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Dinâmica do dossel em mata semidecídua no perímetro urbano de Belo Horizonte, MG

Dynamics of canopy in a semideciduous forest at the urban perimeter of Belo Horizonte, MG

Resumos

A análise da dinâmica do dossel tem grande importância para se avaliar o efeito da urbanização nos fragmentos florestais, uma vez que alterações nas copas resultam em modificações abióticas e bióticas abaixo destas. Para a analise da dinâmica do dossel, avaliou-se a produção de serapilheira e o índice de área foliar (IAF), obtido por três diferentes metodologias, durante dois anos, em um fragmento de mata semidecídua, do perímetro urbano de Belo Horizonte, MG. A produção de serapilheira média anual foi de aproximadamente 6,47 t. ha-1. ano-1, com grande variação sazonal. Os valores médios de IAF obtidos a partir de fotografias hemisféricas (IAF-foto) e utilizando o LAI-2000 (LI-COR) (IAF-LAI2000), no final da estação chuvosa, foram respectivamente, 2,3 e 4,9 e 0,78 e 1,3, na estação seca. Esses valores foram superiores aos valores de IAF obtidos a partir da área foliar específica das folhas da serapilheira (IAF-serapilheira). Os métodos utilizando imagens hemisféricas (IAF-foto e IAF-LAI2000) mostraram, apesar de valores distintos, a dinâmica do dossel de maneira similar. O IAF-serrapilheira mostra essa dinâmica de maneira inversa, com uma boa relação linear negativa entre os valores de IAF, obtidos através das imagens hemisféricas, e os valores de IAF obtidos através das folhas da serapilheira. Esses resultados sugerem que as três metodologias igualmente podem ser utilizadas para registrar a dinâmica do dossel.


The analysis of canopy dynamics is important to evaluate the effects of urbanization on forest fragments, once canopies alterations can result in biotic and abiotic modifications in inferior strata. For analysis of canopy dynamics, litterfall and leaf area index (LAI), obtained by three different methods, were evaluated for two years in a fragment of a semideciduous forest at the urban perimeter of Belo Horizonte, MG. The annual mean litterfall was approximately 6.47 t.ha-1.year-1, with great seasonal variation. The average values of LAI obtained from hemispherical photographs (LAI-photo), and using LAI-2000 (LI-COR) (LAI-LAI2000), were respectively, 2.3 and 4.9 at the end of the wet season, and 0.78 and 1.3 at the dry season. These values were higher than the values of LAI obtained from specific leaf area of the leaf litter (LAI-litter). The methodologies using hemispherical images (LAI-photo and LAI-LAI2000) showed, in spite of distinct values, the canopy dynamics in a similar way. LAI-litter showed the dynamics in inverse way, with good negative linear relationship among the LAI values obtained through hemispherical images and the LAI values obtained through leaf litter. These results suggested that all of these methods can be used to register the canopy dynamics.

Litterfall; semideciduous forest; leaf area index (LAI)


Dinâmica do dossel em mata semidecídua no perímetro urbano de Belo Horizonte, MG

SANDER ANTÔNIO DE PAULA1 1 . Universidade Federal de Minas Gerais, Instituto de Ciências Biológicas, Departamento de Botânica, Caixa Postal 486, 31270-110, Belo Horizonte, MG, Brasil. ,2 1 . Universidade Federal de Minas Gerais, Instituto de Ciências Biológicas, Departamento de Botânica, Caixa Postal 486, 31270-110, Belo Horizonte, MG, Brasil. e JOSÉ PIRES DE LEMOS FILHO1 1 . Universidade Federal de Minas Gerais, Instituto de Ciências Biológicas, Departamento de Botânica, Caixa Postal 486, 31270-110, Belo Horizonte, MG, Brasil. ,3 1 . Universidade Federal de Minas Gerais, Instituto de Ciências Biológicas, Departamento de Botânica, Caixa Postal 486, 31270-110, Belo Horizonte, MG, Brasil.

