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Intoxicação por Senecio brasiliensis em bezerros: padrão e evolução de lesões hepáticas

Senecio brasiliensis poisoning in calves: pattern and evolution of hepatic lesions

RESUMO:

Intoxicações por plantas do gênero Senecio representam uma importante causa de morte em bovinos no Rio Grande do Sul e estima-se que mais de 50% das mortes causadas por plantas tóxicas devem-se à intoxicação por Senecio spp. Nesse trabalho, são descritos os aspectos epidemiológicos, clínicos e anatomopatológicos de um surto de intoxicação natural por Senecio brasiliensis em bezerros e a caracterização e evolução das lesões hepáticas durante o surto. Um lote com 206 bovinos, fêmeas, sem raça definida, foi desmamado com aproximadamente quatro meses de idade e soltos em campo nativo com 25 hectares, contendo grande quantidade de Senecio brasiliensis em diferentes estágios. Os bovinos permaneceram nesse campo durante três meses e posteriormente foram transferidos para outra área. Na nova área, seis bezerras, com idades entre sete a oito meses, começaram a apresentar sinais clínicos de emagrecimento, fraqueza, diarreia e edema subcutâneo de declive na região submandibular. Os seis bovinos morreram em um período de 15 dias e um deles foi necropsiado. Macroscopicamente, foi visualizado o primeiro dos três padrões distintos de lesão hepática dos bovinos desse surto, que se caracterizava por um fígado aumentado de tamanho, com os bordos arredondados e com superfície capsular e de corte alaranjada. Histologicamente havia acentuada degeneração vacuolar hepatocelular difusa, bilestase, megalocitose e leve proliferação de ductos biliares e fibrose periportal. Dois meses após o início do surto, constatou-se que em um período de 20 dias adoeceram mais 28 bezerras e, dessas, 14 morreram. Os bovinos acometidos nessa segunda visita tinham idades entre nove a 10 meses. O principal sinal clínico observado foi fotossensibilização, e incluía graus variados de fotofobia, lacrimejamento, salivação excessiva, descarga ocular mucopurulenta, secreção nasal e glossite diftérica ventral. Das 14 bezerras mortas, realizou-se a necropsia de duas delas, sendo visualizado o segundo padrão de lesão hepática nesse surto (Padrão 2). Os fígados estavam com a superfície capsular lisa e esbranquiçada e moderadamente diminuídos de tamanho. Ao corte observou-se leve irregularidade do parênquima e áreas mais claras intercaladas com áreas avermelhadas. O aspecto histológico incluía acentuada fibrose periportal, marcada proliferação de ductos biliares, megalocitose, áreas multifocais de necrose de hepatócitos, hemorragia e lesões veno-oclusivas. A atividade sérica da GGT foi avaliada em 15 bovinos afetados nessa segunda visita à propriedade. Desses, 13 bezerras testadas apresentaram alterações nos valores, que variaram de 26-175 U/L. Em uma terceira visita à propriedade, sete meses após o início do surto, mais 27 bezerras adoeceram em um período de 40 dias e, dessas, 23 morreram, sendo três submetidas à necropsia. Evidenciou-se o terceiro padrão de lesão hepática. O fígado dos três bovinos estava diminuído de tamanho e acentuadamente firme. A superfície capsular era lisa e esbranquiçada, e a superfície de corte apresentava-se difusamente acastanhada. Lesões histológicas semelhantes ao segundo padrão foram também constatadas no fígado dessas três bezerras. Na quarta visita à propriedade, realizaram-se biópsias hepáticas nos 163 bovinos restantes do lote. Lesões hepáticas características da intoxicação estavam presentes em 103 dos 163 bovinos submetidos à biopsia hepática. Os bovinos afetados foram classificados em grupos de acordo com a severidade e os aspectos morfológicos observados. O diagnóstico de intoxicação nos bovinos desse estudo baseou-se nos achados epidemiológicos, clínicos e anatomopatológicos, associados ao histórico do consumo da planta e evolução das lesões.

TERMOS DE INDEXAÇÃO:
Doenças de bovinos; plantas tóxicas; plantas hepatotóxicas; Senecio brasiliensis; Asteraceae; intoxicação por plantas; bezerros; alcaloides pirrolizidínicos; padrões de lesões hepáticas; fotossensibilização hepatógena

ABSTRACT:

Poisoning by Senecio spp. plants are an important cause of death in cattle in the State of Rio Grande do Sul, Brazil. It is estimated that over 50% of deaths caused by toxic plants are due to the ingestion of Senecio spp. The epidemiological, clinical and anatomopathological aspects of a spontaneous outbreak of Senecio brasiliensis in calves are described here. Characterization and evolution of liver lesions during the outbreak are also described. Two hundred and six 4-month-old female calves were weaned and placed in a 25-hectare pasture heavily infested by S. brasiliensis at of varying growth stages. The calves remained in this pasture for three months and were later transferred to another area where six calves aged 7-8- month-old developed clinical signs including unthriftiness, diarrhea, and subcutaneous dependent edema in the submandibular region. All these six affected calves died within 15 days from the onset of clinical signs and one of those was necropsied. Grossly the first of three patterns of hepatic lesions described in this report was observed and it was characterized by an enlarged liver, with round borders and an orange hue to the capsular and cut surfaces. Histologically there was marked diffuse vacuolar hepatocellular degeneration, bilestasis, hepatocellular megalocytosis, and mild bile duct proliferation and periportal fibrosis. Two months after the onset of the outbreak, in another visit to the farm, it was observed that an additional 28 calves got sick and 14 died. Affected calves observed in this second on-site visit were 9-10 month-old and their main clinical sign was photosensitization characterized by varying degrees of photophobia, tearing from the eyes, marked drooling, mucopurulent ocular discharge, increased nasal secretion, and ventral diphtheric glossitis. Two of the fourteen calves that died were necropsied and displayed the second pattern of hepatic lesions observed in the outbreak. Liver had smooth and whitish capsular surfaces and a moderate decrease in size. There was moderate irregularity to the cut surface of hepatic parenchyma and pale areas intercalated with red ones. Histologically there was marked periportal fibrosis, marked bile duct proliferation, hepatocellular megalocytosis, focal areas of hepatocellular necrosis, and hemorrhage and veno-occlusive changes. In this second on-site visit, GGT serum activity was determined in 15 affected calves and 13 of them had increased values (26-175 U/L). Seven months after the onset of the outbreak, a third visit was made to the farm when was learned that and additional 27 calves have been affected, 23 of which died within a period of 40 days. At the necropsy of three of these calves the third pattern of hepatic lesions were observed. The liver was decreased in size and markedly firm. The capsular surface was smooth and whitish and the capsular surface was diffusely tan. Histological lesions similar to those observed in the second pattern were seen in in the liver of these three calves. A fourth on-site visit to the farm was made and a liver biopsy was performed in each of the 163 calves remaining in the herd and hepatic lesions characteristic of Senecio poisoning were observed in the liver biopsy of 103 of them. Affected calves were classified in groups according to the severity and morphologic aspects of the observed hepatic lesions. The diagnosis of Senecio poisoning in calves of this study was based on epidemiology, clinical and anatomopathological findings associated with the history of consumption of the plant, and on the chronological development of the lesions.

