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Produção e partição de matéria seca de cultivares de feijão em competição com plantas daninhas

Dry matter production and distribution of bean cultivars under weed competition

Resumos

Objetivou-se com este trabalho avaliar os efeitos da competição entre três cultivares de feijão e seis espécies de plantas daninhas no crescimento inicial e na alocação de matéria seca pelas plantas. Adotou-se arranjo fatorial em esquema 3 x 6 + 9, constituído pela combinação de três genótipos de feijão (IPR Colibri, IPR Eldorado e Pérola) em competição com seis espécies de plantas daninhas (Euphorbia heterophylla, Bidens pilosa, Cenchrus echinatus, Amaranthus spinosus, Commelina benghalensis e Brachiaria plantaginea), além de nove tratamentos adicionais, correspondentes aos cultivares de feijão e às espécies daninhas ausentes de competição. O delineamento foi em blocos casualizados com quatro repetições, e cada vaso contendo 5 L de substrato representou uma unidade experimental. O período de convivência entre os cultivares de feijão e as plantas daninhas foi de 45 dias após emergência da cultura; depois disso, coletou-se o material vegetal para avaliação da matéria seca e distribuição entre os diferentes órgãos (raízes, folhas e caule). Os cultivares de feijão apresentaram menor acúmulo de matéria seca quando estavam em competição com as espécies de plantas daninhas. A raiz foi o principal órgão afetado negativamente pela competição. De forma contrária, as folhas e o caule das espécies daninhas foram os órgãos mais prejudicados. De maneira geral, o cultivar Pérola foi o genótipo que mais tolerou a competição com plantas daninhas, e E. heterophylla foi a espécie daninha menos competitiva. A. spinosus e B. plantaginea foram as espécies com maior capacidade de competição com a cultura do feijão.

Euphorbia heterophylla; Bidens pilosa; Cenchrus echinatus; Amaranthus spinosus; Commelina benghalensis; Brachiaria plantaginea


This study aimed to determine the competitive ability of three bean cultivars and six weed species and to quantify the effect of competition on the plants' growth and dry mass allocation. A factorial scheme 3 x 6 + 9 was adopted, consisting of a combination of three genotypes (Colibri IPR, IPR Eldorado, Pearl) in competition with six species of weeds (Euphorbia heterophylla, Bidens pilosa, Cenchrus echinatus, Amaranthus spinosus, Commelina benghalensis and Brachiaria plantaginea), plus nine additional treatments corresponding to the bean cultivars and weeds without competition. Both treatments were arranged in a randomized block design with four replicates, with each pot (containing 5 dm³ soil) representing an experimental unit. The period of coexistence between the bean cultivars and weeds was 45 days after emergence, followed by collection of the plant material to assess the dry mass distribution among the different organs (roots, leaves and stems). The bean cultivars had a lower biomass accumulation when in competition with the weed species. The root was the main organ affected negatively. Conversely, the leaves and the stems of the competing species, in general, were the most affected. Overall, the cultivar Pearl was the genotype most tolerant to weed competition and E. heterophylla was the least competitive weed. A. spinosus and B. plantaginea were found to have a greater capacity to compete with the bean crop.

Euphorbia heterophylla; Bidens pilosa; Cenchrus echinatus; Amaranthus spinosus; Commelina benghalensis; Brachiaria plantaginea


ARTIGOS

Produção e partição de matéria seca de cultivares de feijão em competição com plantas daninhas

Dry matter production and distribution of bean cultivars under weed competition

Cury, J.P.I; Santos, J.B.II; Valadão Silva, D.I; Carvalho, F.P.I; Braga, R.R.III; Byrro, E.C.M.III; Ferreira, E.A.IV

IMestrandos do Programa de Pós-Graduação em Produção Vegetal, Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri PPGPV/UFVJM, CEP: 39100-000, Diamantina-MG, <joaopcury@yahoo.com.br>, <danielvaladaos@yahoo.com.br>, <felipepaolinelli_dm@hotmail.com>

IIProfessor Adjunto, Dep. de Agronomia, UFVJM, <barbosa@pq.cnpq.br>

IIIAcadêmicos do Curso de Agronomia, UFVJM, <granderenan@gmail.com>, <elizabyrro@hotmail.com>

