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Atividade fotossintética de plantas cultivadas em solo contaminado com picloram

Photosynthetic activity of plants cultivated in soil contaminated with picloram

Resumos

Objetivou-se, com este trabalho, avaliar os efeitos do picloram sobre as características associadas à atividade fotossintética de Brachiaria brizantha, Brachiaria decumbens, Eleusine coracana e Zea mays, consideradas espécies com potencial de remediação de solo contaminado por esse herbicida. O experimento foi conduzido em esquema fatorial 4 x 3, no delineamento inteiramente casualizado, com quatro repetições. O primeiro fator constou do cultivo das espécies B. brizantha, B. decumbens, E. coracana e Zea mays,e o segundo, de três doses (0, 80 e 160 g ha-1) de picloram, aplicadas em pré-emergência. Após o preenchimento dos vasos com 6,0 kg de solo, classificado como Argissolo Vermelho-Amarelo, fez-se a irrigação e aplicou-se o herbicida na superfície do solo. Um dia após essa aplicação, procedeu-se à semeadura das espécies vegetais. Aos 40 dias após a emergência das espécies vegetais, foram determinados a condutância estomática, a taxa de transpiração, a concentração de CO 2 na câmara subestomática, o gradiente de CO2 e a taxa fotossintética, utilizando-se um analisador de gases no infravermelho (IRGA). Aos 90 dias após a emergência das plantas, foi coletada a parte aérea e determinada a matéria seca. Resíduos de picloram no solo podem alterar as variáveis fisiológicas estudadas, porém a produção de matéria seca da parte aérea dessas espécies não foi influenciada pela ação do herbicida, independentemente das doses aplicadas, indicando tolerância das espécies ao picloram. Desse modo, a avaliação prévia das características fisiológicas não pode ser utilizada como indicador de tolerância dessas espécies ao picloram.

fitorremediação; Brachiaria brizantha; Brachiaria decumbens; Eleusine coracana; Zea mays


The objective of this work was to evaluate the effects of picloram on the characteristics associated with the photosynthetic activity of Brachiaria brizantha, Brachiaria decumbens, Eleusine coracana and Zea mays, considered to be species with potential to remediate soil contaminated with this herbicide. The experiment was conducted in a factorial 4 x 3 in a completely randomized design, with four replications. The first factor consisted of cultivation of the species B. brizantha, B. decumbens, E. coracana and Zea mays and the second factor of three picloram doses (0, 80 and 160 g ha-1) applied in preemergence. Pots were filled with 6.0 kg of soil, classified as red-yellow Hapludalf, and irrigation and herbicide application were carried out on the soil surface. One day after this application, the plant species were sown. Forty days after emergence of the plant species, stomatal conductance, transpiration rate, sub-stomatal CO2 concentration, CO2 gradient, and photosynthetic rate were evaluated, using an infrared gas analyzer (IRGA). Ninety days after plant emergence, shoot was collected to determine shoot dry matter. Picloram residues in soil can affect the physiological variables studied but shoot dry matter was not influenced by the action of this herbicide, regardless of the doses applied, indicating tolerance of the species to picloram. Thus, prior assessment of the physiological characteristics cannot be used as an indicator of tolerance of these species to picloram.

phytoremediation; Brachiaria brizantha; Brachiaria decumbens; Eleusine coracana; Zea mays


ARTIGOS

Atividade fotossintética de plantas cultivadas em solo contaminado com picloram

Photosynthetic activity of plants cultivated in soil contaminated with picloram

Belo, A.F.I; Coelho, A.T.C.P.II; Tironi, S.P.III; Ferreira, E.A.IV; Ferreira, L.R.V; Silva, A.AV

IEngª-Agrª., M.Sc., Doutora em Fitotecnia, Dep. de Fitotecnia, Universidade Federal de Viçosa - DFT/UFV, 36570-000 Viçosa-MG <ferreiragro@yahoo.com.br>