INDEX TERMS:
Cattle diseases; poisonous plants; hepatotoxic plants; Senecio brasiliensis; Asteraceae; plant poisoning; calves; pyrrolizidine alkaloids; hepatic lesions pattern; hepatogenous photosensitization

Introdução

Intoxicações por plantas do gênero Senecio representam uma importante causa de morte em animais de produção, principalmente, em bovinos, com perdas econômicas na cadeia produtiva (Tokarnia et al. 2012aTokarnia C.H., Brito M.F., Barbosa J.D., Peixoto P.V. & Döbereiner J. 2012a. Senecio spp., p.177-191. In: Ibid. (Eds), Plantas Tóxicas do Brasil para Animais de Produção. 2ª ed. Editora Helianthus, Rio de Janeiro. 566p.). Estima-se, que no Rio Grande do Sul, mais de 50% das mortes de bovinos causadas por plantas tóxicas devem-se à intoxicação por Senecio spp. (Riet-Correa & Medeiros 2001Riet-Correa F. & Medeiros R.M.T. 2001. Intoxicações por plantas em ruminantes no Brasil e no Uruguai: importância econômica, controle e riscos para a saúde pública. Pesq. Vet. Bras. 21(1):38-42., Rissi et al. 2007Rissi D.R., Rech R.R., Pierezan F., Gabriel A.L., Trost M.E., Brum J.S., Kommers G.D. & Barros C.S.L. 2007. Intoxicações por plantas e micotoxinas associadas a plantas em bovinos no Rio Grande do Sul: 461 casos. Pesq. Vet. Bras. 27(7):261-268., Lucena et al. 2010Lucena R.B., Rissi D.R., Maia L.A., Flores M.M., Dantas A.F.A., Nobre V.M.T., Riet-Correa F. & Barros C.S.L. 2010. Intoxicação por alcaloides pirrolizidínicos em ruminantes e equinos no Brasil. Pesq. Vet. Bras. 30(5):447-452.). Neste gênero da família Asteraceae, estão incluídas mais de 1.200 espécies, e no Brasil são conhecidas 67 delas, com distribuição geográfica na região CentroSul do país (Hind 1993Hind D.J.N. 1993. A Checklist of the Brazilian Senecioneae (Compositae). Kew Bull. 48:279-295., Tokarnia et al. 2012aTokarnia C.H., Brito M.F., Barbosa J.D., Peixoto P.V. & Döbereiner J. 2012a. Senecio spp., p.177-191. In: Ibid. (Eds), Plantas Tóxicas do Brasil para Animais de Produção. 2ª ed. Editora Helianthus, Rio de Janeiro. 566p.). A principal espécie de Senecio associada com intoxicações em animais de produção é o S. brasiliensis (Riet-Correa & Méndez 2007Riet-Correa F. & Méndez M.C. 2007. Intoxicação por plantas e micotoxinas, p.99-221. In: Riet-Correa F. , Schild A.L., Lemos R.A.A. & Borges J.R. (Eds), Doenças de Ruminantes e Equídeos. Vol.2. 3ª ed. Pallotti, Santa Maria. 694p., Tokarnia et al. 2012aTokarnia C.H., Brito M.F., Barbosa J.D., Peixoto P.V. & Döbereiner J. 2012a. Senecio spp., p.177-191. In: Ibid. (Eds), Plantas Tóxicas do Brasil para Animais de Produção. 2ª ed. Editora Helianthus, Rio de Janeiro. 566p.). Além dessa espécie, observa-se um aumento no número de casos relacionados à intoxicação por Senecio madagascariensis (Cruz et al. 2010Cruz C.E.F., Karam F.C., Dalto A.C., Pavarini S.P., Bandarra P.M. & Driemeier D. 2010. Fireweed (Senecio madagascariensis) poisoning in cattle. Pesq. Vet. Bras. 30(1):10-12., Stigger et al. 2014Stigger A.L., Estima-Silva P., Fiss L., Coelho A.C.B., Santos B.L., Gardner D.R., Marcolongo-Pereira C. & Schild A.L. 2014. Senecio madagascariensis Poir. (Asteraceae): uma nova causa de seneciose em bovinos no Sul do Rio Grande do Sul. Pesq. Vet. Bras. 34(9):851-855.).

A toxicidade das plantas do gênero Senecio deve-se à presença de alcaloides que pertencem ao grupo das pirrolizidinas, os quais são hepatotóxicos e produzem lesão crônica e irreversível, caracterizada pela inibição da mitose de hepatócitos (Radostits et al. 2007Radostits O.M., Gay C.C., Hinchcliff K.W. & Constable P.D. 2007. Diseases associated with toxins in plants, fungi, cyanobacteria, plant-associated bacteria, and venoms in ticks and vertebrate animals, p.1850-1920. In: Ibid. (Eds.), Veterinary Medicine. 10th ed. Saunders Elsevier, Philadelphia. 2156p., Riet-Correa & Méndez 2007Riet-Correa F. & Méndez M.C. 2007. Intoxicação por plantas e micotoxinas, p.99-221. In: Riet-Correa F. , Schild A.L., Lemos R.A.A. & Borges J.R. (Eds), Doenças de Ruminantes e Equídeos. Vol.2. 3ª ed. Pallotti, Santa Maria. 694p., Barros 2016Barros C.S.L. 2016. Fígado, vias biliares e pâncreas exócrino, p.181-265. In: Santos R.L. & Alessi A.C. (Eds), Patologia Veterinária. 2ª ed. Roca, Rio de Janeiro. 842p., Tokarnia et al. 2012aTokarnia C.H., Brito M.F., Barbosa J.D., Peixoto P.V. & Döbereiner J. 2012a. Senecio spp., p.177-191. In: Ibid. (Eds), Plantas Tóxicas do Brasil para Animais de Produção. 2ª ed. Editora Helianthus, Rio de Janeiro. 566p.). Sob condições naturais, a intoxicação por Senecio spp. acomete principalmente bovinos (Tokarnia et al. 2012aTokarnia C.H., Brito M.F., Barbosa J.D., Peixoto P.V. & Döbereiner J. 2012a. Senecio spp., p.177-191. In: Ibid. (Eds), Plantas Tóxicas do Brasil para Animais de Produção. 2ª ed. Editora Helianthus, Rio de Janeiro. 566p.), mas podem ocorrer surtos esporádicos em equinos (Gava & Barros 1997Gava A. & Barros C.S.L. 1997. Senecio spp. Poisoning in horses in southern Brazil. Pesq. Vet. Bras. 17(1):36-40.), ovinos (Ilha et al. 2001Ilha M.R., Loretti A.P., Barros S.S. & Barros C.S.L. 2001. Intoxicação espontânea por Senecio brasiliensis (Asteraceae) em ovinos no Rio Grande do Sul. Pesq. Vet. Bras. 21(3):123-138., Giaretta et al. 2014bGiaretta P.R., Panziera W., Hammerschmitt M.E., Bianchi R.M., Galiza G.J.N., Wiethan I.S., Bazzi T. & Barros C.S.L. 2014b. Clinical and pathological aspects of chronic Senecio spp. poisoning in sheep. Pesq. Vet. Bras. 34(10):967-973.) e bubalinos (Corrêa et al. 2008Corrêa A.M.R., Bezerra P.S.J., Pavarini S.P., Santos A.S., Sonne L., Zlotowski P., Gomes G. & Driemeier D. 2008. Senecio brasiliensis (Asteraceae) poisoning in Murrah buffaloes in Rio Grande do Sul. Pesq. Vet. Bras. 28(3):187-189.). A intoxicação em bovinos é observada, geralmente, em animais acima dos 18 meses (Barros 2016Barros C.S.L. 2016. Fígado, vias biliares e pâncreas exócrino, p.181-265. In: Santos R.L. & Alessi A.C. (Eds), Patologia Veterinária. 2ª ed. Roca, Rio de Janeiro. 842p.), e a ocorrência da intoxicação natural em bezerros é incomum, embora seja comprovado experimentalmente que bovinos jovens são mais suscetíveis (Torres & Coelho 2008Torres M.B.A. & Coelho K.I.R. 2008. Experimental poisoning by Senecio brasiliensis in calves: quantitative and semi-quantitative study on changes in the hepatic extracellular matrix and sinusoidal cells. Pesq. Vet. Bras. 28(1):43-50.). Intoxicação por diversas espécies de Senecio tem sido bem documentada no Rio Grande do Sul e as descrições macroscópicas referem-se a fígados esbranquiçados e firmes cujos aspectos histológicos predominantes incluem megalocitose, proliferação de ductos biliares e fibrose difusa. Entretanto, esses padrões frequentes de lesões hepáticas podem variar (Grecco et al. 2010Grecco F.B., Schild A.L., Soares M.P., Marcolongo-Pereira C., Estima-Silva P. & Sallis E.S.V. 2010. Aspectos epidemiológicos e padrões de lesões hepáticas em 35 surtos de intoxicação por Senecio spp. em bovinos no sul do Rio Grande do Sul. Pesq. Vet. Bras. 30(5):389-397.). Na literatura, os dados referentes aos aspectos macroscópicos e microscópicos das lesões hepáticas, associados as suas respectivas evoluções, são escassos. O objetivo deste trabalho é relatar um surto de intoxicação natural por Senecio brasiliensis em bezerros no Rio Grande do Sul e abordar os aspectos epidemiológicos e clínicos desta condição, além de caracterizar os padrões e a evolução das lesões hepáticas.

