Acessibilidade / Reportar erro

Metabolismo e distribuição do flúor em ovinos jovens tratados cronicamente com fluoreto de sódio

Metabolism and distribution of fluor in lambs chronically treated with sodium fluoride

Resumos

Este estudo teve por objetivo avaliar o metabolismo do flúor (F) em ovinos. Para tanto, utilizaram-se 12 animais, com cinco meses de idade, os quais receberam como dieta base 3% do peso vivo de feno de alfafa e água ad libitum. Os animais foram divididos e constituíram um grupo Controle, que recebeu apenas sal iodado (5g de NaCl/animal + 0,2mg I/kg matéria seca) e, um grupo Tratado, que recebeu sal iodado adicionado de fluoreto de sódio (4,7mg F/kg de peso corporal). Esses sais foram administrados via sonda oro-esofágica, diariamente por um período de 150 dias. Para análise de F, coletaram-se amostras de sangue, urina e fezes e, ao fim do período experimental, após a eutanásia dos animais, coletou-se a glândula pineal e amostras de osso. Também nesta ocasião, coletou-se uma amostra de rim para exame histopatológico. Analisando-se os teores séricos, urinários e ósseos de F, verificou-se que foram significativamente superiores nos animais Tratados em relação aos Controles. Quanto ao F contido na glândula pineal, não houve diferença significativa entre os grupos. Na análise histológica do rim, não foram observadas alterações. Conclui-se que a administração crônica de flúor induz ao acúmulo desse elemento nos ossos, mesmo havendo um alto teor de cálcio na alimentação e esse acúmulo parece não ser nocivo aos animais. Em ovinos, a capacidade orgânica de acúmulo ósseo e excreção urinária do flúor é diferente de outras espécies animais.

Flúor; ovinos; soro; urina; osso


The objective of the present study was to evaluate fluorine metabolism in growing lambs. Twelve 5-month-old male lambs maintained on alfalfa hay (3% BW) and non-fluorinated water ad libitum were used. Animals were allocated into Control, receiving 5g NaCl/animal/day + 0.2mg I/kg dry matter) and Treated group, receiving the same treatment plus sodium fluoride (4.7mg F/kg body weight). Mineral treatment was given by gavage, daily for 150 days. Blood, urine and fecal samples were collected during and the end of the experiment. At the end of treatment period animals were euthanized and kidney, pineal and bone samples were collected. Urine F was higher in treated animals throughout the experiment. Bone F levels were also increased in treated animals; pineal F content however, was not different between groups. Kidney histology revealed no differences. It is concluded that chronic F administration induces accumulation of the element in the skeleton. However such fact appears not to be detrimental to animals. Rates of F accumulation in bone and urine excretion obtained in other species can not be used in growing lambs.

Fluoride; sheep; serum; urine; bone


Metabolismo e distribuição do flúor em ovinos jovens tratados cronicamente com fluoreto de sódio

Metabolism and distribution of fluor in lambs chronically treated with sodium fluoride

Andreane R. FilappiI, * * Autor para correspondência: afilappi@bol.com.br ; Danívia S. PrestesI; Fabiane G. AntesI; Éder L.M. FloresII; Valderi L. DresslerII; Érico M.M. FloresII; Marcelo CecimI

IDepartamento de Clínica de Grandes Animais, Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), Campus Camobi, Santa Maria, RS 97105-900, Brasil