IVPós-doutorando, PPGPV/UFVJM, <evanderalves@yahoo.com.br>

RESUMO

Objetivou-se com este trabalho avaliar os efeitos da competição entre três cultivares de feijão e seis espécies de plantas daninhas no crescimento inicial e na alocação de matéria seca pelas plantas. Adotou-se arranjo fatorial em esquema 3 x 6 + 9, constituído pela combinação de três genótipos de feijão (IPR Colibri, IPR Eldorado e Pérola) em competição com seis espécies de plantas daninhas (Euphorbia heterophylla, Bidens pilosa, Cenchrus echinatus, Amaranthus spinosus, Commelina benghalensis e Brachiaria plantaginea), além de nove tratamentos adicionais, correspondentes aos cultivares de feijão e às espécies daninhas ausentes de competição. O delineamento foi em blocos casualizados com quatro repetições, e cada vaso contendo 5 L de substrato representou uma unidade experimental. O período de convivência entre os cultivares de feijão e as plantas daninhas foi de 45 dias após emergência da cultura; depois disso, coletou-se o material vegetal para avaliação da matéria seca e distribuição entre os diferentes órgãos (raízes, folhas e caule). Os cultivares de feijão apresentaram menor acúmulo de matéria seca quando estavam em competição com as espécies de plantas daninhas. A raiz foi o principal órgão afetado negativamente pela competição. De forma contrária, as folhas e o caule das espécies daninhas foram os órgãos mais prejudicados. De maneira geral, o cultivar Pérola foi o genótipo que mais tolerou a competição com plantas daninhas, e E. heterophylla foi a espécie daninha menos competitiva. A. spinosus e B. plantaginea foram as espécies com maior capacidade de competição com a cultura do feijão.

Palavras-chave: Euphorbia heterophylla, Bidens pilosa, Cenchrus echinatus, Amaranthus spinosus, Commelina benghalensis, Brachiaria plantaginea.

ABSTRACT

This study aimed to determine the competitive ability of three bean cultivars and six weed species and to quantify the effect of competition on the plants' growth and dry mass allocation. A factorial scheme 3 x 6 + 9 was adopted, consisting of a combination of three genotypes (Colibri IPR, IPR Eldorado, Pearl) in competition with six species of weeds (Euphorbia heterophylla, Bidens pilosa, Cenchrus echinatus, Amaranthus spinosus, Commelina benghalensis and Brachiaria plantaginea), plus nine additional treatments corresponding to the bean cultivars and weeds without competition. Both treatments were arranged in a randomized block design with four replicates, with each pot (containing 5 dm3 soil) representing an experimental unit. The period of coexistence between the bean cultivars and weeds was 45 days after emergence, followed by collection of the plant material to assess the dry mass distribution among the different organs (roots, leaves and stems). The bean cultivars had a lower biomass accumulation when in competition with the weed species. The root was the main organ affected negatively. Conversely, the leaves and the stems of the competing species, in general, were the most affected. Overall, the cultivar Pearl was the genotype most tolerant to weed competition and E. heterophylla was the least competitive weed. A. spinosus and B. plantaginea were found to have a greater capacity to compete with the bean crop.

Keywords: Euphorbia heterophylla, Bidens pilosa, Cenchrus echinatus, Amaranthus spinosus, Commelina benghalensis, Brachiaria plantaginea.

INTRODUÇÃO

O feijão-comum (Phaseolus vulgaris) é uma das culturas mais difundidas no Brasil, por constituir, juntamente com o arroz, alimento básico para a população.

Por ser o feijoeiro cultivado durante todo o ano, ele sofre interferência de uma ampla variedade de plantas daninhas (Cobucci et al., 1999). Segundo Kozlowski et al. (2002), a redução de produtividade dessa cultura devido à competição com espécies infestantes pode chegar a 71%, dependendo das características da cultura, da comunidade infestante, do ambiente e da época e duração do período de convivência entre plantas.

Entre as tecnologias disponíveis para o controle de plantas daninhas no feijoeiro, os herbicidas são a alternativa utilizada pelos produtores em lavouras com elevados níveis tecnológicos, devido à alta eficiência e rendimento operacional (Procópio et al., 2001). Entretanto, o uso exclusivo desse processo pode resultar numa crescente competitividade dos fatores bióticos nocivos às culturas. Assim, a melhor alternativa para redução das plantas daninhas não deve-se basear apenas em um método específico de controle, e sim no uso de técnicas conjuntas ao longo dos cultivos (Fontes et al., 2003).

