Novos táxons infraespecíficos e combinações em Pilocarpus Vahl (Rutaceae)

New infraspecific taxa and combinations in Pilocarpus Vahl (Rutaceae)

Novos táxons infraespecíficos e combinações em Pilocarpus Vahl (Rutaceae)¹

New infraspecific taxa and combinations in Pilocarpus Vahl (Rutaceae)

Ladislau A. Skorupa

Embrapa Meio Ambiente, Caixa Postal 69, 13820-000 Jaguariúna, SP, Brasil. [e-mail]

ABSTRACT

New infraspecific taxa and combinations in Pilocarpus are presented in anticipation to a complete publication of the taxonomic revision of the genus: P. grandiflorus Engl. var. recurvus Skorupa; P. pauciflorus A. St.-Hil. subsp. clavatus Skorupa; P. racemosus Vahl subsp. goudotianus (Tul.) Skorupa; P. racemosus Vahl subsp. goudotianus (Tul.) Skorupa var. mollis (Cuatrec.) Skorupa; P. racemosus Vahl subsp. goudotianus (Tul.) Skorupa var. heterochromus (Kaastra) Skorupa. Data on the geographic distribution, habitat and phenology are given for these taxa.

Key words:Pilocarpus, Rutaceae, taxonomy

RESUMO

Novos táxons infraespecíficos e combinações em Pilocarpus são apresentados em antecipação à completa publicação da revisão do gênero: P. grandiflorus Engl. var. recurvus Skorupa; P. pauciflorus A. St.-Hil. subsp. clavatus Skorupa; P. racemosus Vahl subsp. goudotianus (Tul.) Skorupa; P. racemosus Vahl subsp. goudotianus (Tul.) Skorupa var. mollis (Cuatrec.) Skorupa; P. racemosus Vahl subsp. goudotianus (Tul.) Skorupa var. heterochromus (Kaastra) Skorupa. Informações sobre a distribuição geográfica, hábitat e fenologia são fornecidos para estes táxons.

Palavras-chave:Pilocarpus, Rutaceae, taxonomia

Introdução

Pilocarpus Vahl (Rutaceae) é um gênero neotropical de plantas arbustivas e arbóreas, com distribuição geográfica que se estende desde o sul do México e América Central - incluindo as Pequenas e Grandes Antilhas - até o sul da América do Sul. Skorupa (1996) reconheceu 16 espécies para o gênero, incluindo quatro novos táxons específicos (Skorupa 1998, 1999). A maioria de seus representantes ocorre no Brasil, predominantemente em sua porção oriental onde são encontradas 12 espécies, constituindo o centro de diversidade genética do gênero.

O propósito deste trabalho é apresentar novos táxons infraespecíficos e novas combinações, em antecipação à publicação da revisão taxonômica do gênero.

Material e métodos

O estudo taxonômico do qual deriva este trabalho (Skorupa 1996) foi baseado na análise de caracteres vegetativos e reprodutivos de materiais botânicos depositados nos seguintes herbários: BHCB, BM, BR, C, CAY, CEN, CEPEC, CPAP, EAC, EAN, F, FUEL, G, GH, GUA, HRB, HUM, IAC, IAN, ICN, INPA, K, L, MG, MICH, MO, NY, P, R, RB, RFA, S, SP, SPF, TEPB, UEC, UPCB, US.

Resultados e Discussão

1. Pilocarpus grandiflorus Engl. in Martius & Eichler, Fl. bras. 12(2):137, tab. 31, fig. 1. 1874. Tipo: BRASIL: Inter Vitoria et Bahia, Sello s.n. (lectótipo, aqui designado, P, fragmentos Herb. Baillon ex B). Epítipo, aqui designado: tab. 31, fig. 1, de Engler in Martius & Eichler, Fl. bras. 12(2). 1874.

Figuras 1-18.

Engler (1874) baseou a descrição de P. grandiflorus em Sello s.n., único material relacionado. Sua descrição é acompanhada de uma ilustração, com análise. O material tipo depositado em B foi destruído. Fragmentos desse material estão depositados em P. Estes fragmentos, juntamente com a ilustração na Flora Brasiliensis, constituem os únicos materiais originais remanescentes. Kaastra (1982) não se posicionou com relação à escolha de um lectótipo. Diante disso, designase aqui os fragmentos do tipo em P como lectótipo. Por outro lado, considerando o estado precário em que se encontram esses fragmentos em P, os quais são insuficientes para a aplicação precisa do nome do táxon, designa-se aqui como epitipo a ótima ilustração do táxon contida na Flora Brasiliensis.

