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Proposta metodológica para análise da ocorrência de sinergismo e efeitos potencializadores entre aleloquímicos

Methodological proposal for analysis of synergism and potentializing effects among allelochemicals

Resumos

Os procedimentos envolvendo a análise de sinergismo entre aleloquímicos têm envolvido, basicamente, a utilização de concentrações fixas. Neste trabalho, propõe-se um modelo teórico envolvendo quatro possibilidades de respostas: uma que demonstra a existência de sinergismo (possibilidade A do modelo); outra que revela a inexistência de sinergismo (possibilidade B do modelo); e duas que revelam que uma substância potencializa o efeito de outra (possibilidades C e D do modelo). Para efeito de teste do modelo, utilizaram-se duas substâncias químicas (ácido 3,4,5-trimetoxibenzóico [S1] e ácido verátrico [S2]) isoladas das folhas de Parkia pendula, com atividade alelopática já comprovada, nas seguintes proporções: S1 pura, S2 pura e combinações de S1 e S2, nas seguintes proporções: 3:1, 1:1 e 1:3. Como plantas indicadoras foram utilizadas as plantas daninhas malícia (Mimosa pudica) e mata-pasto (Senna obtusifolia). Os resultados, analisados em relação às quatro possibilidades estabelecidas no modelo teórico, permitiram inferir a inexistência de efeitos sinérgicos entre as duas substâncias testadas. As variações entre os resultados obtidos e a possibilidade B do modelo podem ser atribuídas ao potencial inibitório da substância e à sensibilidade das espécies receptoras às substâncias testadas.

alelopatia; inibição; modelo; plantas daninhas


The procedures involving the analysis of synergism between allelochemicals have basically involved the use of fixed concentrations. This work deals with theoretical model involving four possibilities of response: one demonstraing the existence of synergism (possibility A of the model); one demonstraing the absence of synergism (possibility B of the model) and two showing that a substance potentializes the effect of another (possibilities C and D of the model). Two isolated chemical substances (3,4,5-trimetoxybenzoic acid [S1] and 3,4-dimetoxybenzoic acid [S2]) were used to test the model, isolated from Parkia pendula leaves with known allelopathic activity , in the following combinations: pure S1; pure S2, and combinations S1 and S2, in the following ratios 3:1; 1:1; and 1:3. As indicators, the weeds Mimosa pudica and Senna obtusifolia were used. The results, based on analysis of the four possibilities established in the theoretical model, allowed to infer the absence of synergistic effect between the two tested substances. The variations observed between the obtained results and the possibility B of the model can be attributed to the inhibition potential of the substance and the sensitivity of the receiving species to the tested substances.

allelopathy; inhibition; model; weeds


ARTIGOS

NOTA CIENTÍFICA

Proposta metodológica para análise da ocorrência de sinergismo e efeitos potencializadores entre aleloquímicos

Methodological proposal for analysis of synergism and potentializing effects among allelochemicals

Souza Filho, A.P.S.

Embrapa Amazônia Oriental, Trav. Dr. Enéas Pinheiro, S/N, 66095-100 Belém-PA, <apedro@cpatu.embrapa.br>

RESUMO

Os procedimentos envolvendo a análise de sinergismo entre aleloquímicos têm envolvido, basicamente, a utilização de concentrações fixas. Neste trabalho, propõe-se um modelo teórico envolvendo quatro possibilidades de respostas: uma que demonstra a existência de sinergismo (possibilidade A do modelo); outra que revela a inexistência de sinergismo (possibilidade B do modelo); e duas que revelam que uma substância potencializa o efeito de outra (possibilidades C e D do modelo). Para efeito de teste do modelo, utilizaram-se duas substâncias químicas (ácido 3,4,5-trimetoxibenzóico [S1] e ácido verátrico [S2]) isoladas das folhas de Parkia pendula, com atividade alelopática já comprovada, nas seguintes proporções: S1 pura, S2 pura e combinações de S1 e S2, nas seguintes proporções: 3:1, 1:1 e 1:3. Como plantas indicadoras foram utilizadas as plantas daninhas malícia (Mimosa pudica) e mata-pasto (Senna obtusifolia). Os resultados, analisados em relação às quatro possibilidades estabelecidas no modelo teórico, permitiram inferir a inexistência de efeitos sinérgicos entre as duas substâncias testadas. As variações entre os resultados obtidos e a possibilidade B do modelo podem ser atribuídas ao potencial inibitório da substância e à sensibilidade das espécies receptoras às substâncias testadas.

