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Distribuição de glyphosate e acúmulo de nutrientes em biótipos de azevém

Glyphosate distribution and nutrient accumulation in ryegrass biotypes

Resumos

Objetivou-se neste trabalho avaliar o acúmulo de nutrientes e a translocação de glyphosate em biótipos de azevém. Para isso, foram montados dois ensaios: no primeiro aplicou-se 14C-glyphosate, adicionando 10 µL da calda sobre a face adaxial da primeira folha com lígula totalmente visível, quando as plantas de azevém apresentavam três perfilhos. A quantidade de glyphosate absorvido, translocado e exsudado foi avaliada 64 horas após aplicação, por meio da medição da radiação emitida pelo 14C-glyphosate, em espectrômetro de cintilação líquida. O glyphosate foi quantificado em folha de aplicação, perfilhos, raízes e na solução nutritiva onde foram cultivados os biótipos de azevém. No segundo experimento, aplicou-se o glyphosate (480 g ha-1) tanto no biótipo sensível quanto no resistente. Após dez dias da aplicação, a parte área e as raízes das plantas foram coletadas e secas em estufa, sendo determinados os teores de macronutrientes. No primeiro ensaio, verificou-se exsudação radicular em ambos os biótipos, nos quais a quantidade de glyphosate exsudada foi semelhante, não ultrapassando 5% do total que penetrou na planta. No perfilho principal do biótipo sensível, comparado ao resistente, foi observada maior concentração do produto marcado. O biótipo resistente apresentou maior acúmulo de produto marcado na folha de aplicação; no sensível, a maior parte do glyphosate foi encontrada nas raízes. Com relação ao segundo ensaio, na presença de herbicida o biótipo sensível apresentou menor teor de fósforo tanto na parte aérea quanto na planta. Os biótipos resistente e sensível, sem aplicação de herbicida, tenderam a apresentar maiores teores de N total e N inorgânico na parte aérea e na planta como um todo, quando comparados aos tratamentos em que foi realizada a aplicação do produto. Ambos os biótipos mostraram a mesma capacidade de absorção e acúmulo de macronutrientes na ausência do produto.

14C-glyphosate; Lolium multiflorum; nutrição mineral; resistência


This work aimed to evaluate nutrient accumulation and glyphosate translocation in ryegrass biotypes. Two trials were conducted: in the first, 10 uL of 14C-glyphosate ware applied on the upper side of the first leaf showing completely visible ligule, with ryegrass plants at the three-tiller stage. The amount of glyphosate absorbed, translocated and exudated was evaluated 64 hours after application, by using a liquid scintillation spectrometer. Glyphosate was quantified in the leaf it had been applied, in the tillers, roots and in the nutritive solution the plants were grown. In the second trial, glyphosate was applied on the resistant and the susceptible biotypes at the rate of 480 g L-1. Ten days after application, the shoot and roots were collected and oven-dried and the levels of macronutrients were determined. In the first trial, root exudation was observed in both biotypes, in which the amount of exudated glyphosate was similar and not greater than 5% of the absorbed glyphosate. In the main tiller of the susceptible biotype, a higher concentration of 14C-glyphosate was observed, compared to the resistant one. The resistant biotype showed more glyphosate accumulation in the leaf it had been applied and in the susceptible biotype; most 14-C glyphosate was found in the root system. In the second trial, the susceptible biotype showed less P accumulation than the resistant one. Both the resistant and susceptible biotypes tended to accumulate more total N and inorganic N in the shoot and in the whole plant in the absence of glyphosate, compared to the applied treatments. Both biotypes presented the same absorption capacity and macronutrients accumulation in the absence of the glyphosate.

14C-glyphosate; Lolium multiflorum; mineral nutrition; resistance


ARTIGOS

Distribuição de glyphosate e acúmulo de nutrientes em biótipos de azevém

Glyphosate distribution and nutrient accumulation in ryegrass biotypes

Ferreira, E.A.I; Silva, A.A.II; Reis, M.R.III; Santos, J.B.IV; Oliveira, J.A.V; Vargas, L.VI; Khouri, K.R.VII; Guimarães, A.A.VIII

IPós-doutorando do Dep. de Fitotecnia da Universidade Federal de Viçosa - DFT/UFV, 36570-000, Viçosa-MG, <evanderalves@yahoo.com.br>

IID.S., Professor do Dep. de Fitotecnia da Universidade Federal de Viçosa – DFT/UFV

