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Perfil hematológico, bioquímico sérico, proteína C reativa e cortisol de ararajubas (Guaroba guarouba) mantidas em cativeiro

Blood profile, serum biochemistry, C-reactive protein and cortisol in golden conures (Guaroba guarouba) in captivity

Resumos

Objetivou-se determinar os valores hematológicos, bioquímicos séricos, proteína C reativa e cortisol de 14 ararajubas (Guaroba guarouba) clinicamente saudáveis mantidas em cativeiro no zoológico do Parque Estadual de Dois Irmãos Recife/PE. Amostras de sangue foram obtidas da veia jugular com volume médio de 0,8ml, fracionando em duas porções, a primeira depositada em tubo MiniCollect®CE contendo EDTA e a outra tubo com gel separador, para a separação do soro sanguíneo. Os indicadores bioquímicos e PCR foram determinados através do analisador ARCHITECT c8000. O cortisol foi analisado no Cobas E411 da Roche. Para a determinação dos números de eritrócitos e leucócitos, foi utilizada a metodologia da contagem em câmara de Neubauer. O hematócrito foi avaliado pelo método do microhematócrito e a hemoglobina pelo método da cianometahemoglobulina. Para a contagem diferencial de leucócitos, foi utilizada a técnica de Shilling. Os índices hematimétricos (VCM, HCM E CHCM) foram determinados com os valores encontrados na série eritrocítica. Os dados foram caracterizados por dispersão de freqüências, utilizando-se as seguintes medidas de tendência central: Média, desvio-padrão, mediana e percentil de 25 e percentil 75. A determinação de alguns parâmetros como ferro, triglicerídeos, PCR e cortisol foram identificados como sendo pioneiramente referenciados nesta espécie de ave. Os dados são apresentados como sendo de referência para a ararajuba (Guaroba guarouba) criada em cativeiro em condições similares de manejo e higidez e ainda pode contribuir para os trabalhos de conservação ex situ desta espécie.

Hematologia; bioquímica; ararajuba; Guaroba guarouba; zoológico


The aim of this study was to determine the hematological, serum biochemical, C-reactive protein and cortisol 14 clinically healthy golden conures (Guaroba guarouba) kept in captivity at the Zoo of Parque Estadual de Dois Irmãos Recife/PE, Brazil. Blood samples were collected from the jugular vein with an average of 0.8mL and divided into two parts, the first deposited in MiniCollect®EC and the other containing EDTA tube with gel separator for separating blood serum. Biochemical indicators and PCR was determined using the ARCHITECT analyzer c8000. Cortisol was analyzed on the Roche Cobas E411. To determine the number of erythrocytes and leukocytes the methodology of counting in a Neubauer chamber was used. Hematocrit was assessed by using the microhematocrit and hemoglobin for the method of cianometahemoglobulina. For the differential count the Shilling technique was used. The RBC indices (MCV, MCH and MCHC) were determined with values found in the erythrocytic series. The data were characterized by dispersion of frequencies, using the following measures of central tendency: mean, standard deviation, median and percentile 25 and 75 percentile. Parameters such as iron, triglycerides, CRP, and cortisol were identified and referenced in this pioneering species of bird. Data are presented as reference for Guaroba guarouba raised in captivity under similar conditions of management and healthiness and can still contribute to the work of ex situ conservation of this species.

Hematology; biochemistry; golden conure; Guaroba guarouba; zoo


MORFOFISIOLOGIA

Perfil hematológico, bioquímico sérico, proteína C reativa e cortisol de ararajubas (Guaroba guarouba) mantidas em cativeiro

Blood profile, serum biochemistry, C-reactive protein and cortisol in golden conures (Guaroba guarouba) in captivity

Cleyton C.D. CarvalhoI,* * Autor para correspondência: cleytondantas@bol.com.br ; Janaina A.C. RamosII; Luciana C. Rameh-de-AlbuquerqueII; Márcio A. SilvaII; Eduardo L. SousaII; Danilo A.P.V. LustosaIII; Pierre C. SoaresI

IDepartamento de Medicina Veterinária, Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE), Rua Dom Manoel de Medeiros s/n, Recife, PE 52171-900, Brasil

IIParque Estadual de Dois Irmãos (Horto e Jardim Zoológico), Praça Farias Neves s/n, Dois Irmãos, Recife, PE 52171-011

