Acessibilidade / Reportar erro

O dualismo das igrejas evangélicas e sua postura sociopolítica

Evangelical Churches dualism and their socio-political stance

Resumos

Resumo: A pesquisa sobre religião e esfera pública no bairro de Felipe Camarão em Natal, Rio Grande do Norte, durante mais de dez anos provocou a indagação sobre qual seria o fator doutrinário ou filosófico que reduziria o impacto da intensa presença dessas igrejas nas periferias urbanas no Brasil na superação dos problemas sociais ali existentes. Foram pesquisadas durante cinco anos todas as 97 igrejas evangélicas cuja presença foi registrada em 2011. O dualismo metafísico apareceu como um componente em tensão ou em plena atuação no âmbito dessas igrejas. Ao discutir as implicações práticas dessa mentalidade dualista, o trabalho propõe uma resposta à indagação acima formulada.

Palavras-chave:
Igrejas Evangélicas; Transformação Social; Dualismo


Abstract: The research on religion and public sphere in Felipe Camarão Neighborhood (Natal-RN) during more than a decade has caused a question about the doctrinal or philosophical hindrance to an impact of this intense church presence in Brazilian urban peripheries in response to the social problems present there. It has been researched for five years all 97 churches found in the 2011 survey. Metaphysical dualism appeared as an issue of tension or of plain circulation in the core of those churches. To discuss the practical implications of this dualistic mentality, this paper proposes an answer to the question formulated above.

Keywords:
Evangelical Churches; Social Transformation; Dualism


O crescimento dos evangélicos no Brasil traduz-se na proliferação de um imenso número de pontos de reunião e de culto, especialmente nas periferias das cidades. Nesses locais, o número de adesões a essas igrejas é aparentemente maior do que em outras vizinhanças urbanas. Além da maior disposição à adesão por parte das pessoas desses bairros às igrejas, pesa também para essa quantidade diferenciada o fato de o imóvel alugado ou adquirido por essas igrejas ter, nas áreas periféricas, um custo menor em relação ao das chamadas “áreas nobres”.

Vimos acompanhando por mais de dez anos as igrejas evangélicas em Felipe Camarão, bairro da periferia oeste da cidade de Natal, Rio Grande do Norte. Em um determinado momento de nossa pesquisa, perguntamo-nos: qual seria o impacto da presença intensa de igrejas evangélicas em um determinado espaço urbano na transformação dos indicadores sociais e da prática democrática?

Posturas teóricas explicacionistas partem geralmente de uma visão generalizante da religião para responder a essa pergunta. Aqueles que veem a religião como instrumento ideológico, ou lhe negam alguma potência transformadora, até se surpreenderiam com essa pergunta. Entretanto, existem indicadores históricos e sociológicos que apontam no sentido contrário, pois religiões e grupos religiosos tiveram papel preponderante na transformação social mesmo depois da separação, no ocidente, da esfera religiosa da política1 1 Ver a análise cuidadosa de diversos exemplos da presença pública das igrejas em Casanova (1994). Ver também Taylor (2007), especialmente o capítulo 14. . A tentativa de estabelecer leis gerais para os fenômenos humanos reflete a visão iluminista do mundo e tende para o positivismo e a ineficácia quando aplicadas à sociedade. É possível agrupar e classificar os diferentes subgrupos humanos, mas tais classificações são tão fluidas que, na maioria das vezes, essas identificações começam a ruir no instante que se prestam a qualificações do tipo: “Todos os componentes do grupo x são deste ou daquele modo”.

Isso se aplica particularmente ao âmbito da religião. Ainda podemos dizer “os católicos romanos”, “os budistas”, “os evangélicos”, etc., mas a fragmentação e a subdivisão dessas categorias são tão grandes que tais nomeações começam a perder qualquer significado. As tentativas de agrupamento também são discutíveis: tradicionais, históricos, de missão, evangelicais, pentecostais, neopentecostais… As generalizações e classificações pressupõem um conceito de identidade excessivamente fixo, como que dado pela natureza, cuja taxionomia refletiria uma realidade ontologicamente definida como conjunto de características deste ou daquele grupo humano. Isso exclui uma concepção de identidade que “diz respeito à percepção dos atores de que o seu lugar no mundo passa por investimentos simbólicos pelos quais eles se afirmam e negociam com os outros a sua forma de inserção na sociedade” (Burity 2002BURITY, Joanildo A. (org.). (2002), Cultura e identidade: perspectivas interdisciplinares. Rio de Janeiro: DP&A.:7). Só existe identidade na troca de identificações, na aceitação vs. rejeição dessas identificações. Tentativas exteriores de classificação, muitas vezes com ares de cientificidade, também operam nessa troca e podem influenciar nos comportamentos esperados, porém geralmente falta a instância dialogante e acabam por cair no vazio ou em simples dogmatismo, mas sempre com alguma consequência.

Foi provavelmente por conta dessa natureza fluida dos agrupamentos religiosos que o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), para o Censo de 1991, fez a opção de não “enquadrar” o informante em nenhum grupo religioso pré-identificado, tomando “ao pé da letra” a autodefinição que ele desse. Pelo que sabemos, na hora de computar os dados, esse procedimento mostrou-se inviável, influenciando provavelmente no fato de as informações sobre religião só terem sido divulgadas seis anos após a realização desse Censo2 2 “O IBGE e o Instituto de Estudos da Religião - ISER, em parceria, desenvolveram, para o Censo Demográfico 2000, a classificação de religiões, passando a fazer as atualizações necessárias a cada Censo Demográfico.” (IBGE 2010:27). .

Já nos últimos Censos (2000 e 2010), uma classificação preliminar e suficientemente abrangente das manifestações religiosas multifacetadas dos brasileiros foi elaborada com a ajuda do Instituto de Estudos da Religião (ISER)3 3 Cf. nota 2. . Tais classificações ajudaram a dar sentido aos agrupamentos religiosos, apontaram para sua grande diversidade, indicaram as possíveis tensões e, principalmente, as tendências de crescimento ou decréscimo. Entretanto, quanto mais nos aproximamos de uma observação concreta e localizada do fenômeno, temos a impressão de ser às vezes imprecisa. Classificações de agrupamentos humanos que se presem acontecerão em diálogo: não se trata de mera autoidentificação nem de uma forma colocada sobre tais grupos.

De fato, quando se tenta qualificar este ou aquele grupo religioso, é necessário dizer “este ou aquele grupo tende a ser, na sua maioria, assim”. Isso tem a vantagem de desestimular reificações e petrificações conceituais que podem se transformar em preconceitos. É o caso da qualificação de alienados, ou extramundanos, ou fechados que é lançada sobre os evangélicos em geral e, de modo mais enfático, sobre os pentecostais e neopentecostais. Às vezes, realmente, a maioria ou alguns deles o são, às vezes não, mas é inadequado “pré-conceituá-los” por meio de uma generalização dessa natureza.

Não se sustenta mais, por exemplo, a suposição de que as Igrejas Evangélicas sejam como um todo irresponsáveis diante da realidade social em que vivem. Joanildo Burity demonstrou isso, dentre outros lugares, no livro Redes, parcerias e participação religiosa nas políticas sociais no Brasil (2006BURITY, Joanildo. (2006), Redes, parcerias e participação religiosa nas políticas sociais no Brasil. Recife: Fundação Joaquim Nabuco - Massangana.), e no artigo “Religião e Cidadania: alguns problemas de mudança sociocultural e de intervenção política” do livro Religião e Cidadania (2011). Nesses textos, ele constata que os analistas de políticas públicas, da Ciência Política e da Sociologia deixam passar desapercebida a intensa atividade de envolvimento das religiões na esfera pública. Ele afirma: “Quando muito, encontraremos alusões rápidas, em frases curtas e vacilantes ou em remissões bibliográficas. Falta conhecimento da dinâmica interna do campo religioso e suas formas próprias de raciocínio e ativismo social e político, levando à invisibilidade de processos em curso ou a erros de avaliação e expectativas mal fundamentadas de parte a parte” (Burity 2006:197, grifo nosso).