IIEngº-Agrº., DFT/UFV

IIIEngº-Agrº., M.Sc., Doutorando, DFT/UFV

IVEngº-Agrº., D.Sc., Bolsista PNPD (Capes), Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri, Faculdade de Ciências Agrárias, Campus II - Rodovia MGT 367 - Km 583, nº 5000, Bairro Alto da Jacuba, 39100-000 Diamantina-MG

VEngº-Agrº., D.Sc., Professor, DFT/UFV

RESUMO

Objetivou-se, com este trabalho, avaliar os efeitos do picloram sobre as características associadas à atividade fotossintética de Brachiaria brizantha, Brachiaria decumbens, Eleusine coracana e Zea mays, consideradas espécies com potencial de remediação de solo contaminado por esse herbicida. O experimento foi conduzido em esquema fatorial 4 x 3, no delineamento inteiramente casualizado, com quatro repetições. O primeiro fator constou do cultivo das espécies B. brizantha, B. decumbens, E. coracana e Zea mays,e o segundo, de três doses (0, 80 e 160 g ha-1) de picloram, aplicadas em pré-emergência. Após o preenchimento dos vasos com 6,0 kg de solo, classificado como Argissolo Vermelho-Amarelo, fez-se a irrigação e aplicou-se o herbicida na superfície do solo. Um dia após essa aplicação, procedeu-se à semeadura das espécies vegetais. Aos 40 dias após a emergência das espécies vegetais, foram determinados a condutância estomática, a taxa de transpiração, a concentração de CO 2 na câmara subestomática, o gradiente de CO2 e a taxa fotossintética, utilizando-se um analisador de gases no infravermelho (IRGA). Aos 90 dias após a emergência das plantas, foi coletada a parte aérea e determinada a matéria seca. Resíduos de picloram no solo podem alterar as variáveis fisiológicas estudadas, porém a produção de matéria seca da parte aérea dessas espécies não foi influenciada pela ação do herbicida, independentemente das doses aplicadas, indicando tolerância das espécies ao picloram. Desse modo, a avaliação prévia das características fisiológicas não pode ser utilizada como indicador de tolerância dessas espécies ao picloram.

Palavras-chave: fitorremediação, Brachiaria brizantha, Brachiaria decumbens, Eleusine coracana, Zea mays.

ABSTRACT

The objective of this work was to evaluate the effects of picloram on the characteristics associated with the photosynthetic activity of Brachiaria brizantha, Brachiaria decumbens, Eleusine coracana and Zea mays, considered to be species with potential to remediate soil contaminated with this herbicide. The experiment was conducted in a factorial 4 x 3 in a completely randomized design, with four replications. The first factor consisted of cultivation of the species B. brizantha, B. decumbens, E. coracana and Zea mays and the second factor of three picloram doses (0, 80 and 160 g ha-1) applied in preemergence. Pots were filled with 6.0 kg of soil, classified as red-yellow Hapludalf, and irrigation and herbicide application were carried out on the soil surface. One day after this application, the plant species were sown. Forty days after emergence of the plant species, stomatal conductance, transpiration rate, sub-stomatal CO2 concentration, CO2 gradient, and photosynthetic rate were evaluated, using an infrared gas analyzer (IRGA). Ninety days after plant emergence, shoot was collected to determine shoot dry matter. Picloram residues in soil can affect the physiological variables studied but shoot dry matter was not influenced by the action of this herbicide, regardless of the doses applied, indicating tolerance of the species to picloram. Thus, prior assessment of the physiological characteristics cannot be used as an indicator of tolerance of these species to picloram.

Keywords: phytoremediation, Brachiaria brizantha, Brachiaria decumbens, Eleusine coracana, Zea mays.

INTRODUÇÃO

A contaminação ambiental causada pelo uso indiscriminado de agrotóxicos tem gerado preocupações, especialmente no caso de herbicidas que são aplicados em grande volume nos sistemas de produção vegetal.

Herbicidas de longo efeito residual apresentam como principais problemas a possibilidade de contaminação de culturas cultivadas em sucessão e a contaminação ambiental ocasionada pela lixiviação, podendo atingir cursos de águas subterrâneas (Santos et al., 2007).