IIIHospital Militar de Área do Recife (HMAR), Rua do Hospício 534, Bairro Boa Vista, Recife, PE 50050-050

RESUMO

Objetivou-se determinar os valores hematológicos, bioquímicos séricos, proteína C reativa e cortisol de 14 ararajubas (Guaroba guarouba) clinicamente saudáveis mantidas em cativeiro no zoológico do Parque Estadual de Dois Irmãos Recife/PE. Amostras de sangue foram obtidas da veia jugular com volume médio de 0,8ml, fracionando em duas porções, a primeira depositada em tubo MiniCollect®CE contendo EDTA e a outra tubo com gel separador, para a separação do soro sanguíneo. Os indicadores bioquímicos e PCR foram determinados através do analisador ARCHITECT c8000. O cortisol foi analisado no Cobas E411 da Roche. Para a determinação dos números de eritrócitos e leucócitos, foi utilizada a metodologia da contagem em câmara de Neubauer. O hematócrito foi avaliado pelo método do microhematócrito e a hemoglobina pelo método da cianometahemoglobulina. Para a contagem diferencial de leucócitos, foi utilizada a técnica de Shilling. Os índices hematimétricos (VCM, HCM E CHCM) foram determinados com os valores encontrados na série eritrocítica. Os dados foram caracterizados por dispersão de freqüências, utilizando-se as seguintes medidas de tendência central: Média, desvio-padrão, mediana e percentil de 25 e percentil 75. A determinação de alguns parâmetros como ferro, triglicerídeos, PCR e cortisol foram identificados como sendo pioneiramente referenciados nesta espécie de ave. Os dados são apresentados como sendo de referência para a ararajuba (Guaroba guarouba) criada em cativeiro em condições similares de manejo e higidez e ainda pode contribuir para os trabalhos de conservação ex situ desta espécie.

Termos de indexação: Hematologia, bioquímica, ararajuba, Guaroba guarouba, zoológico.

ABSTRACT

The aim of this study was to determine the hematological, serum biochemical, C-reactive protein and cortisol 14 clinically healthy golden conures (Guaroba guarouba) kept in captivity at the Zoo of Parque Estadual de Dois Irmãos Recife/PE, Brazil. Blood samples were collected from the jugular vein with an average of 0.8mL and divided into two parts, the first deposited in MiniCollect®EC and the other containing EDTA tube with gel separator for separating blood serum. Biochemical indicators and PCR was determined using the ARCHITECT analyzer c8000. Cortisol was analyzed on the Roche Cobas E411. To determine the number of erythrocytes and leukocytes the methodology of counting in a Neubauer chamber was used. Hematocrit was assessed by using the microhematocrit and hemoglobin for the method of cianometahemoglobulina. For the differential count the Shilling technique was used. The RBC indices (MCV, MCH and MCHC) were determined with values found in the erythrocytic series. The data were characterized by dispersion of frequencies, using the following measures of central tendency: mean, standard deviation, median and percentile 25 and 75 percentile. Parameters such as iron, triglycerides, CRP, and cortisol were identified and referenced in this pioneering species of bird. Data are presented as reference for Guaroba guarouba raised in captivity under similar conditions of management and healthiness and can still contribute to the work of ex situ conservation of this species.

Index terms: Hematology, biochemistry, golden conure, Guaroba guarouba, zoo.

INTRODUÇÃO

A ararajuba (Guaroba guarouba) é um psitacídeo de médio porte (34-36cm de comprimento total), que habita principalmente as florestas de terra firme nos Estados do Maranhão e Pará, com registros recentes para o Mato Grosso e Rondônia (BirdLife International 2004).

Esta espécie é considerada como globalmente ameaçada de extinção devido à perda acelerada do seu hábitat, principalmente na porção norte do "arco do desmatamento da Amazônia", no oeste do Maranhão e leste do Pará (MMA 2001). Além disso, ainda é cobiçada por comerciantes, contribuindo significativamente para a diminuição das suas populações na natureza (Oren & Novaes 1986, IBAMA 2003, BirdLife International 2004).

Oren & Novaes (1986) estudaram o comportamento reprodutivo e hábitos desta espécie, porém não existe na literatura dados relacionados a parâmetros sanguíneos (hematológicos, bioquímicos e hormonais) que possam ser utilizados como referenciais para auxiliar na análise do estado clínico destas aves quando as mesmas são avaliadas clinicamente por profissionais especializados (Madella et al. 2006).