O manejo integrado de plantas daninhas (MIPD) é um conjunto de medidas de prevenção e controle dessas espécies que vem se fortalecendo desde a década de 1980 (Pitelli, 1987), tecnicamente manejado, seja na cultura do feijoeiro ou em qualquer outra cultura, e se apresenta como uma das principais ferramentas para otimização da produção agrícola (Fontes et al., 2003). Inserido nesse processo, o controle cultural constitui-se em uma técnica de controle importante, pois, em relação às demais, possui baixo custo e faz parte naturalmente dos sistemas de produção (Karam, 2003). Para isso, podem ser empregadas época e densidade apropriadas de semeadura, espaçamento adequado entre fileiras de plantio (Cobucci et al., 1999) e uso de características e habilidades competitivas inerentes às culturas em detrimento das plantas daninhas (Pires et al., 2005).

Uma vez que o crescimento, tanto das culturas quanto das plantas daninhas, depende da habilidade dessas espécies em extrair os recursos existentes no ambiente em que vivem e, na maioria das vezes, o suprimento desses recursos é limitado (Pitelli, 1984), a escolha do cultivar com habilidade competitiva superior poderá manifestar o potencial de supressão das culturas sobre plantas concorrentes (Lamego et al., 2005). As características iniciais presentes na planta que favoreçam o crescimento são determinantes, porque é no período vegetativo que, em geral, se estabelecem as relações definitivas da competição entre plantas cultivadas e não cultivadas (Lamego et al., 2005). Nesse contexto, este trabalho teve como objetivo determinar os efeitos da competição entre cultivares de feijão e plantas daninhas no crescimento e na alocação de matéria seca pelas plantas.

MATERIAL E MÉTODOS

O experimento foi conduzido em casa de vegetação no Departamento de Agronomia da Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM), Diamantina-MG. Foi utilizada amostra de Latossolo Vermelho-Amarelo distrófico típico, textura média, que, após secagem ao ar, foi peneirada (malha de 5 mm). A análise química do solo apresentou o seguinte resultado: pH (água) de 5,4; teor de matéria orgânica de 1 dag kg-1; P, K e Ca de 1,4, 10 e 0,5 mg dm-3, respectivamente; e Mg, Al, H+Al e CTCefetiva de 0,2, 0,4, 4,4 e 1,7 cmolc dm-3, respectivamente. Para adequação do substrato quanto à nutrição, foram aplicados 3,0 g dm-3 de calcário dolomítico e 2,9 g dm-3 da formulação 4-14-8 (N-P2O5-K2O). A adubação complementar nitrogenada em cobertura foi realizada em intervalos de 15 dias após a emergência da cultura (DAE), na dose de 31,0 mg dm3 de ureia previamente dissolvida em água. Aos 15 e 25 DAE foram efetuadas duas pulverizações foliares de 77,0 g ha-1 de molibdênio em cada aplicação, na forma de molibdato de sódio (Na2MoO4.2H2O). As irrigações foram realizadas diariamente, por sistema automático de microaspersão.

Adotou-se arranjo fatorial em esquema 3x6+9, constituído pela combinação de três genótipos de feijão [IPR Colibri, IPR Eldorado e Pérola] em competição com seis espécies de plantas daninhas: Euphorbia heterophylla (EPHHL), Bidens pilosa (BIDPI), Cenchrus echinatus (CCHEC), Amaranthus spinosus (AMASP), Commelina benghalensis (COMBE) e Brachiaria plantaginea (BRAPL), e, ainda, nove tratamentos adicionais, correspondentes aos cultivares de feijão e às espécies daninhas ausentes de competição. Ambos os tratamentos foram delineados em blocos casualizados com quatro repetições, e cada vaso com capacidade volumétrica de 5 L (25,0 x 21,0 cm de diâmetro e altura, respectivamente), contendo amostra de solo, representou uma unidade experimental.