(recebido: 5 de setembro de 2000; aceito: 20 de junho de 2001)

ABSTRACT - (Dynamics of canopy in a semideciduous forest at the urban perimeter of Belo Horizonte, MG). The analysis of canopy dynamics is important to evaluate the effects of urbanization on forest fragments, once canopies alterations can result in biotic and abiotic modifications in inferior strata. For analysis of canopy dynamics, litterfall and leaf area index (LAI), obtained by three different methods, were evaluated for two years in a fragment of a semideciduous forest at the urban perimeter of Belo Horizonte, MG. The annual mean litterfall was approximately 6.47 t.ha-1.year-1, with great seasonal variation. The average values of LAI obtained from hemispherical photographs (LAI-photo), and using LAI-2000 (LI-COR) (LAI-LAI2000), were respectively, 2.3 and 4.9 at the end of the wet season, and 0.78 and 1.3 at the dry season. These values were higher than the values of LAI obtained from specific leaf area of the leaf litter (LAI-litter). The methodologies using hemispherical images (LAI-photo and LAI-LAI2000) showed, in spite of distinct values, the canopy dynamics in a similar way. LAI-litter showed the dynamics in inverse way, with good negative linear relationship among the LAI values obtained through hemispherical images and the LAI values obtained through leaf litter. These results suggested that all of these methods can be used to register the canopy dynamics.

RESUMO - (Dinâmica do dossel em uma mata semidecídua no perímetro urbano de Belo Horizonte, MG). A análise da dinâmica do dossel tem grande importância para se avaliar o efeito da urbanização nos fragmentos florestais, uma vez que alterações nas copas resultam em modificações abióticas e bióticas abaixo destas. Para a analise da dinâmica do dossel, avaliou-se a produção de serapilheira e o índice de área foliar (IAF), obtido por três diferentes metodologias, durante dois anos, em um fragmento de mata semidecídua, do perímetro urbano de Belo Horizonte, MG. A produção de serapilheira média anual foi de aproximadamente 6,47 t. ha-1. ano-1, com grande variação sazonal. Os valores médios de IAF obtidos a partir de fotografias hemisféricas (IAF-foto) e utilizando o LAI-2000 (LI-COR) (IAF-LAI2000), no final da estação chuvosa, foram respectivamente, 2,3 e 4,9 e 0,78 e 1,3, na estação seca. Esses valores foram superiores aos valores de IAF obtidos a partir da área foliar específica das folhas da serapilheira (IAF-serapilheira). Os métodos utilizando imagens hemisféricas (IAF-foto e IAF-LAI2000) mostraram, apesar de valores distintos, a dinâmica do dossel de maneira similar. O IAF-serrapilheira mostra essa dinâmica de maneira inversa, com uma boa relação linear negativa entre os valores de IAF, obtidos através das imagens hemisféricas, e os valores de IAF obtidos através das folhas da serapilheira. Esses resultados sugerem que as três metodologias igualmente podem ser utilizadas para registrar a dinâmica do dossel.

Key words - Litterfall, semideciduous forest, leaf area index (LAI)

Introdução

A expansão demográfica da população humana tem resultado em atividades que produzem destruição, degradação e fragmentação de habitats, exercendo uma constante pressão sobre as comunidades vegetais urbanas, criando novas condições ambientais, características ecológicas distintas e um ambiente com inter-relações delicadas (Grapow & Blasi 1998). O crescimento urbano, muitas vezes mal planejado, pode levar a mudanças na dinâmica e estrutura do dossel dos fragmentos remanescentes, alterando a produtividade, evapotranspiração, temperatura foliar, penetração de luz, interceptação da chuva e temperatura do solo, podendo ainda levar à redução de biodiversidade e a mudanças na distribuição e abundância dos organismos.

O desenvolvimento de técnicas que permitem avaliar a produtividade e a dinâmica do dossel em ambientes florestais tem também importância nos estudos de matas secundárias e urbanas, uma vez que podem oferecer informações valiosas para o manejo e conservação do ambiente.

A quantificação da serapilheira permite a compreensão dos aspectos dinâmicos dos ecossistemas (Domingos et al. 1997), servindo para estimar a produção primária líquida (Bray & Gorham 1964, Moore & Chapman 1986) e fornecendo informações sobre a quantidade de energia fixada pelo sistema (Delitti 1989).