IIDepartamento de Química, UFSM, Santa Maria, RS

RESUMO

Este estudo teve por objetivo avaliar o metabolismo do flúor (F) em ovinos. Para tanto, utilizaram-se 12 animais, com cinco meses de idade, os quais receberam como dieta base 3% do peso vivo de feno de alfafa e água ad libitum. Os animais foram divididos e constituíram um grupo Controle, que recebeu apenas sal iodado (5g de NaCl/animal + 0,2mg I/kg matéria seca) e, um grupo Tratado, que recebeu sal iodado adicionado de fluoreto de sódio (4,7mg F/kg de peso corporal). Esses sais foram administrados via sonda oro-esofágica, diariamente por um período de 150 dias. Para análise de F, coletaram-se amostras de sangue, urina e fezes e, ao fim do período experimental, após a eutanásia dos animais, coletou-se a glândula pineal e amostras de osso. Também nesta ocasião, coletou-se uma amostra de rim para exame histopatológico. Analisando-se os teores séricos, urinários e ósseos de F, verificou-se que foram significativamente superiores nos animais Tratados em relação aos Controles. Quanto ao F contido na glândula pineal, não houve diferença significativa entre os grupos. Na análise histológica do rim, não foram observadas alterações. Conclui-se que a administração crônica de flúor induz ao acúmulo desse elemento nos ossos, mesmo havendo um alto teor de cálcio na alimentação e esse acúmulo parece não ser nocivo aos animais. Em ovinos, a capacidade orgânica de acúmulo ósseo e excreção urinária do flúor é diferente de outras espécies animais.

Termos de indexação: Flúor, ovinos, soro, urina, osso.

ABSTRACT

The objective of the present study was to evaluate fluorine metabolism in growing lambs. Twelve 5-month-old male lambs maintained on alfalfa hay (3% BW) and non-fluorinated water ad libitum were used. Animals were allocated into Control, receiving 5g NaCl/animal/day + 0.2mg I/kg dry matter) and Treated group, receiving the same treatment plus sodium fluoride (4.7mg F/kg body weight). Mineral treatment was given by gavage, daily for 150 days. Blood, urine and fecal samples were collected during and the end of the experiment. At the end of treatment period animals were euthanized and kidney, pineal and bone samples were collected. Urine F was higher in treated animals throughout the experiment. Bone F levels were also increased in treated animals; pineal F content however, was not different between groups. Kidney histology revealed no differences. It is concluded that chronic F administration induces accumulation of the element in the skeleton. However such fact appears not to be detrimental to animals. Rates of F accumulation in bone and urine excretion obtained in other species can not be used in growing lambs.

Index terms: Fluoride, sheep, serum, urine, bone.

INTRODUÇÃO

O flúor (F) é considerado um elemento essencial, mas o interesse biológico está voltado aos efeitos tóxicos que ele pode ocasionar no organismo (Li 2003). A toxicidade do F é um reflexo da quantidade e duração da ingestão do elemento, da solubilidade dos compostos que o contém e de fatores individuais (Underwood & Suttle 1999). A intoxicação crônica por F, denominada comumente de fluorose, é a forma mais freqüente de intoxicação observada nos animais domésticos, e ocorre pela ingestão de pequenas doses de F, por um longo período de tempo (Shupe & Olson 1983).

Em animais de produção, a fluorose crônica pode ser observada em três situações: consumo contínuo de suplementos minerais com alto teor de F; consumo de água rica em F e, pastejo de forragens contaminadas com F, adjacentes às indústrias (Ammerman 1980, Suttie 1980, Mcdowell 1999). Destas fontes, a que proporcionalmente assume maior importância, é o suplemento mineral, uma vez que o F advém das mesmas fontes do fósforo (P) (McDowell 1999). A deficiência de P é relatada como a mais freqüente nas pastagens e a de maior repercussão econômica, havendo necessidade de suplementação, sobretudo para ruminantes mantidos em pastejo (Suttie 1980, Tokarnia et al. 2000).

Nos últimos anos, tem-se discutido, cada vez mais, a utilização de fontes alternativas de fósforo (fosfatos de rocha e superfosfato triplo) nos suplementos minerais destinados à alimentação animal. Entretanto, essas fontes contêm um teor maior de F comparado a outras convencionalmente utilizadas (fosfato bicálcico) (Lopes & Tomich 2001). A biodisponibilidade do F varia conforme a fonte, mas a utilização pelo organismo animal é similar, embora a forma e a intensidade dos efeitos tóxicos variem entre espécies (Whitford et al. 1991). Assim, o objetivo do presente estudo foi avaliar o metabolismo do flúor em ovinos, quanto à absorção, distribuição e eliminação deste elemento.

MATERIAL E MÉTODOS

O presente experimento foi desenvolvido na Universidade Federal de Santa Maria, RS, no período de novembro de 2005 a abril de 2006. O mesmo foi aprovado pelo Comitê de Bioética e Bem Estar animal dessa Universidade.