Mudas de C. benghalensis foram transplantadas e as demais espécies de plantas daninhas foram semeadas diretamente nos vasos, aos 15 dias antes da semeadura dos cultivares de feijão, de forma a coincidir com a emergência da cultura e possibilitar a expressão do potencial competitivo inerente à biologia dessas espécies. Para as espécies semeadas, as densidades de plantas almejadas foram mantidas por meio de desbastes. O experimento foi composto pela mesma densidade de plantas daninhas e plantas de feijão (uma planta por vaso) exceto para a espécie E. heterophylla, que possuía a densidade de duas plantas por vaso. Os valores para densidade foram preestabelecidos após estudos de fitossociologia em áreas de cultivo de feijão sobre o mesmo tipo de solo (dados não apresentados).

Aos 45 dias após a emergência e convivência da cultura com as espécies infestantes, para determinação da matéria seca, procedeu-se à retirada das plantas de feijão e, também, das plantas daninhas, separando-as em raízes, caules e folhas. Esse intervalo foi estabelecido com o intuito de quantificar os prejuízos da convivência do feijoeiro com plantas daninhas durante o período crítico de prevenção da interferência de espécies infestantes, que pode ser estendido até aproximadamente 58 dias após a emergência da cultura (Kozlowski et al., 2002).

Após essa coleta, todo o material vegetal foi lavado em água destilada e seco em estufa com circulação forçada de ar, a 65 ºC, até atingir peso constante, para determinação da massa da matéria seca. Essa determinação foi realizada em balança eletrônica com precisão de 0,0001 g. Além disso, foi calculada a distribuição percentual de matéria seca entre os componentes vegetativos dos cultivares de feijão e das diferentes espécies de plantas daninhas, fazendo-se a relação da matéria seca de cada órgão (folha, caule e raiz) com a matéria seca total. Para as espécies C. echinatus e B. plantaginea, a bainha foi somada às folhas e o colmo foi comparado como o caule.

Os dados obtidos de matéria seca foram submetidos à análise de variância, e as médias, quando significativas, comparadas pelo teste de Tukey a 5% de probabilidade de erro; foi feito também um contraste, para comparação entre a testemunha de cada espécie de planta daninha, livre de interferência, e a média de suas respectivas competições com os três cultivares de feijão.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

O grau de interferência variou com a espécie de planta daninha e com o cultivar de feijão. De maneira geral, os resultados demonstram que o cultivar Pérola foi o que mais tolerou a competição imposta pelas plantas daninhas; sob interferência das diferentes espécies, apresentou acúmulo de matéria seca total superior ao da média dos demais cultivares (Tabela 1).

A duração do ciclo do feijoeiro pode ter relação direta com a habilidade do cultivar em tolerar a competição imposta pelas plantas daninhas na fase inicial. O cultivar Pérola é o único dos genótipos de feijão avaliados que tem ciclo tardio, diferentemente dos demais, de ciclo precoce (IPR Colibri) e semiprecoce (IPR Eldorado) (IAPAR; Vieira et al., 2002). É possível que a germinação e emergência do cultivar Pérola, independentemente de ele possuir ciclo mais longo, ocorram de forma mais rápida, apresentando assim maior altura e dossel denso, não expondo a cultura ao sombreamento e à maior interferência inicial imposta pelas plantas infestantes. Smith Jr. (1974), trabalhando com a cultura do arroz, reporta que cultivares de ciclo mais longo têm maior capacidade de competição com plantas daninhas. Conforme Lamego et al. (2005), o aumento em estatura na fase inicial de desenvolvimento de plantas de soja causa interferências negativas do crescimento de plantas daninhas, podendo essa característica estar presente em cultivares tanto de ciclo precoce como tardio (Jannink et al., 2001) e relacionada com a habilidade competitiva delas (Jannink et al., 2000).

Ademais, é possível inferir que o tempo de duração do ciclo do cultivar Pérola, além de ser uma característica de competitividade inerente à biologia desse material genético, seja capaz de atrasar o início da competição com plantas daninhas pelo mesmo nicho ecológico. Como consequência, o período anterior à interferência (PAI) do cultivar irá se tornar mais extenso, de forma que a necessidade de controle das espécies infestantes também seja adiada ele é compreendido como a convivência com plantas daninhas por um determinado período, que não interfere negativamente na produtividade da cultura (Brighenti et al., 2004).