IIIEngºAgrº, Doutorando em Fitotecnia da Universidade Federal de Viçosa – DFT/UFV

IVD.S., Professor de Agronomia da FAAG/Univale. Rua Israel Pinheiro, 2000, Bairro Universitário, 35020-220, Governador Valadares-MG

VD.S., Professor do Departamento de Biologia Geral DBG-UFV

VIPesquisador da Embrapa Trigo, Caixa Postal 451,99001-970, Passo Fundo-RS

VIIEngºAgr º, Mestre em Fitotecnia

VIIIAcadêmica de Agronomia/UFV

RESUMO

Objetivou-se neste trabalho avaliar o acúmulo de nutrientes e a translocação de glyphosate em biótipos de azevém. Para isso, foram montados dois ensaios: no primeiro aplicou-se 14C-glyphosate, adicionando 10 µL da calda sobre a face adaxial da primeira folha com lígula totalmente visível, quando as plantas de azevém apresentavam três perfilhos. A quantidade de glyphosate absorvido, translocado e exsudado foi avaliada 64 horas após aplicação, por meio da medição da radiação emitida pelo 14C-glyphosate, em espectrômetro de cintilação líquida. O glyphosate foi quantificado em folha de aplicação, perfilhos, raízes e na solução nutritiva onde foram cultivados os biótipos de azevém. No segundo experimento, aplicou-se o glyphosate (480 g ha-1) tanto no biótipo sensível quanto no resistente. Após dez dias da aplicação, a parte área e as raízes das plantas foram coletadas e secas em estufa, sendo determinados os teores de macronutrientes. No primeiro ensaio, verificou-se exsudação radicular em ambos os biótipos, nos quais a quantidade de glyphosate exsudada foi semelhante, não ultrapassando 5% do total que penetrou na planta. No perfilho principal do biótipo sensível, comparado ao resistente, foi observada maior concentração do produto marcado. O biótipo resistente apresentou maior acúmulo de produto marcado na folha de aplicação; no sensível, a maior parte do glyphosate foi encontrada nas raízes. Com relação ao segundo ensaio, na presença de herbicida o biótipo sensível apresentou menor teor de fósforo tanto na parte aérea quanto na planta. Os biótipos resistente e sensível, sem aplicação de herbicida, tenderam a apresentar maiores teores de N total e N inorgânico na parte aérea e na planta como um todo, quando comparados aos tratamentos em que foi realizada a aplicação do produto. Ambos os biótipos mostraram a mesma capacidade de absorção e acúmulo de macronutrientes na ausência do produto.

Palavras-chave: 14C-glyphosate, Lolium multiflorum, nutrição mineral, resistência.

ABSTRACT

This work aimed to evaluate nutrient accumulation and glyphosate translocation in ryegrass biotypes. Two trials were conducted: in the first, 10 uL of 14C-glyphosate ware applied on the upper side of the first leaf showing completely visible ligule, with ryegrass plants at the three-tiller stage. The amount of glyphosate absorbed, translocated and exudated was evaluated 64 hours after application, by using a liquid scintillation spectrometer. Glyphosate was quantified in the leaf it had been applied, in the tillers, roots and in the nutritive solution the plants were grown. In the second trial, glyphosate was applied on the resistant and the susceptible biotypes at the rate of 480 g L-1. Ten days after application, the shoot and roots were collected and oven-dried and the levels of macronutrients were determined. In the first trial, root exudation was observed in both biotypes, in which the amount of exudated glyphosate was similar and not greater than 5% of the absorbed glyphosate. In the main tiller of the susceptible biotype, a higher concentration of 14C-glyphosate was observed, compared to the resistant one. The resistant biotype showed more glyphosate accumulation in the leaf it had been applied and in the susceptible biotype; most 14-C glyphosate was found in the root system. In the second trial, the susceptible biotype showed less P accumulation than the resistant one. Both the resistant and susceptible biotypes tended to accumulate more total N and inorganic N in the shoot and in the whole plant in the absence of glyphosate, compared to the applied treatments. Both biotypes presented the same absorption capacity and macronutrients accumulation in the absence of the glyphosate.

Keywords: 14C-glyphosate, Lolium multiflorum, mineral nutrition, resistance.

INTRODUÇÃO

Há décadas os herbicidas tornaram-se insumos indispensáveis na agricultura, em razão de seu custo, sua eficiência e sua rapidez de operação para controle de plantas daninhas (Silva et al., 2007). No entanto, devido ao uso inadequado desses produtos, foram selecionados diversos biótipos de plantas daninhas resistentes a vários deles (Burnside, 1992).