Material e Métodos

Os dados epidemiológicos e clínicos foram obtidos durante quatro visitas à propriedade onde os casos de intoxicação por Senecio brasiliensis ocorreram e por contato constante com o proprietário durante um ano. Amostras de sangue de 15 bovinos afetados foram coletadas para a realização de hemograma e avaliação na atividade das enzimas gamaglutamiltransferase (GGT), aspartatoaminotransferase (AST) e fosfatase alcalina (FA). Durante as visitas realizou-se a necropsia de seis bovinos (Bovinos 1-6). O Bovino 1 foi submetido à necropsia na primeira visita à propriedade, os Bovinos 2 e 3 na segunda visita e os Bovinos 4, 5 e 6 na terceira visita. Fragmentos de órgãos dos bovinos foram coletados, fixados em formol a 10%, processados rotineiramente para histologia e corados pela técnica de hematoxilina e eosina (HE). Na quarta visita à propriedade, biópsias hepáticas foram realizadas em 163 bovinos (método adaptado de Barros et al. 2007Barros C .S.L., Castilhos L.M.L., Rissi D.R., Kommers G.D. & Rech R.R. 2007. Biópsia hepática no diagnóstico da intoxicação por Senecio brasiliensis (Asteraceae) em bovinos. Pesq. Vet. Bras. 27(1): 53-60.). Cortes selecionados de fígados foram corados pela técnica de histoquímica de tricômico de Masson, para evidenciação de tecido conjuntivo fibroso. Amostras de milho foram coletadas para determinação de aflatoxinas. O método empregado para extração, clarificação e quantificação de aflatoxinas foi preconizado por Mallmann et al. (2000)Mallmann C.A., Santurio J.M., Almeida C.A., Fontana F., Mostardeiro C.P. & Stefanon E.C. 2000. Automation of the analytical procedure for the simultaneous determination of aflatoxins AFB1, AFB2, AFG1 and AFG2. X International Iupac Symposium on Mycotoxins and Phycotoxins. Guarujá, São Paulo, p.35..

Resultados

O surto de intoxicação por Senecio brasilienesis ocorreu em uma propriedade rural no município de São Francisco de Paula (29° 26′ 52″ S, 50° 35′ 2″ W), Rio Grande do Sul, Brasil. Um lote com 206 bezerras, sem raça definida, nascidas nos meses de setembro e outubro de 2014, foi desmamado com, aproximadamente, quatro meses de idade e soltas em campo nativo com 25 hectares, contendo grande quantidades de S. brasiliensis em diferentes estágios. Os bovinos permaneceram nesse campo durante três meses (janeiro a abril de 2015) e posteriormente foram levados para outra área, onde foram submetidos a um sistema de semi-confinamento, no qual se realizou suplementação com silagem de milho e ração formulada na propriedade contendo milho, ureia e casca de soja. Nessa nova área, inicialmente, seis bezerras (6/206), com idades entre sete a oito meses, começaram a apresentar sinais clínicos caracterizados por emagrecimento, fraqueza, pelos arrepiados, diarreia e edema na região submandibular. Os seis bovinos morreram em um período de 15 dias e um deles (Bovino 1) foi submetido à necropsia na primeira visita à propriedade. Macroscopicamente, observou-se leve icterícia e áreas de hemorragia no tecido subcutâneo (Fig.1A). Nessa bezerra, foi visualizado o primeiro dos três padrões distintos de lesão hepática dos bovinos desse surto. Esse padrão inicial (Padrão 1) denotou um estágio subagudo da intoxicação e caracterizava-se por um fígado aumentado de tamanho, com os bordos arredondados e com superfície capsular alaranjada. A superfície de corte também era difusamente alaranjada e o parênquima possuía consistência friável (Fig.1B). Histologicamente, havia acentuada degeneração vacuolar hepatocelular difusa, marcada bilestase, moderada megalocitose e proliferação de ductos biliares e leve fibrose periportal (Fig.1C e 1D).

Fig.1:
(A) Bezerra intoxicada por Senecio brasiliensis submetida à necropsia no início do surto. Observe a leve icterícia e áreas de hemorragia no tecido subcutâneo. (B) Superfície de corte do fígado do bovino da figura A. Esse representou o primeiro padrão de lesão hepática observado nesse surto (Padrão 1). Note que o parênquima hepático está difusamente alaranjado. (C) Aspecto histológico do fígado com o Padrão 1. Observa-se acentuada degeneração vacuolar difusa de hepatócitos e marcada bilestase. Note que nesse padrão a proliferação do epitélio ductal e de tecido conjunativo fibroso são leves. HE, obj.10x. (D) Maior aumento da Figura 1C, demonstrando os numerosos vacúolos de diferentes tamanhos no interior do citoplasma de hepatócitos, que por vezes deslocam o núcleo. Há ainda acentuada bilestase. No centro dessa imagem há um espaço porta com leve fibrose e proliferação de ductos biliares. HE, obj.20x.