As florestas tropicais apresentam produção contínua de serapilheira no decorrer do ano, sendo que as quantidades produzidas nas diferentes épocas dependem do tipo de vegetação considerada (Leitão-Filho et al. 1993) e de sua resposta às variações sazonais. A sazonalidade na produção de serapilheira interfere na dinâmica do dossel e, conseqüentemente, na penetração de luz, temperatura das folhas, evapotranpiração, interceptação das chuvas e temperatura do solo (Welles 1990).

As variações que ocorrem no dossel podem ser avaliadas através do índice de área foliar (IAF), que é a área foliar total por unidade de área de terreno ocupado. Esse índice descreve as dimensões assimiladoras da comunidade (Maass et al. 1995), tendo relação com os processos de evapotranspiração, fluxos de CO2, interceptação de luz e chuva (McWilliam et al. 1993), sendo importante nos estudos de produtividade (Reich et al. 1992, McWilliam et al. 1993, Maass et al. 1995).

O índice de área foliar (IAF) é influenciado diretamente por mudanças sazonais ao longo do ano, e seus valores decrescem com a perda das folhas pela vegetação. Esse índice pode ser estimado através de fotografias hemisféricas do dossel (Bonhomme & Chartier 1972, Pearcy 1989, Steege 1993) e de software específico que permite a determinação de diversas variáveis relacionadas à estrutura do dossel (Steege 1993). Alternativamente, uma outra metodologia utilizando equipamento capaz de adquirir imagens hemisféricas (LAI 2000, LI-COR, EUA), testado e recomendado por Welles & Norman (1991), permite determinações rápidas do índice de área foliar (IAF), com aplicações imediatas, incluindo estudos sobre produtividade do dossel (Welles 1990, Welles & Norman 1991).

O IAF pode também ser estimado através da determinação da área foliar específica (AFE, área foliar por biomassa foliar), em uma amostra significativa da parcela estudada, multiplicada pela biomassa total de folhas da parcela, conforme adotado por Golley et al. (1978) e McWilliam et al. (1993).

Considerando a carência de estudos sobre a produtividade e a dinâmica do dossel em fragmentos urbanos, o presente trabalho objetivou estimar a sazonalidade da produção de serapilheira e a dinâmica do dossel através do índice de área foliar, a partir do emprego de diferentes metodologias já estabelecidas, em fragmento de mata semidecídua no perímetro urbano em Belo Horizonte/MG. Propôs-se, ainda, verificar se a estimativa do IAF pode ser feita através da obtenção da AFE, a exemplo de Golley et al. (1978) e McWilliam et al. (1993), porém utilizando-se folhas mortas recém caídas, amostradas através de cestos coletores de serapilheira.

Material e métodos

O presente trabalho foi realizado na Estação Ecológica da Universidade Federal de Minas Gerais (EE-UFMG; 19o51' S e 43o59' W), uma área protegida de cerca de 150 ha no campus Pampulha. A EE-UFMG, conforme descreve Lombardi et al. (1999), abriga áreas com vegetação herbácea e arbustiva, áreas transicionais de cerrado, floresta semidecídua e fragmentos de floresta secundária, estando sujeita à pressão antrópica com ocorrência ocasional de fogo e danos por ação do vento, com freqüente queda de árvores.

O trecho de mata estudado é formado por mata mesófila semidecídua em regeneração, com aproximadamente 40 anos e cerca de 60 ha. Seu dossel ocupa alturas que variam entre 12 e 16 m, conforme o local. É possível distinguir, em alguns trechos da mata, uma estratificação não contínua de copas de árvores, o que permite a chegada de radiação solar direta até o solo, em vários locais. Nos sítios de maior luminosidade, geralmente onde ocorre uma clareira devido à queda de uma árvore adulta ou galhos, desenvolve-se sub-bosque com um grande número de lianas, que foram estudas por Lombardi et al. (1999).