Uma das grandes preocupações, depois de constatada a resistência, é desenvolver técnicas de manejo dessas plantas nas lavouras e, principalmente, evitar a dispersão delas para novas áreas (Christoffoleti & Lopez-Ovejero, 2003). Todavia, para desenvolver novas técnicas de manejo é necessário conhecer as causas que levaram os biótipos a adquirir resistência, bem como conhecer a capacidade competitiva desses novos biótipos em relação àqueles que não apresentam resistência.

Dentre as possíveis causas de resistência, destacam-se as alterações na enzima EPSPs, o metabolismo diferencial do glyphosate ou o aparecimento de barreiras que dificultam a absorção, translocação e exsudação desses herbicidas (Christoffoleti & Lopez-Ovejero, 2003).

Quanto à capacidade competitiva dos biótipos resistentes em relação aos sensíveis, a capacidade de extração e acúmulo de forma eficiente dos nutrientes pelas plantas pode ser fator importante na capacidade competitiva dos diferentes biótipos.

O glyphosate tem sido usado intensivamente na agricultura há mais de 25 anos e, até o momento, em poucas populações de plantas daninhas ocorreu pressão de seleção suficiente para aumento de biótipos resistentes. O primeiro caso de resistência de plantas daninhas a esse herbicida foi registrado em 1996. Nos últimos anos, devido ao uso repetido do glyphosate na mesma safra, têm-se observado ocorrências de espécies com biótipos resistentes em oito países, sendo elas: Lolium rigidum, Amaranthus palmeri, Amaranthus rudis, Ambrosia artemisiifolia, Eleusine indica, Conyza canadensis, Lolium multiflorum, Conyza bonariensis, Euphorbia heterophylla, Sorghum alepense e Plantago lanceolata (Weed Science, 2007).

O primeiro caso de Lolium multiflorum resistente ao glyphosate foi relatado por Perez & Kogan (2002). O biótipo resistente foi identificado em pomares no Chile que vinham recebendo, em média, três aplicações de glyphosate por ciclo durante vários anos. No Brasil foram registrados até o momento quatro casos de plantas daninhas resistentes ao glyphosate: Lolium multiflorum (azevém), Coniza bonariensis (buva), Coniza canadensis (buva) e Euphorbia heterophylla (leiteiro). Biótipos de azevém resistentes ao glyphosate constituem um grave problema nas lavouras de soja transgênica e em pomares no Rio Grande do Sul, levando a considerável aumento nos custos de produção (Vargas, 2005).

Além do problema do aparecimento de resistência de plantas daninhas, outras modificações podem ocorrer em seu metabolismo, aumentando ou diminuindo suas atividades fisiológicas, que podem afetar seu crescimento e desenvolvimento. Desse modo, podem ocorrer alterações no status nutricional das plantas cultivadas. Trabalhos desenvolvidos com a cultura do arroz e mostarda por Mishra & Kurchana (2001) e Rana (2000) evidenciaram alterações dos teores de macronutrientes em tecidos foliares devido à aplicação de herbicidas. Também Carolus et al. (1971) aplicaram diversos herbicidas em ervilhas e encontraram alteração nos teores de nutrientes com variação mínima de peso de matéria seca, enquanto Eastin & Davies (1967) aplicaram atrazine em amendoim e constataram aumento nos teores de algumas formas de N. A aplicação de glyphosate para controle de algumas espécies de gramíneas, em áreas de cultivo de pínus sob estudo de competição entre a cultura e as plantas daninhas, aumentou em 31% a concentração foliar de K (Sword et al., 1998).

Neste trabalho foram avaliadas a absorção, translocação e exsudação do glyphosate por biótipos resistente e sensível ao herbicida, assim como o efeito deste sobre a capacidade de acúmulo de nutrientes nesses biótipos.

MATERIAL E MÉTODOS

O presente trabalho constou de dois ensaios. No primeiro, plantas de azevém (biótipos resistente e sensível) foram cultivadas em solução nutritiva, em câmara de crescimento com temperatura dia/noite de 25/16 ºC, respectivamente, e fotoperíodo de 12 horas de luz. O 14C-glyphosate foi aplicado em mistura com glyphosate comercial (480 g ha-1) sobre a face adaxial da primeira folha com lígula totalmente visível, utilizando-se uma microsseringa, adicionando-se 10 µL da calda com atividade específica de aproximadamente 700 Bq, quando as plantas apresentavam três perfilhos aos 30 dias após a emergência.

