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Estudo da composição química de flocos de cereais com ênfase nos teores de fenilalanina

Study on the chemical composition of breakfast cereals with emphasis on their phenylalanine contents

Resumos

Foi estudada a composição química e o teor de fenilalanina em 13 tipos de flocos de cereais produzidos no país e disponíveis no comércio de São Paulo. Todos os produtos contêm elevado teor de carboidratos totais, superior a 77%, fornecendo no mínimo 345 kcal/100g. Os seus teores protéicos (Nx5,7) são variáveis e se situam entre 3,8 e 7,3%. Os teores de fenilalanina variam entre 224 e 451 mg/100g de produto, sendo os valores mais baixos encontrados nos cereais com o menor teor protéico, que correspondem aos flocos de milho com maior concentração de açúcar. Através da análise de aminoácidos, foram encontrados em média 5,96g de fenilalanina/100g de aminoácidos recuperados. As diferenças em torno desta média não foram estatisticamente significativas e mostraram-se independentes do cereal que deu origem aos produtos. Houve correlação linear entre o teor de nitrogênio (micro-Kjeldahl) e a concentração de fenilalanina nas amostras (coef. correl. 0,9887) o que permite estimar o teor de fenilalanina unicamente a partir da análise de nitrogênio, adotando o teor de 5,96g de fenilalanina/100g aminoácidos. Os cálculos resultaram nos teores de fenilalanina dos 13 produtos, que não diferiram estatisticamente dos obtidos pela análise de aminoácidos.

cereais matinais; composição química; fenilalanina


The chemical composition and the amount of phenylalanine in 13 types of breakfast cereals produced in Brazil and marketed in São Paulo were studied. All products showed high amounts of carbohydrates, higher than 77%, supplying a minimum of 345 kcal/100g. The protein contents (Nx5.7) ranged from 3.8 to 7.3%. The phenylalanine levels varied between 224 and 451 mg/100g of the products and the lowest levels were detected in cereals with a reduced protein content, corresponding to cereal flakes with high sugar contents. The amino acid analysis revealed that phenylalanine accounted for 5.96±0.12 g/100g recovered amino acids, with no significant statistical differences among the 13 products studied and showed to be independent of the cereal type. It was possible to establish a linear correlation between the micro-Kjeldahl nitrogen and the phenylalanine level of the samples (correl. coeff. 0.9887) and consequently estimate the phenylalanine contents based only on a simple nitrogen analysis and multiplying the protein content by 5.96. The calculated phenylalanine contents in the 13 products did not differ statistically from the data obtained by amino acid analysis.

cereal flakes; chemical composition; phenylalanine


ESTUDO DA COMPOSIÇÃO QUÍMICA DE FLOCOS DE CEREAIS COM ÊNFASE NOS TEORES DE FENILALANINA1 1 Recebido para publicação em 19/06/97; Aceito para publicação em 04/12/97.

LANFER MARQUEZ2 1 Recebido para publicação em 19/06/97; Aceito para publicação em 04/12/97. , Ursula Maria; NISHI2 1 Recebido para publicação em 19/06/97; Aceito para publicação em 04/12/97. , Luciana Erica; BARROS2 1 Recebido para publicação em 19/06/97; Aceito para publicação em 04/12/97. , Rosa Maria Cerdeira; FILISETTI COZZI2 1 Recebido para publicação em 19/06/97; Aceito para publicação em 04/12/97. , Tullia Maria Clara Catherine & PENTEADO2 1 Recebido para publicação em 19/06/97; Aceito para publicação em 04/12/97. , Marilene de Vuono Camargo

RESUMO

Foi estudada a composição química e o teor de fenilalanina em 13 tipos de flocos de cereais produzidos no país e disponíveis no comércio de São Paulo. Todos os produtos contêm elevado teor de carboidratos totais, superior a 77%, fornecendo no mínimo 345 kcal/100g. Os seus teores protéicos (Nx5,7) são variáveis e se situam entre 3,8 e 7,3%. Os teores de fenilalanina variam entre 224 e 451 mg/100g de produto, sendo os valores mais baixos encontrados nos cereais com o menor teor protéico, que correspondem aos flocos de milho com maior concentração de açúcar. Através da análise de aminoácidos, foram encontrados em média 5,96g de fenilalanina/100g de aminoácidos recuperados. As diferenças em torno desta média não foram estatisticamente significativas e mostraram-se independentes do cereal que deu origem aos produtos. Houve correlação linear entre o teor de nitrogênio (micro-Kjeldahl) e a concentração de fenilalanina nas amostras (coef. correl. 0,9887) o que permite estimar o teor de fenilalanina unicamente a partir da análise de nitrogênio, adotando o teor de 5,96g de fenilalanina/100g aminoácidos. Os cálculos resultaram nos teores de fenilalanina dos 13 produtos, que não diferiram estatisticamente dos obtidos pela análise de aminoácidos.