Na área de mata, foi estabelecido um transecto com 500 m de comprimento por 5,0 m de largura. Para a estimativa da quantidade de folhedo produzido, utilizaram-se 20 coletores circulares, com armação de metal e cesto em nylon com malha de 1 mm e área de superfície de 0,20 m2 e uma profundidade de 0,25 m, os quais foram instalados a cerca de 0,20 m do solo, para minimizar a contaminação das amostras, a uma distância de 25 m entre si.

A serapilheira foi amostrada mensalmente, durante o período de janeiro de 1997 a dezembro de 1998, sendo separada em folhas, ramos, elementos reprodutivos (flores, frutos e sementes) e resíduos e, em seguida, colocada em estufa a 80 °C até atingir peso constante. Foram incluídos na fração ramos apenas aqueles com diâmetro igual ou inferior a 2,0 cm. Os ramos com mais de 2,0 cm de diâmetro tiveram seu peso anotado a parte. A partir da pesagem do material foram calculadas as médias mensais da produção total de serapilheira e das suas frações. Os valores da produção mensal de serapilheira foram submetidos à análise de variância (ANOVA) e as médias comparadas pelo teste t.

O índice de área foliar (IAF), foi estimado tanto a partir de fotografias hemisféricas, utilizando programa desenvolvido por Steege (1993), como utilizando o analisador de copas LAI-2000 (LI-COR, EUA) (Welles 1990, Welles & Norman 1991). As fotografias hemisféricas do dossel foram obtidas nos meses de fevereiro, maio, agosto, setembro e novembro de 1997 e 1998, tendo como ponto de referência os 20 coletores dispostos no transecto. Foi utilizada uma câmara fotográfica Asahi-Pentax equipada com lente de 17 mm (fish-eye) e filme P&B Kodak Temax ASA 100. A câmara foi fixada sobre tripé com a lente voltada para o dossel, a cerca de 1,20 m do solo, alinhada com auxílio de nível e bússola orientada ao norte. As imagens fotográficas foram adquiridas eletronicamente em resolução de 100 Dpi em preto e branco e convertidas em arquivos com extensão bmp, sendo analisadas através do programa Winphot (Steege 1993). Na utilização do programa, uma área circular centralizada de cada imagem foi selecionada, sendo cada pixel preto avaliado em relação a um pixel branco, obtendo-se o contraste que possibilita a determinação do IAF.

Os valores do índice de área foliar (IAF), obtidos através do LAI-2000, foram determinados a partir da interceptação da luz pelo dossel, determinada por uma lente 8 mm (fish-eye) acoplada a um sensor óptico e a um microprocessador. Para estimar o IAF, o LAI-2000 realiza medidas simultâneas da atenuação de luz azul através do dossel, em cinco ângulos zenitais. Para isto, utiliza uma medida de radiação a céu visível (acima do dossel) e compara o valor obtido com os valores de radiação interceptada pelo dossel. As medidas mensais com o LAI-2000, realizadas entre janeiro a dezembro de 1998, foram efetuadas em 10 pontos eqüidistantes a cada 50 m, ao longo do transecto original. Para as leituras acima do dossel, utilizou-se uma área descampada, para evitar a interferência de outros elementos como sugerido por Welles (1990). Em cada ponto no interior da mata, foram efetuadas seis medidas com o LAI-2000, obtendo-se o valor médio do IAF.

O IAF também foi determinado utilizando-se os valores da área foliar específica (AFE) da fração folhas da serapilheira coletada. A biomassa foliar produzida mensalmente foi agrupada em quatro amostras com o conteúdo de cinco coletores. De cada amostra, foram retiradas aleatoriamente 40 folhas de cujos limbos foram obtidos recortes de área conhecida. Esses recortes foram imediatamente pesados em balança de precisão, permitindo a determinação da AFE. A partir dos valores da AFE, foram estimados os valores do índice de área foliar (IAF), considerando a massa seca de todas as folhas em cada coletor.

Os valores médios de IAF obtidos ao longo do tempo, em cada metodologia utilizada, foram comparados entre si pelo teste t, e os valores obtidos através das fotografias e do LAI-2000, foram relacionados com os valores de IAF obtidos a partir da área foliar específica (AFE) de folhas amostradas nos coletores de serapilheira, através do ajuste de regressão linear.