Embora a utilização de exames laboratoriais para complementar o diagnóstico apresente uma limitada aplicabilidade para aves individuais (Oglesbee 1998), o conhecimento das alterações hematológicas de psitacídeos em cativeiro pode servir como modelo para o estudo das respostas dos animais na natureza frente a um determinado desafio, bem como facilitar o diagnóstico de enfermidades.

A hematologia é um instrumento valioso e fundamental, pois serve para monitorar a saúde geral do animal e avaliar sua capacidade para transportar oxigênio e defender-se contra os agentes infecciosos (Voigt 2003), cujo objetivo é orientar o profissional no estabelecimento de prognóstico e protocolos terapêuticos para as diferentes enfermidades. No entanto, para que seja convenientemente utilizado, há necessidade do conhecimento da fisiologia padrão nas diferentes espécies em suas respectivas regiões (Cordeiro 2003).

A bioquímica sérica é outra ferramenta para auxiliar o diagnóstico de doenças metabólicas, definir o perfil nutricional de uma população homogênea e permitir uma avaliação clínica mais aprofundada de indivíduos. De uma maneira geral, para aves, sugere-se a determinação de parâmetros de função renal como o ácido úrico, de indicadores do metabolismo protéico como as proteínas totais, uréia e albumina; indicadores do metabolismo energético como o colesterol e a glicose plasmática (Pinheiro et al. 2003), minerais como cálcio e fósforo, indicadores de lesão hepática, o aspartato aminotransferase (AST) e gama-glutamil-transferase (GGT) e de lesão muscular, a creatinina quinase (CK). A proteína C reativa (PCR) permite fornecer informações sobre a ocorrência de danos teciduais e o monitoramento da recuperação da inflamação (Carvalho et al. 2008), e o cortisol hormônio corticosteróide é envolvido na resposta ao estresse.

No Brasil, os clínicos veterinários utilizam como valores de normalidade do hemograma e bioquímica sanguínea aqueles estabelecidos em outros países, onde o clima, região, nutrição e manejo diferem dos encontrados no país, podendo assim, acarretar em erros na interpretação dos resultados obtidos. Neste contexto, o objetivo deste trabalho foi determinar os valores hematológicos e bioquímicos, PCR e cortisol de ararajubas (Guaroba guarouba) criadas em cativeiro no Município do Recife, Pernambuco, Brasil.

MATERIAL E MÉTODOS

As aves utilizadas foram oriundas do Zoológico Parque Estadual de Dois Irmãos, localizado no bairro Dois Irmãos em Recife, Pernambuco, cuja área é de 384,42 hectares, sendo 14 hectares de área construída, situando-se em uma região remanescente de Mata Atlântica, categorizado como área de proteção integral, o manejo com aves e as respectivas colheitas de materiais biológicos seguiram recomendações do certificado de cadastro técnico federal de regularidade do sisfauna do Parque Estadual Dois Irmãos autorizadas pelo IBAMA-PE (Proc. 3543851).

Foram estudados 14 exemplares de ararajubas que encontravam em cativeiro há mais de quatro meses, elas foram identificadas através de anilhas metálicas numeradas nos membros pélvicos, o peso corporal variava de 200 a 350 gramas, recebia a mesma dieta alimentar composta por grãos, ração e frutas. Não foi possível determinar o sexo desses animais, também não havia ave acasalada e todas as aves do estudo possuíam controle sanitário e histórico de saúde conhecido e registrado.

Utilizou-se o método de contenção física conforme Marques (2009). A colheita de sangue foi realizada segundo Oglesbee (1998) e Martinez (2003), utilizando-se puçás e luvas de raspa de couro, a venipunção foi realizada na veia ulnar (braquial) na superfície ventral da articulação úmeroradioulnar ou venipunção da veia jugular direita. As amostras foram colhidas com seringas descartáveis tipo insulina, com um volume final de 0,8 ml, dividida em duas porções de volume iguais, onde a primeira foi depositada em tubo de MiniCollect®CE contendo EDTA (ácido dietilenodiaminotetracético) para prova hematológica e a segunda depositada em tubo com gel separador, sendo em seguida submetido à centrifugação (500 G) para a separação do soro sanguíneo.