Delineamento experimental. Neste estudo, foram utilizados 12 ovinos, machos, mestiços das raças Texel x Ile de France, com idade aproximada de 5 meses e peso de 22-25 kg. Os animais foram mantidos em baias e receberam como dieta base 3% do peso vivo de feno de alfafa e água ad libitum. Após um período de adaptação de 15 dias, os animais foram distribuídos em grupos: Controle (n=6) e Tratado (n=6). O primeiro grupo recebeu sal iodado (5g de NaCl/animal + 0,2mg I/kg matéria seca) e o segundo, o mesmo sal iodado adicionado de fluoreto de sódio (4,7mg F/kg de peso corporal). Os sais foram diluídos em água destilada, e administrados via sonda oro-esofágica, diariamente, por um período de 150 dias. A dose foi ajustada a cada 14 dias, de acordo com o incremento no ganho de peso dos ovinos.

Amostras da dieta. Mensalmente, amostras do feno de alfafa e de água foram coletadas para análise de F. Ainda, no feno, o cálcio foi analisado.

Amostras de soro. Foram realizadas coletas de sangue (5mL), da veia jugular, aos 60, 90, 120 e 150 dias de tratamento. As coletas foram realizadas no turno da manhã, antes do tratamento e alimentação dos animais. As alíquotas de soro foram acondicionadas a uma temperatura de -20°C para posterior análise de F.

Amostras de fezes. Nos últimos três dias da primeira semana do experimento, os animais tratados foram alojados em gaiolas metabólicas, para obtenção do conteúdo diário de fezes. A média de matéria seca (MS) obtida e considerada para posterior quantificação de F foi de 29,85 (±7,93) %. A produção fecal diária variou de 215 a 670g de MS.

Amostras de urina. Amostras equivalentes às 24 horas foram obtidas por meio de manutenção dos animais em gaiolas metabólicas, nos dias zero, 60, 90, 120 e 150 de experimento, para posterior análise de F.

Amostras de osso. Após os 150 dias de experimento, os animais foram eutanasiados. Amostras sagitais do terço superior da antepenúltima costela direita foram coletadas em todos os animais. Essas foram estocadas à -20°C para posterior análise de F. Para estimar o acúmulo total desse elemento no esqueleto, considerou-se o peso corporal vazio (PCV), o qual se baseou no peso vivo final menos 8% (conteúdo do trato gastrintestinal). A média do PCV no grupo Controle foi de 38,72 (±6,21) kg e no grupo Tratado foi de 36,85 (±3,15) kg. A percentagem de osso em relação ao PCV foi de 10,36%.

Amostras de glândula pineal e rim. Após a eutanásia, a glândula pineal de todos os animais foi coletada e estocada à -20°C para análise de F. Ainda, uma amostra do rim direito foi removida e fixada em formol a 10% para exame histopatológico (coloração hematoxilina-eosina).

Análise de flúor. Eletrodo íon específico para estimar o teor de F em todas as amostras analisadas foi utilizado. A preparação das amostras séricas e urinárias foi efetuada de acordo com técnica recomendada por Eaton et al. (1995). As amostras de fezes e ossos foram moídas e submetidas ao processo de piroidrólise, conforme técnica descrita por Dressler et al. (2002). A glândula pineal foi preparada para análise pelo processo de extração, segundo a metodologia recomendada por Inkielewicz et al. (2003).

Análise estatística. Os resultados de F foram expressos em média ± desvio padrão. As médias séricas e urinárias, nos diferentes tempos e entre grupos, foram avaliadas por análise de variância (ANOVA), seguido pelo teste "post-hoc" de Tukey. O teste t de Student foi utilizado para determinar a significância das diferenças entre o grupo Tratado e Controle, nas amostras ósseas e pineais.

RESULTADOS

Durante o período experimental de 150 dias, foi observado que o peso de todos os animais incrementou continuamente. Nos grupos Controle e Tratado, respectivamente, houve ganho de peso médio diário de 128g e 112g e pesos finais de 42,08 (±6,75) kg e 40,05 (±4,80) kg.

