Acessibilidade / Reportar erro

HAMBÚRGUERES FORMULADOS COM BASE PROTÉICA DE PESCADO

HAMBURGERS FORMULATES WITH FISH PROTEIN BASE

Resumos

A recuperação das proteínas de pescado, de espécies de baixo valor comercial ou de subprodutos de sua industrialização, constitui-se em ma alternativa promissora para a elaboração de produtos alimentícios de alta qualidade nutricional e economicamente viáveis. O objetivo deste trabalho foi obter uma Base-Protéica-de-Pescado (BPP) que permitisse elaborar hambúrgueres com diferentes sabores. Pela disponibilidade e baixo custo de matéria-prima foi utilizada a pescada (Cynoscion striatus). A parte comestível, essencialmente músculo, foi submetida a sucessivas lavagens para retirar matéria solúvel e odores característicos, controlando-se as variáveis: solvente, soluto/solvente, tempo, temperatura, regime de agitação e número de ciclos de lavagens. A matéria-prima e BPP foram caracterizadas pelas propriedades físico-químicas e microbiológicas. O tratamento estatístico dos resultados, mediante modelo fatorial, permitiu verificar que é possível obter uma BPP, principalmente sem o sabor e odor característico do pescado, utilizando uma parte de soluto para cada duas de solvente, independente do tempo do ciclo de lavagens. A BPP foi utilizada para elaborar seis diferentes tipos de hambúrgueres e, mediante avaliação sensorial, utilizando escala hedônica para sabor, ficou evidenciada a aceitação de todos esses produtos não havendo preferência por um específico. Os resultados experimentais levam a concluir que a BPP, obtida a partir da pescada, pode ser utilizada na elaboração de hambúrgueres com bons atributos sensoriais e nutricionais.

Pescado; Proteínas; Hambúrgueres


The utilization of fish protein, from species of low commercial value or subproducts of industrialization, became a promising alternative for the food products development with high nutritive quality and economically feasible. The goal of this work was to obtain a Fish Protein Base (FPB) wich allowed preparation of different flavors of hamburgers. Whting Cynoscion striatu was used, due to the availability and low cost of raw material. The eatable part, essentially muscle, was submitted to successive washes to remove dissolvable matter and peculiar smell, maintaining under control the following variables: solvente, solute/solvent, time, temperature, agitating pattern and number of washing cycles. The raw material and FPB were characterized by their physical-chemical and microbiological properties. The statistic treatment, through factorial analysis, verified the conclusion that is possible to obtain an FPB, without the flavor or the peculiar smelling of fish, handling one part of solute for every two parts of solvent, independent on time and washing cycles. The FPB was utilized to elaborate six different types of hamburgers. By sensory evaluation, using hedonic scales for flavor, the acceptance of all these products was observed, without specific preference for one or another. The experimental results lead to the conclusion that whiting FPB, can be used to elaborate hamburgers with good sensorial and nutrition atributes.

Fish; Proteins; Hamburguers


HAMBÚRGUERES FORMULADOS COM BASE PROTÉICA DE PESCADO1 1 Recebido para publicação em 18/05/98. Aceito para publicação em 13/11/98.

D.R.S. SIMÕES2 1 Recebido para publicação em 18/05/98. Aceito para publicação em 13/11/98. ; M.A. PEDROSO2 1 Recebido para publicação em 18/05/98. Aceito para publicação em 13/11/98. , W. AUGUSTO RUIZ3,* 1 Recebido para publicação em 18/05/98. Aceito para publicação em 13/11/98. , T.L. ALMEIDA4 1 Recebido para publicação em 18/05/98. Aceito para publicação em 13/11/98.