Dois meses após o início do surto, realizou-se uma segunda visita à propriedade e constatou-se que em um período de 20 dias adoeceram mais 28 bezerras (28/200) e, dessas, 14 morreram (14/200). Os bovinos acometidos nessa visita tinham idades entre nove a 10 meses. O principal sinal clínico observado nessa ocasião, além dos citados previamente, foi a fotossensibilização. As bezerras afetadas por essa manifestação apresentavam graus variados de fotofobia, lacrimejamento, salivação excessiva (Fig.2A), descarga ocular mucopurulenta, secreção nasal e glossite diftérica ventral (Fig.2B). As lesões cutâneas eram eritematosas (lesões iniciais) e crostosas (lesões mais tardias), frequentemente visualizadas no plano nasal, dorso das orelhas, tetos e pele da região periocular e dorsal. Alguns desses bovinos apresentaram alterações do comportamento, sinais neurológicos e agressividade. Das 14 bezerras mortas, realizou-se a necropsia de duas delas (Bovinos 2 e 3), no qual foi possível distinguir o segundo padrão de lesão hepática nesse surto (Padrão 2). Os fígados de ambas as bezerras acometidas estavam com a superfície capsular lisa e esbranquiçada e moderadamente diminuídos de tamanho. Ao corte observou-se leve irregularidade do parênquima e áreas mais claras intercaladas com áreas avermelhadas (Fig.2C). O parênquima estava acentuadamente firme. O aspecto histológico desse segundo padrão incluía acentuada fibrose periportal, marcada proliferação de ductos biliares e moderada megalocitose. Em algumas áreas a fibrose era intensa, dissecava os hepatócitos remanescentes e ocasionalmente unia os espaços porta (fibrose em ponte). Observaram-se áreas multifocais de moderada a acentuada necrose de hepatócitos e hemorragia e numerosas veias centrolobulares circundadas por abundante tecido conjuntivo fibroso (lesão veno-oclusiva) (Fig.2D). O tecido fibroso foi corado fortemente em azul pela técnica de histoquímica de tricrômico de Masson (Fig.2E). Na pele dos bovinos com fotossensibilização, observou-se acentuada acantose irregular, hiperceratose ortoceratótica e paraceratótica, e numerosas crostas sobre a epiderme, constituídas por grande quantidade de detritos celulares e infiltrado inflamatório composto principalmente por neutrófilos íntegros e degenerados. Havia áreas multifocais de ulceração da epiderme e moderado infiltrado inflamatório constituído por neutrófilos, plasmócitos, linfócitos e macrófagos nessas áreas e circundando alguns anexos (Fig.2F).

Fig.2:
(A) Bovino intoxicado por Senecio brasiliensis com sinal clínico de fotossensibilização, dois meses após o início do surto. Observe que o animal apresenta intensa salivação. (B) Superfície ventral da língua do bovino da figura A, demonstrando área extensa de ulceração com áreas de deposição de fibrina (glossite diftérica ventral). (C) Superfície de corte do fígado dos bovinos com o segundo padrão de lesão hepática (Padrão 2). Observe a leve irregularidade do parênquima e a presença de áreas mais claras intercaladas com áreas avermelhadas. (D) Lesões histológicas visualizadas no fígado dos bovinos com o Padrão 2. Note a acentuada fibrose periportal e a marcada proliferação de ductos biliares. A proliferação de tecido conjuntivo fibroso é intensa, disseca os hepatócitos remanescentes e ocasionalmente une os espaços porta (fibrose em ponte). Nessa imagem há ainda áreas de moderada necrose hepatocelular e hemorragia. HE, obj.10x. (E) Veia centrolobular circundada por tecido conjuntivo fibroso (lesão veno-oclusiva), corado em azul na técnica de tricrômico de Masson, obj.20x. (F) Pele de um bovino com fotossensibilização. Observa-se área focalmente extensa de úlcera da epiderme, associada à grande quantidade de detritos celulares e infiltrado inflamatório predominantemente neutrofílico. O infiltrado inflamatório invade a derme superficial e circunda alguns anexos. HE, obj.10x.

A atividade sérica da GGT foi avaliada em 15 bovinos afetados nessa segunda visita à propriedade. Desses, 13 bezerras testadas apresentaram alterações nos valores, que variaram de 26-175 U/L (valores de referência: 6,1-17,4 U/L [Tennant & Center 2008Tennant B.C. & Center S.A. 2008. Hepatic function, p.379-412. In: Kaneco J.J., Harvey J.W. & Bruss M.L. (Eds), Clinical Biochemistry of Domestic Animals. 6th ed. Academic Press/Elsevier, Philadelphia. 916p.]). Dois bovinos afetados não apresentaram alteração na atividade dessa enzima. Os demais parâmetros hematológicos e sorológicos avaliados estavam dentro dos limites normais.

Em uma terceira visita à propriedade, sete meses após o início do surto, o proprietário relatou que em aproximadamente 40 dias, mais 27 bezerras adoeceram (27/186) e dessas, 23 morreram (23/186). Nessa fase do surto, os bovinos acometidos tinham aproximadamente um ano de idade e apresentaram sinais clínicos de emagrecimento, diarreia (sinais mais acentuados nessa etapa), pelos arrepiados (Fig.3A), edema submandibular e graus leves de fotossensibilização. Das 23 bezerras mortas, três foram submetidas à necropsia (Bovinos 4, 5 e 6). Nessa terceira fase do surto, foram evidenciadas características macroscópicas e microscópicas mais crônicas da intoxicação, o que auxiliou a diferenciar o terceiro padrão de lesão hepática (Padrão 3). O fígado dos bovinos estava diminuído de tamanho e acentuadamente firme. A superfície capsular era lisa e esbranquiçada, e a superfície de corte apresentava-se difusamente acastanhada (Fig.3B). Outras lesões macroscópicas observadas, e que também eram semelhantes nos bovinos necropsiados com o segundo padrão, incluíam: ascite, hidropericárdio, edema no mesentério, edema das dobras do abomaso e aumento de volume da vesícula biliar. Em todos os casos a bile estava viscosa e em um dos bovinos havia marcado edema na vesícula biliar, caracterizado por espessamento da parede e presença de numerosos pólipos edematosos na mucosa.

Fig.3:
(A) Bovino intoxicado por Senecio brasiliensis sete meses após o início do surto. Note que o bovino está acentuadamente magro, com os pelos arrepiados e com fezes secas aderidas na cauda (sinal de diarreia). (B) Superfície de corte do fígado dos bovinos com o terceiro padrão de lesão hepática (Padrão 3), demonstrando coloração difusamente acastanhada. (C) Aspecto histológico do Padrão 3. Nessa imagem observe a acentuada proliferação de ductos biliares e de tecido conjuntivo fibroso. Próximo ao canto inferior direito da imagem é possível visualizar um nódulo de regeneração, caracterizado por um grupo de hepatócitos circundados por tecido fibroso. Essa característica regenerativa da lesão designou um aspecto mais crônico da intoxicação. HE, obj.10x. (D) Maior aumento da Figura C, demonstrando acentuada fibrose, proliferação de ductos biliares e megalocitose. HE, obj.20x. (E) Tecido conjuntivo fibroso corado em azul pela técnica de tricrômico de Masson. Observe a acentuada proliferação fibrosa nos espaços porta (asteriscos) e circundando algumas veias centrolobulares (lesões veno-oclusivas [setas]). Obj.10x. (F) Acentuada vacuolização (status spongiosus) na junção entre a substância cinzenta e a substância branca subcortical do telencéfalo frontal de um dos bovinos intoxicados e que apresentou o terceiro padrão de lesão hepática. HE, obj.10x.

Lesões histológicas semelhantes ao Padrão 2 foram visualizadas no Padrão 3, entretanto, nódulos de regeneração foram melhor evidenciados no terceiro padrão (Fig.3C) e a megalocitose era mais pronunciada (Fig.3D). Lesões veno-oclusivas também foram observadas, e o tecido fibroso proliferado no parênquima hepático se destacou em azul na técnica de tricrômico de Masson (Fig.3E). Não foram observadas lesões graves de necrose e hemorragia. No encéfalo dos bovinos, observou-se acentuada vacuolização (status spongiosus) principalmente na junção entre a substância cinzenta e a substância branca subcortical do telencéfalo frontal (Fig. 3F), parietal e occipital, e substância branca dos pedúnculos cerebelares. Em um dos casos havia também intensa vacuolização no tálamo, tronco encefálico e medula espinhal.