Os cultivares de feijão, quando em competição com as espécies Bidens pilosa e Cenchrus echinatus, obtiveram produções de aproximadamente 38 e 51% de matéria seca total, respectivamente, dos valores observados na média das testemunhas ausentes de competição (Tabela 1). Já o acúmulo de matéria seca total dessas espécies, quando em convivência com os cultivares de feijão, foi de aproximadamente 72 e 68%, respectivamente (Tabela 2).

Conforme Teixeira et al. (2009), B. pilosa e C. echinatus estão entre as espécies de plantas daninhas predominantes em áreas onde se cultiva o feijão, tanto no período da seca (B. pilosa) quanto no período das águas (C. echinatus). Deve-se considerar que a população com que as plantas daninhas ocorrem nas lavouras não apresenta a sua real habilidade de competição, quando, na realidade, o efeito decorre do maior número de indivíduos em uma população e não da capacidade particular de cada indivíduo em competir com as culturas (Bianchi et al., 2006). Entretanto, B. pilosa e C. echinatus, além de estarem em alta densidade e comumente presentes em áreas com cultivo de feijão, são espécies que apresentam elevado potencial competitivo; em nível de indivíduo, são capazes de submeter a cultura a significativas reduções no acúmulo de matéria seca.

Amaranthus spinosus e Brachiaria plantaginea foram as espécies com maior capacidade de competição com o feijoeiro, pois afetaram negativamente o acúmulo de matéria seca em todos os componentes vegetativos da cultura, submetendo-a valores de, aproximadamente, 17% de matéria seca total e 11% de matéria seca de raiz, comparadas à testemunha livre da interferência (Tabela 1). Contudo, o acúmulo de matéria seca total de A. spinosus e B. plantaginea indica que os efeitos competitivos dos cultivares de feijão foram significativos (produção de aproximadamente 17 e 13% de matéria seca total inferior à das respectivas testemunhas (Tabela 2).

Resultados diferentes foram observados por Passini et al. (2003), avaliando a competição da cultura do feijão-comum com B. plantaginea. Esses autores verificaram que o feijoeiro possui maior habilidade competitiva do que esta espécie e que a competição interespecífica pode ser considerada desprezível. Carvalho & Christoffoleti (2008) verificaram que a competição entre o feijoeiro e diversas espécies do gênero Amaranthus foi prejudicial para a cultura e as plantas daninhas, porém de forma mais pronunciada para as espécies infestantes. No entanto, conforme Teixeira et al. (2009), o feijoeiro apresenta baixa capacidade competitiva e está enquadrado no grupo de culturas agrícolas que menos sombreiam o solo, o que expõe a cultura a intensa interferência de plantas daninhas. Ademais, é possível inferir que, de maneira geral, as plantas cultivadas têm menor capacidade competitiva, em razão do processo de melhoramento pelo qual passaram, do que espécies da comunidade infestante (plantas não cultivadas); como consequência, apresentam menor tolerância aos efeitos da competição (Fontes et al., 2003).

Em nível de indivíduo, os resultados demonstram que o feijoeiro, sob interferência de diferentes espécies de plantas daninhas, apresenta menor habilidade competitiva e tolerância à competição, com menores acúmulos de matéria seca em relação à espécie concorrente (Tabela 1). Contudo, observou-se que os cultivares de feijão, quando em competição com Euphorbia heterophylla e Commelina benghalensis, obtiveram produções de aproximadamente 50 e 61% de matéria seca total, respectivamente, do valor observado na média das testemunhas ausentes de competição (Tabela 1). O acúmulo de matéria seca total dessas espécies, quando em convivência com o feijoeiro, foi somente de 24 e 39%, respectivamente (Tabela 2).

Euphorbia heterophylla, quando comparada às demais espécies de plantas daninhas, foi a espécie mais sensível à competição com a cultura do feijão. Em todos os seus componentes vegetativos, observou-se produção de matéria seca acentuadamente menor, comparada à testemunha dessa espécie [redução de aproximadamente 80% da parte aérea (folha e caule) e 63% da raiz (Tabela 2)]. Isso corrobora a ideia de que mesmo espécies de comportamento "agressivo" podem sofrer de forma mais pronunciada a competição com plantas cultivadas, por possuírem menor habilidade competitiva em relação a estas. Resultados contrários foram encontrados por Voll et al. (2002) com a cultura da soja, os quais concluíram que E. heterophylla é considerada uma das espécies com maior capacidade de competição.