RESUMO

A recuperação das proteínas de pescado, de espécies de baixo valor comercial ou de subprodutos de sua industrialização, constitui-se em ma alternativa promissora para a elaboração de produtos alimentícios de alta qualidade nutricional e economicamente viáveis. O objetivo deste trabalho foi obter uma Base-Protéica-de-Pescado (BPP) que permitisse elaborar hambúrgueres com diferentes sabores. Pela disponibilidade e baixo custo de matéria-prima foi utilizada a pescada (Cynoscion striatus). A parte comestível, essencialmente músculo, foi submetida a sucessivas lavagens para retirar matéria solúvel e odores característicos, controlando-se as variáveis: solvente, soluto/solvente, tempo, temperatura, regime de agitação e número de ciclos de lavagens. A matéria-prima e BPP foram caracterizadas pelas propriedades físico-químicas e microbiológicas. O tratamento estatístico dos resultados, mediante modelo fatorial, permitiu verificar que é possível obter uma BPP, principalmente sem o sabor e odor característico do pescado, utilizando uma parte de soluto para cada duas de solvente, independente do tempo do ciclo de lavagens. A BPP foi utilizada para elaborar seis diferentes tipos de hambúrgueres e, mediante avaliação sensorial, utilizando escala hedônica para sabor, ficou evidenciada a aceitação de todos esses produtos não havendo preferência por um específico. Os resultados experimentais levam a concluir que a BPP, obtida a partir da pescada, pode ser utilizada na elaboração de hambúrgueres com bons atributos sensoriais e nutricionais.

Palavras-chaves: Pescado, Proteínas, Hambúrgueres.

SUMMARY

HAMBURGERS FORMULATES WITH FISH PROTEIN BASE. The utilization of fish protein, from species of low commercial value or subproducts of industrialization, became a promising alternative for the food products development with high nutritive quality and economically feasible. The goal of this work was to obtain a Fish Protein Base (FPB) wich allowed preparation of different flavors of hamburgers. Whting Cynoscion striatu was used, due to the availability and low cost of raw material. The eatable part, essentially muscle, was submitted to successive washes to remove dissolvable matter and peculiar smell, maintaining under control the following variables: solvente, solute/solvent, time, temperature, agitating pattern and number of washing cycles. The raw material and FPB were characterized by their physical-chemical and microbiological properties. The statistic treatment, through factorial analysis, verified the conclusion that is possible to obtain an FPB, without the flavor or the peculiar smelling of fish, handling one part of solute for every two parts of solvent, independent on time and washing cycles. The FPB was utilized to elaborate six different types of hamburgers. By sensory evaluation, using hedonic scales for flavor, the acceptance of all these products was observed, without specific preference for one or another. The experimental results lead to the conclusion that whiting FPB, can be used to elaborate hamburgers with good sensorial and nutrition atributes.

Keywords: Fish, Proteins, Hamburguers.

1 — INTRODUÇÃO

O Brasil apresenta um dos mais baixos índices de consumo de pescado. Este índice, dentre outros fatores, provalvemente deve-se à falta de conhecimento da importância do pescado na alimentação [33].

A oferta de produtos derivados de pescado e a diversificação na linha de produtos de origem marinha, poderá incrementar o consumo deste produto, em particular na região sul do Brasil, onde tradicionalmente o consumo de carnes das chamadas espécies de açougue apresenta o maior índice per capita.

Considerando que a demanda de produtos alimentícios será cada vez maior, principalmente para aqueles com proteína de alto valor nutricional e valor tecnológico agregado, a recuperação das proteínas de pescado, de espécies de baixo valor comercial ou dos subprodutos de sua industrialização, constitui-se numa alternativa promissora.

O pescado, bem como a Carne de Pescado Separada Mecanicamente (CPSM), são alimentos de fácil digestão e fonte de proteínas, minerais, principalmente cálcio e fósforo, vitaminas A, D e complexo B, o que o torna um produto de alto valor nutricional [17, 40, 33].

O músculo do pescado contém dois grupos principais de proteínas: as proteínas solúveis do sarcoplasma e as proteínas estruturais das miofibrilas. Os principais componentes das proteínas estruturais são: actomiosina, tropomiosina, miosina e actina [6]. As proteínas miofibrilares representam de 66 a 77 % das proteínas totais do músculo do pescado e apresentam alta funcionalidade quando comparadas com as proteínas sarcoplasmáticas [24].

As proteínas sarcoplasmáticas representam aproximadamente 20-25 % da proteína total do músculo, são solúveis em água e como principais características estão a sua capacidade de adesão às proteínas miofibrilares impedindo a formação de gel de alta elasticidade, baixa viscosidade, baixa capacidade de retenção de água e baixa capacidade de absorção de sabores e corantes [24].