Adicionalmente à variedade típica (figuras 1-9), reconhece-se aqui uma segunda variedade, denominada var. recurvus.

1.a. Pilocarpus grandiflorus Engl. var. recurvus Skorupa var. nov. Tipo: BRASIL: Bahia: Ilhéus, 5,5 km SW Olivença, rumo a Vila Brasil, 14°55'S, 39°07'W, 3IV1992, L. A. Skorupa & A. Amorin 992 (holótipo, CEN).

Figuras 10-18.

Bracteolae 2, oppositae, semper ad pedicellorum basin sitae, antherae lobis inferioribus et superioribus thecarum fortiter recurvatis.

Bractéolas 2, opostas, inseridas na base dos pedicelos; anteras com lobos inferiores e superiores das tecas fortemente recurvados e em contato com a porção dorsal.

Distribuição e fenologia: variedade conhecida apenas das proximidades de Olivença, sudeste da Bahia, Brasil, em florestas úmidas. Espécimes com flores e frutos coletados em fevereiro e março.

Parátipos: BRASIL: Bahia: Ilhéus, 5 km SW de Olivença, rumo a Vila Brasil, 8-II-1982, L.A. Mattos et al. 1490 (SPF); 4 km SW de Olivença, rumo a Vila Brasil, 18-III-1994, L.A. Skorupa 1014 (CEN); 5,4 km de Olivença, rumo a Maruim, 14°15'S, 39°02'W, 5II1994, W.W. Thomas et al. 10281 (SPF).

A variedade recurvus difere da var. grandiflorus por apresentar anteras com lobos das tecas fortemente recurvados (figuras 12, 14) e bractéolas opostas, sempre inseridas na base do pedicelo (figura 11); a var. grandiflorus apresenta anteras com ápices apenas levemente recurvados (figura 5) e bractéolas alternas ou subopostas, inseridas próximo ao cálice ou até a porção média do pedicelo (figura 3).

2. Pilocarpus pauciflorus A. St.-Hil., Bull. Sci. Soc. Philom. Paris, sér. 3, 10: 131. 1823. Tipo: BRASIL: Santa Catarina: Itapacoroia, 1816-1821, A.F.C.P. Saint-Hilaire s.n. (lectótipo, P; foto do lectótipo, P; isolectótipos, MPU, P).

Figuras 19-27.

Adicionalmente à subespécie típica, é reconhecida uma nova subespécie, denominada subsp. clavatus.

2.a. Pilocarpus pauciflorus A. St.-Hil. subsp. clavatus Skorupa subsp. nov. Tipo: BRASIL: Bahia: Itapetinga, Sítio Amarelina, ca. 5 km de Itapetinga rumo a Itororó, 2-IV-1992, L.A. Skorupa et al. 991 (holótipo, CEN; isótipos, NY, RB, SPF).

Figuras 23-27.

Folia dense reticulata; raceme 25,0-34,0 mm lati; pedicelli 5,0-17,0 mm longi; corolla 9,0-10,0 mm diam., petala 3,8-4,3 mm longa et 2,1-2,4 mm lata, paulo sub anthesi reflexa; stygmata clavata; mericarpia angulosa apice subtruncata.

Árvores até 10,0 m alt.; fuste cinéreo, 12,015,0 cm diâm. Folhas simples, alternas, subopostas ou subverticiladas, lâmina 2,2-8,0 × 1,03,2 cm, obovada a estreitamente obovada, estreitamente elíptica a elíptica, cartácea, densamente reticulada, nervuras secundárias 8-10 pares; pecíolo 2,0-8,0 mm. Racemo 7,0-17,5 cm × 2,5-3,4 cm na antese, raque ca. 1,5 mm diâm. na base, diminutamente pubescente, tricomas hialinos ou ferrugíneos; pedicelos (5,0-)13,0-17,0 mm compr., pubescentes; bráctea floral 1, 1,0-1,4 × 0,50,8 mm, triangular, ápice subacuminado, face externa estrigilosa; cálice 5lobado, lobos ca. 1,0 × 1,3 mm, ovados, externamente pubérulos; corola 9,0-10,0 mm diâm.; pétalas 5, 3,84,3 × 2,12,4 mm, lanceoladas a estreitamente ovadas, face externa pubérula ou glabra, levemente reflexa na antese; filetes 3,4-3,7 × ca. 0,4 mm, glabros, anteras 1,3-1,6 × 1,01,1 mm; disco ca. 2,7 mm diâm., pubescente, tricomas ferrugíneos; estigma clavado, ca. 0,6 × 0,5 mm. Mericarpos 10,011,5 × 9,0-9,5 mm, obovóides, angulados, subtruncados no ápice, linha de deiscência até 1/3 da distância até o ápice; pedicelos 17,0-28,0 mm compr.; sementes 9,0-9,5 × 5,0-5,5 mm, elipsóides; hilo ca. 4,4 × 1,4-1,6 mm, estreitamente ovado.