Existe uma atuação social por parte das mais diferentes igrejas, que varia de ações assistenciais aos “domésticos da fé”, passando por ações comunitárias do tipo Organizações não Governamentais (ONGs), até atuações político-eleitorais, às vezes com interesses corporativistas e às vezes como ação política com vistas à transformação social. Ao se debruçar sobre a atuação social das igrejas, Burity descreve essas diferentes abordagens e problematiza o alcance de cada uma delas no sentido de produzir cidadania e transformação social. Acrescenta-se a isso que, embora poucas congregações locais - o mesmo não pode ser dito das denominações - tenham condições de criar uma ONG ou mesmo um projeto social com certa autonomia em relação à igreja, um número significativo delas, senão a totalidade, tem algum tipo de socorro social aos membros da igreja ou da comunidade em situação de grande vulnerabilidade. Porém, levando-se em conta o tamanho da presença das igrejas evangélicas no Brasil e o fato de que a grande maioria dos fiéis dessas igrejas é de praticantes, os quais se congregam em milhares de pequenas igrejas locais, o impacto social das igrejas é aparentemente pequeno.

De qualquer forma, faltam-nos critérios para fazer uma avaliação precisa acerca dessa consideração, pois não há um indicador suficientemente seguro para se dizer como seria uma dada realidade se as igrejas não estivessem presentes ali. Claro que é possível comparar um dado local com outro, uma região com outra, um país com outro, etc. e ver a relação variável entre presença de igrejas e melhoras sociais tais como a diminuição da violência, aumento da expectativa de vida, melhorias na educação, saúde, moradia e aparelhos urbanos. Isso já foi tentado outras vezes4 4 Ver um levantamento preliminar e já um tanto distante no tempo em Lopes Jr. (1999). , mas as variáveis são tantas que não é possível isolar elementos que possibilitem conclusões muito convincentes. E quanto mais se expande o olhar, menos clara fica a influência da ação social das igrejas na sociedade como um todo.

As conclusões possíveis de se tirar de perspectivas macro referem-se muito mais a mentalidades do que a ações concretas, mas, mesmo nesse nível, a avaliação da presença evangélica não é muito favorável no que tange às mudanças sociais. Enquanto nos últimos cinquenta anos a população brasileira cresceu 63,2%, o número de evangélicos quase dobrou de tamanho, aumentando 93,3%. O salto maior foi entre 1991 e 2000, quando os evangélicos cresceram 71,1%, reduzindo o salto para 44,1% entre 2000 e 2010. Neste último Censo, eles chegaram a 22,2% da população brasileira, com 42,3 milhões de fiéis:

Figura 1:
Percentual da população residente, segundo os grupos de religião. Brasil - 2000/2010

Pelo que tudo indica, esse crescimento não parece estar trazendo alterações significativas no quadro social brasileiro e no aumento da cidadania. O bispo anglicano e cientista político Robinson Cavalcanti, tragicamente assassinado juntamente com sua esposa em fevereiro de 2012, afirmou: “o rápido crescimento do protestantismo não tem sido acompanhado de redução dos problemas sociais, políticos, econômicos, morais” (Cavalcanti 2006CAVALCANTI, Robinson. (2006), “Crescem os crentes, crescem os problemas”. Revista Ultimato, ano XXXIX, nº 302, set./out. 2006, p. 38.:38). O sociólogo Paul Freston, entrevistado pela revista Carta Capital, entende que “quanto mais uma religião cresce, mais fica parecida com a sociedade na qual está inserida” (Carta Capital 2012CARTA CAPITAL. (2012), “A avalanche evangélica”. Carta Capital, “Política, Economia e Cultura”, ano XVII, nº 707, 25 jul. 2012, p. 43.:43). Mas, se é comum, como vimos, que as igrejas realizem algum tipo de intervenção social, então é possível que o conjunto dessas ações possa operar algum impacto na sociedade, ou pelo menos que mude, de alguma forma, a mentalidade de seus adeptos.

Em 1992, o ISER realizou um Censo Institucional Evangélico nas áreas suburbanas do Rio de Janeiro. A pesquisa constatou que eram abertas de cinco a seis igrejas evangélicas por semana na baixada fluminense. Isso causou certa admiração, pois, desde os anos 1970, essa mesma região caracterizava-se por altos índices de violência. No “Comentário Final” da primeira apresentação do Censo Institucional, Rubem César Fernandes observou que,

Com as devidas variações, características semelhantes às encontradas no Grande Rio devem ser obtidas entre os evangélicos em outras regiões metropolitanas do país. Falamos aqui, portanto, de um fenômeno nacional. É este, talvez, o mais importante movimento promotor de mudanças de mentalidades na sociedade brasileira contemporânea, sobretudo em suas camadas urbanas mais pobres (Fernandes 1992FERNANDES, Rubem Cesar. (1992), Censo Institucional Evangélico - CIN 1992. Rio de Janeiro: ISER.:25, grifo nosso).

O boom evangélico que ocorria nas periferias do Sudeste (São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Espírito Santo) levou mais tempo para ocorrer no Nordeste, como podemos observar na tabela que se segue, no qual este teve um crescimento de 59,2% no número de evangélicos entre 2000 e 2010, enquanto que o Norte teve 43,9%; o Sudeste, 40,5%; o Sul, 32%; e o Centro-Oeste, 41,7%:

Tabela 1
Distribuição percentual da população residente, por Grandes Regiões

Mesmo assim, o Nordeste continua sendo a região menos evangélica do Brasil e, ainda que as regiões metropolitanas tenham acompanhado mais de perto o ritmo de crescimento nacional, esse processo foi posterior no Nordeste. A figura a seguir, produzida pelo IBGE demonstra isso:

Figura 2
Percentual de evangélicos na população residente dos municípios Brasil- 2010

Essa maior aproximação em semelhança das regiões urbanas nordestinas com áreas urbanas das demais regiões brasileiras permite-nos imaginar que os processos de relação sociopolítica dessas igrejas sejam de igual forma parecidos. As igrejas de periferias são mais paroquiais, isto é, trabalham com aqueles que estão por perto, enquanto a membresia das igrejas do centro está espalhada pela cidade. Porém, nem “mudanças de mentalidade” (Fernandes 1992FERNANDES, Rubem Cesar. (1992), Censo Institucional Evangélico - CIN 1992. Rio de Janeiro: ISER.:25) nem eficácia transformadora são perceptíveis em escala significativa até o momento, embora a autocompreensão dos evangélicos como uma força eleitoral abra uma faceta política que, a despeito de ainda ser corporativista e conservadora, tem o potencial de produzir uma pedagogia política.

Não fica claro, no entanto, quais poderiam ser as “mudanças de mentalidades” sugeridas por Fernandes, pois na pesquisa que desenvolvemos desde 2006 na periferia de Natal/RN não encontramos tais mudanças. A organização social, a participação política e as transformações sociais provocadas pelo conjunto dos moradores não são diferentes dos outros bairros de Natal com mais ou menos igrejas. Percebemos em nossos estudos que a presença intensiva de igrejas evangélicas parecia, por volta de 2006, não estar gerando qualquer impacto significativo (Lopes Jr., Rezende e Correia 2012LOPES JR., Orivaldo P.; REZENDE, Dannyel B. H.; CORREIA, Bruno C. F. de Barros. (2012), “Evangelismo e participação em Natal/RN: por uma cultura sociopolítica da mudança”. Revista Cronos, vol. 12, nº 1: 25-40.; Lopes Jr. e Rezende 2012LOPES JR., Orivaldo P.; REZENDE, Dannyel B. H. (2012), “Igrejas evangélicas como agentes de transformação social em Natal-Rio Grande Do Norte (RN), Brasil”. In: C. P. Gumuncio (org.). Religión, Política y Cultura en América Latina: Nuevas Miradas. Santiago do Chile: Universidad de Santiago de Chile.).

Posteriormente, entretanto, encontramos indicações de por que a proliferação de igrejas evangélicas dificilmente vai gerar “mudanças de mentalidades” ou qualquer outro tipo de mudança em um sentido popular de transformação sociopolítica. Não se trata, aqui, de avaliar o que é feito e o que não é feito de modo a influenciar o bairro na superação da miséria e da violência, mas o que, na própria concepção de religiosidade e de sociedade, estimularia ou desestimularia uma ação social coletiva e dos membros como cidadãos nessa direção.