Palavras chave: cereais matinais; composição química; fenilalanina.

SUMMARY

STUDY ON THE CHEMICAL COMPOSITION OF BREAKFAST CEREALS WITH EMPHASIS ON THEIR PHENYLALANINE CONTENTS. The chemical composition and the amount of phenylalanine in 13 types of breakfast cereals produced in Brazil and marketed in São Paulo were studied. All products showed high amounts of carbohydrates, higher than 77%, supplying a minimum of 345 kcal/100g. The protein contents (Nx5.7) ranged from 3.8 to 7.3%. The phenylalanine levels varied between 224 and 451 mg/100g of the products and the lowest levels were detected in cereals with a reduced protein content, corresponding to cereal flakes with high sugar contents. The amino acid analysis revealed that phenylalanine accounted for 5.96±0.12 g/100g recovered amino acids, with no significant statistical differences among the 13 products studied and showed to be independent of the cereal type. It was possible to establish a linear correlation between the micro-Kjeldahl nitrogen and the phenylalanine level of the samples (correl. coeff. 0.9887) and consequently estimate the phenylalanine contents based only on a simple nitrogen analysis and multiplying the protein content by 5.96. The calculated phenylalanine contents in the 13 products did not differ statistically from the data obtained by amino acid analysis.

Key-words: cereal flakes, chemical composition, phenylalanine.

1 — INTRODUÇÃO

A fenilcetonúria é uma anormalidade metabólica caracterizada pela falta ou reduzida atividade do sistema enzimático responsável pela conversão da fenilalanina em tirosina, provocando, desta forma, um aumento no nível plasmático de fenilalanina e a excreção de diversos metabólitos da fenilalanina na urina. Crianças fenilcetonúricas não tratadas costumam apresentar níveis de fenilalanina iguais ou superiores a 20 mg/100 mL de plasma, enquanto a concentração em crianças sadias se situa ao redor de 1 a 3 mg/100 mL de plasma (3).

Os sintomas desta anormalidade se manifestam por alterações no desenvolvimento da criança, sendo comum a ocorrência de alterações na pele, convulsões e, o mais grave, o retardo mental progressivo e irreversível. Apesar da fenilcetonúria não ser curável até o momento, se diagnosticada precocemente, as suas consequências podem ser prevenidas a partir de um tratamento com uma alimentação especial, pobre em fenilalanina. Na cidade de São Paulo, sua incidência é de 1:12.000 a 1:15.000 recém-nascidos, de acordo com uma estimativa a partir de um levantamento realizado em Postos de Saúde e berçários, por SCHMIDT et al em 1987 (18). A fenilcetonúria pode ser responsabilizada por 1,6% dos doentes mentais institucionalizados entre 3 e 12 anos, de acordo com o levantamento realizado por NÓBREGA em 1967 (15). No Brasil, a partir de 1990, tornou-se obrigatório, a nível nacional, o diagnóstico neonatal (teste do pezinho), tendo-se reconhecido a importância da identificação correta e precoce desta doença, como prevenção de uma deficiência mental grave (9).

Assim, o diagnóstico precoce permite o imediato início da alimentação especial, preferencialmente ainda no primeiro mês de vida. O resultado deste tratamento depende do rigor e do controle da alimentação oferecida à criança durante o seu desenvolvimento. A ingestão de fenilalanina recomendada para estas crianças é variável, podendo uma mesma quantidade do aminoácido provocar níveis plasmáticos distintos em diversas crianças. A quantidade de fenilalanina que cada criança pode ingerir costuma variar entre 250 e 500 mg por dia, dependendo de vários fatores, da idade e da sua capacidade em metabolizar a fenilalanina. Assim, cada criança deve ser tratada individualmente, com suporte médico e nutricional, avaliando-se a sua capacidade de metabolização e garantindo uma ingestão deste aminoácido que permita a manutenção de sua taxa plasmática não superior a 3 mg/100 mL de plasma (3, 4). Comparativamente, crianças sadias ingerem aproximadamente 2500 mg de fenilalanina por dia.