Nas áreas agrícolas, as plantas daninhas por serem espécies não cultivadas e ocorrerem, em geral, em populações superiores às das plantas cultivadas são frequentemente rotuladas como mais competitivas (Bianchi et al., 2006). Todavia, Meschede et al. (2004), utilizando-se da técnica de testemunhas duplas, determinaram o período anterior à interferência em soja. Esses autores verificaram que a matéria seca acumulada por cada indivíduo presente em uma população de plantas daninhas denota ser uma variável mais importante e fidedigna do que a própria população no que se refere ao grau de interferência imposto à cultura. Assim, é possível inferir que a capacidade das espécies de plantas daninhas e das culturas em acumular matéria seca, principalmente na fase inicial de desenvolvimento, está diretamente relacionada com a capacidade competitiva destas, conforme evidenciado nos trabalhos de Bennett & Shaw (2000) e Lamego et al. (2005) com a cultura da soja.

De acordo com alguns autores, não somente o acúmulo, mas a alocação de biomassa, é um aspecto fundamental na competição entre espécies de plantas (Domingos et al., 2005). A distribuição percentual de matéria seca entre os componentes vegetativos de cultivares de feijão foi alterada em função da interferência de diferentes plantas daninhas (Figura 1). De maneira geral, os resultados demonstram que o cultivar Pérola foi o que menos alterou a alocação de matéria seca sob interferência das diferentes espécies de plantas daninhas (Figura 1).


Observou-se menor acúmulo proporcional de matéria seca no caule do cultivar Pérola sob interferência de E. heterophylla e C. benghalensis (19%), em relação à testemunha ausente de convivência com essas espécies (21%) (Figura 1). Sob interferência de B. pilosa e A. spinosus, observou-se menor alocação relativa de matéria seca nas raízes (14%) em relação à testemunha (17%) (Figura 1). Esse efeito é ainda mais visível quando o cultivar estava em competição com a espécie B. plantaginea (produção de 12% de matéria seca de raiz). É possível inferir que o potencial agressivo de B. plantaginea em nível radicular fez com que o cultivar Pérola, quando submetido à interferência desta espécie, induzisse a maior alocação relativa de matéria seca para os órgãos superiores, na tentativa de sobreviver à competição.

Observou-se maior acúmulo proporcional de matéria seca de folhas do cultivar IPR Eldorado sob interferência de E. heterophylla e C. benghalensis (68%), em relação à testemunha livre de competição (63%) (Figura 1). Sob interferência de C. echinatus, nota-se também maior acúmulo relativo de matéria seca para as folhas, porém com redução significativa das raízes (produção 9% superior de folha e 11% inferior de raízes em relação à respectiva testemunha) (Figura 1). É possível que, em consequência da superioridade no estabelecimento do sistema radicular por parte das espécies E. heterophylla, C. benghalensis e C. echinatus em relação ao cultivar IPR Eldorado, a cultura destinasse maiores quantidades de fotoassimilados para a parte aérea, principalmente para as folhas, na tentativa de sombrear as espécies com as quais estava em competição, reduzindo assim a disponibilidade de radiação solar para fotossíntese da infestante.

Sob interferência de A. spinosus e B. plantaginea, observou-se maior alocação relativa de matéria seca no caule do cultivar IPR Eldorado (28 e 25%, respectivamente), em relação à testemunha ausente de competição (14%) (Figura 1). Em ambas as competições houve realocação de matéria seca. No primeiro caso, a produção relativa de raízes pelo cultivar foi 15% inferior; no segundo, a produção de folha foi 6% inferior (Figura 1). As plantas, quando privadas de quaisquer fatores necessários ao seu crescimento, tendem a alterar seu padrão de distribuição de fotoassimilados e, como consequência, de suas características morfofisiológicas. Conforme Ballaré (1999), uma planta sob sombreamento normalmente aloca maior quantidade de recurso para o caule, o que lhe permite atingir altura maior e vantagem na competição por luz. Diante disso, é provável que o cultivar IPR Eldorado, no início de ciclo, tenha desenvolvido mais o caule na busca de maior estatura, em detrimento da competição com A. spinosus e B. plantaginea.