Nada haveria de se esperar das igrejas evangélicas se elas fossem um agrupamento humano como um clube, uma família, um time esportivo, uma turma de amigos. Entretanto, as igrejas, assim como escolas, partidos, sindicatos e associações de moradores, são agrupamentos que se constroem em torno de um projeto de mudança das pessoas e da sociedade. Algumas dessas instituições, como as escolas, apostam no projeto de mudança pessoal, e outras, como as associações de moradores, por exemplo, apostam no projeto de mudança coletiva. Às igrejas pesquisadas, na sua maioria, sobra um projeto de mudança pessoal e falta um projeto de mudança coletiva (exceto, talvez, em um sentido moral de mudança). Além do mais, mesmo a expectativa de mudança pessoal se restringe quase que exclusivamente a aspectos morais e religiosos.

Percebemos que há um dispêndio excessivo de energia na manutenção de sua própria existência institucional. Os agentes clericais dessas igrejas são oriundos, em sua maioria, do próprio corpo de fiéis que as compõem. As igrejas de missão e as Assembleias de Deus ligadas ao ministério central da cidade são menos afetadas por essas disputas de poder, porque trazem seus líderes principais de fora do bairro e até da cidade. No caso das Assembleias de Deus e da Igreja Universal do Reino de Deus, há um rodízio anual que, pelo que percebemos, é intencionalmente negativo no que tange ao envolvimento do líder com a realidade local, mesmo que reduza o conflito interno e atrele a direção local à liderança central da denominação com todos seus aparados materiais e simbólicos.

Já as igrejas pentecostais microdenominacionalmente estruturadas sofrem muito com as disputas hierárquicas, mesmo porque muitos desses líderes dependem financeiramente da arrecadação da igreja para se manterem. A multiplicação de microministérios estaria vinculada à multiplicação de fontes de renda para a manutenção de líderes. Como dissemos, esse dispêndio de energia na solução de conflitos internos, bem como a concepção de igreja local como um “empreendimento” que precisa se manter e progredir, faz do projeto para a sociedade algo distante, pouco prioritário e às vezes até contraproducente.

A atuação social das igrejas, quando acontece, é vista como uma “responsabilidade social”. Essa expressão tem aqui o mesmo sentido com o qual é usada em empresas comerciais privadas. A responsabilidade social de uma loja, fábrica ou empresa de serviço é uma parte, bastante secundária, de sua atuação. O projeto ou missão de uma loja, por exemplo, é vender, e vender bastante. O de uma fábrica é produzir muito com pouco custo. Sua missão não é dar bolsas de estudo para seus funcionários e para seus filhos; não é apoiar um projeto ambiental; não é abrir uma escola em um bairro carente como fez o Banco Bradesco em Felipe Camarão. Essas ações que expressam a “responsabilidade social” das empresas são apenas um anexo de sua atuação como um todo. Elas tiram uma pequena parte de seu capital e investem no “social”, por obrigação legal ou interesse de marketing, mas sem perder a perspectiva de lucro. Esse lucro pode vir através de isenções fiscais, prêmios governamentais, prestígio que redunde em mais vendas e na atuação mais empolgada de seus funcionários.

O mesmo ocorre em muitas igrejas que alegam certa “responsabilidade social”. Trata-se, na verdade, apenas de uma ação secundária, um apêndice missionário. Entretanto, nem mesmo a noção de “responsabilidade social” é generalizada entre as igrejas pesquisadas. Por isso, começamos a desconfiar de que deveria haver algo na própria concepção que as diferentes igrejas evangélicas têm de mundo que estaria restringindo sua atuação social e o impacto dessa ação.

Ao nos debruçarmos sobre as querelas doutrinárias alegadas pelos líderes para justificar as divisões e distanciamentos mútuos, assistimos a uma verdadeira reedição do “narcisismo das pequenas diferenças”5 5 Expressão cunhada por Freud em O Mal-Estar da Civilização (página 29 da versão eletrônica consultada, cf. referências). . Mas percebemos também o peso que a simbologia doutrinária desempenha na vida das igrejas. O peso simbólico era de se esperar, pois se trata aqui de uma dinâmica no âmbito da religião e a religião lida com símbolos e seus encadeamentos na forma de mitos (Morin 1987MORIN, Edgar. (1987), O Método III: o conhecimento do conhecimento. Lisboa: Europa-América.:149).

Depoimentos

A partir dessas constatações, deduzimos que deveria haver algo na própria estrutura teológica, doutrinária ou simbólica das igrejas evangélicas que as impeliria ou as restringiria em sua atuação social, configurando-as politicamente. Procurar no arcabouço teológico de uma dada religião as motivações para as práticas de seus fiéis não é um procedimento novo nas Ciências Sociais. Os casos mais notáveis, para citar os clássicos, são as atitudes diversas de católicos e protestantes na prática do suicídio, em Émile Durkheim (1975DURKHEIM, Émile. (1975), “O dualismo da natureza humana e as suas condições sociais”. In: E. Durkheim. Émile Durkheim: a Ciência Social e a Acção. Lisboa: Bertrand.), e a racionalidade econômica como um estímulo direto da soteriologia e do ascetismo intramundano, em Max Weber (2004WEBER, Max. (2004), A ética protestante e o espírito do capitalismo. São Paulo: Companhia das Letras.). Mas qual seria a perspectiva teológica que estaria influenciando a atuação social das igrejas evangélicas e determinando seu impacto e eficácia?

O filósofo Peter Sloterdijk associou doutrinas cristãs como a da Trindade e a da relação mística da alma com Deus com a base psicossocial constitutiva da interfacialidade humana (Sloterdijk 2003SLOTERDIJK, Peter. (2003), Esferas I: Borbujas - Microsferología. Madrid: Siruela.:485-550). O cientista e filósofo político Giorgio Agamben recorre à teologia e à prática cristãs para explicar por que o poder assumiu, no Ocidente, a forma de uma economia e por que ele precisa da glória, ou seja, de todo aparato cerimonial e litúrgico que o acompanha (Agamben 2011AGAMBEN, Giorgio. (2011), O Reino e a Glória: uma genealogia teológica da economia e do governo [Homo Sacer, II, 2]. São Paulo: Boitempo.:10). Esses são dois exemplos do quanto perspectivas doutrinárias religiosas se fazem presentes nas relações humanas e na sociedade como um todo. Comparando essas relações apontadas mais recentemente com as clássicas, percebemos que a perspectiva sociológica dos efeitos deu lugar a uma perspectiva humana mais interiorizada, isto é, não permaneceram restritas ao universo religioso, mas se espalharam mesmo entre pessoas e instituições não religiosas. A “ética protestante”, nesse caso, não seria patrimônio dos protestantes, mas das pessoas em geral que passavam a adotar independentemente de sua profissão de fé.

No caso de nossa pesquisa em Felipe Camarão, os dois aspectos estão presentes, isto é, uma dada concepção teológica tem efeitos na prática das igrejas e, ao mesmo tempo, essa tal concepção emigra para o pensamento das pessoas não ligadas diretamente às igrejas. Esse segundo aspecto fica aqui somente apontado, mas não vamos, nos limites deste artigo, analisar e aquilatar sua ocorrência.

Depois de várias entrevistas com líderes evangélicos em Felipe Camarão e de ouvir sermões e aulas da Escola Bíblica Dominical (EBD), foi-se configurando certa reincidência discursiva que poderia ser o que buscávamos. Geralmente, essas falas situavam-se antes da justificativa para uma ou outra atitude social da igreja. Por exemplo, quando perguntávamos “o que sua igreja pode fazer para mudar a realidade do bairro de Felipe Camarão?”, as respostas usualmente afirmavam o empenho, a necessidade e a dificuldade de “ganhar almas”. Diante dessa resposta recorrente, indagávamos: “Em que isso melhoraria a situação do bairro?”. E a resposta tida como mais do que óbvia era: “como novas criaturas, as pessoas deixariam as drogas, crimes e outros pecados que fazem do bairro o que ele é”.

O Pastor X6 6 Evitamos colocar os nomes dos entrevistados, pois não preparamos um documento de concordância nesse sentido. Por isso, optamos por não indicar nas referências bibliográficas deste artigo as entrevistas citadas, mas registramos aqui suas circunstâncias de realização. da Igreja Universal do Reino de Deus (Rua Joaquim de Castro, 631, Felipe Camarão, Natal/RN) respondeu que mora no bairro desde criança, portanto, dos três pastores dessa congregação, é o que mais está presente na igreja. Segundo ele, a igreja atua e modifica a realidade social através do grupo Força Jovem que promove atividades como partidas de futebol. Ali eles fazem um trabalho de evangelização de jovens que se encontram em situações de risco (drogas e crime). “Mas o trabalho principal”, acrescenta, “é o de libertação espiritual realizado pela IURD. Para assistência dos fiéis nesse aspecto, a igreja tem cultos todos os dias às 7h, 15h e 19h” (grifo nosso).

