 mg/kg de peso corporal (PC)/dia de LOS¹⁰ até a eutanásia, com 100 dias de idade, totalizando 30 dias de administração. Cada grupo foi composto por 15 animais.

A partir do 70º dia de vida, foi coletado diariamente, a partir das 9 horas da manhã, o esfregaço vaginal de todas as fêmeas, que era analisado a fresco ao microscópio óptico, para determinação da fase do ciclo estral⁶.

A eutanásia foi realizada por decapitação em guilhotina, no primeiro proestro, após aproximadamente sete ciclos reprodutivos consecutivos. Os animais foram pesados e as gorduras perigonadal, retroperitoneal e subcutânea foram retiradas e pesadas para avaliação da obesidade.

O ovário direito de cada fêmea foi isolado e fixado em paraformaldeído a 10%, e posteriormente incluído em parafina para processamento histológico. Foram realizados cortes seriados de 8 mm de espessura corados com hematoxilina e eosina em todo o ovário. Os cortes foram analisados utilizando-se microscópio óptico associado a um sistema de imagens (Pro-Image plus)¹¹. Para a contagem, o número de folículos antrais foi definido como aqueles que apresentavam uma cavidade antral bem-definida contendo um oócito com um núcleo; o número de folículos atrésicos foi definido como os que apresentavam células da granulosa em processo degenerativo, às vezes com aparente degeneração oocitária; o número de folículos primários, secundários e maduros foi definido como estruturas grandes, destituído de oócito, contendo de 4 a 5 camadas de pequenas e densas células granulosas, circundando um grande antro, e com compartimento tecal normal. Também foi avaliada a incidência de cistos ovarianos, definidos como folículos com ampla cavidade antral, delgada camada de células da granulosa e hipertrofia tecal.

O sangue total foi coletado em tubos e funis previamente heparinizados e, em seguida, o plasma foi separado e congelado a -80ºC, para posterior dosagem hormonal. As concentrações plasmáticas de LH, hormônios folículo-estimulantes (FSH) e prolactina (PRL) foram determinadas por radioimunoensaio de duplo anticorpo usando reagentes obtidos com o National Hormone & Peptide Program (Harbor-UCLA Medical Center, USA). A iodinação e a purificação dos hormônios, assim como o anticorpo secundário (em ovelha), foram elaboradas pelo laboratório do Dr. Celso R. Franci (Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo - USP). As doses mínimas detectáveis foram: 0,05 ng/mL para LH; 0,2 ng/mL para FSH; 7,0 ng/mL para PRL. O coeficiente de variação intraensaio foi 4% para LH, 3% para FSH e 3,9% para PRL. A concentração plasmática de progesterona foi determinada por meio de kits produzidos por MP Biomedicals^(r) e o erro intra e interensaio foi de 2,5%.

Os resultados foram expressos como média±erro padrão da média e analisados pelo teste de variância ANOVA de uma via, para comparação dos resultados entre os grupos CTL versus CAF, CAF versus CAF+LOS e CTL versus CAF+LOS, complementada pelo teste de comparações múltiplas Newman-Keuls. Como critério de significância foi adotado p<0,05. O desfecho primário no cálculo da amostra para os experimentos propostos, com nível de significância p<0,05 e poder de 80%, baseou-se em estudo prévio realizado em nosso laboratório⁵. Os cálculos foram realizados utilizando-se o programa PEPI 4.0 e o GraphPad Prism, versão 5.00, para Windows (GraphPad Software, San Diego, CA, USA).

Todos os procedimentos com os animais foram aprovados pelo Comitê de Ética no Uso de Animais (CEUA) da Unioeste (certificado nº 0021/2013 - CE).

Resultados

A DCAF induziu obesidade nos animais. O peso corporal e o peso das gorduras perigonadal, retroperitoneal e subcutânea foram 20, 71, 86 e 57%, respectivamente, mais elevados no grupo CAF, quando comparado com o grupo CTL (Tabela 1). O peso corporal e o peso das gorduras retroperitoneal e subcutânea do grupo CAF+LOS foram 16, 19 e 45% mais baixos, respectivamente, em relação ao grupo CAF, evidenciando que a administração de LOS diminuiu o efeito da DCAF sobre esses parâmetros. Porém, o peso da gordura perigonadal foi similar entre os grupos CAF+LOS e CAF (Tabela 1).