Distribuição e fenologia: Sul da Bahia, Brasil, em florestas semidecíduas. Espécimes com flores e frutos coletados em abril.

Parátipo: BRASIL: Bahia: Fazenda Barra da Nega, km 6 da BR 415, trecho Itapetinga-Itororó, 19-IV-1978, L.A. Mattos et al. 178 (SPF).

Pilocarpuspauciflorus é uma espécie facilmente reconhecível pela largura de suas inflorescências na antese, geralmente superior quando comparada com a das demais espécies do gênero ocorrentes no Brasil. Outras características dizem respeito à forma de suas lâminas foliares geralmente obovadas a estreitamente obovadas, com ápices obtusos a arredondados, emarginados; suas pétalas são fortemente reflexas na antese (figura 20); seus filetes são truncados e o estigma capitado. A subsp. clavatus se diferencia da subespécie típica por apresentar lâmina foliar conspicuamente reticulada, flores com pétalas apenas levemente reflexas na antese e estigma clavado (figura 25); suas peças florais também possuem dimensões geralmente superiores, como pode ser verificado na chave abaixo. Além das diferenças morfológicas apontadas acima, as duas subespécies possuem distribuições geográficas alopátricas: a subsp. clavatus ocorre apenas na Bahia, enquanto a subsp. pauciflorus, em Santa Catarina, Paraná, São Paulo, Rio de Janeiro e Espírito Santo. As variações morfológicas e o isolamento geográfico determinaram a escolha da categoria subespécie para o novo táxon.

3. Pilocarpus racemosus Vahl, Eclog. 1:29, tab. 10. 1797. Tipo: WEST INDIES: Leeward Islands, Montserrat, Ryan s.n. (holótipo, C; isótipos, BM, C, P, fotografia do isótipo GH ex C).

Figuras 28-43.

Skorupa (1996) reconheceu três subespécies em P. racemosus: subsp. racemosus, subsp. viridulus Kaastra e subsp. goudotianus (Tul.) Skorupa, esta última como resultado de uma nova combinação.

3.a. Pilocarpus racemosus Vahl subsp. goudotianus (Tul.) Skorupa comb. et stat. nov.

Basiônimo: Pilocarpus goudotianus Tul., Ann. Nat. Bot. Ser. 3. 7: 284. 1847. Tipo: COLÔMBIA: Tolima: between Aipe at Rio Magdalena and Ataco, IV-1844, Goudot s.n. (holótipo e foto do holótipo, P; isótipo, K).

Figuras 37-43.

A subespécie goudotianus difere das demais subespécies de P. racemosus por apresentar folhas simples, unifolioladas ou 1-jugadas, assim como lâminas foliares pubescentes; a subsp. racemosus possui folhas simples, unifolioladas ou até 2-jugadas e lâminas foliares essencialmente glabras; a subsp. viridulus, por sua vez, apresenta folhas simples, unifolioladas ou até 4-jugadas, lâminas foliares glabras e flores completamente esverdeadas, sem a coloração vinácea a purpúrea observada nas demais subespécies de P. racemosus. As três subespécies apresentam morfologia floral muito similar e também bastante peculiar quando comparada com a observada nas demais espécies do gênero. Entre as características peculiares apresentadas conjuntamente apenas por esses três táxons, ressalta-se a ocorrência de um disco bem desenvolvido, envolvendo a base dos filetes; filetes conspicuamente subulados com ápice agudo e estigma clavado (figuras 31, 33, 40). Além dessas características, seus frutos e sementes são bastante similares em tamanho, forma e cores (figuras 35, 36, 42, 43). Kaastra (1982) revelou sua intenção de reunir P. goudotianus Tul. e P. racemosus Vahl em um único táxon, reconhecendo uma grande proximidade dos dois táxons com base em suas características morfológicas. Isso acarretaria a formação de um táxon com demasiados táxons infraespecíficos, argumento que o leva a mantê-los separados. Skorupa (1996) concluiu que se justifica a acomodação de P. goudotianus como uma subespécie de P. racemosus, dadas as afinidades morfológicas apresentadas acima, somadas aos distintos padrões de distribuição geográfica apresentados pelas subespécies: a subsp. goudotianus ocorrendo ao norte e oeste da Colômbia e noroeste da Venezuela e a subsp. racemosus com uma distribuição mais ampla, ocorrendo no México, Pequenas e Grandes Antilhas, noroeste da Colômbia e noroeste da Venezuela. A subsp. viridulus está restrita à Costa Rica e El Salvador.