Esse é um depoimento exemplar do enfoque dado à dimensão espiritual como solucionadora dos problemas: o uso do esporte, algo em si bastante corporal, é somente um meio para um sentido real que é “ganhar almas”. Os cultos aos quais o Pastor X se refere são aqueles em que são acionadas as forças espirituais que trazem libertação espiritual das “forças do mal” e prosperidade a todos os fiéis. A perspectiva pós-milenista, ou seja, aquela de que as bênçãos do reino de Deus já estão disponíveis aos que se convertem, exerce uma influência dualista a mais na praxe da Universal, que circunscreve o fim das dificuldades sociais ao pertencimento proléptico do reino glorioso de Deus.

O líder de jovens W. T., da igreja Casa da Bênção (Rua Folha Dourada, 05), nos deu o seguinte depoimento: “Eu trabalho com jovens, [através do] evangelismo. Se a igreja agir não apenas no espiritual, mas também se preocupar com a ‘vida física’ pode dar uma melhorada no bairro. Na medida em que eles [os jovens] vão se envolvendo, eles percebem que, se a vida espiritual com Cristo não está bem, a vida física vai sofrer decadência”.

É notável a consciência de que o bairro precisa de ajuda no âmbito da “vida física”, mas no final ele se rende à hierarquia do espiritual sobre o material ao concluir que, se a vida espiritual não está bem, um reflexo negativo vai incidir sobre a vida física. O dualismo mostra aqui toda sua força: não se trata apenas de haver duas instâncias na realidade, mas de que uma é superior e a outra inferior e subordinada à primeira. Não se trata apenas de dualismo, mas de uma disjunção dualista.

A Igreja Evangélica Assembleia de Deus da Rua Antônio Trigueiro, 779, é a igreja polo do setor 33, composta por mais de trezentos membros. Visitamos uma escola Bíblica Dominical cujo tema era “Missão Integral da Igreja”. Fomos informados de que a igreja possui um departamento da terceira idade no qual são oferecidas palestras atinentes às dificuldades desse período da vida. No Culto de Santa Ceia, os fiéis levam donativos para os mais carentes do bairro, mas, na conversa que tivemos com um dos líderes da igreja, ele nos informou que toda atividade social é voltada para os seus próprios membros. O pastor dessa igreja (W. M.) deu a seguinte declaração: “Pregamos a palavra; acreditamos na salvação pela crença do indivíduo, pois não é objetivo [da igreja] a reforma social. Queremos atrair pessoas para dentro da igreja”. Não parece que o estudo sobre a Missão Integral da Igreja esteja surtindo muito efeito, não somente por essas observações, mas pelo todo da participação das igrejas da Assembleia de Deus no bairro.

Vejamos agora uma sequência de depoimentos em que se apresentam indicadores do dualismo, estimulado a partir da mesma pergunta: “O que sua igreja pode fazer para mudar a realidade de Felipe Camarão?”.

- Fazemos evangelismo, visitas nas casas. Dizemos que Deus batiza, salva e liberta. Outro Deus não salva (Pr. J., Copastor da Igreja Missionária Pentecostal de Jesus - Rua Maristela Alves, 54B). - Evangelizar, levar a palavra de Deus, orientação para o abandono dos vícios. Ajudar quando existe necessidade material de algum membro da igreja ou parente dos membros. Fazemos a parte social na medida em que podemos. Visitamos os viciados, dando conselhos (Presbítero G., da Evangélica Assembleia de Deus - Felipe Camarão III - da Rua Mira Mangue, 62). - [A igreja tem como] objetivo social a educação de jovens e adultos (Pastor D. L., da Igreja Batista da Convenção Batista Brasileira - Rua Arco Íris, 178). - Oração. Orar pelos líderes políticos (G., líder da Congregação Cristã do Brasil - Rua Antônio Trigueiro com Rua Tibiriçá). - Através da união das igrejas. A Associação dos Líderes Evangélicos de Felipe Camarão (ALEF) luta para acabar com a divisão das igrejas (Pastor A. C., da Igreja de Cristo no Brasil - Rua Sta. Cristina, 1038). - Evangelizar conforme a ordem de Jesus, pregando para ganhar essas vidas, especialmente os jovens e as crianças. Após os 12 anos já começam a ter contato com as drogas e com a prostituição. Os pais impedem os filhos de vir à igreja. Seria necessário ter algum entretenimento para atrair as crianças, mas não conseguimos (Pastor J. S., da Igreja Evangélica Assembleia de Deus - Rua Pai Celestial, 51). - Escolhemos como liderança de ações sociais para este ano o irmão F. F. Decidimos que faremos diversos trabalhos de ações sociais, traremos médicos para atendimento aos moradores do bairro, doação de cestas básicas, corte de cabelo (Dirigente da Igreja Adventista do Sétimo Dia - Rua Sta. Helena, 492. Ver, abaixo, o olhar de uma membra dessa igreja: “quem muda é Deus”.). - Missão integral (Pastora A. L., da Igreja de Deus em Cristo Jesus - Rua São José, 590). - Oração. Lutar pela questão do lixo (junto com a ALEF). Tentar recuperar drogados, mas isto está fora de alcance, devido ao orçamento. Oração sem ação de nada adianta (Pastor S. J. S., da Igreja Evangélica Apocalipse Pentecostal - Rua São Nicolau, esquina com Avenida Oeste). - Diferença de vida, esta é a intenção da igreja. Mostrar que os fiéis têm um relacionamento com um Deus grande, que trabalha dentro da alma e do espírito, e muda o homem de dentro para fora (Pastor R. F., da Igreja Universal do Reino de Deus - Rua Pai Celestial, 815). - Evangelismo. Ajudar os domésticos da fé, primeiro, pois, do contrário, de acordo com a Bíblia, é pecado. Levar a Palavra. Quem deve fazer ação social não faz, a igreja não tem como função tais práticas. A ALEF deve fazer tais coisas, [isto é] a articulação entre os pastores, e com os políticos (Pastor I. D., da Igreja Evangélica Assembleia de Deus - Rua São Carlos, 41).

Um caso curioso foi o da pastora S., da Igreja Deus é Amor, da Rua Antônio Trigueiro, 740. Quando perguntada sobre o que a igreja estava fazendo para mudar a realidade do bairro, ela simplesmente se recusou a responder.

Já para os membros da igreja, perguntamos: “O que sua igreja está fazendo para mudar a realidade social do bairro de Felipe Camarão?”. A visão dos líderes geralmente é mais ideal do que a visão dos membros, que é mais concreta:

- Todas as igrejas mudam através da palavra, muitas almas são salvas (D. M., membro da Igreja Missionária Pentecostal de Jesus - Rua Maristela Alves, 54B). - Mudando muito, mas cabe a cada um reconhecer. A igreja ajuda com cestas básicas e com evangelização (D. S., membro da Igreja do Evangelho Quadrangular - Rua Antônio Trigueiro, 92). - A palavra tem um poder forte de motivação e transformação, além de resgate das pessoas das drogas. Fizemos recentemente uma ação social na Escola Veríssimo de Melo com trio elétrico, corte de cabelo, confecção de currículos, palestras e contamos com o trabalho de voluntários. 1.400 pessoas passaram pela escola. Pretendemos fazer a caminhada da paz pelo bairro com as igrejas evangélicas unidas (P. S., membro da Igreja Universal do Reino de Deus - Rua Joaquim de Castro, 631). - [A igreja] ora pelo bairro, para que Deus possa chegar na vida das pessoas; faz campanha de oração; visita nas famílias (M. C., membro da igreja Assembleia de Deus - Rua Antônio Trigueiro, 779). - [Para mudar a realidade do bairro] além de orar, [a igreja precisa] promover cursos socioeducativos para a população, tratando assuntos como drogas, e oficinas de artesanato, mas a igreja não está fazendo nada disso (O. F., membro da Missão Evangélica Pentecostal do Brasil - Rua Pe. Cícero, 16 b). - A igreja alcança as crianças do bairro através de atividades física, mental e espiritual, principalmente através do projeto “Aventureiros” (6 a 10 anos de idade) e “Desbravadores” (11-15 anos) (Depoimento dado ao pesquisador por um grupo de jovens da igreja Adventista do Sétimo Dia - Rua Felipe Dias, 176). - Através do “clube dos desbravadores” a igreja já faz uma atuação para modificar a realidade social. O grupo limpa praças e ruas, dá assistência com cestas básicas. Ainda neste mesmo dia à tarde haverá uma passeata contra a violência das mulheres que terá a presença do clube dos desbravadores (L., membro da Igreja Adventista do Sétimo Dia - Rua Joaquim de Castro, Ca.389). - A igreja atua socialmente apenas com a distribuição de cestas básicas (D., membro da Evangélica Assembleia de Deus - Felipe Camarão II - Rua Maristela Alves, 130). - Tudo que vemos hoje está escrito no Apocalipse: pai contra filho, filho contra pai… Não há muito o que se fazer se a profecia está nas escrituras. Eu não vou dizer que não tenho medo, porque eu estaria mentindo. Nós fazemos muita oração pelo bairro para que Deus mude o quadro e dê os livramentos para nós. Fazemos visitas, chamamos para os cultos (Dona E. P., da Igreja Pentecostal Deus é Amor - Congregação Felipe Camarão II - Rua Indomar, 635). - Realizar projetos para alcançar não crentes. Ações espirituais e sociais em conjunto. Faz-se primeiro o social, para que se envolva, e depois entra-se com o espiritual. Realizar cultos ao ar livre (Dona J., da Igreja de Deus em Cristo Jesus - Rua Pe. Cícero, 92). - Trazendo o evangelho, ele é quem faz a diferença, é o alimento espiritual, o principal. Em segundo lugar, a educação. É preciso introduzir aos poucos o que não é espiritual. A gente não é só corpo ou só espírito, a fé alcança todas as áreas da nossa vida (Dona S. A., da Igreja Evangélica Assembleia de Deus - Travessa Todos os Santos, 232). - Evangelismo. Muito pouco se tem feito. O trabalho com jovens é limitado. Projeto de esporte em parceria com a escola próxima da igreja, mas ainda não saiu do papel, devido à falta de resposta da escola (Dona M. L., da Igreja Metodista Wesleiana de Felipe Camarão - Rua Nossa Sra. do Livramento, 52). - Trabalhando com evangelismo e o setor social ajudando com alimentos. Oração pelas famílias […] Nosso maior propósito é salvar almas para Jesus (Sr. J. C., da Igreja Assembleia de Deus - Rua Pai Celestial, 51). - Quem muda é Deus, o Espírito Santo. Faremos eventos convidando a todos. Essa reunião que estamos realizando é para o planejamento das atividades [sociais] do próximo ano (D. M. J., da Igreja Adventista do Sétimo Dia - Rua Sta. Helena, 492). - Ação social da igreja em conjunto com a comunidade e o Estado, educação, segurança e combate às drogas. O espiritual e o social em conjunto. Consagrações, jejuns, cultos (Jovem J., membro da Evangélica Assembleia de Deus - Rua Sta. Clara, 505). - Amar a Cristo e formar outros discípulos. Foco no trabalho com crianças. […] Fazer com que os adolescentes fiquem o menor tempo possível nas ruas, trazendo-os para a igreja (Jovem J. G., membro da Igreja Pentecostal Nova Vida - Rua São Nicolau, 10).7 7 Por motivo de espaço, apresentamos aqui o resultado da pesquisa de apenas 48 das 97 igrejas pesquisadas no bairro de Felipe Camarão nessa segunda etapa da pesquisa que foi entre os anos de 2011 e 2016. As respostas já apresentam uma certa saturação, não se justificando o registro de todas elas, visto que a escolha das 48 dentre as 97 foi feita de modo randômico.

Por outro lado, nas igrejas mais “engajadas”8 8 Optamos por não quantificar as igrejas “engajadas” em relação às não engajadas, mas elas são minoria, mesmo sendo o bairro de Felipe Camarão uma exceção na cidade de Natal, graças à atuação, desde 2005, da Associação de Líderes Evangélicos de Felipe Camarão (ALEF). , os líderes falavam de “missão integral”, “papel social da igreja”, “ser sal da terra e luz do mundo”. Essas duas típicas posturas teológico-práticas estão, assim entendemos, alimentando as atitudes de intervenção ou isolamento. Parece-nos, aliás, que, na história do pensamento cristão, essas duas formas de pensamento sempre estiveram presentes. A Igreja Presbiteriana do Brasil, da Rua Pr. Josino Galvão, 152, liderada pelo Pr. G., tem uma atitude de participação na vida do bairro e faz a assistência social. O pastor demonstrou uma visão bastante progressista teologicamente. Um membro da igreja afirmou: “Temos diversos planos para a área [social] e já estão em execução cursos para mulheres (culinária, artesanato) e trabalho com crianças aos sábados”.

A Igreja Presbiteriana Independente (Rua Bom Jesus, 05) construiu seu templo em uma rua cuja parte dos fundos dava para o antigo lixão da cidade, e ela fez um convênio com a ONG Visão Mundial para dar um atendimento às famílias que extraíam do lixão sua sobrevivência, com uma escola para as crianças.

[A igreja tem o] Projeto da escola para as crianças da Igreja e do bairro. Por ter muitas crianças e uma crescente violência, existe a necessidade de acompanhamento. [Fazemos] trabalhos na rua e praça com jovens para evangelizar. A escola [hoje está] de parceria com a prefeitura e com alguns norte-americanos, atendendo de 80 a 100 crianças de manhã e de tarde. Oferecemos educação infantil e lanche. [A escola] funciona na infraestrutura da Igreja (Dona A. N., líder do trabalho social da igreja).

A luta contra o dualismo

Em uma entrevista em 2006, o historiador do cristianismo Justo L. Gonzalez, autor de uma trilogia sobre a História do Pensamento Cristão, ao comparar o fundamentalismo com o liberalismo teológico, observou:

Os dois são produtos da modernidade, embora só o segundo seja chamado de “modernismo” e o primeiro não. Ambos abandonam boa parte da fé e as perspectivas cristãs da igreja antiga. Falo sobre isso no livro Retorno a La Historia Del Pensamento Cristiano, no qual sugiro que existe um terceiro sistema que, além de não ser nem fundamentalista nem liberal (nem uma posição intermediária entre ambos), é mais fiel à fé da igreja antiga e possivelmente também ao Novo Testamento (Gonzalez 2006GONZALEZ, Justo L. (2006), “Entrevista”. Revista Ultimato , ano XXXIX, nº 302, set./out. 2006, p. 47.:47).

Embora não estejamos falando da mesma tensão, a dicotomia fundamentalismo/liberalismo apontada por Gonzalez é a forma que a dicotomia dualismo/monismo (ou dualismo disjuntivo ou não disjuntivo) tomou sob o reino das certezas da modernidade. Por modernidade, entendemos aqui a presunção de superioridade racional tomada sobre si mesmo pelos europeus e posteriormente disseminada pelo globo através das diversas formas de colonização. Dentre as características desse período histórico europeu, as que nos interessam aqui são duas: a postura disjuntiva entre afirmações contrárias e a convicção de que o racionalismo permite aquisições de certezas9 9 A bibliografia sobre esse tema é vasta, por isso nos restringimos a citar aqui apenas dois autores/livros representativos: Latour (1994) e Vattimo (2002). .

Com a disjunção, as duas tendências opostas no seio do cristianismo, de afirmar o dualismo - privilegiando o espiritual em contradição com o material - e a oposição a isso, em uma visão “integral”, deterioraram-se nas duas formas citadas por Gonzalez: liberalismo ou fundamentalismo. Por isso, para o referido autor, essas duas posturas são frutos da modernidade. O “Evangelho Social” proposto por Walter Rauschenbusch nos Estados Unidos, na virada do século XIX para o XX, e a Teologia da Libertação latino-americana iniciada nas comunidades empobrecidas de Lima nos anos 1960 são movimentos internos da igreja cristã que tendem para uma opção materialista dentro da disjunção dualista. Já um bom número de igrejas protestantes assumiu uma opção espiritualista dentro da mesma disjunção.