O picloram é uma auxina sintética amplamente utilizada como herbicida em pastagens e apresenta elevada persistência no solo (Santos et al., 2006). Ele controla as plantas do grupo das magnoliopsidas e apresenta seletividade às plantas da família das poáceas.

Quando aplicado em espécies vegetais sensíveis, os herbicidas desse grupo provocam distúrbios no metabolismo dos ácidos nucleicos, aumento da atividade enzimática e destruição do floema, provocando alongamento, turgescência e rompimento das células (Machado et al., 2006). Também, os herbicidas auxínicos, segundo Pemadasa & Jeyaseelan (1976), induzem o fechamento estomático e, em muitos casos, provocam distúrbios na atividade fotossintética e respiração - causados pelas alterações do balanço iônico nas células. No entanto, esses autores sugerem outros mecanismos que podem induzir o fechamento estomático, como o acúmulo de potássio e amido nas células-guarda, observado em Stachytarpheta indica tratada com 2,4-D.

A dinâmica do picloram no solo pode variar em razão do tipo e conteúdo de argila, do teor de matéria orgânica e da umidade do solo (Walker et al., 1992), visto que este apresenta moderada a baixa sorção às partículas de argila e matéria orgânica (Grover, 1971). Desse modo, essas características influenciam diretamente no potencial de impacto ambiental do herbicida em questão.

O pH é outro fator que influencia diretamente na sorção do picloram no solo. Esse herbicida é um ácido fraco, o qual, na sua forma molecular, é capaz de doar prótons e formar íons carregados negativamente, com aumento dos valores do pH do meio. Nessa situação, ocorre menor sorção aos coloides do solo (D'Antonino et al., 2009). Com isso, o picloram pode atingir com facilidade águas subterrâneas (Pang et al., 2000), podendo causar efeitos negativos às algas (Wong, 2000), como observado com o herbicida auxínico 2,4-D.

Uma maneira de reduzir o efeito residual no solo do picloram e, consequentemente, o impacto ambiental é o cultivo de espécies vegetais com capacidade de remediação desse contaminante dos solos (Carmo et al., 2008). Essa técnica baseia-se na capacidade que algumas espécies vegetais possuem de acelerar a retirada de compostos tóxicos do ambiente (solo e água), seja por fitodegradação ou fitoestimulação da microbiota capaz de metabolizar o produto, promovendo assim sua descontaminação (Cunningam et al., 1996).

O emprego da fitorremediação na despoluição de solos contaminados com herbicidas vem sendo pesquisado nos últimos anos (Belo et al., 2007; Carmo et al., 2008) e apresentase como técnica promissora, pois, além de menor custo, possibilita a metabolização dos compostos orgânicos (Cunningham et al., 1996). Dessa forma, o sucesso no emprego da fitorremediação depende da natureza química e das propriedades do composto, além da aptidão ecológica da espécie vegetal a ser empregada, visando efetivar a remediação e diminuir o tempo de descontaminação da área (Santos et al., 2007).

A escolha de uma espécie com potencial de remediação de áreas contaminadas com herbicidas mimetizadores de auxinas é difícil, pois esses herbicidas causam distúrbios fisiológicos nas plantas (Pemadasa & Jeyaseelan, 1976). Esse grupo de herbicidas pode alterar os aspectos fotossintéticos até mesmo de plantas consideradas tolerantes, como o milho (Zhao & Wang, 2010), podendo atuar no fechamento estomático por meio da menor absorção de água pelo sistema radicular (Machado et al., 2006). Com o fechamento dos estômatos, reduz-se a turgescência foliar, levando a planta a reduzir as taxas transpiratórias com o fechamento estomático.

Considerando que o sucesso na adoção de espécies vegetais para remediação de solos contaminados com herbicidas é limitado pela suscetibilidade delas ao contaminante, e sabendo que o herbicida picloram atua indiretamente na atividade fotossintética, as variáveis associadas à fotossíntese podem ser utilizadas como indicadores da tolerância das plantas a esse herbicida, e devem ser investigadas. Com isso, objetivou-se, com este trabalho, avaliar as características associadas à atividade fotossintética de Brachiaria brizantha, Brachiaria decumbens, Eleusine coracana e Zea mays quando cultivadas em solo contaminado com diferentes concentrações de picloram.