Tabela 1.
Efeito da dieta de cafeteria, associada ou não à administração do losartan, sobre o peso corporal (g) e o peso das gorduras perigonadal, subcutânea e retroperitoneal (g/100 g de peso corporal) de ratas adultas

	CTL	CAF	CAF+LOS	Valor p
Peso corporal (g)	265±5,8b	320±9,2a,c	269±17,4b	a versus b=p<0,001 b versus c=p<0,01
Gordura perigonadal (g/100 g de peso corporal)	3,1±0,1b,c	5,3±0,3a	5,2±0,3a	a versus b=p<0 ,001 a versus c=p<0,001
Gordura subcutânea (g/100 g de peso corporal)	5,8±4,5b	9,1±0,9a	5,0±0,7b	a versus b=p<0,05 b versus c=p<0,01
Gordura retroperitoneal (g/100 g de peso corporal)	1,4±0,1b,c	2,6±0,1a,c	2,1±0,2a,b	a versus b=p<0,001 a versus c=p<0,01 b versus c=p<0,05

• Os dados são apresentados como média±EPM. As letras sobrescritas representam diferenças estatísticas entre os grupos: a=CTL, b=CAF e c=CAF+LOS; p<0,05; n=15. CTL: controle; CAF: cafeteria; CAF+LOS: cafeteria+losartan.

O número de folículos primários (Figura 1A), secundários (Figura 1B) e maduros (Figura 1D), por ovário, foi semelhante entre os grupos CAF e CTL, demonstrando que a DCAF não influenciou esses parâmetros. O tratamento com LOS não influenciou o número de folículos primários e maduros, mas reduziu em 49% o número de folículos secundários no grupo CAF+LOS, em relação ao grupo CAF (Figura 1B). Na Figura 1C observa-se que o número de folículos antrais foi 76% mais elevado no grupo CAF, em relação ao grupo CTL, e foi semelhante entre os grupos CTL e CAF+LOS, revelando que o LOS bloqueou o aumento do número de folículos antrais induzido pela ingestão da DCAF.

Figura 1.
Efeito da dieta de cafeteria, associada ou não à administração do losartan, sobre o número de folículos primários (A), secundários (B), antrais (C) e maduros (D) em ovário de ratas adultas

O diâmetro dos folículos maduros foi semelhante entre os grupos (CTL=665,8±18,8 µm; CAF=725,0±21,0 µm; CAF+LOS=752,5±24,7 µm). A espessura das camadas da teca também foi similar entre os grupos estudados (CTL=36,5±2,1 µm; CAF=36,0±0,9 µm; CAF+LOS=31,1±1,1 µm). O mesmo foi observado em relação ao número de folículos atrésicos: CTL=4,6±0,7; CAF=2,6±1,4; CAF+LOS=4,6±1,1 e ao número de cistos ovarianos: CTL=1,0±0,5; CAF=0,8±0,6; CAF+LOS=0,6±0,4.

Observa-se na Tabela 2 que as concentrações plasmáticas de FSH e LH foram 38 e 30%, respectivamente, inferiores no grupo CAF, quando comparado com o grupo CTL. Todavia, a concentração desses dois hormônios nos animais CAF+LOS foi semelhante em ambos os grupos, CTL e CAF. Isso demonstra que o tratamento com LOS atenuou a redução das concentrações de FSH e de LH nos animais obesos por DCAF. As concentrações de progesterona e PRL foram semelhantes entre os três grupos estudados (Tabela 2).

Tabela 2.
Efeito da dieta de cafeteria, associada ou não à administração do losartan, sobre a concentração de hormônios folículo-estimulantes, luteinizante, progesterona e prolactina de ratas adultas

	CTL	CAF	CAF+LOS	Valor p
FSH (ng/mL)	4,5±0,5 b	2,8±0,3a	3,9±0,6	a versus b=p<0,05
LH (ng/mL)	1,3±0,1b	0,8±0,1a	1,0±0,1	a versus b=p<0,05
Progesterona (ng/mL)	43,6±10,7	68,2±24,6	95,1±45,8
PRL (ng/mL)	26,5±1,8	24,9±3,8	24,6±4,3

• Os dados são apresentados como média±EPM. As letras sobrescritas representam diferenças estatísticas entre os grupos: a=CTL, b=CAF e c=CAF+LOS; p<0,05; n=15. CTL: controle; CAF: cafeteria; CAF+LOS: cafeteria+losartan; FSH: hormônios folículo-estimulantes; LH: luteinizante; PRL: prolactina.