Na análise do F no feno de alfafa e na água, foram observadas concentrações traços do elemento. Quanto ao cálcio (Ca) no feno, verificaram-se teores médios de 18,9g kg-1 MS.

Quanto ao F fecal dos animais tratados, não houve diferença significativa (p>0,05) entre as concentrações nos diferentes dias de coleta. Verificou-se uma concentração média de 212,67 (±115,11) mg F/g de MS. Quanto ao F fecal diário, o teor médio foi de 73,73 (±9,65) mg/24h.

Os teores séricos e urinários de F foram analisados e foi possível verificar que os valores foram significativamente superiores (p<0,01) nos animais Tratados em relação aos Controles. No grupo Tratado, foi observado que os teores séricos de F estiveram constantes durante todo o experimento. Já em relação às concentrações urinárias desse elemento, houve diferença significativa no F (mg L-1) entre os dias 60, 120 e 150 de tratamento e nas concentrações de F referentes às 24 horas, entre os dias 60 e 150; 90 e 150 de tratamento (Quadro 1).


Em relação ao F ósseo, a concentração foi significativamente maior (p<0,0001) nas costelas dos animais tratados (cerca de 60 vezes mais). Quanto ao F contido na glândula pineal, não houve diferença significativa (p>0,05) entre os grupos (Quadro 2). Na análise histológica do rim de todos os animais, não foram observadas alterações na integridade do órgão.


DISCUSSÃO

A dose de 4,7mg de F/kg de peso vivo foi utilizada neste experimento, visto que, em estudo prévio em ovinos (Kessabi et al. 1986) a mesma dose foi capaz de produzir elevação nos teores de F nos dentes e ossos e, lesões em órgãos como fígado e rins.

O F, em humanos, é absorvido no trato alimentar, tipicamente entre 70 a 90%. Quando proveniente do fluoreto de sódio, a absorção pode ser de até 100% (Maguire et al. 2004). Neste experimento, a percentagem de F absorvido (F ingerido menos F fecal) pelos animais Tratados foi de 65% (da quantidade média total administrada de 22,4g de F/animal, em 150 dias de experimento, apenas 14,56g foi efetivamente absorvida). A excreção fecal de F verificada (35%) se assemelha ao resultado de 30% observado por Dunipace et al. (1995) em ratos. Esses autores ainda observaram que o tempo de administração do F (três ou 18 meses), não interferiu na excreção fecal desse elemento. O percentual de excreção fecal obtido no presente estudo foi maior do que os 20% descritos previamente (Whitford 1990). O F ingerido pode ter sua absorção gastrintestinal reduzida na presença de altas concentrações de Ca na dieta, devido à formação de complexos insolúveis com esse elemento (Maguire et al. 2004). A análise do feno de alfafa fornecido diariamente aos animais, neste estudo, revelou teores de Ca na MS, 7,9 vezes superior aos requerimentos diários para a espécie e categoria em questão, que é de 2,4g kg-1 de MS (Underwood & Suttle 1999). Isso possivelmente justifique a menor taxa de absorção do F verificada, em comparação com a taxa anteriormente mencionada em humanos. Cabe destacar que o alto teor de Ca reduziu, mas não foi capaz de bloquear totalmente a absorção de F.

A concentração sérica de F é mantida em limites estreitos, devido a mecanismos regulatórios que envolvem principalmente o tecido esquelético e renal (Whitford 1989, McDowell 1992). Esse fato justifica a razão para o teor de F sérico, no presente estudo, ter se mantido constante nos animais Tratados. Esses animais ainda exibiram maior concentração de F sérico em relação aos animais Controle. Dunipace et al. (1995) também observaram um incremento e constância nas concentrações plasmáticas de F em ratos tratados com 5ppm F na água de beber, durante 18 meses. Possivelmente, o resultado sérico de F observado neste estudo, tenha ocorrido em função de que, segundo Whitford (1996), doses crônicas podem induzir ao aumento dos teores séricos e ao acúmulo de F nos ossos. A ingestão contínua de F também foi capaz de elevar os teores séricos e plasmáticos deste elemento, em animais de outros estudos (Richards et al. 1985, Samal & Naik 1992, Carvalho 2005, Humberto 2007).