Na quarta e última visita à propriedade, realizou-se biópsias hepáticas nos 163 bovinos restantes do lote, que inicialmente era de 206. A realização das biópsias coincidiu com um ano após o início do surto e os bovinos tinham aproximadamente 19 meses de idade. Lesões hepáticas características da intoxicação estavam presentes em 103 (63,2%) dos 163 bovinos submetidos à biopsia hepática. Os bovinos afetados foram classificados em grupos de acordo com a severidade e os aspectos morfológicos observados. Os bovinos classificados com lesões leves (80/163 [49,1%]) apresentavam megalocitose como único achado ou associada à discreta fibrose periportal e proliferação de ductos biliares (Fig.4A). Os bovinos moderadamente afetados (8/163[4,9%]) demonstraram graus mais acentuados de megalocitose, proliferação de ductos biliares e fibrose periportal (Fig. 4B). Já os bovinos considerados severamente afetados (15/163 [9,2%]) possuíam acentuada megalocitose associada à marcada proliferação de ductos biliares e fibrose difusa, que ocupava extensas áreas do parênquima, dissecava os hepatócitos remanescentes, unia os espaços portas e por vezes formava nódulos de regeneração (Fig.4C e 4D).

Fig. 4:
Aspectos histológicos observados nos bovinos submetidos à biópsia hepática. (A). Bovinos com lesões hepáticas iniciais. Observa-se leve a moderada megalocitose, associada à discreta fibrose periportal e proliferação de ductos biliares. HE, obj. 20x. (B). Bovinos com lesões hepáticas moderadas. Note que a megalocitose, a proliferação de ductos biliares e a fibrose periportal são mais proeminentes do que na figura A. HE, obj. 20x. (C). Bovinos severamente afetados. Nesse padrão, o parênquima hepático foi praticamente substituído por acentuada proliferação de ductos biliares e tecido conjuntivo fibroso, que disseca os hepatócitos remanescentes. Observe ainda acentuada megalocitose. HE, obj. 20x. (D). Fragmento de fígado retirado durante a biópsia de um bovino com lesões graves, demonstrando os numerosos nódulos de regeneração. HE, obj. 4x.

Amostras de milho, coletadas para determinação de aflatoxinas, resultaram em limites abaixo da quantificação.

Discussão

O diagnóstico de intoxicação por Senecio brasiliensis nos bezerros desse estudo baseou-se nos achados epidemiológicos, clínicos e anatomopatológicos, associados ao histórico do consumo da planta.

Dados na literatura demonstram a alta prevalência de casos de intoxicação por plantas do gênero Senecio em bovinos no Rio Grande do Sul (Riet-Correa & Medeiros 2001Riet-Correa F. & Medeiros R.M.T. 2001. Intoxicações por plantas em ruminantes no Brasil e no Uruguai: importância econômica, controle e riscos para a saúde pública. Pesq. Vet. Bras. 21(1):38-42., Pedroso et al. 2007Pedroso P.M.O., Pescador C.A., Oliveira E.C., Sonne L., Bandarra P.M., Raymundo D.L. & Driemeier D. 2007. Intoxicações naturais por plantas em ruminantes diagnosticadas no Setor de Patologia Veterinária da UFRGS no período de 1996-2005. Acta Scient. Vet. 35(2):213-218., Rissi et al. 2007Rissi D.R., Rech R.R., Pierezan F., Gabriel A.L., Trost M.E., Brum J.S., Kommers G.D. & Barros C.S.L. 2007. Intoxicações por plantas e micotoxinas associadas a plantas em bovinos no Rio Grande do Sul: 461 casos. Pesq. Vet. Bras. 27(7):261-268., Grecco et al. 2010Grecco F.B., Schild A.L., Soares M.P., Marcolongo-Pereira C., Estima-Silva P. & Sallis E.S.V. 2010. Aspectos epidemiológicos e padrões de lesões hepáticas em 35 surtos de intoxicação por Senecio spp. em bovinos no sul do Rio Grande do Sul. Pesq. Vet. Bras. 30(5):389-397., Lucena et al. 2010Lucena R.B., Rissi D.R., Maia L.A., Flores M.M., Dantas A.F.A., Nobre V.M.T., Riet-Correa F. & Barros C.S.L. 2010. Intoxicação por alcaloides pirrolizidínicos em ruminantes e equinos no Brasil. Pesq. Vet. Bras. 30(5):447-452.). O maior risco de ingestão de Senecio spp. ocorre pelo pastejo direto em épocas de escassez de forragem, uma vez que a planta é pouco palatável e consumida pelos bovinos somente sob determinadas condições. Estima-se que a planta seja ingerida em maior quantidade durante os meses de maio a agosto, período em que as diferentes espécies estão em brotação, com maior concentração de alcaloides e a disponibilidade de forragem é escassa nos campos nativos do Rio Grande do Sul (Riet-Correa & Méndez 2007Riet-Correa F. & Méndez M.C. 2007. Intoxicação por plantas e micotoxinas, p.99-221. In: Riet-Correa F. , Schild A.L., Lemos R.A.A. & Borges J.R. (Eds), Doenças de Ruminantes e Equídeos. Vol.2. 3ª ed. Pallotti, Santa Maria. 694p., Tokarnia et al. 2012aTokarnia C.H., Brito M.F., Barbosa J.D., Peixoto P.V. & Döbereiner J. 2012a. Senecio spp., p.177-191. In: Ibid. (Eds), Plantas Tóxicas do Brasil para Animais de Produção. 2ª ed. Editora Helianthus, Rio de Janeiro. 566p.). A superlotação de bovinos e a grande quantidade de Senecio spp. favorecem a ingestão e, se as plantas novas estão estreitamente associadas as forrageiras, o perigo do consumo pelos bovinos é ainda maior (Karam et al. 2011Karam F.C., Schild A.L. & Mello J.R.B. 2011. Intoxicação por Senecio spp. em bovinos no Rio Grande do Sul: condições ambientais favoráveis e medidas de controle. Pesq. Vet. Bras. 31(7):603-609.). À semelhança do que é descrito, a baixa disponibilidade de pastagem, somada a um aumento na lotação e à grande quantidade de exemplares de S. brasiliensis em diferentes estágios, são fatores que demonstram forte associação com o surto de intoxicação nos bovinos aqui descritos. Entretanto, diferentemente do que é reportado, a ingestão da planta pelos bovinos nesse surto, provavelmente iniciou em janeiro e estendeu-se à início de abril. Apesar da maior frequência da ingestão ser nos meses de maio a agosto, se as condições ambientais são favoráveis à planta, o seu desenvolvimento pode ocorrer em qualquer época do ano e consequentemente, a ingestão e a intoxicação em diferentes períodos. No Rio Grande do Sul, observa-se que sempre há espécies de Senecio em estágio vegetativo, o que indica constante disponibilidade aos animais. Assim, as mortes dos bovinos podem ocorrer durante o ano todo (Karam et al. 2002Karam F.S.C., Méndez M.C., Jarenkow J.A. & Riet-Correa F. 2002. Fenologia de quatro espécies tóxicas de Senecio (Asteraceae) na região Sul do Rio Grande do Sul. Pesq. Vet. Bras. 22(1):33-39., Karam et al. 2004Karam F.S.C., Soares M.P., Haraguchi M., Riet-Correa F., Méndez M.C. & Jarenkow J.A. 2004. Aspectos epidemiológicos da seneciose na região Sul do Rio Grande do Sul, Brasil. Pesq. Vet. Bras. 24(4):191-198., Riet-Correa & Méndez 2007Riet-Correa F. & Méndez M.C. 2007. Intoxicação por plantas e micotoxinas, p.99-221. In: Riet-Correa F. , Schild A.L., Lemos R.A.A. & Borges J.R. (Eds), Doenças de Ruminantes e Equídeos. Vol.2. 3ª ed. Pallotti, Santa Maria. 694p.).

