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Produção de compostos fenólicos durante a infecção ectomicorrízica por dois isolados de Pisolithus tinctorius em Eucalyptus urophylla in vitro

Phenolic compound production during ectomycorrhizal infection of Eucalyptus urophylla roots by two isolates of Pisolithus tinctorius in vitro

Resumos

Devido à grande variedade fisiológica e morfológica entre os fungos ectomicorrízicos, é possível observar variações no seu comportamento durante o estabelecimento da simbiose. Este trabalho teve como objetivos caracterizar as etapas da infecção micorrízica por dois isolados de P. tinctorius em E. urophylla, além de verificar a ocorrência de defesas estruturais e bioquímicas na planta. Plântulas de E. urophylla foram inoculadas com os isolados de P. tinctorius obtidos de eucalipto (1604) ou de Pinus (185). Após 0, 12, 24, 72, 96 e 120 horas da inoculação com cada um dos isolados, foi efetuada a dosagem de compostos fenólicos no tecido radicular. Nestes mesmos períodos foram feitos cortes anatômicos das raízes para verificar o desenvolvimento da infecção. Os cortes histológicos não evidenciaram reações estruturais de defesa das plantas nestes períodos testados. No entanto, foi observada colonização mais rápida pelo isolado 1604, o qual iniciou a adesão à raiz 24 horas após a inoculação. O isolado 185 só foi observado na raiz após 96 horas. A dosagem de compostos fenólicos mostrou variação significativa durante a infecção pelo isolado 185 e maior concentração nas raízes inoculadas com este isolado após 96 horas da inoculação. Porém, este acúmulo não impediu a continuidade de seu desenvolvimento na raiz. Neste trabalho não foi observada relação entre o atraso na infecção pelo isolado 185 e a produção de compostos fenólicos pelas raízes.


Physiological and structural diversity of ectomycorrhizal fungi can lead to differences in their behaviour during root infection and colonization. In incompatible interactions, the plant reacts against infection with structural and biochemical defenses, including production of antifungal compounds like phenolics. This study investigated the initial stages of ectomycorrhizal infection in interactions between P. tinctorius and E. urophylla to determine the plant reaction. E. urophylla seedlings were inoculated with a compatible (1604) or an incompatible (185) isolate of P. tinctorius. Extration of phenolic compounds was carried out at 0, 12, 24, 72, 96 and 120 hours after inoculation. At the same time, root samples were collected, processed and embedded in glycol methacrylate resin. Sections were studied under ligth microscopy. Ectomycorrhiza was formed on eucalyptus roots by 96 hours after inoculation with isolate 185 and by 24 hours in plants inoculated with isolate 1604. Structural reactions were not observed by light microscopy. On the other hand, a higher concentration of phenolic compounds in roots inoculated with the isolate 185 was observed 96 hours after inoculation. Although only plants inoculated with isolate 185 showed significant differences in phenolic concentration at the various infection stages, phenol accumulation could not be associated with delay in infection.

Pisolithus tinctorius; phenolic compounds; ectomycorrhiza


Produção de compostos fenólicos durante a infecção ectomicorrízica por dois isolados de Pisolithus tinctorius em Eucalyptus urophylla in vitro11. Parte da tese de doutorado de M. J. Baptista. Parte da tese de doutorado de M. J. Baptista.

MÍRIAN J. BAPTISTA21. Parte da tese de doutorado de M. J. Baptista. Parte da tese de doutorado de M. J. Baptista. , 41. Parte da tese de doutorado de M. J. Baptista. Parte da tese de doutorado de M. J. Baptista. , BEATRIZ APPEZZATO DA GLORIA31. Parte da tese de doutorado de M. J. Baptista. Parte da tese de doutorado de M. J. Baptista. , SÉRGIO F. PASCHOLATI21. Parte da tese de doutorado de M. J. Baptista. Parte da tese de doutorado de M. J. Baptista. eTASSO L. KRUGNER21. Parte da tese de doutorado de M. J. Baptista. Parte da tese de doutorado de M. J. Baptista.