Nas igrejas evangélicas de Felipe Camarão, e, nesse caso, é possível extrapolar para as igrejas das periferias urbanas do Brasil, está em questão até onde se aplica a disjunção dualista da modernidade. Em um grau de extremo dualismo, a alma individual deve ser salva e a realidade mundana desprezada. No extremo oposto, uma visão teologicamente liberal defende que a meta do Cristianismo seria a transformação da sociedade. Essa segunda possibilidade, institucionalmente falando, não existe em Felipe Camarão. No entanto, encontramos algumas igrejas e líderes que “buscam um terceiro sistema” como diz Gonzalez, e que se expressa nos depoimentos com a expressão “Missão Integral”.

Estudiosos dos textos neotestamentários do pensamento cristão e da história do cristianismo, como é o caso de Pablo Richard (1987RICHARD, Pablo. (1987), “O Fundamento Material da Espiritualidade”. Revista Estudos Bíblicos (REB - Ed. Vozes), nº 7 (2ª Edição): 73-85.), apontam para um progressivo afastamento no cristianismo, de um dualismo não disjuntivo, próprio da tradição do judaísmo veterotestamentário, para um dualismo metafísico de tradição helênica. Tanto o fundador do cristianismo como todos os apóstolos e o cenário no qual o texto sagrado cristão foi escrito eram judeus. Não fazia parte da cosmologia usual desses fundadores o dualismo ontológico grego entre matéria e espírito. Porém, à medida que o cristianismo avançava no mundo greco-romano e sua composição se tornava paulatinamente menos judaica, o dualismo foi entrando na teologia e no ensino eclesiástico, em parte como estratégia missionária e em parte como influência do ambiente intelectual e ideológico.

O teólogo chileno Pablo Richard, comentando um texto da carta aos Romanos, diz o seguinte:

Nesta seção (Romanos 8.1-17), o conceito carne se refere à tendência de todo o homem à morte, enquanto espírito significa a tendência de todo o homem à vida: “A aspiração da carne é a morte - enquanto a aspiração do espírito é a vida e a paz” (Rm 8.6). O homem, por conseguinte, aparece dividido entre estas duas tendências ou aspirações antagônicas. Uma é a carne que o leva à morte. Outra, o espírito que o leva à vida. Cada tendência (em grego: frónema) compromete todo o homem. Todas essas indicações nos possibilitam descobrir a seguinte estrutura interna desta seção: carne ( morte espírito ( vida Uma falsificação muito difundida do pensamento paulino tem sido a de identificar carne com corpo e espírito com alma. Em São Paulo, pelo contrário, o antagonismo carne-espírito atravessa tanto a alma como o corpo do homem. Todo o homem, corpo e alma, pode estar orientado para a morte ou para a vida. Carne-espírito são duas tendências ou aspirações do homem total (Richard 1987RICHARD, Pablo. (1987), “O Fundamento Material da Espiritualidade”. Revista Estudos Bíblicos (REB - Ed. Vozes), nº 7 (2ª Edição): 73-85.:74, grifo do autor).

Ou ainda, conforme Juan Luis Segundo, outro teólogo latino-americano:

O cristianismo sempre continuou devendo mais ao Antigo Testamento hebreu que à cultura grega em geral. Por outra parte, sua inculturação não se realizou adaptando elementos culturais da massa da população grega, com sua religião politeísta (a de Homero ou Hesíodo, por exemplo), mas foi uma maneira de pensar o universo, a Divindade e suas relações mútuas (apesar de oriundas do mundo mental hebreu), através de conceitos mais úteis e refinados da filosofia grega (Segundo 1995SEGUNDO, Juan Luis. (1995), Que mundo? Que homem? Que Deus? Aproximações entre ciência, filosofia e Teologia. São Paulo: Paulinas .:41).

Quais “conceitos mais úteis e refinados” são esses? Basicamente, o monismo versus o dualismo. Para ele, “o Cristianismo acultura-se no monismo” (Segundo 1995SEGUNDO, Juan Luis. (1995), Que mundo? Que homem? Que Deus? Aproximações entre ciência, filosofia e Teologia. São Paulo: Paulinas .:80), porém, quando a partir de meados do século IV se começa a produzir as fórmulas cristológicas, terá que se posicionar de modo mais explícito quanto ao dualismo até então difuso (Segundo 1995:82).

Como o dualismo não era uma mentalidade propriamente estranha nem para os cristãos daqueles primeiros séculos e nem totalmente distante do que estava presente nos textos apostólicos, os teólogos acolheram grande parte dele. Outras coisas, como a oposição carne-espírito, foram ressignificadas. No entanto, eles rejeitaram com ênfase as versões mais extremas de dualismo, como o neoplatonismo, o docetismo e o maniqueísmo.

Os Pais Apostólicos, isto é, líderes ligados aos fundadores, foram sucedidos pelos Pais Apologetas, que eram líderes que tinham como missão tornar o cristianismo aceitável no mundo greco-romano. Um exemplo típico é a conversão ao cristianismo de Justino Mártir, um estudioso da filosofia, especialmente de Platão e Plotino, e que vai se tornar um dos Pais da Igreja: ele vê o cristianismo como a realização plena da filosofia platônica (Cavalcante 2007CAVALCANTE, Ronaldo. (2007), Espiritualidade Cristã na História: das origens até Santo Agostinho. São Paulo: Paulinas.:122).

Nos três primeiros séculos, no entanto, os cristãos eram uma minoria perseguida e, além de terem que se impor, digamos assim, epistemologicamente, tinham que aprender a viver em um ambiente muitas vezes hostil. Cecil John Cadoux, no livro The Early Church and the world (1925), mostra que “no decurso do primeiro século começou a haver crescente senso de isolamento da Igreja do Mundo, resultando disso ‘acentuada tendência para restringir o círculo, de modo que o amor cristão tornou-se amor à fraternidade’” (Cadoux apud Wright 1966WRIGHT, G. Ernest. (1966), A Doutrina Bíblica do Homem na Sociedade. São Paulo: ASTE .:145).

O pensamento dualista e o afastamento do mundo são processos concomitantes e que se alimentam mutuamente. Em momentos extremos, esse afastamento chega a tomar feições apocalípticas ou milenaristas. Tais movimentos não são exclusivos de cristãos, e nem mesmo puramente religiosos (Hobsbawm 1978HOBSBAWM, Eric J. (1978), Rebeldes Primitivos: Estudo sobre Formas Arcaicas de movimentos Sociais nos Séculos XIX e XX. Rio de Janeiro: Zahar Editores.:64-98), porém a tensão entre afastamento e integração é constante no cristianismo ao longo de sua história10 10 A expressão cunhada por Umberto Eco em Apocalípticos e Integrados (1979), aplicada à participação ou recusa da “cultura de massas”, serve de analogia a essa tensão dualista. .

Como o Novo Testamento e a Bíblia (judaica) são estabelecidos como os textos fundamentais e normativos do cristianismo, e como neles o dualismo dificilmente se configura como dualismo metafísico ou disjuntivo, há de haver sempre uma luta para combater os excessos dualistas e o afastamento do mundo. A patrística, a teologia medieval, as teologias protestantes, concílios como o Vaticano II, congressos como os do Concílio Mundial de Igrejas (1948) e o de Lausanne em 1974, bem como movimentos teológicos como o da Igreja Confessante na Alemanha, a Teologia da Esperança, a Teologia da Libertação, a Teologia da Missão Integral, etc. lutarão através dos séculos para afastar os cristãos do dualismo metafísico11 11 Seria interessante narrar a história daquilo que é chamado de Heresias Cristãs ao longo dos séculos, para ver quanto do embate entre apocalípticos e integrados está presente nelas. Temos, por exemplo, o grande debate entre o gnosticismo (já existente no Novo Testamento em textos como o da carta de Paulo aos Colossenses) e os pais antignósticos; o do neoplatonismo em Clemente de Alexandria; a dicotomia “Cidade dos Homens” vs. “Cidade de Deus” em Agostinho; a reforma de Cluny; etc. (Tillich 1988:52-72; Seeberg 1967:101, 126). .

Uma possibilidade lógica ou talvez analógica de entender esse fio condutor da tensão dualista seria a de recorrer à ideia de um cérebro bicameral com paredes rígidas ou paredes desmoronadas, proposta por Julian Jaynes. O livro The Origin of Consciousness in the Breakdown of the Bicameral Mind causou frisson quando lançado em 1976. As ideias do autor foram acolhidas com entusiasmo por alguns, e rejeitadas com veemência por outros tantos. A rejeição custou-lhe a reprovação de sua candidatura a uma cadeira como professor na Universidade de Princeton.