Kaastra (1982) reconheceu a subsp. heterochromus em P. goudotianus Tul., apresentando as seguintes características discriminadoras: flores com pétalas e filetes purpúreos na base e esverdeados nas porções superiores, segmentos do cálice dentados, catáfilos glabros e pecíolos glabrescentes. Considerando tratar-se de variações que não alteram a conceituação da subsp. goudotianus, como aqui considerada, propõe-se a redução da subsp. heterochromus à condição de variedade de P. racemosus subsp. goudotianus, nova combinação apresentada acima. Desta forma, como conseqüência dessa nova combinação, surgem outras novas combinações ao nível das variedades, a saber: subsp. goudotianus var. goudotianus; subsp. goudotianus var. mollis, e subsp. goudotianus var. heterochromus.

3.a.1. Pilocarpus racemosus Vahl subsp. goudotianus (Tul.) Skorupa var. heterochromus (Kaastra) Skorupa, comb. et stat. nov.

Basiônimo: Pilocarpus goudotianus Tul. subsp. heterochromus Kaastra, Acta Bot. Neerl. 26:486. 1977. Tipo: COLÔMBIA: Huila: upper basin of Rio Magdalena, Cabrera Lajas, ca. 11 km E of Villavieja on road to Baraya, 4-VII-1950, S.G. Smith 1136 (holótipo, UC; isótipos, F, GH, MO, US).

A var. heterochromus é conhecida apenas da localidade tipo, no centro-oeste da Colômbia.

3.a.2. Pilocarpus racemosus Vahl subsp. goudotianus (Tul.) Skorupa var. mollis (Cuatrec.) Skorupa comb. nov.

Basiônimo: Pilocarpus alvaradoi Pittier var. mollis Cuatrec., Rev. Acad. Colomb. Ci. Exact. y Nat. 8:467. 1952. Pilocarpus goudotianus Tul. subsp. goudotianus var. mollis (Cuatrec.) Kaastra, Acta Bot. Neerl. 26:486. 1977. Tipo: COLÔMBIA: Magdalena: forest along highway, 70 km southeast of Riohacha, 80m, 7-XII1944, O. Haught 4480 (holótipo, US; isótipos, COL, GH, K, NY, UC). Syn. nov.

A var. mollis é conhecida apenas da localidade tipo, a noroeste da Colômbia.

Agradecimentos - O autor agradece a Tarciso S. Filgueiras pelas diagnoses em Latim e a Emiko Naruto pelas ilustrações.

(recebido: 2 de maio de 2002; aceito: 23 de abril de 2003)

• ENGLER, A. 1874. Rutaceae: Pilocarpus In Flora brasiliensis (C.F.P. Martius & A.G. Eichler, eds.). R. Oldenbourg, Munich & Leipzig, v.12, p.131139.
• KAASTRA, R. 1982. Flora neotropica - monograph 33. Pilocarpinae. New York Botanical Garden, New York.
• SKORUPA, L.A. 1996. Revisão taxonômica de Pilocarpus Vahl (Rutaceae). Tese de doutorado, Universidade de São Paulo, São Paulo.
• SKORUPA, L.A. 1998. Three new species of Pilocarpus Vahl (Rutaceae) from Brazil. Novon 8:447-454.
• SKORUPA, L.A. 1999. A new species of Pilocarpus Vahl (Rutaceae) from Peru. Novon 9:257-259.

1

. Parte da Tese de Doutorado do autor, no Departamento de Botânica da Universidade de São Paulo, SP, Brasil.

Datas de Publicação

• Publicação nesta coleção
  22 Abr 2004
• Data do Fascículo
  Jun 2003

Histórico

• Recebido
  02 Maio 2002
• Aceito
  23 Abr 2003