FISBERG, em 1994 (6), na cidade de São Paulo, avaliou os teores de fenilalanina no plasma de 42 crianças fenilcetonúricas entre 1 e 12 anos de idade, e estas apresentaram níveis alarmantes de fenilalanina: em média 14,5 mg/100 mL de sangue nas crianças até 7 anos, e 15,8 mg/100 mL nas crianças entre 7 e 12 anos. Estes dados parecem ser uma resposta a dietas contendo teores de fenilalanina superiores aos previstos ou constantes em Tabelas de Composição de Alimentos, podendo refletir a falta de rigor na restrição alimentar, bem como resultar da falta de informação sobre o contéudo de fenilalanina em muitos alimentos ingeridos pelas crianças.

Os teores de fenilalanina em proteínas alimentares variam entre 4 e 6%, não existindo nenhuma proteína natural isenta deste aminoácido. Daqui se conclui que, quanto maior o teor de proteína num alimento, maior será também o seu teor em fenilalanina. Desta forma, o cardápio de fenilcetonúricos se restringe a alimentos como frutas e verduras, alimentos à base de amidos ou alimentos dietéticos especiais, para manter a ingestão de fenilalanina nos limites de tolerância inividual. Pelo fato de não existir um estudo espécifico das necessidades de pacientes fenilcetonúricos, a ingestão dos demais nutrientes, incluindo calorias, segue as recomendações estabelecidas nos Estados Unidos em 1989 (Recommended Dietary Allowances) (7), ou as estabelecidas pela FAO, de 1985 (5).

Vale salientar que, a princípio, todos os alimentos podem ser consumidos, desde que o seu teor em fenilalanina não ultrapasse a tolerância individual. Na prática, soma-se a quantidade de fenilalanina contida em todos os ingredientes utilizados no preparo das refeições e adapta-se à quantidade deste ou daquele alimento à tolerância da criança ao aminoácido. As necessidades de cada nutriente constituem a base para o cálculo da dieta de crianças fenilcetonúricas e são utilizados, na formulação, apenas alimentos ou matérias-primas alimentares pobres em fenilalanina, mas cujo teor seja conhecido, mantendo-se a sua quantidade total ingerida dentro dos limites fixados para cada criança (13).

Apesar da importância de dados sobre a composição de alimentos, não existem, no Brasil, tabelas completas e atualizadas com a composição em nutrientes dos nossos alimentos, fato reconhecido e há muito discutido (11, 12). As tabelas nacionais contém dados desatualizados, compilados de tabelas de outros países, e a análise, realizada muitas vezes por metodologias atualmente consideradas inadequadas. Resultados analíticos de alimentos comercializados em outros países nem sempre correspondem à composição do mesmo em nosso país, por esta estar sujeita a variações geográficas, climáticas e a adaptações genéticas. Não existem dados relativos a produtos industrializados nas tabelas de composição de alimentos nacionais. Todavia, para alguns deles existem dados atualizados e corretos, determinados nos próprios laboratórios dos fabricantes, constantes nos rótulos dos produtos.

A maioria dos alimentos nacionais não possui dados sobre a composição em aminoácidos. O elevado custo da análise, somado à dificuldade em quantificar a fenilalanina em alimentos complexos, faz com que este aminoácido seja determinado em poucos alimentos. Muitos alimentos com reduzido teor protéico, que são os principais alvos de interesse para os fenilcetonúricos, não foram analisados com relação à sua composição em aminoácidos. Nos alimentos com teor protéico inferior a 3%, a fenilalanina participa com menos de 0,1% no alimento, trazendo dificuldades analíticas adicionais para a sua quantificação.

Estes fatos motivaram os pesquisadores a estudarem a possibilidade de quantificar o teor de fenilalanina a partir do conteúdo protéico do alimento, que, por sua vez, é determinado analiticamente a partir do doseamento de nitrogênio e multiplicação por um fator apropriado, considerando-se fixo o teor de fenilalanina na proteína. Portanto, a precisão no cálculo do teor de fenilalanina depende da precisão da análise do teor protéico. Neste sentido, a indicação da composição centesimal nos rótulos, com valores arredondados pode não ser suficientemente precisa para se conhecer o teor de fenilalanina.