(recebido em 06/11/98; aceito em 31/03/99)

ABSTRACT - (Phenolic compound production during ectomycorrhizal infection of Eucalyptus urophylla roots by two isolates of Pisolithus tinctorius in vitro). Physiological and structural diversity of ectomycorrhizal fungi can lead to differences in their behaviour during root infection and colonization. In incompatible interactions, the plant reacts against infection with structural and biochemical defenses, including production of antifungal compounds like phenolics. This study investigated the initial stages of ectomycorrhizal infection in interactions between P. tinctorius and E. urophylla to determine the plant reaction. E. urophylla seedlings were inoculated with a compatible (1604) or an incompatible (185) isolate of P. tinctorius. Extration of phenolic compounds was carried out at 0, 12, 24, 72, 96 and 120 hours after inoculation. At the same time, root samples were collected, processed and embedded in glycol methacrylate resin. Sections were studied under ligth microscopy. Ectomycorrhiza was formed on eucalyptus roots by 96 hours after inoculation with isolate 185 and by 24 hours in plants inoculated with isolate 1604. Structural reactions were not observed by light microscopy. On the other hand, a higher concentration of phenolic compounds in roots inoculated with the isolate 185 was observed 96 hours after inoculation. Although only plants inoculated with isolate 185 showed significant differences in phenolic concentration at the various infection stages, phenol accumulation could not be associated with delay in infection.

RESUMO - (Produção de compostos fenólicos durante a infecção ectomicorrízica por dois isolados de Pisolithus tinctorius em Eucalyptus urophylla in vitro). Devido à grande variedade fisiológica e morfológica entre os fungos ectomicorrízicos, é possível observar variações no seu comportamento durante o estabelecimento da simbiose. Este trabalho teve como objetivos caracterizar as etapas da infecção micorrízica por dois isolados de P. tinctorius em E. urophylla, além de verificar a ocorrência de defesas estruturais e bioquímicas na planta. Plântulas de E. urophylla foram inoculadas com os isolados de P. tinctorius obtidos de eucalipto (1604) ou de Pinus (185). Após 0, 12, 24, 72, 96 e 120 horas da inoculação com cada um dos isolados, foi efetuada a dosagem de compostos fenólicos no tecido radicular. Nestes mesmos períodos foram feitos cortes anatômicos das raízes para verificar o desenvolvimento da infecção. Os cortes histológicos não evidenciaram reações estruturais de defesa das plantas nestes períodos testados. No entanto, foi observada colonização mais rápida pelo isolado 1604, o qual iniciou a adesão à raiz 24 horas após a inoculação. O isolado 185 só foi observado na raiz após 96 horas. A dosagem de compostos fenólicos mostrou variação significativa durante a infecção pelo isolado 185 e maior concentração nas raízes inoculadas com este isolado após 96 horas da inoculação. Porém, este acúmulo não impediu a continuidade de seu desenvolvimento na raiz. Neste trabalho não foi observada relação entre o atraso na infecção pelo isolado 185 e a produção de compostos fenólicos pelas raízes.

Key words - Pisolithus tinctorius, phenolic compounds, ectomycorrhiza

Introdução

Os fungos micorrízicos são de grande importância para o desenvolvimento e a nutrição das plantas superiores. Em relações simbióticas com diversas espécies vegetais, são capazes de penetrar e colonizar o córtex radicular, formando uma rede micelial que se espalha no solo e absorve água e nutrientes minerais, translocando-os para a raiz (Harley & Smith 1983).

A importância da inoculação ectomicorrízica para o sucesso e estabelecimento das espécies arbóreas foi determinada a partir da década de 70 (Castellano 1994). Foi observado que muitas espécies vegetais hospedeiras apresentavam menor desenvolvimento na ausência de fungos micorrízicos, mesmo em solo fértil; hoje, a seleção cuidadosa do fungo é considerada um passo importante nos programas de inoculação em viveiros de mudas (Trappe 1977). Em virtude da grande variabilidade fisiológica e morfológica existente entre os fungos ectomicorrízicos, é possível esperar variações no seu comportamento durante o estabelecimento da simbiose, provocando respostas nas plantas que variam desde uma simbiose bastante eficiente até a ausência de efeitos ou a ocorrência de efeitos deletérios no crescimento (Harley & Smith 1983).

Embora existam poucas evidências de especificidade entre plantas hospedeiras e fungos micorrízicos, observa-se que pode haver uma maior ou menor compatibilidade nas interações ectomicorrízicas. Nas relações incompatíveis, a planta mostra respostas de defesa que incluem deposição de compostos fenólicos, formação de papila, espessamento das paredes celulares, entre outras. A reação da planta limita o desenvolvimento da simbiose e, conseqüentemente, impede sua efetividade (Duddridge 1987). Não se sabe ainda em que momento ocorre o reconhecimento entre os simbiontes e a determinação da incompatibilidade ou compatibilidade da simbiose ectomicorrízica, mas, provavelmente, os estádios iniciais da interação são os passos principais para o desenvolvimento de uma simbiose eficiente (Malajczuk et al. 1990).