Em humanos jovens, do F absorvido na dieta diária, aproximadamente 50% está associado aos tecidos calcificados e o restante está associado à excreção urinária (Whitford 1989). No presente experimento, os teores de F ósseo e urinário foram significativamente mais elevados nos animais Tratados. Da dose absorvida de F (14,56g), observou-se que cerca de 51% (7,3g) depositou-se nos ossos, resultado similar aos 50% encontrados por Richards et al. (1985) em suínos. Dos 49% remanescentes, 38% (5,53g) foi excretado via urina e 11% permaneceu no organismo. Considerando que, segundo Suttie (1980), há uma grande variação do conteúdo de F nos diferentes ossos e em distintas áreas desses ossos, possivelmente, neste estudo, o acúmulo ósseo de F tenha sido maior do que o verificado nas costelas. Samal & Naik (1992), observaram uma maior deposição óssea de F e uma menor excreção urinária em ovinos jovens em crescimento. No entanto, em estudos prévios com outras espécies, a percentagem excretada diariamente na urina foi de 50% (Whitford 1990,Dunipace 1995).

Os tecidos mineralizados (ossos e dentes) acumulam altas concentrações de F e são os primeiros a demonstrar os sinais clínicos de toxicidade deste elemento (Samal & Naik 1992, Underwood & Suttle 1999, Bohatyrewicz 1999). Esses se caracterizam nos dentes, inicialmente, por manchas esbranquiçadas, com aspecto de giz; pigmentação marrom, hipoplasia do esmalte; desgaste dentário exagerado e hiperplasia da gengiva (Riet-Correa et al. 1983). Nos ossos, o acúmulo de F poderá causar decréscimo na resistência óssea, levando à fragilidade e ao aumento do risco de fraturas (Turner et al. 1992).

Neste experimento, os ovinos tratados com F foram avaliados clinicamente quanto ao aspecto dentário. Essa avaliação foi realizada quinzenalmente e, não foram observadas alterações características de fluorose, apesar das concentrações urinárias e ósseas de F serem condizentes com aquelas vistas neste quadro. De acordo com os dados mencionados por Shupe (1980) para bovinos e por Samal & Naik (1992) para ovinos, os animais deste experimento se enquadrariam em um caso de fluorose moderada a severa. Outros fatores além da dose e duração da ingestão podem determinar a toxidade do F, como: o nível de nutrição, o estresse, o estado sanitário, a exposição a outros agentes que podem exercer sinergismo ou antagonismo e ainda, a solubilidade da fonte utilizada (Shupe 1980, Suttie 1980). Embora se tenha utilizado, neste estudo, uma fonte mais biodisponível de F, isso não interferiu no estado sanitário e nutricional dos animais, os quais atingiram, ao final do experimento, condição corporal para abate. O bom estado dos animais tratados aliado aos altos teores de Ca contidos na dieta, são fatores que podem ter contribuído para a não ocorrência dos sinais clínicos de toxicidade do F. Cabe enfatizar que esse elemento não é igualmente tóxico para todas as espécies (McDowell 1992). Em animais de laboratório tratados com fluoreto de sódio, cronicamente, foi relatado crescimento subnormal e significante decréscimo no peso corporal em relação aos animais controle (Pushpalatha et al. 2005).

A eliminação do F absorvido ocorre quase que exclusivamente via urinária. O incremento dessa excreção é diretamente proporcional ao aporte de F na dieta, permanecendo elevado ao longo do tempo, enquanto o conteúdo ósseo de F for excessivo. Deste modo, ocorre um mecanismo de redução do F corporal com o tempo (McDowell 1992). Neste estudo, os animais Tratados apresentaram teores urinários elevados de F ao longo do período experimental. Como os rins podem exibir alta concentração deste elemento durante uma alta ingestão de F (McDowell 1992), porções deste sistema estão mais sujeitas aos efeitos tóxicos do que outros tecidos moles (Shashi et al. 2002). Em animais de laboratório, a ingestão contínua de dietas com 5, 15 e 50ppm de F, durante 18 meses, foi capaz de ocasionar alterações histológicas nos rins, como glomeruloesclerose difusa e inflamação intersticial crônica (Dunipace et al. 1995). Neste trabalho, o resultado da análise histológica do rim dos animais Tratados não revelou alterações.