A avaliação da absorção e translocação do 14C-glyphosate em biótipos resistente e sensível foi realizada 64 horas após o tratamento com o produto. Decorrido esse período, foram coletadas e fracionadas em folha de aplicação, perfilho principal, perfilho 2 e perfilho 3 e raízes, sendo avaliada também a solução nutritiva onde foram cultivadas as plantas. A folha de aplicação foi lavada com 9,0 mL de metanol, para extração do produto não-absorvido. Todo o material vegetal foi seco em estufa com circulação forçada de ar a 50ºC, por 48 horas, para obtenção da massa seca de cada parte da planta. Em seguida, procedeu-se à moagem de cada parte da planta em moinho de bola, até uma textura equivalente a 200 mesh. Depois disso, amostras de 100 mg de massa seca de cada parte da planta (folha de aplicação, parte aérea e raízes) foram adicionadas em frascos de 20 mL, para contagem. Dentro de cada frasco, as amostras foram homogeneizadas com 1 mL de Triton-X-100 por 14 segundos, adicionando-se, em seguida, 5 mL de coquetel de cintilação, sendo novamente submetidas à homogeneização. Os frascos assim preparados foram colocados em espectrômetro de cintilação líquida Beckman 6500, o qual corrigia o quenching automaticamente.

Os valores da radiação (cpm total) encontrada na solução de lavagem e na planta foram convertidos em porcentagem em relação à radiação total medida. Na planta, esses valores de 14C-glyphosate foram convertidos em porcentagem em relação ao total presente na planta, distribuídos em folha de aplicação, perfilhos, raízes e exsudação radicular. Os resultados foram apresentados em gráficos, utilizando-se médias observadas e desvios-padrões.

O segundo ensaio foi instalado e conduzido em casa de vegetação, utilizando vasos com capacidade de 6 L de substrato, composto de Argissolo Vermelho-Amarelo (Tabela 1) e areia lavada na proporção de 3:1, e adubado. Os vasos foram mantidos em ambiente protegido e irrigados diariamente, visando a manutenção da umidade adequada do solo, sendo mantidas três plantas por vaso. O experimento foi disposto em um esquema fatorial 2 x 2, sendo os tratamentos compostos pelas parcelas que receberam aplicação de glyphosate (C/H) e não receberam aplicação de glyphosate (S/H) e pelos biótipos resistente e sensível arranjados em blocos ao acaso (DBC), com quatro repetições.

Aos 45 dias após a emergência (DAE) foi aplicado o herbicida glyphosate na dose de 480 g ha-1 da formulação comercial Roundup Transorb®, contendo o sal de isopropalamina.

Dez dias após aplicação dos tratamentos, as plantas foram colhidas, fracionadas em parte área e raízes e secas em estufa com circulação forçada de ar à temperatura de 65 ºC. As amostras foram transferidas para o Laboratório de Nutrição Mineral, onde foram moídas e submetidas à digestão nítrico-perclórica. Utilizaram-se amostras de 0,5 g em 10 mL de HNO3 concentrado, submetidas à temperatura de no máximo 200 oC, para a digestão. Obtido o extrato, foram determinados os teores de fósforo (P), enxofre (S), potássio (K), cálcio (Ca) e magnésio (Mg). Para determinação do nitrogênio orgânico (N orgânico), as amostras foram submetidas à digestão sulfúrica. Foi determinada também a concentração total de nutrientes na planta (teor de nutriente x massa seca da planta).

Os dados foram submetidos à análise de variância, e a comparação entre as médias foi feita pelo teste F a 5% de significância.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

No primeiro ensaio, foi observada maior concentração de 14C-glyphosate na folha de aplicação do biótipo resistente (68%). No biótipo sensível, a folha de aplicação apresentou 40% do produto marcado (Figura 1). Resultados semelhantes foram encontrados por Ferreira et al. (2006), os quais verificaram, depois de 64 horas da aplicação do produto, que aproximadamente 81% do total absorvido se encontrava retido na folha onde foi realizada a aplicação, enquanto no biótipo sensível a retenção foi de 54%.