Malajkczuk et al. (1990) compararam o processo de formação micorrízica em eucalipto por dois isolados do fungo Pisolithus tinctorius, sendo um de eucalipto e outro de Pinus. Os isolados de eucalipto iniciaram a colonização dois dias após a inoculação, enquanto os isolados de Pinus iniciaram a colonização apenas após sete dias. Aparentemente, os eventos associados com os processos de reconhecimento entre os dois simbiontes levaram à discriminação entre os dois isolados e ao desenvolvimento diferencial da simbiose.

Lei et al. (1990) conduziram estudos histoquímicos para avaliar as alterações presentes nos diversos estádios do processo de infecção de eucalipto pelos dois isolados de P. tinctorius: o isolado 445 de eucalipto e o isolado 270 de Pinus. Foi observado que existem diferenças intraespecíficas entre os fungos ectomicorrízicos, antes classificados como possuidores de ampla faixa de hospedeiros. Isto justifica a necessidade de trabalhos que expliquem as falhas de programas de inoculação que usaram simbiontes supostamente compatíveis (Lei et al. 1990). Mais estudos sobre o processo de colonização ectomicorrízica e das reações da planta à infecção são ainda necessários para que se determine em que etapa do desenvolvimento micorrízico se iniciam as reações de incompatibilidade e quais processos se manifestam nas interações compatíveis e incompatíveis, fornecendo as bases para se determinar os fatores necessários ao desenvolvimento de interações micorrízicas mais eficientes.

Este trabalho teve como objetivos caracterizar as etapas da infecção micorrízica em interações compatíveis e incompatíveis entre P. tinctorius e E. urophylla e verificar a ocorrência de defesas estruturais e bioquímicas na planta.

Material e métodos

Foram utilizados os isolados de Pisolithus tinctorius 1604 (isolado de Eucalyptus grandis) e 185 (isolado de Pinus taeda), cedidos por D.H. Marx, do "USDA Forest Service", Athens - Georgia, EUA. Os fungos foram cultivados em meio Melin Norkrans (MMN) (Marx 1969), modificado segundo Wong & Fortin (1989) e incubados a 27°C, no escuro, durante 30 dias. As sementes de Eucaliptus urophylla foram desinfestadas com hipoclorito de sódio (1% de cloro ativo) e germinadas em placas de Petri de 9 cm de diâmetro, contendo meio batata-dextrose-agar (BDA). Assim que as radículas atingiram cerca de 1 cm de comprimento, as plântulas de E. urophylla foram transferidas para placas de 9 cm de diâmetro contendo meio Pachlewski modificado (Albrecht et al. 1994), coberto com papel de filtro. Em seguida, foram cobertas com uma segunda folha de papel de filtro e incubadas a 22°C, em fotoperíodo de 16 horas luz / 8 horas escuro, por 30 dias para permitir o desenvolvimento das raízes e parte aérea.

Os isoladores de P. tinctorius 185 e 1604 cresceram em placas de Petri de 9 cm de diâmetro contendo meio BDA coberto com uma folha de papel de filtro. O fungo cresceu sobre a folha de papel até cobrir toda superfície, por cerca de 25 a 30 dias, no escuro, a 27°C e, em seguida, o papel foi retirado e colocado sobre o sistema radicular das plântulas (Chilvers et al. 1986).

O experimento foi conduzido em delineamento inteiramente casualizado, com quatro plântulas por tratamento. Foram coletados 10 segmentos de raízes laterais de segunda ordem de cada plântula após 0, 12, 24, 72, 96 e 120 horas da inoculação. Os segmentos coletados foram cortados em fragmentos com cerca de 2 mm de comprimento e fixados em solução de Karnovsky (Karnovsky 1965) por 24 horas. Após a fixação, as amostras foram desidratadas em série etílica até etanol 100% e, em seguida, foram infiltradas em resina glicol metacrilato da Reichert-Jung. As seções foram cortadas com espessura de 2 mm em micrótomo rotativo e coradas com azul de astra e fuccina básica (Alves de Brito & Alquini 1996) ou com azul de toluidina (Sakai 1973) visando as análises histológicas usuais. Foram preparadas duas lâminas para cada coloração. Cada lâmina continha 10 cortes e, em cada um dos cortes, havia quatro seções de raízes de plântulas diferentes, compondo quatro repetições. As seções foram analisadas para detecção de alterações histológicas que demonstrassem a compatibilidade ou incompatibilidade de cada isolado de P. tinctorius em interação com E. urophylla. Foram feitas fotomicrografias dos materiais preparados em lâminas.