A contagem de hemácias foi efetivada em hemocitômetro utilizando a câmera de Neubauer, segundo técnica descrita por Jain (1993). A determinação do volume globular pelo método do microhematócrito; a concentração da hemoglobina, determinada pelo método da cianometahemoglobina e calculados os índices hematimétricos (Benez 2001).

Para os leucócitos, utilizou-se pipeta de Thomas (diluição 1:200), usando a solução de Alsiver's com formol e cristal violeta. O valor obtido na contagem de leucócitos na câmara de Neubaeur foi acrescido de 10 % e multiplicado por 100, a fim de se obter o valor verdadeiro referente ao número de leucócitos por mililitro (Thrall et al. 2004). Para a observação morfológica das células vermelhas e contagem diferencial das células brancas, fez-se dois esfregaços de sangue sobre lâminas coradas com Panótico, onde foram contadas 100 (cem) células (Garcia-Navarro et al. 1994). No soro sanguíneo foram determinados: Proteína total, albumina, globulina, ácido úrico, glicose, colesterol, DHDL, LDH, VLDH, triglicérides, AST, GGT, fosfatase alcalina (FA), bilirrubina total, cálcio, fósforo, ferro e PCR através do analisador automático ARCHITECT c8000. Para a determinação do cortisol utilizou-se o analisador da Cobas E411 da Roche Diagnostics.

Os dados foram caracterizados por dispersão de freqüências, utilizando-se as seguintes medidas de tendência central: Média, desvios-padrão, mediana e percentil de 25 e percentil 75.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Os resultados dos parâmetros hematológicos, bioquímicos, PCR e de cortisol, estão apresentados no Quadro 1. Prioste et al. (2012) ao estudarem os valores de referências hematológicas em cativeiro de (Guaruba guarouba) clinicamente saudáveis ​apresentaram valores próximos das concentrações encontradas neste experimento, em seus estudos os valores hematológicos obtiveram o seguinte comportamento: no eritrograma os eritrócitos variaram: 3,6±0,5 × 106 células/mm3, hemoglobina 12,8±1,4g/dl, hematócrito de 46±3,8%, volume corpuscular médio 132±20 fl, hemoglobina corpuscular média (HCM) 36±5,7 pg, concentração de hemoglobina corpuscular média (CHCM) 28±3,5%, e no leucograma os leucócitos totais: 11,9±4,5 × 103 células/mm3, heterófilos 6.284±2.715 células/mm3, linfócitos 5.473±2.408 células/mm3, monócitos 113±162 células/mm3, eosinófilos de 10±42 células/mm3, basófilos 27±64 células/mm3.


Em trabalho realizado por Gomes et al. (2011) em suas conclusões perceberam que a espécie exerce influência sobre os parâmetros do hemograma em aves do gênero Ara, em seu estudo na análise comparativa o eritrograma apresentou diferenças significativas entre as espécies de arara, para o número total de hemácias e o volume globular. Os resultados apresentados por estes autores apresentaram concentrações discretamente inferiores ao demonstrado neste trabalho.

Os valores do hemograma quando comparados com outras espécies filogeneticamente próximas estudadas no Brasil, corroboram com os dados aqui apresentados, como por Bonello et al. (2002) ao estudarem vinte araras-canindé (Ara ararauna), obtiveram valores médios de hemácias de 3,2 (x 106/μL), volume globular de 47 (%), hemoglobina de 13,38g/dL, VCM de 147,8 fL e CHCM de 28,64g/dL. Os valores dos eritrócitos observados nas ararajubas estiveram próximos aos valores observados por Bonello et al. (2002). Importante considerar que diferenças de valores do eritrograma em ararajubas podem ser relacionadas com alguns fatores de variabilidade, como metodologia, fatores ambientais (altitude e clima), estresse do manejo da criação, do tipo de criação, bem como do manejo alimentar (Jain 1993).