Em pouquíssimas palavras, o autor defende a ideia de que, ao longo dos séculos e com o desenvolvimento de certas habilidades humanas mais sofisticadas, como a escrita, os dois hemisférios cerebrais foram interagindo mais e mais, gerando a consciência de si. Desse modo, aquilo que até então era concebido como uma voz externa a si, um comando superior e muitas vezes sagrado, passou, através de uma longa construção social da consciência, a ser entendido como um processo mental integrado.

Foi somente assim que a dominação civil deixou de ser uma instituição divina e, como tal, intocável e indiscutível para ser um poder que precisaria de outras formas de legitimação. A partir daí, o indivíduo, ao se impor diante da ordem hierárquica da sociedade, adquire o status de cidadão. Só pelo “breakdown” da mente bicameral isso se torna possível.

No entanto, como o cérebro humano continua sendo bicameral, ele traz, continuamente, a resistência desse dualismo intransponível. Isso não apenas na atitude individual, mas na própria organização social. Um exemplo que o autor dá é o das cidades que mantêm, ainda, em toda parte, um templo religioso central, refletindo o tempo em que tudo era comandado por essa “voz” externa12 12 Ver também o livro de Teixeira (2009). . Diz ele: “nossa arquitetura religiosa e urbana é, em parte, penso eu, o resíduo de nosso passado bicameral” (Jaynes 1990JAYNES, Julian. (1990), The origin of consciousness in the breakdown of the bicameral mind. London: Pinguin Books.:150, tradução nossa).

Ao olharmos os 97 templos religiosos pesquisados no bairro de Felipe Camarão nesse período, sem nenhum centro, percebemos que, embora não haja mais essa centralidade do sagrado, ele está difuso por toda parte, podendo ser fonte de pequenas bicameralidades ou de fechamentos e aberturas para a cidadania. Repousar sobre o dualismo bicameral seria como um estado de alívio de stress ou uma entropia por conta da complexidade dos sistemas sociais. É no dualismo que essa busca encontra seu lugar de conforto, gerando um efeito psicossocial alienante e a construção de microbolhas relacionais isoladas através de forte camada impermeabilizante, que atua como imunização do mundo de violência “lá de fora”. Porém, é justamente esse fechamento em microbolhas que alimenta a violência. Para Peter Sloterdijk, as explosões de violência estariam ligadas ao “fenômeno das esferas que rebentam e das comunidades de vida que implodem” (2007:152), e acrescenta:

O caráter inóspito que caracteriza as relações modernas converte todo tipo de proximidade em algo precário. Os sentimentos positivos transferíveis para a Pátria e para a família converteram-se num recurso escasso. O ponto de partida para transferências positivas e criativas como tais já está comprometido, as simbioses estão contaminadas, os espaços familiares de proteção e o biótopo da confiança estão atrofiados (Sloterdijk & Heinrichs 2007SLOTERDIJK, Peter; HEINRICHS, Hans-Jürgen. (2007), O sol e a morte: investigações dialógicas. Lisboa: Relógio D’Água.:152).

As comunidades fechadas, neognósticas e bicamerais não estão produzindo experimentos pedagógicos e seminais de comunidades de vida e de proximidades, mas, como alerta o autor, “a modernidade faz parte da construção de cavernas políticas e das suas histerias. O fato de nesta época os homens psicóticos começarem a padecer de perturbações na capacidade de julgar e se juntarem em pseudo comunas ilusórias é algo que se deduz da sua situação” (Sloterdijk & Heinrichs 2007SLOTERDIJK, Peter; HEINRICHS, Hans-Jürgen. (2007), O sol e a morte: investigações dialógicas. Lisboa: Relógio D’Água.:153). É muito significativo Sloterdijk usar os termos “histeria” e “psicose”, porque isso é justamente a manifestação dos modos mais agudos de bicameralidade fechada.

Nisso, ambos se aproximam de Slavoj Žižek quando este afirma que a perversão psíquica se dá quando o indivíduo se submete acriticamente à ordem imaginária (Žižek 2009ŽIŽEK, Slavoj. (2009), Lacrimae rerum: ensaios sobre cinema moderno. São Paulo: Boitempo .:154). Os indivíduos alienam-se confortavelmente no eu socialmente construído e renunciam à pujança criativa da subjetividade. Fazendo um jogo de palavras: a alienação no juissance (gozo) do outro implica a limitação do puissance (potência) do sujeito (Žižek 2009).

Já a interação tem um enorme potencial político-transformador, porque pode ser uma força de restauração de esferas estilhaçadas e comunidades de vida implodidas. A interação aplica-se inicialmente sobre a própria disjunção das ideias, rompendo com a opção fechada entre monismo e dualismo, entre espírito e matéria, mythos e logos, e até mesmo entre vida e morte, pois não se trata de oposições redutíveis ou elimináveis.

Não interessa à humanidade nem teocracias nem secularismos. Não se trata de almejar a unicameralidade, o que é impossível, mas de fazer interagir a ordem mítico-simbólica com a ordem lógico-racional13 13 O que Joanildo Burity chama de “confusão entre o religioso e o político” (2011:138) só é “confusão” de um ponto de vista disjuntivo. . A maioria das igrejas evangélicas pesquisadas está distante da realidade, refém da situação de isolamento e sem qualquer projeto coletivo de mudança. A superação desse estado de coisas pode acontecer se elas recusarem o fechamento bicameral e colocarem em relação os elementos disjuntados por um dualismo metafísico.

O impacto transformador potencial de mais de cem igrejas em um bairro periférico e violento de Natal é reduzido ao mínimo por conta da adesão da quase totalidade delas a uma visão dualista do mundo. O sucesso da proposta “integral” representa a possibilidade de o cristianismo voltar a ter o sentido transformador que teve na história ocidental e global; entretanto, o quadro apresentado nesta pesquisa é pouco promissor.