Muitos tecidos moles e fluídos corpóreos não acumulam F e neles são encontradas apenas quantidades traços (Szkoda 1998). O acúmulo está condicionado ao teor de Ca presente (McDowell 1992). A glândula pineal tem maior concentração de Ca do que alguns tecidos moles pela presença de hidroxiapatita. Devido ao fato de estar localizada fora da barreira hemato-encefálica e possuir um suprimento sangüíneo profuso, essa hidroxiapatita pode seqüestrar o F da corrente sangüínea (Gartner & Hiatt 2003). No entanto, neste estudo, as concentrações de F na pineal dos animais Tratados não diferiram dos animais Controles. Esse resultado não condiz com o encontrado por Luke (2001), o qual observou concentração de F na glândula pineal de humanos, aproximadamente quatro vezes superior aos teores verificados nos ossos.

CONCLUSÕES

Nas condições em que o experimento foi desenvolvido, conclui-se que a administração crônica de flúor induz ao acúmulo desse elemento nos ossos, mesmo havendo um alto teor de cálcio na alimentação e, esse acúmulo parece não ser nocivo aos animais. Em ovinos, a capacidade orgânica de acúmulo ósseo e excreção urinária do flúor é diferente de outras espécies animais.

Recebido em 25 de setembro de 2007.

Aceito parta publicação em 14 de fevereiro de 2008.