A escassez de dados analíticos sobre a composição de alimentos nacionais, incluindo os alimentos industrializados, e a pouca diversidade no cardápio dos fenilcetonúricos, motivaram o estudo da composição de flocos de cereais, produzidos no país e disponíveis no comércio de São Paulo, por serem produtos largamente consumidos por crianças saudáveis. Foi dada ênfase à determinação do teor de fenilalanina nestes produtos, através da análise de aminoácidos, e comparativamente, a partir de cálculo, tomando como base o teor de proteína no produto e a concentração de fenilalanina na proteína.

2 — MATERIAL E MÉTODOS

2.1 – Material

As amostras foram adquiridas no comércio local da cidade de São Paulo em meados de 1995, ou fornecidas pelos fabricantes. Foram analisados 13 tipos de flocos de cereais, produzidos por quatro fabricantes nacionais, de acordo com a Tabela 1. Os flocos foram moídos, tamisados em peneira de malha de 0,25 mm e armazenados em frascos herméticos As determinações analíticas foram realizadas em triplicata, onde a tomada de amostra foi feita criteriosamente devido à tendência dos grãos de açúcar a se depositarem no fundo das embalagens.

2.2 – Métodos

2.2.1 – Composição química

O nitrogênio total foi determinado pelo método de micro-Kjeldahl, empregando o procedimento recomendado pela AOAC (1), substituindo-se, no entanto, a mistura K2SO4/HgO por K2SO4/CuSO4. Utilizou-se 100 mg de amostra, sendo a titulação final efetuada com HCl 0,01N para aumentar a precisão. O teor de nitrogênio foi convertido para proteína através da multiplicação por 5,7, fator indicado na literatura para cereais (21).

A determinação de umidade seguiu a técnica adotada pelo Instituto Adolfo Lutz, pesando-se 5 g de amostra, mantendo-a durante aproximadamente 5 horas em estufa à 105°C, até peso constante (16).

Lipídeos foram determinados por extração com éter etílico em aparelho de Soxhlet, e o resíduo mineral fixo foi determinado por calcinação em mufla a 550°C.

O teor de fibra total da dieta foi determinado por método enzímico-gravimétrico recomendado por Prosky et al (17) com pequenas modificações, e o teor de carboidratos totais foi calculado por diferença.

2.2.2 – Análise de aminoácidos

A análise de aminoácidos foi realizada após hidrólise ácida das amostras com HCl 6N por 22 horas a 110°C, em ampolas seladas à vácuo. A proporção proteína:HCl foi de 5mg:1mL. Os hidrolisados foram evaporados em dessecador contendo pastilhas de NaOH e posteriormente ressuspensos em tampão citrato pH 2,2 (Na-S, Beckman Instr., Palo Alto, CA). As amostras foram filtradas por membranas de 0,22 µm e convenientemente diluídas com tampão citrato. A análise foi realizada por cromatografia de troca iônica em autoanalisador de aminoácidos Beckman Modelo 7300, equipado com coluna de 200 mm de comprimento, contendo resina de troca iônica de sódio e operando em condições para hidrolisados protéicos. Não foram determinados os teores de cisteína e de triptofano.

2.2.3 – Determinação da fenilalanina

A fenilalanina foi determinada de duas maneiras: por análise direta, a partir do perfil de aminoácidos, e por cálculo, conhecendo-se o teor de nitrogênio na amostra e o teor médio de fenilalanina/100g de aminoácidos, determinado previamente pelo perfil de aminoácidos.