Almeida et al. (2001), estudando ararajubas (Guaroba guarouba) relataram valores de hemácias significamente inferiores aos observados neste estudo, com contagem de hemácias com valor médio de 1,9 (x 106/mm3) com faixa de variação de 1,3 a 2,7 (x 106/mm3). Pode ser demonstrado uma pequena variação na concentração da hemoglobina, quando confrontados com os dados de Almeida et al. (2001), Bonello et al. (2002) Santos (1999) e Allgayer et al. (2005). Esta pequena variação pode ser devida ao tipo de alimentação ou as técnicas utilizadas, tais como: hematina ácida, oxihemoglobina e cianometahemoglobina, com margem de erro de 15%, 10% e 1% respectivamente (Bush 1982).

As médias dos parâmetros hematócrito, CHCM e VCM registrados nas ararajubas são análogos aos dados de outros psitacídeos, como apresentados por Santos (1999), Almeida et al. (2001), Bonello et al. (2002) e Allgayer et al. (2005), refletindo, deste modo, uma condição de normalidade para a espécie em questão e sendo importante para estudos clínicos e acompanhamentos em situações de enfermidades que provavelmente essas aves venha a manifestar. Como são escassos estudos com caracterização do perfil hematológico e bioquímico desta espécie, importante ressaltar a relevância de novos estudos sobre o eritrograma, em situações de higidez e doenças. Os valores dos leucócitos totais foram inferiores aos reportados por Almeida et al. (2001) quando avaliaram a mesma espécie e registraram leucometria global obteve média de 13,8 (x 103/μl). Esta variação pode estar associada, provavelmente, com idade e atividade muscular, bem como diferença de metodologia de análise (Jain 1993). Com relação aos demais parâmetros do perfil leucométrico, estes foram análogos aos observados por Santos (1999), Almeida et al. (2001), Bonello et al. (2002) e Allgayer et al. (2005). As divergências encontradas com os dados da literatura ressaltam a importância de se divulgar os resultados do presente estudo e a necessidade de se desenvolver estudos mais amplos sobre os valores hematológicos das ararajubas, levando-se em consideração a região e o modo de criação, assim como a metodologia empregada nas análises hematológicas.

Como detectado nos parâmetros anteriormente estudados, as informações relativas à mensuração dos aspectos bioquímicos em aves de cativeiro também se apresentam escassas, dificultando a comparação dos resultados obtidos. Estudos semelhantes foram realizados por Valle et al. (2008), que mensuraram alguns indicadores bioquímicos em psitacídeos mantidos em cativeiro, como a espécie Ara ararauna, onde obtiveram os seguintes resultados: AST (108-140 U/L), GGT (6,3-9,5 U/L), FA (185-387 U/L), proteínas totais (3,4-4,0g/dL), albumina (1,3-1,4g/dL), ácido úrico (1,9-2,3mg/dl), colesterol (177-216mg/dL), cálcio (9-10,3mg/dL) e fósforo (5,1-6,4mg/dL). Da mesma forma que nos mamíferos, as atividades enzimáticas nas aves podem ser utilizadas para detectar distúrbios hepatocelulares. Os valores encontrados das atividades da AST e GGT mostraram próximos aos valores registrados por Valle et al. (2008), porém o que chama a atenção é a atividade da FA, em que nas aves ararajubas tal atividade foi muito inferior aos observados em araras Canindé. Certamente fatores relacionados com a condição nutricional sejam decisivos para definir tal variação, além de que estudos com perfil hormonal precisam ser realizados, para que se possa compreender melhor o metabolismo bioquímico e mineral destas aves.

De acordo com Valle et al., (2008) ao avaliar araras canindé, as concentração de colesterol variaram de (150,1mg/dL e 215,7mg/dL). Lumeij (1997) relatou que as concentrações plasmáticas de colesterol para a maioria das espécies das aves estava compreendida entre 100 e 250mg/dL, e tais dados comprovados neste experimento com ararajubas, quando obtiveram valores médios de 180,00±8,32mg/dL. Em trabalho realizado por Gomes et al. (2011) ao avaliarem Ara araruna, Ara chloroptera e Ara macao, encontraram concentrações séricas de 198,7mg/dL, 114,9mg/dL e 146,60mg/dL, respectivamente para as espécies estudas.