Resultados e Discussão

A produção de serapilheira ocorreu durante todo o período de observação, com uma considerável variação entre os meses, conforme pode ser observado na figura 1, tendo relação com a distribuição das chuvas nos dois anos de coleta (dados obtidos junto ao aeroporto da Pampulha, Belo Horizonte, MG). Os meses de maior e menor produção de serapilheira coincidiram com os meses da estação seca e da chuvosa, respectivamente, da mesma forma como o já verificado por outros autores (Golley et al. 1978, Pagano 1989, Luizão & Luizão 1991, Leitão-Filho et al. 1993, Oliveira & Lacerda 1993, Domingos et al. 1997). A maior produção ocorreu no mês de setembro, nos dois anos de coleta, com valores médios de 895,16 kg.ha-1 em 1997 e de 800,80 kg.ha-1 em 1998. A menor produção de serapilheira ocorreu em março, com valores médios de 313,55 kg.ha-1 1997 e de 359,60 kg.ha-1 em 1998. A variação média entre a produção máxima e a mínima foi da ordem de 2,37 vezes, significativa ao nível de 5%.


Os valores anuais de produção serapilheira obtidos neste estudo foram de 6991,74 kg.ha-1 em 1997 e de 5953,92 kg.ha-1, para o segundo ano. A fração folhas teve a maior contribuição para a formação da serapilheira, correspondendo a aproximadamente 70% do total (4826,29 kg.ha-1, em 1997 e 4255,41 kg.ha-1, em 1998) (figura 2). Este valor percentual está coerente com os valores sugeridos por Bray & Gorham (1964) (62,4%) e por O`Neill & De Angelis apud Domingos et al. (1997) (71%). Segundo Morellato (1993), valores elevados da fração das folhas evidenciam uma sazonalidade mais pronunciada. A maior queda de folhas foi registrada em setembro (655,56 kg.ha-1, em 1997, e 622,41 kg.ha-1, em 1998), e a menor queda de folhas foi observada no mês de março (211,94 kg.ha-1, em 1997, e 177,80 kg.ha-1, em 1998). A variação média entre a produção de folhas máxima e a mínima foi da ordem de 3,28 vezes, significativa ao nível de 5%.


A contribuição mensal em 1997 da fração ramos (figura 2) representou 19,29% da serapilheira total, com o máximo no mês de maio (390,84 kg.ha-1). Este valor elevado provavelmente resultou de efeitos da ação do vento. No ano seguinte, a fração ramos representou 20,83% da produção total de serapilheira, com maior produção em mês de agosto (159,33 kg.ha-1). A variação média entre a produção de ramos máxima e a mínima foi da ordem de 5,39 vezes, significativa ao nível de 5%. Segundo Leitão-Filho et al. (1993), a fração ramos é a menos adequada para caracterizar a comunidade pela ausência de um padrão fenológico definido que possa ser relacionado com os fatores bióticos e abióticos.

A fração contendo elementos reprodutivos apresentou pouca variação ao longo do ano (figura 2). Esse resultado pode estar relacionado aos diversos padrões fenológicos das espécies da comunidade e pode ter relação com o grande numero de lianas observadas na mata amostrada, conforme descrito por Lombardi et al. (1999). Segundo Morellato & Leitão-Filho (1992), as lianas florescem e frutificam em diversas épocas do ano, incluindo aquelas que são desfavoráveis para a grande maioria das árvores. A participação dos elementos reprodutivos foi mais expressiva na composição da serapilheira no mês de julho, com média anual de 19,43 kg.ha-1, em 1997 e de 21,47 kg.ha-1, em 1998. Esse valor pode ser considerado baixo, indicando um forte investimento na manutenção das partes vegetativas (Leitão-Filho et al. 1993). A fração de resíduos foi mais representativa no período de chuvas, com média anual de 15,08 kg.ha-1 1997 e de 18,32 kg.ha-1 em 1998.