Intoxicação espontânea por Senecio spp. em bovinos é, em geral, observada em animais adultos e em pastoreio a campo (Karam et al. 2004Karam F.S.C., Soares M.P., Haraguchi M., Riet-Correa F., Méndez M.C. & Jarenkow J.A. 2004. Aspectos epidemiológicos da seneciose na região Sul do Rio Grande do Sul, Brasil. Pesq. Vet. Bras. 24(4):191-198., Barros et al. 2007Barros C .S.L., Castilhos L.M.L., Rissi D.R., Kommers G.D. & Rech R.R. 2007. Biópsia hepática no diagnóstico da intoxicação por Senecio brasiliensis (Asteraceae) em bovinos. Pesq. Vet. Bras. 27(1): 53-60., Rissi et al. 2007Rissi D.R., Rech R.R., Pierezan F., Gabriel A.L., Trost M.E., Brum J.S., Kommers G.D. & Barros C.S.L. 2007. Intoxicações por plantas e micotoxinas associadas a plantas em bovinos no Rio Grande do Sul: 461 casos. Pesq. Vet. Bras. 27(7):261-268., Riet-Correa & Méndez 2007Riet-Correa F. & Méndez M.C. 2007. Intoxicação por plantas e micotoxinas, p.99-221. In: Riet-Correa F. , Schild A.L., Lemos R.A.A. & Borges J.R. (Eds), Doenças de Ruminantes e Equídeos. Vol.2. 3ª ed. Pallotti, Santa Maria. 694p., Grecco et al. 2010Grecco F.B., Schild A.L., Soares M.P., Marcolongo-Pereira C., Estima-Silva P. & Sallis E.S.V. 2010. Aspectos epidemiológicos e padrões de lesões hepáticas em 35 surtos de intoxicação por Senecio spp. em bovinos no sul do Rio Grande do Sul. Pesq. Vet. Bras. 30(5):389-397., Lucena et al. 2010Lucena R.B., Rissi D.R., Maia L.A., Flores M.M., Dantas A.F.A., Nobre V.M.T., Riet-Correa F. & Barros C.S.L. 2010. Intoxicação por alcaloides pirrolizidínicos em ruminantes e equinos no Brasil. Pesq. Vet. Bras. 30(5):447-452.). Diferentemente dos dados da literatura, no presente surto a doença ocorreu em bovinos jovens, caracterizando uma apresentação pouco frequente da doença. A ocorrência de intoxicação natural em bezerros é incomum e há escassos relatos (Basile et al. 2005Basile J.R., Diniz J.M.F., Okano W., Cirio S.M. & Leite L.C. 2005. Intoxicação por Senecio spp. (Compositae) em bovinos no Sul do Brasil. Acta Sci. Vet. 33(1):63-68., Barros et al. 2007Barros C .S.L., Castilhos L.M.L., Rissi D.R., Kommers G.D. & Rech R.R. 2007. Biópsia hepática no diagnóstico da intoxicação por Senecio brasiliensis (Asteraceae) em bovinos. Pesq. Vet. Bras. 27(1): 53-60., Hammerschmitt et al. 2014Hammerschmitt M.E., Giaretta P.R., Tessele B., Panziera W., Martins T.B., Vielmo A., Leon R.M. & Barros C.S.L. 2014. Apresentação clínico-patológica atípica de intoxicação por Senecio spp. em um bezerro. VIII Encontro Nacional de Diagnóstico Veterinário (Endivet) e II Encontro Internacional de Sanidade de Animais de Produção (Enisap), Cuiabá, MT. Disponível em <https://www2.ufrb.edu.br/apa/documentos/category/7-intoxicacoes?download=72:6715>.
https://www2.ufrb.edu.br/apa/documentos/...
), embora seja comprovado experimentalmente que bovinos jovens são mais suscetíveis (Torres & Coelho 2008Torres M.B.A. & Coelho K.I.R. 2008. Experimental poisoning by Senecio brasiliensis in calves: quantitative and semi-quantitative study on changes in the hepatic extracellular matrix and sinusoidal cells. Pesq. Vet. Bras. 28(1):43-50.). Além disso, intoxicações espontâneas por Senecio spp. em bezerros, quando descritas, geralmente ocorrem como casos isolados (Grecco et al. 2010Grecco F.B., Schild A.L., Soares M.P., Marcolongo-Pereira C., Estima-Silva P. & Sallis E.S.V. 2010. Aspectos epidemiológicos e padrões de lesões hepáticas em 35 surtos de intoxicação por Senecio spp. em bovinos no sul do Rio Grande do Sul. Pesq. Vet. Bras. 30(5):389-397., Hammerschmitt et al. 2014Hammerschmitt M.E., Giaretta P.R., Tessele B., Panziera W., Martins T.B., Vielmo A., Leon R.M. & Barros C.S.L. 2014. Apresentação clínico-patológica atípica de intoxicação por Senecio spp. em um bezerro. VIII Encontro Nacional de Diagnóstico Veterinário (Endivet) e II Encontro Internacional de Sanidade de Animais de Produção (Enisap), Cuiabá, MT. Disponível em <https://www2.ufrb.edu.br/apa/documentos/category/7-intoxicacoes?download=72:6715>.
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) e não em forma de surto. Na literatura brasileira há escassas descrições de surtos de intoxicação por espécies de Senecio em bezerros, e os casos abordados foram associados com a ingestão de feno misturado com a planta (Basile et al. 2005Basile J.R., Diniz J.M.F., Okano W., Cirio S.M. & Leite L.C. 2005. Intoxicação por Senecio spp. (Compositae) em bovinos no Sul do Brasil. Acta Sci. Vet. 33(1):63-68., Barros et al. 2007Barros C .S.L., Castilhos L.M.L., Rissi D.R., Kommers G.D. & Rech R.R. 2007. Biópsia hepática no diagnóstico da intoxicação por Senecio brasiliensis (Asteraceae) em bovinos. Pesq. Vet. Bras. 27(1): 53-60.) e não em bezerros à campo, como visualizados nesse trabalho. Além disso, nesse estudo houve um acompanhamento da evolução da intoxicação.