Discussão

No presente estudo, a administração do bloqueador do receptor AT₁ da Angiotensina II, LOS, reduziu o peso corporal e o peso das gorduras retroperitoneal e subcutânea em ratas com obesidade induzida por DCAF. Esses resultados são concordantes com os de estudos prévios que mostram que o tratamento com antagonistas do receptor AT₁ da Angiotensina II é benéfico contra a obesidade e a resistência à insulina^{8 , 12}. Todavia, não alterou o peso da gordura perigonadal das fêmeas obesas, postulando efeitos tecido-específico dessa droga.

A obesidade induz subfecundidade e infertilidade^{5 , 13}, mesmo quando a ovulação é regular¹⁴. Evidências mostram que o SRA, além de estar aumentado na obesidade, também está envolvido no controle da fertilidade feminina. Há um aumento na concentração de Angiotensina II no hipotálamo, no período pré-ovulatório, importante para a secreção do hormônio liberador de gonadotrofinas, e a injeção intracerebroventricular de Angiotensina II estimula a secreção pré-ovulatória de LH¹⁵. No ovário humano, todos os componentes do SRA foram evidenciados por meio de análise proteica, enquanto no ovário de ratas apenas compostos isolados do SRA são expressos¹⁶. Receptores AT₁ e AT₂ foram detectados em células da granulosa de folículos primordial, primário e secundários¹⁷. A Angiotensina II e seus receptores AT₁ e AT₂ parecem exercer efeitos reguladores no ovário em relação à maturação do núcleo do oócito e à ovulação em mulheres¹⁸. Além disso, folículos com elevada atividade SRA local foram associados com melhor qualidade do ovócito e aumento nas concentrações de fatores de crescimento vascular endotelial durante os procedimentos de fertilização in vitro ¹⁹.

Considerando os efeitos benéficos do SRA sobre o desenvolvimento dos folículos, poderia ser questionado o uso de um fármaco bloqueador do receptor da Angiotensina II com o intuito de favorecer o desenvolvimento folicular. No entanto, os trabalhos foram desenvolvidos em indivíduos magros, que provavelmente não apresentam atividade aumentada do SRA, diferindo do nosso estudo, que avaliou fêmeas obesas. A atividade do SRA⁷ está aumentada em indivíduos obesos, e esse aumento parece contribuir para os efeitos deletérios da obesidade⁵. Nesse sentido, o bloqueio de receptores de Angiotensina II pode contribuir para a tentativa de reduzir alguns efeitos associados à obesidade, incluindo a redução na fertilidade. De fato, o LOS, administrado desde o desmame e concomitante à oferta da DCAF, previne o bloqueio do pico pré-ovulatório de progesterona e LH e a consequente redução no número de óvulos liberados no período ovulatório induzido pela obesidade⁸. No presente estudo, iniciamos a administração de LOS na vida adulta, 50 dias após o início da oferta da DCAF, com o objetivo de avaliar um possível papel reversor, em vez de preventivo, do LOS sobre a redução no desenvolvimento folicular induzido pela obesidade.