MATERIAL E MÉTODOS

O trabalho foi conduzido em casa de vegetação, no período de novembro de 2007 a janeiro de 2008. O experimento constou de um fatorial 4 x 3, no delineamento inteiramente casualizado, com quatro repetições. O primeiro fator foi constituído pelo cultivo das espécies Brachiaria brizantha, Brachiaria decumbens, Eleusine coracana e Zea mays, e o segundo, de três doses (0, 80 e 160 g ha-1)de picloram, aplicadas em pré-emergência.

Como substrato para o cultivo das plantas, utilizaram-se amostras de solo classificado como Argissolo Vermelho-Amarelo, cujas características físicas e químicas estão apresentadas na Tabela 1. As amostras do solo em estudo foram coletadas na profundidade de 0-20 cm, em área sem histórico de aplicação de herbicidas, e passadas em peneira com malha de 4 mm, seguida de adubação com superfosfato simples na proporção de 10,0 g kg-1 de solo.

Após o preparo do solo, este foi colocado em vasos revestidos com filme de polietileno, visando evitar perda do herbicida por lixiviação. Foram utilizados 6,0 kg do substrato por vaso, os quais foram irrigados ajustando-se a umidade em valor próximo a 80% da capacidade de campo. Foi feita a seguir a aplicação do herbicida com um pulverizador de precisão, pressurizado a CO2, equipado com bicos TT110.02, espaçados de 0,5 m, calibrado para aplicação de 100 L ha-1 de calda herbicida.

A semeadura de B. brizantha, B. decumbens, E. coracana e Zea mays foi realizada um dia após a aplicação do picloram. Sete dias após a emergência delas, foi realizado o desbaste, deixando-se três plantas por vaso. Para o bom crescimento e desenvolvimento das plantas, foram feitas irrigações diárias, mantendo-se a umidade do solo próxima a 80% da capacidade de campo. O controle da umidade do solo foi realizado por meio de pesagens semanais dos vasos, repondo-se a água evapotranspirada.

Aos 30, 45 e 60 dias após emergência (DAE) foi adicionado em cada vaso 0,3 g de ureia, visando melhor crescimento das plantas. A partir dos 60 DAE, foram feitas adubações semanais de cobertura com 100 mL por vaso de solução Ouro Verde® contendo (g L-1): N (3,75), P2O5 (3,75), K2O (5,00), CaO (0,75), S (1,00), MgO (0,20), Cl (0,10), Mn (0,075), Fe (0,015), B (0,012) e Zn (0,010).

Aos 40 DAE, foram realizadas avaliações na folha mais jovem, com limbo foliar totalmente expandido, das quatro espécies, utilizando-se analisador de gases no infravermelho (IRGA), marca ADC, modelo LCA PRO (Analytical Development Co. Ltd, Hoddesdon, UK). Foram determinados a condutância estomática (gs - mol m-1 s-1), a taxa de transpiração (E - mol H2O m-2 s-1), a concentração de CO2 na câmara subestomática (Ci -µmol mol-1), o gradiente de CO2 (ΔC - µmol mol-1) e a taxa fotossintética (A -µmol m-2 s-1). Essas avaliações foram realizadas entre 7 e 9 horas da manhã, em dia de céu limpo, utilizando-se iluminação artificial de 1.400 µmol m-2 s-1 na câmara de avaliação do equipamento, de forma a manter as condições ambientais mais homogêneas durante as avaliações.

Aos 90 DAE, fez-se a colheita da parte aérea das plantas, que foram secas em estufa de circulação forçada de ar (70 ± 1 ºC) até atingirem peso constante, determinando-se a matéria seca.

Os dados foram submetidos à análise de variância e de regressão, sendo comparado somente o fator doses. Os modelos foram escolhidos com base na significância dos coeficientes de regressão, utilizando-se o teste t a 5% de probabilidade, no fenômeno biológico e no coeficiente de determinação (r2= SQReg/SQTrat).