  • Ammerman C.B. 1980. Introductory remarks for the Symposium on Fuoride Toxicosis in Cattle. J. Anim. Sci. 51(3):744-745.
  • Bohatyrewicz A. 1999. Effects of fluoride on mechanical properties of femoral bone in growing rats. Fluoride 32(2):47-54.
  • Carvalho J.G. 2005. Avaliação de várias concentrações de flúor na formação óssea ectópica de ratos jovens e velhos. Dissertação de Mestrado, USP, Bauru. 83p.
  • Dressler V.L., Pozebon D., Flores E.L.M., Flores E.M.M. & Paniz J.N.G. 2002. Determination of fluoride in geological and biological samples following pyrohydrolytic decomposition. Analyt. Chem. Acta 466:117-123.
  • Dunipace A.J., Brizendine E.J., Zhang W., Wilson M.E., Miller L.L., Katz B.P., Warrick J.M. & Stookey G.K. 1995. Effect of aging on animal response to chronic fluoride exposure. J. Dent. Res. 74(1):358-368.
  • Eaton A.D., Clesceri L.S. & Greenberg A.E. 1995. Standard Methods for the Examination of Water and Wastewater. American Public Health Association, Washington, D.C. 1018p.
  • Gartner L.P. & Hiatt J.L. 2003. Tratado de Histologia. 2Ş ed. Guanabara Koogan, Rio de Janeiro. 456p.
  • Humberto H.J.C. 2007. Efeitos da ingestão de flúor provenientes do fosfato de rocha e fluoreto de sódio na fluorose dental de ovinos. Dissertação de Mestrado, USP, Pirassununga. 63p.
  • Inkielewicz I., Czarnowski W. & Krechniak J. 2003. Determination of fluoride in soft tissues. Fluoride 36(1):16-20.
  • Kessabi M., Hamliri A. & Braun J.P. 1986. Experimental fluorosis in sheep: alleviating effects of aluminum. Vet. Hum. Toxicol. 28(4):300-304.
  • Li L. 2003. The biochemistry and physiology of metallic fluoride: Action, mechanism and implications. Clin. Rev. Oral Biol. Med. 14(2):100-114.
  • Lopes H.S.O. & Tomich T.R. 2001. Avanços Recentes na Nutrição Mineral de Bovinos. FEALQ, Piracicaba. 30p.
  • Luke J. 2001. Fluoride deposition in the aged human pineal gland. Caries Res. 35:125-128.
  • Maguire A., Moynihan P.J. & Zohouri V. 2004. Bioavailability of fluoride in drinking water: A human experimental study, June 2004. Newcastle. Disponível em: http://www.ncl.ac.uk/dental/assets/docs/fluoride_ bioavailability Acesso em 16 Set. 2004.
  • McDowell L.R. 1992. Minerals in Animal and Human Nutrition. Academic Press, San Diego. 524p.
  • McDowell L.R. 1999. Minerais para Ruminantes sob Pastejo em Regiões Tropicais, Enfatizando o Brasil. Unesp, São Paulo. 93p.
  • Pushpalatha T., Srinivas M. & Reddy P.S. 2005. Exposure to high fluoride concentration in drinking water will affect spermatogenesis and steroidogenesis in male albino rats. Biometals 18:207-212.
  • Richards A., Kragstrup J. & Nielsen-Kudsk F. 1985. Pharmacokinetics of chronic ingestion in growing pig. J. Dent. Res. 64(3):425-430.
  • Riet-Correa F., Oliveira J.A., Méndez M.C. & Schild A.L. 1983. Poluição industrial como causa da intoxicação por flúor em bovinos no município de Rio Grande, RS. Pesq. Vet. Bras. 3(4):107-114.
  • Samal U.N. & Naik B.N. 1992. The fluorosis problem in tropical sheep. Fluoride 25(4):183-190.
  • Shashi A., Singh J.P. & Thapar S.P. 2002. Toxic effects of fluoride on rabbit kidney. Fluoride 35(1):38-50.
  • Shupe J.L. 1980. Clinicopathologic features of fluoride toxicosis in cattle. J. Anim. Sci. 51(3):747-758.
  • Shupe J.L. & Olson A.E. 1983. Clinical and pathologic aspects of fluoride toxicosis in animal, p.319-338. In: Shupe J.L., Peterson H.B. & Leone N.C. (ed.), Fluorides Effects on Vegetation, Animals and Humans. Logan, Utah.
  • Suttie J.W. 1980. Nutritional aspects of fluoride toxicosis. J. Anim. Sci. 51(3):759-766.
  • Szkoda J., Minta M., Biernacki B. & Wlodarczyk B. 1998. Fluorine concentration in maternal and foetal tissues of rodents after experimental exposure to sodium fluoride in drinking water. Metabolism Fluoru. 8:89-94.
  • Tokarnia C.H., Döbereiner J. & Peixoto P.V. 2000. Deficiências minerais em animais de fazenda, principalmente bovinos criados em regime de campo. Pesq. Vet. Bras. 20(3):127-138.
  • Turner C.H., Akhter M.P. & Heaney R.P. 1992. The effects of fluoridated water on bone strength. J. Orthop. Res. 10:581-587.
  • Underwood E.J. & Suttle N.F. 1999. The Mineral Nutrition of Livestock. 3rd ed. CAB Internacional, London. 664p.
  • Whitford G.M. 1989. The metabolism and toxicity of fluoride, p.11-50. In: Myers H.M. (ed.), Monographs in Oral Science. Vol.13. Karger, San Francisco.
  • Whitford G.M. 1990. The physiological and toxicological characteristics of fluoride. J. Dent. Res. 69(3):539-549.
  • Whitford G.M., Biles E.D. & Birdsong-Withford N.L. 1991. A comparative study of fluoride pharmacokinetics in five species. J. Dent. Res. 70(6):948-951.
  • Whitford G.M. 1996. The Metabolism and Toxicity of Fluoride. 2nd Rev. Monographs in Oral Science 16. Karger, New York.
  • *
    Autor para correspondência:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      22 Abr 2008
    • Data do Fascículo
      Fev 2008

    Histórico

    • Aceito
      14 Fev 2008
    • Recebido
      25 Set 2007
    Colégio Brasileiro de Patologia Animal - CBPA Pesquisa Veterinária Brasileira, Caixa Postal 74.591, 23890-000 Rio de Janeiro, RJ, Brasil, Tel./Fax: (55 21) 2682-1081 - Rio de Janeiro - RJ - Brazil
    E-mail: pvb@pvb.com.br