No perfilho principal, onde foi realizada a aplicação do produto, observou-se maior acúmulo de 14C-glyphosate no biótipo sensível: aproximadamente 15% do total encontrado na planta; esse valor, no biótipo resistente, foi de aproximadamente 10%. Para os perfilhos 2 e 3 esses valores foram semelhantes (Figura 1). A maior concentração do produto marcado foi encontrada na parte aérea do biótipo sensível 25%, enquanto no resistente esse valor foi de cerca de 20% (Figura 2).


Nas raízes, a distribuição do 14C-glyphosate foi consideravelmente diferente entre os dois biótipos: no sensível, a concentração do produto marcado foi cerca de quatro vezes maior que no resistente (40 e 10%, respectivamente). Não foi observada diferença com relação à exsudação radicular nos dois biótipos; os valores não ultrapassaram 5% (Figura 1). Rodrigues et al. (1982) observaram exsudação radicular de 14C-glyphosate por plantas de trigo tratado com este herbicida e que plantas de milho cultivadas próximo ao trigo absorviam o 14C-glyphosate pelas raízes, distribuindo-o por todas as partes da planta, sendo as maiores concentrações encontradas nas raízes. É provável que, nesse período de dez dias, parte do glyphosate já tenha sido metabolizada a ácido aminometilfosfônico (AMPA). A principal rota de degradação do glyphosate em plantas de soja, denominada rota do AMPA, leva à formação do próprio aminometil ácido fosfônico e glioxilato, a partir do glyphosate. O AMPA, uma vez formado, é clivado em metilamina e fosfato inorgânico, como produtos finais de degradação; todas essas reações podem ocorrer na planta, porém é o solo o principal local da degradação do glyphosate realizada por microrganismos (Hoagland, 1980).

No segundo ensaio, os biótipos resistente e sensível de azevém apresentaram maiores teores de N total na parte aérea quando submetidos ao tratamento com glyphosate (33,82 e 35,42 g kg-1 nas plantas tratadas, contra 28,64 e 27,00 g kg-1 nas plantas não tratadas com o produto, respectivamente para os biótipos resistente e sensível), conforme Tabela 2. Sword et al. (1998) constataram redução nos teores de N total nas folhas de plantas de pínus que receberam o glyphosate em condições de competição. No tocante ao teor de N orgânico, não foi observada diferença na concentração do produto tanto entre os biótipos quanto na presença de herbicida. Santos et al. (2007), trabalhando com soja RR, observaram redução nos teores foliares de N total após aplicação de diferentes formulações de glyphosate.

No biótipo sensível, as plantas que receberam tratamento herbicida apresentaram três vezes mais N inorgânico, comparado ao biótipo resistente. Neste biótipo, o tratamento com herbicida apresentou duas vezes mais N inorgânico que o tratamento que não recebeu o produto (16,83 e 8,58 g kg-1, respectivamente), porém não foi observada diferença nos teores de N inorgânico entre os biótipos (Tabela 2). Deve-se considerar que o nitrogênio é um elemento constituinte de moléculas de proteínas, coenzimas, ácidos nucléicos e citocromos, provocando grande resposta nas plantas quando aplicado, e o glyphosate é derivado de aminoácidos, sendo seu mecanismo de ação a inibição da enol-piruvil-shikimato-fosfato sintetase (EPSPs), enzima responsável por uma das etapas da síntese dos aminoácidos aromáticos fenilalamina, tirosina e triptofano (Hess, 1994). Sem a síntese desses aminoácidos a formação de proteínas é comprometida, além da paralisação da síntese de compostos secundários, como vitaminas, hormônios e substâncias fenólicas (Kissmann, 2003). Dessa forma, o maior teor de N inorgânico no biótipo sensível pode ser devido à inibição da enzima EPSPs e à paralisação da síntese de aminoácidos. O acúmulo de N inorgânico indica que a enzima nitrato redutase pode estar sendo afetada pelo herbicida.

O biótipo sensível tratado com glyphosate apresentou menor teor de fósforo na parte aérea (2,46 g kg-1) quando comparado ao tratamento sem herbicida (3,79 g kg-1). Quando se comparam os dois biótipos, verifica-se maior teor de P para o biótipo resistente, independentemente da aplicação do herbicida em ambos os tratamentos (Tabela 2). O P assume importantes funções nos tecidos vegetais, como componente de fosfatos, açúcares, ácidos nucléicos, nucleotídeos, coenzimas, fosfolipídios e ácido fítico, e tem papel central em reações que envolvem ATP (Taiz & Zeiger, 2002). Com relação ao K, foi constatado também menor teor desse nutriente na parte aérea do biótipo sensível que recebeu a aplicação do glyphosate (17,04 g kg-1), quando comparado ao tratamento que não recebeu o herbicida (35,58 g kg-1), conforme Tabela 2. O K é requerido como co-fator de mais de 40 enzimas e é o principal cátion no estabelecimento do turgor celular e na manutenção da eletroneutralidade celular (Taiz & Zeiger, 2002). É possível que tanto para o P quanto para o K ocorra redução na absorção desses nutrientes pelo biótipo sensível tratado com o produto. Não foram observadas diferenças entre os biótipos nos teores de S, Ca e Mg (Tabela 2).