Em nosso estudo, as fêmeas obesas apresentaram aumento no número de folículos antrais, quando comparadas ao grupo CTL. Essa característica é similar à observada na síndrome dos ovários policísticos (SOP), a mais comum desordem endócrina da mulher em idade reprodutiva e caracterizada por anovulação crônica, hiperandrogenismo e resistência à insulina²⁰. Essas alterações são frequentemente agravadas pela obesidade e estão associadas à presença de múltiplos folículos antrais não atrésicos de tamanho médio nos ovários²¹. A SOP é experimentalmente induzida em modelos animais pela administração de valerato de estradiol²², que apresentam muitos folículos antrais nos ovários em vez de folículos pré-ovulatórios dominantes. Todavia, assim como a espessura da camada da teca e o diâmetro dos folículos maduros, o número de folículos atrésicos e de cistos ovarianos foi semelhante entre os animais CAF e o grupo CTL, diferindo morfologicamente dos modelos experimentais de SOP que exibem uma grande quantidade de cistos ovarianos e hipertrofia tecal²³. Isso pode ser atribuído a diferenças nos modelos experimentais, visto que os modelos de SOP induzidos pelo valeriato de estradiol não apresentam obesidade e incluem uma sobrecarga exógena de estradiol. No presente estudo, a espessura da camada da teca, o diâmetro dos folículos maduros, bem como o número de folículos atrésicos e de cistos ovarianos, não foram alterados pelo LOS. Contudo, sua administração reduziu o número de folículos secundários e antrais em fêmeas obesas, o que complementa e fortalece as evidências da relação entre SRA e alterações na fertilidade associadas à obesidade⁸.

Considerando que no presente estudo as ratas obesas apresentaram redução nas concentrações plasmáticas de FSH e de LH, sugerimos que essas alterações contribuíram para o aumento no número de folículos antrais. Evidências indicam que a SOP poderia ser, primariamente, uma resposta à ausência prolongada de picos de gonadotrofinas. De fato, o FSH é necessário para a formação do antro e também em fases posteriores do desenvolvimento folicular, assim como para a transição de folículos com pequeno antro a folículos maiores²³. Adicionalmente, a supressão do gene do receptor de LH promove redução no desenvolvimento folicular, que raramente prossegue para além do estágio antral precoce e não pode ser induzido por meio de tratamento com gonadotrofina exógena²⁴.

A administração de LOS atenuou a redução das concentrações de LH e FSH induzidas pela DCAF. Assim, sugerimos que esse efeito benéfico do LOS possa ter contribuído para o restabelecimento do desenvolvimento folicular das fêmeas CAF+LOS. No entanto, ainda não está claro se esse efeito é direto sobre os parâmetros reprodutivos, ou indireto, por meio do restabelecimento dos parâmetros metabólicos. Vias endócrinas, inflamatórias, neurais e celular-intrínsecas estão desreguladas na obesidade e evidências sugerem que o SRA pode estar envolvido nos problemas associados com a obesidade⁷. Considerando que os efeitos benéficos do LOS sobre a ovulação estão associados ao papel protetor contra o acúmulo de gordura, à resistência à insulina e ao aumento das concentrações plasmáticas de triglicérides e LDL⁸, a utilização de fármacos inibidores do SRA que melhoram a síndrome metabólica¹⁴ poderia favorecer indiretamente a fertilidade na obesidade. A redução do acúmulo das gorduras retroperitoneal e subcutânea pelo LOS em nosso estudo também pode, indiretamente, ter contribuído para melhorar o desenvolvimento folicular nessas fêmeas. Além disso, a diminuição do acúmulo de gorduras provavelmente está associada com uma redução proporcional da atividade dos componentes do SRA no tecido adiposo, a qual contribui para a reserva sistêmica²⁵. Esse efeito poderia reduzir os efeitos da Angiotensina II derivada desse tecido, além do efeito resultante do bloqueio dos receptores AT₁ pelo uso do LOS.

Não podemos deixar de comentar as diferenças interespécies e a grande variedade de modelos experimentais utilizados para o estudo dos efeitos da obesidade ou da Angiotensina II sobre a fertilidade feminina, além do fato de a transposição dos resultados do modelo animal para os humanos ser muito complexa; no entanto, apesar dessas limitações, os resultados apresentados neste estudo contribuem e se somam às inegáveis evidências experimentais e clínicas, indicando a importante participação da Angiotensina II como intermediador de alterações reprodutivas femininas associadas à obesidade.

Em conclusão, nossos resultados indicam que o tratamento com LOS, antagonista do receptor AT₁ da Angiotensina II, na dose e no tempo utilizados, melhora o desenvolvimento folicular em ratas com obesidade induzida por DCAF.

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Datas de Publicação

• Publicação nesta coleção
  Jul 2015

Histórico

• Recebido
  13 Abr 2015
• Aceito
  22 Maio 2015