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Observou-se redução da condutância estomática (gs) em B. decumbens, E. coracana e B. brizantha com o aumento da concentração de picloram no solo (Tabela 2). A redução da gs pode ter sido provocada pela ação do picloram, que estimula a produção do etileno nas plantas, o qual por sua vez estimula a síntese do ácido abscísico, que se acumula inicialmente nas folhas e depois é translocado pela planta, atuando no fechamento estomático (Mercier, 2004). Todavia, não foram observadas diferenças na gs da espécie Zea mays, independentemente das doses de picloram avaliadas (Tabela 2), demonstrando tolerância dessa espécie ao herbicida estudado.

A taxa transpiratória (E) não foi alterada na espécie Zea mays, independentemente das concentrações de picloram no solo. No entanto, B. decumbens, E. coracana e B. brizantha apresentaram redução da E à medida que aumentou a concentração do herbicida no solo (Tabela 3).

O fechamento estomático influencia na redução da transpiração. A gs é responsável pelo fluxo de entrada de CO2 e saída de água pelo estômato; quanto menor sua abertura, maior a resistência estomática e, consequentemente, a diminuição da transpiração (Taiz & Zeiger, 2004). Os herbicidas auxínicos podem atuar no fechamento estomático através da menor absorção de água pelo sistema radicular (Machado et al., 2006), reduzindo a turgescência foliar, levando a planta a reduzir as perdas de água com o fechamento estomático.

A concentração de CO2 na câmara subestomática (Ci) não foi alterada nas espécies B. brizantha e Zea mays, independentemente das doses de picloram estudadas. Quanto às espécies B. decumbens e E. coracana, houve redução da Ci com o aumento da concentração do herbicida no solo (Tabela 4). A menor concentração do CO2 no espaço interno da folha pode ser devido à maior atividade fotossintética, com maior taxa de carboxilação, incorporando o CO2 a compostos orgânicos; por outro lado, pode ser devido à maior resistência ao influxo de CO2 pelos estômatos, que é representada pela condutância estomática.

Neste estudo, os resultados obtidos de menor Ci das espécies B. decumbens e E. coracana podem ser atribuídos ao efeito do picloram, que pode atuar diretamente nos estômatos, interferindo na regulação osmótica celular, ou provocar distúrbios indiretos, como a menor absorção de água pelo sistema radicular (Machado et al., 2006). Isso faria com que houvesse a redução da turgescência foliar, levando a planta a reduzir as perdas de água com o fechamento estomático e, consequentemente, reduzindo o influxo de CO2.

Outro processo conhecido - provocado pelos herbicidas auxínicos - é o estímulo de produção do etileno nas plantas, este que por sua vez estimula a síntese do ácido abscísico (ABA). O ABA acumula-se inicialmente nas folhas e depois é translocado pela planta, atuando no fechamento estomático (Mercier, 2004), reduzindo o influxo de CO2 para o interior da folha e, consequentemente, a Ci.

O gradiente de CO2 (ΔC) - que representa a diferença entre a concentração do CO2 atmosférico e a do CO2 no interior da folha - decresceu em B. decumbens, B. brizantha e Zea mays com o aumento da concentração de picloram no solo. O menor ΔC pode ser resultante do menor consumo de CO2 pela atividade fotossintética, resultando em maior concentração de CO2 no interior da folha. Contudo, não foram observadas diferenças no ΔC pela espécie E. coracana, independentemente das doses de picloram avaliadas (Tabela 5).

A fotossíntese e, consequentemente, a respiração dependem de vários fatores, entre eles do constante fluxo de CO2 e O2 entrando e saindo da célula; esse fluxo livre é função da concentração de CO2 e O2 nos espaços intercelulares dependentes da abertura estomática - controladora majoritária do fluxo de gases (Messinger et al., 2006). Essa, por sua vez, é em grande parte controlada pela turgescência tanto das células-guarda (que controlam a abertura dos estômatos) como das células epidérmicas dos estômatos (Humble & Hsiao, 1970). Desse modo, qualquer efeito, causado pelo picloram, que leve à menor absorção ou à translocação de água pode afetar primeiramente a condutância estomática e/ou mesofílica, reduzindo a taxa fotossintética.