Fotossensibilização foi umas das principais alterações clínicas observadas nos bezerros desse surto. Essa manifestação representa um achado clínico pouco frequente relacionado à intoxicação por Senecio spp. na espécie bovina (Riet-Correa & Méndez 2007Riet-Correa F. & Méndez M.C. 2007. Intoxicação por plantas e micotoxinas, p.99-221. In: Riet-Correa F. , Schild A.L., Lemos R.A.A. & Borges J.R. (Eds), Doenças de Ruminantes e Equídeos. Vol.2. 3ª ed. Pallotti, Santa Maria. 694p., Barros 2016Barros C.S.L. 2016. Fígado, vias biliares e pâncreas exócrino, p.181-265. In: Santos R.L. & Alessi A.C. (Eds), Patologia Veterinária. 2ª ed. Roca, Rio de Janeiro. 842p., Tokarnia et al. 2012bTokarnia C.H., Brito M.F., Barbosa J.D., Peixoto P.V. & Döbereiner J. 2012b. Plantas/micotoxinas fotossensibilizantes, p.305-348. In: Ibid. (Eds), Plantas Tóxicas do Brasil para Animais de Produção. 2ª ed. Editora Helianthus, Rio de Janeiro. 566p.), diferentemente de ovinos (Ilha et al. 2001Ilha M.R., Loretti A.P., Barros S.S. & Barros C.S.L. 2001. Intoxicação espontânea por Senecio brasiliensis (Asteraceae) em ovinos no Rio Grande do Sul. Pesq. Vet. Bras. 21(3):123-138., Grecco et al. 2011Grecco F.B., Estima-Silva P., Marcolongo-Pereira C., Soares M.P., Collares G. & Schild A.L. 2011. Seneciose crônica em ovinos no Sul do Rio Grande do Sul. Pesq. Vet. Bras. 31(4):326-330., Giaretta et al. 2014bGiaretta P.R., Panziera W., Hammerschmitt M.E., Bianchi R.M., Galiza G.J.N., Wiethan I.S., Bazzi T. & Barros C.S.L. 2014b. Clinical and pathological aspects of chronic Senecio spp. poisoning in sheep. Pesq. Vet. Bras. 34(10):967-973.) e equinos (Pilati & Barros 2007Pilati C. & Barros C.S.L. 2007. Intoxicação experimental por Senecio brasiliensis (Asteraceae) em equinos. Pesq. Vet. Bras. 27(7):287-296.). Entretanto, esse sinal clínico já foi descrito em surtos de evolução clínica mais prolongada (entre 30-60 dias) (Motta et al. 2000Motta A.C., Rivero G.R., Schild A.L., Riet-Correa F., Méndez M.C. & Ferreira J.L. 2000. Fotossensibilização hepatógena em bovinos no Sul do Rio Grande do Sul. Ciência Rural 30:143-149., Guagnini et al. 2006Guagnini F.S., Colodel E.M., Pescador C.A., Correa A.M.R., Rozza D.B. & Driemeier D. 2006. Fotossensibilização por Senecio sp. (Asteraceae) em bovinos no Rio Grande do Sul. I Encontro Nacional de Diagnóstico Veterinário (Endivet), 27-31 mar., Campo Grande, MS. (CD), Tokarnia et al. 2012bTokarnia C.H., Brito M.F., Barbosa J.D., Peixoto P.V. & Döbereiner J. 2012b. Plantas/micotoxinas fotossensibilizantes, p.305-348. In: Ibid. (Eds), Plantas Tóxicas do Brasil para Animais de Produção. 2ª ed. Editora Helianthus, Rio de Janeiro. 566p., Giaretta et al. 2014aGiaretta P.R., Panziera W., Galiza G.J.A., Brum J.S., Bianchi R.M., Hammerschmitt M.E., Bazzi T. & Barros C.S.L. 2014a. Seneciosis in cattle associated with photosensitization. Pesq. Vet. Bras. 34(5):427-432.), sendo, nesses casos, um dos principais sinais, semelhante ao que foi observado nas bezerras desse trabalho. Clinicamente, as lesões de fotossensibilização nos bezerros do presente surto foram visualizadas principalmente no plano nasal, dorso da língua, orelhas, tetos e pele da região periocular e dorsal, e constituem as regiões mais frequentemente acometidas (Guagnini et al. 2006Guagnini F.S., Colodel E.M., Pescador C.A., Correa A.M.R., Rozza D.B. & Driemeier D. 2006. Fotossensibilização por Senecio sp. (Asteraceae) em bovinos no Rio Grande do Sul. I Encontro Nacional de Diagnóstico Veterinário (Endivet), 27-31 mar., Campo Grande, MS. (CD), Tokarnia et al. 2012bTokarnia C.H., Brito M.F., Barbosa J.D., Peixoto P.V. & Döbereiner J. 2012b. Plantas/micotoxinas fotossensibilizantes, p.305-348. In: Ibid. (Eds), Plantas Tóxicas do Brasil para Animais de Produção. 2ª ed. Editora Helianthus, Rio de Janeiro. 566p., Giaretta et al. 2014aGiaretta P.R., Panziera W., Galiza G.J.A., Brum J.S., Bianchi R.M., Hammerschmitt M.E., Bazzi T. & Barros C.S.L. 2014a. Seneciosis in cattle associated with photosensitization. Pesq. Vet. Bras. 34(5):427-432.).

Testes de função hepática demonstraram alterações no nível sérico de atividade da gamaglutamiltransferase (GGT) em 13 dos 15 bovinos doentes testados. A determinação da atividade sérica da GGT representa o melhor parâmetro de diagnóstico bioquímico de intoxicação por Senecio spp. em bovinos (Barros et al. 2007Barros C .S.L., Castilhos L.M.L., Rissi D.R., Kommers G.D. & Rech R.R. 2007. Biópsia hepática no diagnóstico da intoxicação por Senecio brasiliensis (Asteraceae) em bovinos. Pesq. Vet. Bras. 27(1): 53-60., Santos et al. 2008Santos J.C.A., Riet-Correa F., Simões S.V.D. & Barros C.S.L. 2008. Patogênese, sinais clínicos e patologia das doenças causadas por plantas hepatotóxicas em ruminantes e equinos no Brasil. Pesq. Vet. Bras. 28(1):1-14., Giaretta et al. 2014aGiaretta P.R., Panziera W., Galiza G.J.A., Brum J.S., Bianchi R.M., Hammerschmitt M.E., Bazzi T. & Barros C.S.L. 2014a. Seneciosis in cattle associated with photosensitization. Pesq. Vet. Bras. 34(5):427-432.). Entretanto, testes de função hepática são geralmente pouco confiáveis para detectar casos subclínicos da intoxicação, pois a função hepática é normal nessa fase (Barros et al. 2007Barros C .S.L., Castilhos L.M.L., Rissi D.R., Kommers G.D. & Rech R.R. 2007. Biópsia hepática no diagnóstico da intoxicação por Senecio brasiliensis (Asteraceae) em bovinos. Pesq. Vet. Bras. 27(1): 53-60.). Nesse surto, dois bovinos doentes e com lesões graves, confirmadas posteriormente pela biópsia hepática, não demonstraram alterações nos níveis séricos da GGT, sugerindo, portanto, que não apenas casos subclínicos, mas que casos clínicos podem também não apresentar alteração nos níveis dessa enzima. Com isso, em um surto de intoxicação por Senecio spp. em bovinos, o uso da biópsia hepática pode ser indicado para identificar bovinos com lesões hepáticas, com ou sem sinais clínicos. Essa é uma importante ferramenta de diagnóstico nos casos em que há suspeita de intoxicação por alcaloides pirrolizidínicos e sua aplicação pode substituir testes de função hepática ou ser aplicada concomitantemente (Barros et al. 2007Barros C .S.L., Castilhos L.M.L., Rissi D.R., Kommers G.D. & Rech R.R. 2007. Biópsia hepática no diagnóstico da intoxicação por Senecio brasiliensis (Asteraceae) em bovinos. Pesq. Vet. Bras. 27(1): 53-60., Santos et al. 2008Santos J.C.A., Riet-Correa F., Simões S.V.D. & Barros C.S.L. 2008. Patogênese, sinais clínicos e patologia das doenças causadas por plantas hepatotóxicas em ruminantes e equinos no Brasil. Pesq. Vet. Bras. 28(1):1-14., Karam et al. 2011Karam F.C., Schild A.L. & Mello J.R.B. 2011. Intoxicação por Senecio spp. em bovinos no Rio Grande do Sul: condições ambientais favoráveis e medidas de controle. Pesq. Vet. Bras. 31(7):603-609.).