Com o objetivo de se determinar quantitativamente o acúmulo de compostos fenólicos, foi realizada a dosagem em amostras de raízes, segundo metodologia descrita por Bray & Thorpe (1954). Cada amostra foi composta das raízes de quatro plantas em quatro repetições por tratamento, totalizando 16 plantas. As amostras foram homogeneizadas em 3 ml de metanol 80% acidificado e centrifugadas por cinco minutos a 12.000 g. O sobrenadante foi evaporado em evaporador rotativo sob pressão reduzida a 40 °C e o resíduo foi ressuspenso em 1 ml de metanol. A mistura da reação foi composta de 150 µl do extrato metanólico, 1,5 ml de carbonato de sódio a 2% e 150 µl do reagente Folin-Ciocalteau 2 N. Após 30 minutos foi feita a leitura da absorbância a 750 mm em espectrofotômetro. O branco foi composto de 150 µl de metanol em lugar do extrato metanólico. Os dados obtidos foram utilizados para o cálculo em µg de ácido clorogênico por mg de tecido fresco através da curva padrão de fenóis y = 0,0004 + 0,0029x (Stangarlin 1995).

Resultados

Os cortes realizados a partir dos tratamentos não inoculados (testemunha), de 0 a 120 horas, apresentaram características anatômicas semelhantes: epiderme unisseriada provida de pêlos radiculares, parênquima cortical com cerca de três camadas de células não lignificadas, seguido pela endoderme (figura 1 ). A raiz é protostélica, podendo ser triarca ou tetrarca.

Figuras 1-3. Cortes transversais de raízes de Eucaliptus urophylla. 1. Raiz não inoculada (escala = 19 µm). 2. Corte de raiz 96 horas após a inoculação com o isolado 185, notando-se a presença de acúmulo de substâncias fenólicas (seta) nos pontos de penetração intercelular das hifas fúngicas (escala = 7,37 µm). 3. Raiz de E. urophylla 120 horas após inoculação com o isolado 185, notando-se a presença de manto abundante (seta) (escala = 19 µm).

Nos tratamentos onde foi inoculado o isolado de Pinus (185), a presença do micélio fúngico aderido à raiz só foi observada a partir de 96 horas após a inoculação (figura 2 ). Em 12, 24 e 72 horas, não foi observada, em nenhuma das repetições, a presença do isolado 185 bem como nenhuma alteração na estrutura anatômica da raiz. Em 96 horas, a presença do micélio fúngico mostrou-se relacionada a um maior acúmulo de substâncias fenólicas nas regiões de contato entre micélio e as células epidérmicas (figura 2 ). A 120 horas, o manto já estava bastante desenvolvido (figura 3 ).

Figuras 4-5. Cortes transversais de raízes de E. urophylla. 4. Corte de raiz após 72 horas da inoculação com o isolado 1604, notando-se a presença de manto abundante (seta) (escala = 19 µm). 5. Corte de raiz 96 horas após a inoculação com o isolado 1604, notando-se a penetração intercelular de hifas fúngicas (seta) (escala = 7,37 µm).

Nos tratamentos onde foi inoculado o isolado de eucalipto (1604) observou-se a presença do micélio fúngico aderido à superfície da epiderme a partir de 24 horas após a inoculação. Não foram observadas, no entanto, quaisquer alterações histológicas características de reações de defesa, tais como lignificação de tecidos, acúmulo de substâncias fenólicas ou papilas. A partir de 72 horas após a inoculação (figura 4) observou-se a formação de um manto fúngico em torno das raízes, onde o micélio entrou em contato íntimo com a superfície da epiderme (figura 5).

A dosagem de compostos fenólicos nas raízes não evidenciou diferenças significativas nas plantas inoculadas com o isolado 1604 e na testemunha (figura 6 ). Apenas as plantas inoculadas com o isolado 185 apresentaram alterações significativas na concentração de compostos fenólicos (nível de significância 0,8%) durante os períodos testados (figura 7 ). Em 96 horas após a inoculação, verificou-se que as raízes inoculadas com o isolado 185 apresentaram um acúmulo significativamente maior (nível de significância 5%) de compostos fenólicos (µg de ácido clorogênico.mg de tecido fresco-1) em relação à testemunha não inoculada (figura 8 ).