O colesterol é eliminado na forma de ácidos biliares, o aumento da sua concentração no plasma pode estar associado com obstrução biliar extra-hepática, fibrose hepática e hiperplasia de ductos biliares nas aves (Amand 1986, Campbell 2004), fato não observado nas ararajubas, visto que os valores são análogos aos observados na literatura. Os valores da glicose demonstrado neste trabalho (271,17±10,30mg/dL), apresentam-se dentro dos valores de normalidade quando comparados com a concentração de glicose de aves sadias como relatado por Campbell (2004), no qual encontraram valores que variaram de 200 a 500 mg/dL. Nas aves esse valor é bem superior quando comparados com os mamíferos, e que podem ser explicados pelo fato de que os eritrócitos das aves utilizam ácidos graxos e não glicose para seu metabolismo (Amand 1986, Campbell 2004).

A análise dos triglicerídeos séricos demonstraram concentrações que concordam com os resultados mencionados por Gomes et al. (2011) e Polo et al. (1998) com valores de (118,8±62,3mg/dL) e (106,8±62,3mg/dL), respectivamente. Segundo Polo et al. (1998) diferenças nas concentrações de triglicérides podem sugerir um fator de variabilidade das espécies.

A mensuração das proteínas totais é um indicador útil do estado de higidez aviária (Hochleithner 1994). A concentração das proteínas plasmáticas totais nas aves é menor quando comparada a dos mamíferos, variando entre 3,0 e 6,0g/dL (Campbell & Dein 1984) e 2,5 e 4,5g/dL (Thrall et al. 2004), em araras. A albumina representa de 40 a 50% da proteína plasmática total das aves (teores normais variam de 0,8 a 2,0g/dL) e é sintetizada no fígado (Kaneko et al. 1997). De forma geral, os principais fatores que afetam as concentrações das proteínas totais nas aves são: idade, sazonalidade, condições de criação (manejo) e doenças (Lumeij 1997). Os valores médios de referência da albumina descritos neste estudo, apesar de ser realizado em espécie diferente, são análogos aos observados por Altan et al. (1997) que apresentaram valores da albumina variando de 1,2 a 3,2g/dL para a maioria dos psitacídeos. O ácido úrico é o principal produto do metabolismo de nitrogênio, constituindo aproximadamente 60 a 80% do total de nitrogênio excretado pela urina da ave (Lumeij 1997, Campbell 2004). Os valores médios de acido úrico apresentados são considerados normais, já que apenas concentrações sangüíneas superiores a 15mg/dL em aves sugerem alterações da função renal (Amand 1986, Campbell 2004).

Os valores do cálcio (7,85±0,30mg/dL), foram próximos ao valor médio inferior observado por Valle et al. (2008) ao estudarem Araras canindé (Ara ararauna) e registraram valor do cálcio de 9,0-10,3mg/dL. O teor sanguíneo de fósforo sérico obtido neste trabalho (4,77±0,30mg/dL) foi semelhante ao relatado por Valle et al. (2008), que variou de 4,9 a 6,2mg/dL. Desequilíbrios nutricionais são os principais responsáveis pela ocorrência de distúrbios no metabolismo do cálcio e do fósforo em aves (Oglesbee 1998) e o registro destes macroelementos em ararajubas é de extrema importância quando se fizer necessário discutir dados de situações que comprometam a saúde destas aves, criadas em cativeiro ou em condição livre.

Com relação aos parâmetros ferro, PCR e cortisol nenhum trabalho foi encontrado com dados que pudessem ser utilizados para discussão, tornando-se, deste modo, dados inéditos e importantes para espécies de ararajubas. A PCR é de grande importância na clínica médica e pode ser utilizada como marcador de reação inflamatória em ararajubas em situações de risco, quando estas certamente encontram-se elevadas em sua determinação sanguínea. Quanto ao nível sérico de cortisol, este tem fundamentação para avaliar o nível de estresse em que esses animais são submetidos, particularmente quando se trata de animais de cativeiro.

CONCLUSÃO

Os parâmetros referentes à hematologia, bioquímica, minerais, PCR e cortisol sanguíneos obtidos neste estudo podem ser utilizados como parâmetros de referência para as ararajubas mantidas em cativeiro em condições similares de manejo e higidez e ainda pode contribuir para os trabalhos de conservação ex situ desta espécie.

Recebido em 30 de novembro de 2012.

Aceito para publicação em 23 de janeiro de 2013.

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    Autor para correspondência:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      21 Maio 2013
    • Data do Fascículo
      Mar 2013

    Histórico

    • Recebido
      30 Nov 2012
    • Aceito
      23 Jan 2013
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