Referências Bibliográficas

  • AGAMBEN, Giorgio. (2011), O Reino e a Glória: uma genealogia teológica da economia e do governo [Homo Sacer, II, 2]. São Paulo: Boitempo.
  • BURITY, Joanildo A. (org.). (2002), Cultura e identidade: perspectivas interdisciplinares Rio de Janeiro: DP&A.
  • BURITY, Joanildo. (2006), Redes, parcerias e participação religiosa nas políticas sociais no Brasil Recife: Fundação Joaquim Nabuco - Massangana.
  • BURITY, Joanildo. (2011), “Religião e cidadania: alguns problemas de mudança sociocultural e de intervenção política”. In: J. Burity e P. Andrade (orgs.). Religião e cidadania São Cristóvão: Editora UFS; Recife: Fundação Joaquim Nabuco.
  • CASANOVA, José. (1994), Public Religions in the Modern World Chicago: The University of Chicago Press.
  • CAVALCANTE, Ronaldo. (2007), Espiritualidade Cristã na História: das origens até Santo Agostinho São Paulo: Paulinas.
  • DURKHEIM, Émile. (1975), “O dualismo da natureza humana e as suas condições sociais”. In: E. Durkheim. Émile Durkheim: a Ciência Social e a Acção Lisboa: Bertrand.
  • ECO, Umberto. (1979), Apocalípticos e integrados São Paulo: Perspectiva.
  • FERNANDES, Rubem Cesar. (1992), Censo Institucional Evangélico - CIN 1992 Rio de Janeiro: ISER.
  • FREUD, Sigmund. (1930), O mal-estar da civilização (Versão eletrônica - Edição Standard).
  • HOBSBAWM, Eric J. (1978), Rebeldes Primitivos: Estudo sobre Formas Arcaicas de movimentos Sociais nos Séculos XIX e XX Rio de Janeiro: Zahar Editores.
  • INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. (2010), Censo Demográfico 2010: Características gerais da população, religião e pessoas com deficiência Rio de Janeiro: IBGE.
  • JAYNES, Julian. (1990), The origin of consciousness in the breakdown of the bicameral mind London: Pinguin Books.
  • LATOUR, Bruno. (1994), Jamais fomos modernos Rio de janeiro: Editora 34.
  • LOPES JR., Orivaldo P. (1999), “A conversão ao protestantismo no Nordeste do Brasil”. Lusotopie, Numéro thématique: Dynamiques religieuses en lusophonie contemporaine, vol. 6: 291-308.
  • LOPES JR., Orivaldo P.; REZENDE, Dannyel B. H. (2012), “Igrejas evangélicas como agentes de transformação social em Natal-Rio Grande Do Norte (RN), Brasil”. In: C. P. Gumuncio (org.). Religión, Política y Cultura en América Latina: Nuevas Miradas Santiago do Chile: Universidad de Santiago de Chile.
  • LOPES JR., Orivaldo P.; REZENDE, Dannyel B. H.; CORREIA, Bruno C. F. de Barros. (2012), “Evangelismo e participação em Natal/RN: por uma cultura sociopolítica da mudança”. Revista Cronos, vol. 12, nº 1: 25-40.
  • MORIN, Edgar. (1987), O Método III: o conhecimento do conhecimento Lisboa: Europa-América.
  • RICHARD, Pablo. (1987), “O Fundamento Material da Espiritualidade”. Revista Estudos Bíblicos (REB - Ed. Vozes), nº 7 (2ª Edição): 73-85.
  • SEEBERG, Reinhold. (1967), Manual de historia de las doctrinas Buenos Aires: Casa Bautista de Publicaciones.
  • SEGUNDO, Juan Luis. (1995), Que mundo? Que homem? Que Deus? Aproximações entre ciência, filosofia e Teologia. São Paulo: Paulinas .
  • SLOTERDIJK, Peter. (2003), Esferas I: Borbujas - Microsferología. Madrid: Siruela.
  • SLOTERDIJK, Peter; HEINRICHS, Hans-Jürgen. (2007), O sol e a morte: investigações dialógicas Lisboa: Relógio D’Água.
  • TAYLOR, Charles. (2007), A secular age Massachusetts: Belknap Press.
  • TEIXEIRA, Rubenilson B. (2009), Da cidade de Deus à Cidade dos Homens: a secularização do uso, da forma e da função urbana Natal: EDUFRN.
  • TILLICH, Paul. (1988), História do Pensamento Cristão São Paulo: ASTE.
  • VATTIMO, Gianni. (2002), O fim da Modernidade - Niilismo e hermenêutica na cultura pós-moderna (Trad. Eduardo Brandão). São Paulo: Martins Fontes.
  • WEBER, Max. (2004), A ética protestante e o espírito do capitalismo São Paulo: Companhia das Letras.
  • WRIGHT, G. Ernest. (1966), A Doutrina Bíblica do Homem na Sociedade São Paulo: ASTE .
  • ŽIŽEK, Slavoj. (2009), Lacrimae rerum: ensaios sobre cinema moderno São Paulo: Boitempo .
  • CARTA CAPITAL. (2012), “A avalanche evangélica”. Carta Capital, “Política, Economia e Cultura”, ano XVII, nº 707, 25 jul. 2012, p. 43.
  • CAVALCANTI, Robinson. (2006), “Crescem os crentes, crescem os problemas”. Revista Ultimato, ano XXXIX, nº 302, set./out. 2006, p. 38.
  • GONZALEZ, Justo L. (2006), “Entrevista”. Revista Ultimato , ano XXXIX, nº 302, set./out. 2006, p. 47.

1

  • 1
    Ver a análise cuidadosa de diversos exemplos da presença pública das igrejas em Casanova (1994CASANOVA, José. (1994), Public Religions in the Modern World. Chicago: The University of Chicago Press.). Ver também Taylor (2007TAYLOR, Charles. (2007), A secular age. Massachusetts: Belknap Press. ), especialmente o capítulo 14.

2

  • 2
    “O IBGE e o Instituto de Estudos da Religião - ISER, em parceria, desenvolveram, para o Censo Demográfico 2000, a classificação de religiões, passando a fazer as atualizações necessárias a cada Censo Demográfico.” (IBGE 2010INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. (2010), Censo Demográfico 2010: Características gerais da população, religião e pessoas com deficiência. Rio de Janeiro: IBGE.:27).

3

  • 3
    Cf. nota 2.

4

  • 4
    Ver um levantamento preliminar e já um tanto distante no tempo em Lopes Jr. (1999LOPES JR., Orivaldo P. (1999), “A conversão ao protestantismo no Nordeste do Brasil”. Lusotopie, Numéro thématique: Dynamiques religieuses en lusophonie contemporaine, vol. 6: 291-308.).

5

  • 5
    Expressão cunhada por Freud em O Mal-Estar da CivilizaçãoFREUD, Sigmund. (1930), O mal-estar da civilização. (Versão eletrônica - Edição Standard). (página 29 da versão eletrônica consultada, cf. referências).

6

  • 6
    Evitamos colocar os nomes dos entrevistados, pois não preparamos um documento de concordância nesse sentido. Por isso, optamos por não indicar nas referências bibliográficas deste artigo as entrevistas citadas, mas registramos aqui suas circunstâncias de realização.

7

  • 7
    Por motivo de espaço, apresentamos aqui o resultado da pesquisa de apenas 48 das 97 igrejas pesquisadas no bairro de Felipe Camarão nessa segunda etapa da pesquisa que foi entre os anos de 2011 e 2016. As respostas já apresentam uma certa saturação, não se justificando o registro de todas elas, visto que a escolha das 48 dentre as 97 foi feita de modo randômico.

8

  • 8
    Optamos por não quantificar as igrejas “engajadas” em relação às não engajadas, mas elas são minoria, mesmo sendo o bairro de Felipe Camarão uma exceção na cidade de Natal, graças à atuação, desde 2005, da Associação de Líderes Evangélicos de Felipe Camarão (ALEF).

9

  • 9
    A bibliografia sobre esse tema é vasta, por isso nos restringimos a citar aqui apenas dois autores/livros representativos: Latour (1994LATOUR, Bruno. (1994), Jamais fomos modernos. Rio de janeiro: Editora 34.) e Vattimo (2002VATTIMO, Gianni. (2002), O fim da Modernidade - Niilismo e hermenêutica na cultura pós-moderna. (Trad. Eduardo Brandão). São Paulo: Martins Fontes.).

10

  • 10
    A expressão cunhada por Umberto Eco em Apocalípticos e Integrados (1979ECO, Umberto. (1979), Apocalípticos e integrados. São Paulo: Perspectiva.), aplicada à participação ou recusa da “cultura de massas”, serve de analogia a essa tensão dualista.

11

  • 11
    Seria interessante narrar a história daquilo que é chamado de Heresias Cristãs ao longo dos séculos, para ver quanto do embate entre apocalípticos e integrados está presente nelas. Temos, por exemplo, o grande debate entre o gnosticismo (já existente no Novo Testamento em textos como o da carta de Paulo aos Colossenses) e os pais antignósticos; o do neoplatonismo em Clemente de Alexandria; a dicotomia “Cidade dos Homens” vs. “Cidade de Deus” em Agostinho; a reforma de Cluny; etc. (Tillich 1988TILLICH, Paul. (1988), História do Pensamento Cristão. São Paulo: ASTE.:52-72; Seeberg 1967SEEBERG, Reinhold. (1967), Manual de historia de las doctrinas. Buenos Aires: Casa Bautista de Publicaciones.:101, 126).

12

  • 12
    Ver também o livro de Teixeira (2009TEIXEIRA, Rubenilson B. (2009), Da cidade de Deus à Cidade dos Homens: a secularização do uso, da forma e da função urbana. Natal: EDUFRN.).

13

  • 13
    O que Joanildo Burity chama de “confusão entre o religioso e o político” (2011BURITY, Joanildo. (2011), “Religião e cidadania: alguns problemas de mudança sociocultural e de intervenção política”. In: J. Burity e P. Andrade (orgs.). Religião e cidadania. São Cristóvão: Editora UFS; Recife: Fundação Joaquim Nabuco.:138) só é “confusão” de um ponto de vista disjuntivo.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    08 Jun 2020
  • Data do Fascículo
    Jan-Apr 2020

Histórico

  • Recebido
    01 Abr 2019
  • Aceito
    17 Mar 2020
Instituto de Estudos da Religião ISER - Av. Presidente Vargas, 502 / 16º andar – Centro., CEP 20071-000 Rio de Janeiro / RJ, Tel: (21) 2558-3764 - Rio de Janeiro - RJ - Brazil
E-mail: religiaoesociedade@iser.org.br