Palavras-chave: alelopatia, inibição, modelo, plantas daninhas.

ABSTRACT

The procedures involving the analysis of synergism between allelochemicals have basically involved the use of fixed concentrations. This work deals with theoretical model involving four possibilities of response: one demonstraing the existence of synergism (possibility A of the model); one demonstraing the absence of synergism (possibility B of the model) and two showing that a substance potentializes the effect of another (possibilities C and D of the model). Two isolated chemical substances (3,4,5-trimetoxybenzoic acid [S1] and 3,4-dimetoxybenzoic acid [S2]) were used to test the model, isolated from Parkia pendula leaves with known allelopathic activity , in the following combinations: pure S1; pure S2, and combinations S1 and S2, in the following ratios 3:1; 1:1; and 1:3. As indicators, the weeds Mimosa pudica and Senna obtusifolia were used. The results, based on analysis of the four possibilities established in the theoretical model, allowed to infer the absence of synergistic effect between the two tested substances. The variations observed between the obtained results and the possibility B of the model can be attributed to the inhibition potential of the substance and the sensitivity of the receiving species to the tested substances.

Keywords: allelopathy, inhibition, model, weeds.

As plantas superiores produzem e estocam grande número de produtos de seu metabolismo, os quais são, posteriormente, liberados para o ambiente de diferentes formas, como lixiviação, volatilização, exsudação radicular e decomposição de resíduos (Hallingan, 1975; Putnam & Weston, 1986; Netzly & Butler, 1986; Steinsiek et al., 1982). A esse fenômeno Molisch, em 1937, chamou de alelopatia (Rice, 1987), a qual é um importante mediador da dinâmica populacional, determinando, em sistemas naturais e cultivados, o padrão e a densidade da vegetação (Smith & Martin, 1994). De acordo com An et al. (1993), um aleloquímico pode apresentar dois atributos complementares, estimulatórios e inibitórios, embora na literatura haja predominância de relatos comprovando os efeitos deletérios. Fatores associados à concentração podem alterar esses atributos, levando a efeitos estimulatórios ou inibitórios (Rice, 1984).

Em comunidades de plantas, as inibições alelopáticas são o resultado não de um único agente químico, mas da ação de diferentes aleloquímicos. Se isso for verdade, então podese assumir que a atividade biológica de uma mistura de aleloquímicos será determinada não apenas por sua concentração, mas também pela interação entre ambos. Existem, na literatura, algumas informações sugerindo a existência de sinergismos como resultado da ação combinatória de diferentes aleloquímicos (Einhellig, 1995; Weidenhamer et al., 1994; Kubo et al., 1992). Nos poucos trabalhos em que essa hipótese é testada, a combinação entre dois ou mais agentes alelopáticos envolve concentrações fixas e as inferências são baseadas no aumento das inibições (em que se conclui pela existência de sinergismo) ou na ausência de aumento (em que se conclui pela inexistência de sinergismo). Bons exemplos desse tipo de abordagem são encontrados nos trabalhos de Williams & Hoagland (1982), Rasmussen & Einhellig (1979) e Einhellig et al. (1982). Mais recentemente, Vokou et al. (2003) propuseram modelo matemático para interpretar os resultados das ações de diferentes aleloquímicos.