Macroscopicamente e microscopicamente o padrão das lesões hepáticas dos bovinos intoxicados por Senecio spp. pode variar (Grecco et al. 2010Grecco F.B., Schild A.L., Soares M.P., Marcolongo-Pereira C., Estima-Silva P. & Sallis E.S.V. 2010. Aspectos epidemiológicos e padrões de lesões hepáticas em 35 surtos de intoxicação por Senecio spp. em bovinos no sul do Rio Grande do Sul. Pesq. Vet. Bras. 30(5):389-397.). Essa diferença foi observada nesse surto, no qual foi possível distinguir três aspectos macroscópicos e microscópicos de lesões. No primeiro padrão, visualizado nos primeiros bezerros que adoecerem, houve um predomínio de lesões degenerativas e necróticas, associada à discreta proliferação do epitélio ductal e de tecido conjuntivo fibroso. Esse aspecto de lesão não é comumente observado em bovinos intoxicados naturalmente por espécies de Senecio. De forma experimental, esse tipo de alteração com predomínio de degeneração gordurosa foi observado em bovinos com intoxicação subaguda pela planta (Tokarnia & Döbereiner 1984Tokarnia C.H. & Döbereiner J. 1984. Intoxicação experimental por Senecio brasiliensis (Compositae) em bovinos. Pesq. Vet. Bras. 4(2):39-65.), conferindo, portanto, com as lesões observadas nos primeiros bovinos desse surto.

De maneira geral, as alterações visualizadas no segundo e terceiro padrão de lesões hepáticas dos bovinos desse trabalho foram semelhantes, e corroboram com os dados da literatura (Tokarnia & Döbereiner 1984Tokarnia C.H. & Döbereiner J. 1984. Intoxicação experimental por Senecio brasiliensis (Compositae) em bovinos. Pesq. Vet. Bras. 4(2):39-65., Grecco et al. 2010Grecco F.B., Schild A.L., Soares M.P., Marcolongo-Pereira C., Estima-Silva P. & Sallis E.S.V. 2010. Aspectos epidemiológicos e padrões de lesões hepáticas em 35 surtos de intoxicação por Senecio spp. em bovinos no sul do Rio Grande do Sul. Pesq. Vet. Bras. 30(5):389-397., Lucena et al. 2010Lucena R.B., Rissi D.R., Maia L.A., Flores M.M., Dantas A.F.A., Nobre V.M.T., Riet-Correa F. & Barros C.S.L. 2010. Intoxicação por alcaloides pirrolizidínicos em ruminantes e equinos no Brasil. Pesq. Vet. Bras. 30(5):447-452.). Apesar da fibrose ser intensa em ambas as apresentações, algumas diferenças microscópicas podem ser destacadas. Dentre elas, as áreas de necrose e hemorragia no parênquima hepático presentes no segundo padrão e a acentuada megalocitose e a formação de nódulos regenerativos visualizados no terceiro padrão. Essas alterações constituem evidências importantes que auxiliam na diferenciação do estágio evolutivo da intoxicação (Grecco et al. 2010Grecco F.B., Schild A.L., Soares M.P., Marcolongo-Pereira C., Estima-Silva P. & Sallis E.S.V. 2010. Aspectos epidemiológicos e padrões de lesões hepáticas em 35 surtos de intoxicação por Senecio spp. em bovinos no sul do Rio Grande do Sul. Pesq. Vet. Bras. 30(5):389-397.). Outro achado histológico importante observado nos padrões 2 e 3 foram as lesões veno-ocluvivas. Essa alteração consiste na obliteração de veias intra-hepáticas associada à lesão do endotélio dos sinusóides, acúmulo de eritrócitos e fibrina no espaço subintimal (de Disse), e subsequente fibrose subendotelial (Stalker & Hayes 2007Stalker M.J. & Hayes M.A. 2007. Liver and biliary system, p.297-388. In. Maxie M.G. (Ed.), Jubb, Kennedy, and Palmer’s Pathology of Domestic Animals. Vol.2. 5th ed. Saunders Elsevier, Philadelphia.). Esse padrão de fibrose da veia centrolobular pode contribuir para o desenvolvimento de hipertensão portal e ser, pelo menos parcialmente, responsável pela ascite observada em algumas bezerras desse trabalho. Lesão veno-oclusiva tem sido relatada em bovinos afetados por aflatoxicose, seneciose e em seres humanos após quimioterapia, radioterapia e transplante de medula óssea (Stalker & Hayes 2007Stalker M.J. & Hayes M.A. 2007. Liver and biliary system, p.297-388. In. Maxie M.G. (Ed.), Jubb, Kennedy, and Palmer’s Pathology of Domestic Animals. Vol.2. 5th ed. Saunders Elsevier, Philadelphia.).

Deve-se incluir no diagnóstico diferencial de intoxicação por Senecio spp. em bovinos outras plantas que causam lesões hepáticas, principalmente, aquelas que contêm pirrolizidinas como princípio tóxico (Tokarnia et al. 2012aTokarnia C.H., Brito M.F., Barbosa J.D., Peixoto P.V. & Döbereiner J. 2012a. Senecio spp., p.177-191. In: Ibid. (Eds), Plantas Tóxicas do Brasil para Animais de Produção. 2ª ed. Editora Helianthus, Rio de Janeiro. 566p.). Aflatoxicose também deve ser considerada um importante diagnóstico diferencial, principalmente, em bovinos jovens, pois as lesões hepáticas dessa condição podem assemelhar-se à intoxicação por Senecio spp. (Pierezan et al. 2010Pierezan F., Oliveira Filho J.C., Carmo P.M., Lucena R.B., Rissi D.R., Togni M. & Barros C.S.L. 2010. Surto de aflatoxicose em bezerros no Rio Grande do Sul. Pesq. Vet. Bras. 30(5):418-422., 2012Pierezan F., Oliveira Filho J.C., Carmo P.M., Aires A.R., Souza T.M., Mallmann C.A. & Barros C.S.L. 2012. Intoxicação experimental por aflatoxina em bezerros. Pesq. Vet. Bras.32(7):607-618.). Aspectos semelhantes foram observados nesse surto, no qual as alterações hepáticas apresentavam similaridade com lesões de aflatoxicose. A exclusão desse diagnóstico diferencial no presente trabalho baseou-se na ausência de aflatoxina na ração dos bovinos e o histórico do consumo de S. brasiliensis. Além disso, surtos de aflatoxicose são raros e os bovinos são relativamente resistentes a essa condição (Pierezan et al. 2010Pierezan F., Oliveira Filho J.C., Carmo P.M., Lucena R.B., Rissi D.R., Togni M. & Barros C.S.L. 2010. Surto de aflatoxicose em bezerros no Rio Grande do Sul. Pesq. Vet. Bras. 30(5):418-422., 2012Pierezan F., Oliveira Filho J.C., Carmo P.M., Aires A.R., Souza T.M., Mallmann C.A. & Barros C.S.L. 2012. Intoxicação experimental por aflatoxina em bezerros. Pesq. Vet. Bras.32(7):607-618., Tokarnia et al. 2012aTokarnia C.H., Brito M.F., Barbosa J.D., Peixoto P.V. & Döbereiner J. 2012a. Senecio spp., p.177-191. In: Ibid. (Eds), Plantas Tóxicas do Brasil para Animais de Produção. 2ª ed. Editora Helianthus, Rio de Janeiro. 566p.). Com isso, a avaliação epidemiológica e os achados anatomopatológicos são importantes para o diagnóstico preciso dessa toxicose. Além disso, é de extrema importância o reconhecimento dos diferentes padrões provocados pela ingestão de alcaloides pirrolizidínicos, pois lesões macroscópicas pouco frequentes podem dificultar o diagnóstico inicial da intoxicação.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jan 2017

Histórico

  • Recebido
    01 Jun 2016
  • Aceito
    29 Ago 2016
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