Foi utilizada a seguinte equação para a estimativa da concentração de fenilalanina nos produtos:

Phe(mg/100g produto) = N x 5,7a x 5,96b x 10

N = % de nitrogênio (micro-Kjeldahl) no produto

a = fator de conversão nitrogênio:proteína

b = teor médio de fenilalanina encontrado pelo perfil de aminoácidos expresso em g/100 g de aminoácidos

3 — RESULTADOS E DISCUSSÃO

Na Tabela 2 são apresentados os resultados da análise de composição química das amostras de flocos de cereais. Os produtos analisados possuem um teor de carboidratos superior a 77% e podem ser considerados altamente calóricos, fornecendo no mínimo 345 kcal/100g. Os seus teores protéicos são relativamente reduzidos, variando entre 3,8 e 7,3%, possuindo cada tipo de cereal uma concentração protéica característica. Os teores mais elevados, característica desejável na alimentação de crianças saudáveis, mas de importância fundamental para o cálculo de fenilalanina quando se destina à pacientes fenilcetonúricos, correspondem aos flocos de milho dos fabricantes Newlife, Nutrifoods e Superbom e ao cereal matinal de aveia com amêndoa e mel da Kellogg’s. As menores concentrações protéicas foram encontradas nos produtos 3 e 11, que correspondem a flocos de milho com maior concentração de açúcar em detrimento do teor de proteína, (4,4 e 3,8% de proteína, respectivamente).

Os teores de proteína foram calculados a partir do teor de nitrogênio (micro-Kjeldahl), utilizando um fator de conversão 5,7, aparentemente o mais indicado para amostras de cereais, conforme estudos realizados por SOSULSKI & IMAFIDON, em 1990 (21). MOSSÉ, também em 1990, (14), determinou fatores de conversão para 10 espécies de cereais e 6 leguminosas, que variaram entre 5,1 e 6,0, semelhantes aos valores encontrados em 1969 por TKACHUK (22) e TKACHUK & IRVINE (23), a partir de análises de aminoácidos. Estes fatores de conversão parecem merecer maior confiabilidade em relação aqueles descritos na literatura, anteriores à década de 1960.

O fator 6,25, estabelecido em 1931 (10) e ainda oficialmente adotado em diversos países para a maioria das proteínas de origem vegetal (100g de proteína correspondem a 100/6,25 = 16 g de N), parece estar superestimado, principalmente para vegetais, que costumam apresentar um perfil de aminoácidos com predominância daqueles com número de átomos de nitrogênio maior que 1 (8, 21, 24, 25). SOSULSKI & IMAFIDON (1990)(21) verificaram que aproximadamente 1/3 dos aminoácidos totais em vegetais correspondem a glutamina, asparagina, lisina, arginina e histidina, elevando o teor de nitrogênio acima de 16 g em 100 g de proteína, com conseguinte redução do fator de conversão. A presença de nitrogênio-não-protéico, na forma de compostos tais como ácidos nucléicos, glicosídeos nitrogenados, quitina e sais de amônio, representa outro fator importante que invalida o uso generalizado do fator 6,25.

Nas amostras analisadas, os teores de umidade variaram, da ordem de 3 a 5 % , sendo comum encontrar valores mais elevados uma vez que os produtos adquirem umidade durante o armazenamento, mesmo em embalagem fechada. Este fato poderá resultar em pequenas diferenças na composição centesimal, que, para efeitos comparativos, exigiriam que os resultados fossem expressos em base seca.

Na Tabela 3 estão apresentados os teores de proteína obtidos por análise em comparação aos apresentados nos rótulos, devidamente recalculados para 100g do produto. Observa-se que os valores constantes nos rótulos costumam ser agrupados para alguns tipos de cereais, e carecem de um nível de precisão que seria desejável para o cálculo do teor de fenilalanina.

A composição em aminoácidos dos 13 produtos encontra-se na Tabela 4, expressa em g de aminoácidos /100 g de aminoácidos. A recuperação variou entre 83 e 99%, e os resultados apresentados foram recalculados para 100% de recuperação para facilitar a comparação entre os perfis de aminoácidos de cada produto. A elevada taxa de recuperação de aminoácidos permite supor uma reduzida participação de nitrogênio não-protéico em todas as amostras analisadas, sendo o nitrogênio determinado analiticamente, oriundo de proteínas.

Verificamos que as concentrações médias de cada aminoácido são semelhantes entre si para amostras à base de milho, e comparáveis aos dados publicados em tabelas de composição de alimentos. As amostras cujas composições são à base de arroz, aveia, ou trigo, ou contendo chocolate, amêndoa e mel, se diferenciam nitidamente na sua composição em aminoácidos, principalmente pelo elevado conteúdo em arginina e pelo reduzido conteúdo em leucina, alanina e prolina (19).