Alguns dos efeitos dos herbicidas auxínicos são o acúmulo de cálcio no citoplasma, o estímulo na produção de etileno e a acidificação da parede celular. O etileno promove a formação de celulase (enzimas que degradam celulose), que atuam na parede celular, reduzindo a resistência física desta; com a pressão interna da célula pela água, ocorre elongação celular (Mercier, 2004; Machado et al., 2006). Com o aumento da célula, pode ocorrer obstrução dos canais dos feixes vasculares, reduzindo a translocação de água e fotoassimilados.

Aos 40 dias após a emergência das plantas, verificou-se relação negativa entre a concentração do picloram no solo e a taxa fotossintética das espécies B. decumbens e B. brizantha, apesar de estas terem apresentado preliminarmente tolerância a esse herbicida (Tabela 6). Para E. coracana e Zea mays, não se verificaram alterações na taxa fotossintética quando cultivadas em solo com diferentes concentrações do picloram, evidenciando a distinção entre essas espécies quanto ao efeito desse herbicida. Esses efeitos de redução da taxa fotossintética podem ocorrer por algumas inibições relacionadas às trocas gasosas, como comentado anteriormente, ou por outros mecanismos, como a redução da concentração de clorofilas, que estão diretamente relacionados à atividade fotossintética, envolvidos na captação e dissipação de energia (Sunohara & Matsumoto, 1997).

Outro provável mecanismo de limitação da atividade fotossintética deve-se à alteração da expressão gênica das plantas intoxicadas, pois o herbicida pode atuar como hormônio, influenciando nos reguladores da expressão gênica, podendo bloquear ou proporcionar a maior expressão de alguns genes - o que pode alterar as taxas de síntese de algumas enzimas essenciais para o processo fotossintético (Chapman & Estelle, 2009).

Khan et al. (2002), trabalhando com herbicidas auxínicos em mostarda, observaram redução de aproximadamente 50% da taxa fotossintética e da condutância estomática na presença desses produtos. Em soja, o 2,4-D numa concentração de 100 ppm causou inibição da atividade fotossintética (Wedding et al., 1954). Wong (2000) também verificou redução de até 80% da taxa fotossintética de algas quando tratadas com 2 mg L-1 de 2,4-D. Lopez-Martinez et al. (1997), trabalhando com biótipos resistentes de Echinochloa crus-galli, não observaram alterações no aparato fotossintético das plantas tratadas com quinclorac - herbicida que apresenta mesmo mecanismo de ação do picloram.

B. brizantha, B. decumbens, E. coracana e Zea mays mostraram-se tolerantes ao picloram. Esse herbicida, nas condições avaliadas, não interferiu na produção de matéria seca da parte aérea das referidas espécies (Tabela 7) e também não causou sinal visual de intoxicação às plantas (dados não apresentados).

De modo geral, as plantas da família das poáceas apresentam tolerância aos herbicidas auxínicos, pré-requisito básico para uma planta ser utilizada como fitorremediadora, o que se deve às diferenças anatômicas nos vasos condutores e a outros mecanismos de desintoxicação. No entanto, essas plantas podem ser intoxicadas por esse grupo de herbicidas, como observado por Zhao & Wang (2010), em cujo estudo as auxinas alteraram a atividade fisiológica de plantas de Zea mays.

Zea mays foi a espécie menos afetada pelo picloram quando se avaliaram as características associadas à atividade fotossintética, porém, com base na matéria seca da parte aérea, todas as espécies estudadas mostraram-se tolerantes ao picloram. Isso indica que a avaliação prévia das características fisiológicas não pode ser utilizada como indicador de tolerância dessas espécies ao herbicida.

AGRADECIMENTO

Ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico - CNPq, pelo apoio financeiro para a realização deste trabalho.

LITERATURA CITADA

Recebido para publicação em 26.8.2010 e aprovado em 16.2.2011.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    28 Nov 2011
  • Data do Fascículo
    Dez 2011

Histórico

  • Recebido
    26 Ago 2010
  • Aceito
    16 Fev 2011
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