Neste trabalho, propõe-se um modelo teórico (Figura 1) constante de quatro possibilidades de resultados para a combinação de pares de aleloquímicos. Na possibilidade A, admite-se que toda e qualquer combinação entre as duas substâncias produz efeitos alelopáticos inibitórios sempre superiores àqueles produzidos pelas substâncias puras. Uma vez essa possibilidade manifestada, admite-se a existência de sinergismos entre as substâncias. A proposta B do modelo teórico apresenta conformação inversa à da possibilidade A. Nesse caso, admite-se que as substâncias puras têm maior potencial inibitório do que qualquer uma das combinações estabelecidas e, dessa forma, concebe-se que as substâncias agem isoladamente e que a redução (primeiro quadrante) e o aumento (segundo quadrante) da inibição se devem mais às variações de concentração de cada substância do que a qualquer relação entre elas. Na possibilidade C do modelo, verifica-se que as combinações 3:1 e 1:1 produzem efeitos inibitórios mais intensos do que aqueles produzidos pela substância S1 pura, porém em todas as combinações entre S1 e S2 as inibições são de magnitude inferior à daquelas promovidas pela substância S2; nesse caso propõe-se que a substância S2 potencializa os efeitos de S1. Finalmente, a proposta D, que é inversa à C, mostra que a substância S1 potencializa a atividade da substância S2.


Para efeito de teste da eficiência do modelo, combinaram-se as substâncias químicas isoladas de folhas da leguminosa Parkia pendula, ácido 3,4,5-trimetoxibenzóico (S1) e ácido verátrico (3,4-dimetoxibenzóico) (S2), com atividade alelopática confirmada no trabalho de Fonseca (2005), nas seguintes proporções de cada uma das substâncias S1 e S2: substância S1 pura, substância S2 pura e combinações dessas substâncias nas proporções de 3:1, 1:1 e 1:3.

Foi estabelecida a concentração de 20 mg L1 como limite para todas as combinações. Dessa forma, as substâncias puras foram utilizadas na concentração de 20 mg L-1, e as somas de todas as combinações foram sempre iguais a 20 mg L-1. Assim, as combinações 3:1, 1:1 e 1:3 eram formadas por 15:5, 10:10 e 5:15 mg L-1 das substâncias S1 e S2, respectivamente. As concentrações foram preparadas tendo como eluente o metanol.

A metodologia de avaliação dos efeitos alelopáticos sobre a germinação das sementes e o desenvolvimento da radícula foi aquela utilizada por Souza Filho et al. (2003) e Souza Filho (2002). As plantas daninhas indicadoras foram a malícia (Mimosa pudica) e o mata-pasto (Senna obtusifolia).

Comparando o modelo de resposta obtida (Figura 2) com as quatro possibilidades do modelo teórico proposto na Figura 1, verifica-se coincidência das respostas obtidas com a possibilidade B do modelo teórico, indicando a ausência de efeito sinérgico entre as duas substâncias testadas. As respostas obtidas (Figura 2) mostram variações em relação ao modelo proposto, as quais podem ser atribuídas a dois fatores: às diferenças na habilidade de cada substância em promover inibições nos fatores analisados; e à sensibilidade das espécies receptoras às substâncias testadas. Na Figura 2A, observa-se, por exemplo, que a substância S1 evidenciou maior capacidade para inibir a germinação e o desenvolvimento da radícula e do hipocótilo da planta invasora malícia, o que fez com que a curva ficasse mais elevada na condição S1 pura. Já na Figura 2B, verifica-se que a germinação das sementes de mata-pasto foi pouco afetada pela substância S1, deixando a curva mais elevada na condição S2 pura. Contudo, essas variações não comprometem a análise comparativa, utilizando o modelo teórico proposto. Dessa forma, podese inferir que o modelo proposto é indicado para análise de efeitos da ação combinatória envolvendo dois aleloquímicos.


LITERATURA CITADA

Recebido para publicação em 6.2.2006 e na forma revisada em 4.8.2006.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    04 Out 2006
  • Data do Fascículo
    Set 2006

Histórico

  • Aceito
    04 Ago 2006
  • Recebido
    06 Fev 2006
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