No entanto, o teor de fenilalanina é praticamente constante na proteína de todos os cereais analisados com valores variando entre 5,75 e 6,22%. O valor médio corresponde a 5,96 e a um desvio padrão de 0,12. As diferenças observadas podem ser devidas a erro analítico ou a variações genéticas na composição das proteínas dos diversos cereais. O uso do valor médio de 5,96% de fenilalanina/ 100g de aminoácidos permite a sua aplicação nos flocos de cereais com formulação mista.

Não foi observada diferença entre a concentração de fenilalanina na proteína e o tipo de cereal: à base de arroz, aveia e trigo e a presença de chocolate, amêndoa e mel não alteraram significativamente a porcentagem de fenilalanina na proteína, justificando, mais uma vez, o uso do valor médio na estimativa deste aminoácido por cálculo.

As concentrações de fenilalanina, expressas em mg do aminoácido para 100 g de produto encontram-se na Tabela 5. Os teores variam entre 224 e 451 mg, correspondendo os valores mais baixos, como era de se esperar, aos produtos com a menor concentração protéica.

Dados da literatura mostram que alguns produtos da marca Kellogg’s, produzidos e analisados no exterior, apresentaram teores de fenilalanina inferiores aos produzidos no Brasil e por nós analisados. Foram eles o Froot Loops®, o Rice Krispies® e o Corn Flakes (322, 430 e 439 mg/100g do produto, respectivamente) e o Sucrilhos®, cuja análise apresentou resultados intermediários (224 mg/100g produto) em relação aos publicados por CHAN et al (2) e SCHUETT (20).

A análise de regressão linear entre o teor de nitrogênio (Kjeldahl) na amostra e a concentração de fenilalanina mostrou um coeficiente de correlação de 0,9887 (Figura 1), demonstrando que a o teor de fenilalanina é proporcional ao teor de nitrogênio nestas amostras. Assim, torna-se possível estimar o teor de fenilalanina neste tipo de amostra, unicamente a partir da análise de nitrogênio, conhecendo-se a concentração de fenilalanina na proteína.


O teor de fenilalanina nos 13 produtos foi estimado a partir do teor de proteína (Nx5,7) e adotando um teor de fenilalanina médio de 5,96 g em 100 g de aminoácidos. Os resultados deste cálculo são apresentados comparativamente aos teores de fenilalanina obtidos pela análise direta dos aminoácidos nos hidrolisados protéicos. A comparação estatística (teste de Tukey, P £ 0,05) mostrou não haver diferença significativa entre os teores de fenilalanina obtidos por análise ou pela estimativa a partir do teor de nitrogênio.

4 — CONCLUSÕES

Os 13 tipos de flocos de cereais estudados possuem elevado teor de carboidratos, superior a 77% e fornecem no mínimo 345 kcal/100g. Os teores protéicos variam entre 3,8 e 7,3% e os teores de fenilalanina entre 224 e 451 mg/100g de produto, sendo estes valores característicos para cada produto analisado. Os valores mais baixos em proteínas e em fenilalanina correspondem aos cereais com maior teor de açúcares. Nas amostras analisadas foram encontrados 5,96 ± 0,12g de fenilalanina/100g de aminoácidos recuperados, sendo as diferenças em torno desta média estatisticamente não significativas. Houve correlação linear entre o teor de proteína (Nx5,7) e a concentração de fenilalanina, o que permite estimar o teor de fenilalanina a partir do doseamento de N nestes produtos. Os cálculos resultaram em teores de fenilalanina estatisticamente semelhantes aos obtidos pela análise de aminoácidos.

5 — REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

AGRADECIMENTOS

Os autores agradecem ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) pelas bolsa de iniciação científica concedida à acadêmica Luciana Érica Nishi; à Inês Maria Henrique pelo auxílio nas análises químicas e às Empresas pela colaboração com as amostras de cereais e o intercâmbio de informações.

2 Departamento de Alimentos e Nutrição Experimental da Faculdade de Ciências Farmacêuticas da USP.

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  • 1
    Recebido para publicação em 19/06/97; Aceito para publicação em 04/12/97.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      14 Dez 2004
    • Data do Fascículo
      Dez 1997

    Histórico

    • Aceito
      04 Dez 1997
    • Recebido
      19 Jun 1997
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