Figura 6. Valores médios da dosagem de compostos fenólicos em raízes de E. urophylla não inoculadas (Testemunha), inoculadas com P. tinctorius isolado de Pinus (185) e com P. tinctorius isolado de eucalipto (1604). Testemunha (); 1604 (n) e 185 ().

Figura 7. Variação na concentração de compostos fenólicos em raízes de E. urophylla inoculadas com o isolado 185 de P. tinctorius. y = 3,335 + 0,156x - 0,0085x2 + 0,000132x3 - 0,00000060x4r2 = 0,89**. Nível signif. = 0,8%.

Figura 8. Dosagem de compostos fenólicos no período de 96 horas após a inoculação em raízes de E. urophylla não inoculadas (Tes), inoculadas com o isolado 185 e 1604 de P. tinctorius. Nível signif. = 5% e DMS = 1,594

Discussão

A comparação entre as ectomicorrizas formadas em E. urophylla pelos isolados de eucalipto e de Pinus indica que a adesão à raiz, início da formação do manto e penetração na epiderme ocorre mais rapidamente na interação com o isolado de eucalipto. Nas raízes inoculadas com o isolado 1604, é possível observar a presença de micélio fúngico aderido à raiz 24 horas após a inoculação e formação de micélio espesso em até 72 horas. Na interação com o isolado 185, a formação de manto só ocorre após 96 horas da inoculação. Estes resultados foram semelhantes aos obtidos por Lei et al. (1990), onde, após a inoculação de raízes de E. urophylla com P. tinctorius isolados de Pinus e de eucalipto, foi observado que os isolados de eucalipto formavam manto com duas a três camadas de hifas dois dias após a inoculação. O isolado de Pinus só formava manto após quatro dias. Estes resultados demonstram a existência de diferenças intraespecíficas entre os isolados de P. tinctorius quanto à rapidez de formação de ectomicorrízas. Estas diferenças são peculiares à simbiose pois, em meio de cultura, o isolado 185 tem um crescimento cerca de 1,5 vezes mais rápido que o isolado 1604.

Quanto à rapidez de adesão, penetração e desenvolvimento da estrutura ectomicorrízica, Burgess et al. (1994), comparando 20 isolados diferentes de P. tinctorius, observaram que a extensão do desenvolvimento ectomicorrízico se relaciona positivamente com o potencial do fungo em beneficiar a planta hospedeira. Em geral, quanto mais rápido era o desenvolvimento das micorrizas, maior era o estímulo ao crescimento in vivo. Desta forma fica clara a vantagem da inoculação com isolados compatíveis para as plantas e a importância desta diferença de compatibilidade para a efetividade da simbiose.

O fator que leva à diferença de agressividade entre os dois isolados, no entanto, ainda não foi determinado. Neste trabalho, durante as fases iniciais de contato entre os fungos ectomicorrízicos e a planta (12, 24, 72 horas), não foram observadas alterações estruturais nas células vegetais caracterizando mecanismos de defesa, tais como lignificação, espessamento de paredes, formação de papilas ou o acúmulo de compostos fenólicos em resposta à penetração do isolado incompatível.

A produção de compostos fenólicos foi observada na interação com o isolado 185 após 96 horas da inoculação. No entanto, o manto continuou a se desenvolver e atingiu proporção semelhante à observada no isolado 1604, 120 horas após a inoculação. Verificou-se, na interação com o isolado 185, apenas um atraso no início do desenvolvimento da simbiose. Esse atraso, verificado in vitro, onde o fungo é colocado em contato direto com a raiz, pode, em condições ambientais normais, ser um fator importante na restrição do desenvolvimento micorrízico determinando a baixa efetividade da simbiose. A dosagem de fenólicos totais, indicando aumento significativo após 96 horas da inoculação, foi restrita a este período, relacionado ao início da penetração do fungo e não se manteve a 120 horas. Lei et al. (1990) verificaram a reação das células vegetais à presença do isolado fúngico incompatível também após quatro dias da inoculação. Segundo os autores, foi observada a formação de espessamentos de paredes, ao nível ultraestrutural, semelhantes aos observados em interações planta-patógeno.