A produção anual de serapilheira aqui é comparável a de outras florestas brasileiras (tabela 1), fato que pode sugerir que a produção de serapilheira, não foi fortemente alterada no fragmento florestal estudado. Com base em seus resultados obtidos para um estudo avaliando áreas sujeitas à poluição, Johnson et al. (1982) verificaram que a produção de serapilheira não foi diretamente afetada pela poluição atmosférica, mas sofreu forte influência da simplificação na estrutura da comunidade e das mudanças no fluxo de nutrientes. Desse modo, a quantificação da produção de serapilheira, por si só, não é um bom indicador de interferência antrópica em meio urbano. Para isso, estudos adicionais seriam necessários.

O IAF obtido através das fotografias hemisféricas apresentou variação significativa entre a estação chuvosa e estação seca (teste t, p < 0,05), 2,21 ± 0,76 no ano de 1997 e 2,54 ± 0,10 para o ano de 1998 e 0,77 ± 0,45 no ano de 1997 de 0,69 ± 0,16 para o ano de 1998, respectivamente (figura 3). A utilização de fotografias hemisféricas para determinação do índice de área foliar (IAF), segundo McWilliam et al. (1993), tende a não corresponder aos valores reais de IAF, uma vez que não há diferenciação entre folhas e ramos. Steege (1993) aponta que a metodologia utilizando fotografias hemisféricas estima adequadamente até valores de IAF igual a 4, e subestima valores de IAF superior a 5. Dessa forma, os valores de IAF obtidos a partir das fotografias no presente trabalho, inferiores a 4, estariam bem estimados.


Verifica-se que os valores de IAF obtidos a partir de fotografias hemisféricas na EE-UFMG foram inferiores, conforme o esperado, aos descritos para trechos da Floresta Amazonica, que alcançam 5,2 a 7,5 (McWilliam et al. 1993), superiores ao IAF descrito para área de cerrado na estação chuvosa, cerca de 1,0 (Miranda et al. 1997) e para um bosque de aroeiras (Brina & Lemos-Filho 1996).

Já os valores médios obtidos pelo LAI-2000 (figura 3) foram 4,92 ± 0,19 para o período de chuvas e de 1,32 ± 0,36 para o período seco, sendo estatisticamente distintos (teste-t, p < 0,05). Embora os valores obtidos tenham sido superiores aos estimados através das fotografias hemisféricas, ambos os métodos mostraram igualmente a dinâmica do dossel ao longo do ano.

Os valores da área foliar específica (AFE), utilizados para a estimativa do índice de área foliar (IAF), considerando a biomassa da fração folhas da serapilheira, variaram entre 4 e 18 m2.kg-1. O IAF pela fração foliar da serapilheira, diferiu ao longo dos meses, com os maiores valores na estação seca nos dois anos de coleta (figura 4).


A redução dos valores de IAF na estação seca, detectada pelos métodos convencionais (fotografias e LAI 2000), foi acompanhada por um aumento da queda da serapilheira, com conseqüente estimativa de alto IAF-serapilheira, e o aumento do IAF na estação chuvosa que coincide com a renovação das folhas do dossel e menor IAF estimado pela serapilheira.

De fato, verificou-se uma boa relação linear negativa entre os valores estimados a partir da AFE-serapilheira e os valores de IAF obtidos através das fotografias hemisféricas (figura 5) e os valores de IAF obtidos pelo LAI-2000 (figura 6).



As equações com elevados coeficientes de determinação demonstram que tanto a utilização de qualquer das duas metodologias baseadas em imagens hemisféricas, como a estimativa do IAF utilizando os valores da AFE da fração folhas da serapilheira, permitem do mesmo modo, porém inversamente, quantificar as variações na cobertura do dossel.

Agradecimentos - Os autores agradecem o apoio do CNPq e da FAPEMIG, que possibilitaram a realização do presente trabalho.

2. Bolsista do programa PIBIC/ FAPEMIG.

3. Autor para correspondência: lemos@mono.icb.ufmg.br

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    . Universidade Federal de Minas Gerais, Instituto de Ciências Biológicas, Departamento de Botânica, Caixa Postal 486, 31270-110, Belo Horizonte, MG, Brasil.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      04 Jul 2002
    • Data do Fascículo
      Dez 2001

    Histórico

    • Aceito
      20 Jun 2001
    • Recebido
      05 Set 2000
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