Ao avaliar os teores de macronutrientes nas raízes, não foram constatadas diferenças entre os biótipos resistente e sensível, assim como entre os tratamentos com e sem herbicida (Tabela 3).

A avaliação do teor total de nutrientes na planta indicou menor acúmulo de N total no biótipo sensível não tratado com glyphosate, comparado aos biótipos resistente e sensível tratados (Tabela 4). Já para P e K observou-se comportamento diferente: o biótipo sensível tratado apresentou menor teor total desses nutrientes. O teor de P no biótipo sensível tratado foi de 2,97 g kg-1, e nas plantas que não receberam o tratamento, de 4,41 g kg-1; no biótipo resistente não foi observada diferença entre as plantas tratadas e não tratadas com o produto, indicando que o glyphosate não interfere na absorção de P no biótipo resistente. Com relação ao K, no biótipo sensível tratado foi constatado menor teor do nutriente: 40,43 g kg-1 contra 70,14 g kg-1 nas plantas não tratadas. Os resultados referentes aos teores de N total, P e K na planta são similares aos observados na parte aérea dos biótipos. Para os macronutrientes S, Ca e Mg não foram observadas diferenças entre os biótipos resistente e sensível nos tratamentos com e sem herbicida (Tabela 4).

O biótipo sensível, na ausência de herbicida, apresentou maior acúmulo de massa seca quando comparado aos demais tratamentos (Tabela 5); também para a concentração total de macronutrientes na planta foram observados maiores valores no biótipo sensível sem herbicida, em relação ao resistente. Em condições normais, o biótipo sensível parece apresentar maior taxa de crescimento que o resistente; dessa forma, o biótipo sensível pode ser mais competitivo que o resistente. Esses resultados assemelham-se aos encontrados por Ferreira et al. (2006), que observaram que 35 dias após a emergência o biótipo sensível apresentava maior número de folhas, altura e massa seca que o resistente.

O biótipo sensível tratado com herbicida apresentou menores concentrações de P, K, Ca e Mg (20,91; 207,02; 10,015; e 15,24 g kg-1, respectivamente), comparado ao tratamento em que o produto não foi aplicado (38,01; 411,73; 15,30; e 21,27 g kg-1, respectivamente), conforme Tabela 6. Para as concentrações de todos os nutrientes avaliados nas plantas não tratadas (N total, P, K, S, Ca e Mg), o biótipo sensível apresentou maiores valores em comparação ao resistente (Tabela 6). Entretanto, deve-se considerar que o biótipo sensível em condições normais apresenta maior produção de massa seca que o resistente; desta forma, é esperado que o biótipo sensível apresente maior concentração de nutrientes.

De acordo com os resultados, pode-se concluir que o biótipo sensível tem maior capacidade de translocação do glyphosate que o resistente, e os dois biótipos avaliados apresentam exsudação radicular do produto. Com relação ao acúmulo de nutrientes, não houve diferenças entre os biótipos e entre os tratamentos com e sem herbicida nos teores de macronutrientes das raízes. Na presença de herbicida, o biótipo resistente apresentou maior teor de fósforo tanto na parte aérea quanto na planta. Verificou-se tendência de os biótipos resistente e suscetível tratados com herbicida apresentarem maiores teores de N total e N inorgânico na parte aérea e na planta como um todo, quando comparados às plantas não tratadas. Os biótipos não diferiram na capacidade de absorção e acúmulos de macronutrientes na ausência do produto.

LITERATURA CITADA

Recebido para publicação em 28.4.2007 e na forma revisada em 4.1.2008.

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  • WEED SCIENCE. Disponível em: <http://www.weedscience.org/in.asp>. Acesso em: 17 de janeiro de 2007.
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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    15 Abr 2008
  • Data do Fascículo
    Mar 2008

Histórico

  • Recebido
    28 Abr 2007
  • Aceito
    04 Jan 2008
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