O acúmulo de compostos fenólicos na planta hospedeira parece ter papel importante na compatibilidade ectomicorrízica. A lignificação de paredes celulares, a deposição de compostos fenólicos e a formação de papila foi observada previamente em interações entre simbiontes incompatíveis. Duddridge (1987) descreve a interação entre Suillus grevillei (fungo ectomicorrízico específico de plantas do gênero Larix) e diversas espécies vegetais, incluindo Pinus nigra, Pinus sylvestris e Pseudotsuga menziesii. Nestas interações incompatíveis foram observadas anormalidades na interface fungo-planta, consideradas sinais de incompatibilidade, incluindo espessamento de parede, depósito de fenólicos e lise na rede de Hartig. Essas alterações, no entanto, ocorreram entre um fungo considerado específico, de faixa restrita de hospedeiros e espécies vegetais distintas. P. tinctorius, diferentemente, é um fungo considerado de ampla faixa de hospedeiros (Duddridge 1986) e é compreensível que as reações da planta a dois isolados desta espécie sejam mais discretas.

Os eventos iniciais do desenvolvimento da simbiose, ocorridos até 72 horas após a inoculação, parecem ser responsáveis pela rápida adesão e crescimento na superfície da raiz pelo isolado 1604. Neste período, não se verifica qualquer aumento na produção de compostos fenólicos e este fator não pode explicar porque o isolado 185 tem sua adesão e crescimento inibidos e o isolado 1604 é favorecido. Provavelmente, algum tipo de reconhecimento permitiu ou estimulou o desenvolvimento deste fungo e inibiu o isolado 185. Quando ocorreu a penetração, posteriormente, a planta reagiu ao isolado 185 através do aumento na concentração de fenólicos, fator este que pode ter dificultado, mas não impediu o seu desenvolvimento.

Fenóis antibióticos podem ser formados em resposta ao ingresso de patógenos e ser parte dos mecanismos de resposta ativa ou, por outro lado, ocorrer constitutivamente nas plantas e funcionar como inibidores pré-formados associados à resistência de plantas não hospedeiras (defesa constitutiva ou pré-formada) (Nicholson & Hammerschmidt 1992). Nas raízes de eucalipto não inoculadas, foi verificada a presença de fenóis constitutivos localizados na epiderme e endoderme. Estas plantas mostram, também na testemunha, níveis elevados de fenóis. De forma semelhante, Ling-Lee et al. (1977) verificaram que muitas células epidérmicas de raízes não inoculadas de Eucalyptus fastigata acumulam consideráveis quantidades de materiais fenólicos. Fenóis foram também detectados na endoderme e camadas corticais mais externas em raízes micorrizadas e não micorrizadas. Não foi comprovado o efeito dos fenóis constitutivos sobre o crescimento e desenvolvimento dos isolados 185 e 1604 de P. tinctorius, mas a tolerância a estes fenóis poderia ser um fator determinante das diferenças entre os dois fungos. Estudos recentes têm demonstrado que fenólicos vegetais induzem genes catabólicos em muitos microrganismos, assim como genes requeridos para formar associações ativas com plantas. Bactérias dos gêneros Rhizobium e Agrobacterium são exemplos desse fenômeno porque os genes envolvidos na formação de nódulos e na transformação de plantas são induzidos por moléculas fenólicas vegetais específicas. Os produtos destas vias agem diretamente ou indiretamente como sinais para a planta hospedeira e para o microrganismo, levando à interações patogênicas ou simbióticas. É possível que compostos fenólicos produzidos pelas raízes de eucalipto exerçam importante papel nas interações com estes fungos (Peters & Verma 1990). Não deve, portanto, ser descartada a possibilidade de que compostos fenólicos ou outras substâncias presentes e/ou liberadas pelas raízes tenham efeito determinante no reconhecimento entre os simbiontes e na determinação da compatibilidade ou incompatibilidade entre a planta hospedeira e os fungos ectomicorrízicos.

2. Departamento de Fitopatologia, Escola Superior de Agricultura "Luiz de Queiroz", ESALQ-USP, Caixa Postal 9, 13418-900 Piracicaba, SP, Brasil.

3. Departamento de Botânica, Escola Superior de Agricultura "Luiz de Queiroz", ESALQ-USP, Caixa Postal 9, 13418-900 Piracicaba, SP, Brasil.

4. Autor para correspondência: mjbaptis@carpa-ciagri.usp.br

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  • 1. Parte da tese de doutorado de M. J. Baptista.
    Parte da tese de doutorado de M. J. Baptista.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      22 Fev 2000
    • Data do Fascículo
      Out 1999

    Histórico

    • Aceito
      31 Mar 1999
    • Recebido
      06 Nov 1998
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