Observou-se maior acúmulo relativo de matéria seca no caule do cultivar IPR Colibri sob interferência de E. heterophylla, C. benghalensis e C. echinatus (Figura 1). Em nível radicular, observou-se também realocação de matéria seca (acúmulo de aproximadamente 3, 2 e 5% superior, respectivamente, ao da testemunha livre de competição Figura 1). Estima-se que o cultivar IPR Colibri, quando submetido à competição com essas espécies, principalmente acima do solo, acumule maiores quantidades de matéria seca nos órgãos inferiores, sobretudo nas raízes, na tentativa de minimizar os efeitos negativos da interferência; uma ramificação extensa do sistema radicular pode significar provavelmente um órgão mais eficiente de captação e utilização de nutrientes.

Sob interferência de A. spinosus e B. plantaginea, notou-se também maior alocação relativa de matéria seca no caule do cultivar IPR Colibri, porém com redução significativa das raízes produção 6 e 11% superior de caule e aproximadamente 3 e 6% inferior de raízes, respectivamente (Figura 1). Conforme Larcher (2000), A. spinosus e B. plantaginea, por serem plantas daninhas com vias de fixação de carbono do tipo C4, possuem um mecanismo fotossintético que lhes confere características vantajosas em competição com plantas de metabolismo C3 (como o feijoeiro), pois apresentam rápido crescimento inicial e dossel vigoroso, o que as tornam altamente competitivas.

As alterações nos padrões de alocação de matéria seca pelos cultivares de feijão influenciaram diretamente na distribuição percentual de matéria seca pelas espécies com as quais estavam em competição (Figura 2). Observou-se maior acúmulo relativo de matéria seca nas raízes de E. heterophylla em função da convivência com os cultivares de feijão (Figura 2). Esse comportamento corrobora em parte os resultados obtidos por Vidal & Trezzi (1999), que, pesquisando o desenvolvimento de quatro biótipos de E. heterophylla oriundos de diferentes locais do Estado do Rio Grande do Sul, verificaram maiores proporções de raízes e caule em relação à biomassa total dessa espécie nos períodos mais avançados de desenvolvimento.


Ao contrário de E. heterophylla, a espécie C. benghalensis em convivência com cultivares de feijão acumulou maiores quantidades de matéria seca nas folhas, com redução de raízes (produção 8% superior de folhas e 7% inferior de raiz, em relação à respectiva testemunha livre de competição Figura 2). É possível que C. benghalensis, quando submetida à convivência com o feijoeiro, induza a alocação de matéria seca para os órgãos superiores, na tentativa de que seu dossel predomine em relação ao da cultura; assim, a captação de luz seria superior.

De acordo com os resultados, os cultivares de feijão avaliados, quando em competição com E. heterophylla e C. benghalensis, apresentaram menor produção de matéria seca, porém essas espécies praticamente foram suprimidas pela cultura. Observou-se, de modo geral, que o cultivar Pérola foi o genótipo de feijão que mais tolerou a competição com plantas daninhas.

Amaranthus spinosus e B. plantaginea demonstraram ser as espécies com maior capacidade competitiva, pois afetaram negativamente o acúmulo e a distribuição de matéria seca em todos os componentes vegetativos da cultura.

As diversas relações de competição às quais o feijoeiro foi submetido, por possuir competidores distintos, demonstram que em cada competição há variação do acúmulo e alocação de recursos energéticos (fotoassimilados) nos componentes vegetativos da cultura e das espécies de plantas daninhas, o que afetou diretamente o crescimento destas. A raiz dos cultivares de feijão, de maneira geral, foi o principal órgão afetado negativamente pela competição. De forma contrária, as folhas e o caule das espécies competidoras, de maneira geral, foram os órgãos mais prejudicados.

AGRADECIMENTOS

Ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e à Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais (FAPEMIG), pelo apoio financeiro na execução deste trabalho.

LITERATURA CITADA

Recebido para publicação em 16.10.2010 e na forma revisada em 18.2.2011.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    11 Abr 2011
  • Data do Fascículo
    Mar 2011

Histórico

  • Aceito
    18 Fev 2011
  • Recebido
    16 Out 2010
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