Este trabalho teve como objetivo principal, elaborar hambúrgueres com diferentes sabores utilizando polpa de pescado de baixo valor comercial. Acredita-se que este processo possibilite um estágio mais desenvolvido na tecnologia de pescado, justamente por envolver a aplicação de uma tecnologia não tradicional e facilmente adaptável.

2 — MATERIAIS E MÉTODOS

2.1 – Matéria-Prima

A matéria-prima foi "pescada-olhuda" Cynoscion striatus,obtida de empresas distribuidoras de pescados da cidade do Rio Grande - RS.

2.2 – Metodologia

O pescado foi selecionado quanto a características físicas como peso e tamanho, classificado quanto a características de qualidade sensorial principalmente, fileteado e acondicionado em embalagens plásticas de aproximadamente 5 kg e levados ao laboratório para processamento. Após lavagem, as amostras foram processadas seguindo as operações descritas no fluxograma da Figura 1. As amostras que não foram imediatamente processadas foram acondicionadas em embalagens plásticas de aproximadamente 1 kg, cuidando manter sua integridade e orientação apropriada e estocadas sob congelamento até seu processamento.

FIGURA 1.
Fluxograma Operacional para a Obtenção do Produto a Nível Laboratorial.

Foram retiradas amostras analíticas de cada batelada para a determinação da composição centesimal dos filés segundo a AOAC (1990) e para a caracterização físico-química dos filés a que foi realizada mediante ensaios de Nitrogênio Não Protéico (NNP) [23], Nitrogênio Solúvel em Água (NSA) (23), Bases Voláteis Totais (BVT) pelo método de destilação [32] e o número de Ácido Tiobarbitúrico (TBA) [46].

Para verificar as condições de higiene e manipulação do pescado, os filés foram caracterizados microbiologicamente utilizando-se metodologias para contagem total de bactérias aeróbias mesófilas pela técnica do ágar padrão [21]; contagem total de coliformes pela técnica do Número Mais Provável (NMP) (ICMSF, 1985); contagem total de coliformes fecais pela técnica do NMP (ICMSF,1985); contagem de Staphylococcus aureus pela técnica da contagem direta [21]; pesquisa de Salmonella pela técnica de isolamento [21] e teste qualitativo para pesquisa de Vibrio cholerae.

2.3 – Processamento

Os filés foram lavados com água corrente para a retirada das sujidades e posteriormente cominutados. A operação de cominutação foi realizada em multiprocessador doméstico com aproximadamente 150 g por batelada, à máxima velocidade por aproximadamente 5 segundos, obtendo-se uma massa homogênea.

A massa foi submetida a lavagem com água potável refrigerada à temperatura entre 5-7ºC em regime de agitação constante de aproximadamente 555 rpm, utilizando agitador mecânico da marca Janke & Kunkel K. G. modelo RM 114. Neste tratamento foram estudadas as variáveis: soluto:solvente nas relações de: 1:1, 1:2, 1:3 e 1:5; número de ciclos de extração 1, 2, 3, 4 e 5 e tempo de extração de 2, 4 e 6 minutos, efetuando-se 3 repetições em cada batelada.

Após cada lavagem foi realizada a separação de sólidos utilizando penerias de 0,06 mm de diâmetro (250 mesh), por 10 minutos. As impurezas, resíduos de membranas ou eventuais partículas não homogeneizadas, foram manualmente retiradas na polpa lavada, resultando uma polpa refinada a qual foi estocada sob refrigeração para facilitar a drenagem de líquido.

O processamento foi monitorado retirando alíquotas das soluções resultantes da separação por peneiramento e determinando proteínas pelo método de Biureto [25], utilizando uma curva-padrão de albumina de soro bovino (BSA).

2.4 – Caracterização da Polpa

Na polpa lavada foram determinados: rendimento, por gravimetria, e as características sensoriais de sabor, odor, cor, textura, transparência e geleificação.

As características sensoriais da polpa, de cada batelada, permitiram definir qual o processo para obter uma polpa inodora, incolor, com melhor transparência, textura ou melhor firmeza e que quando submetida ao congelamento apresente características de geleificação.

2.5 – Planejamento Experimental

Foi utilizado um modelo fatorial de (4 x 3 x 5) com 3 repetições utilizando o teste de Duncan para análise das médias. Os fatores foram Relação Soluto-Solvente nos níveis 1:1; 2:1; 3:1 e 5:1; Tempo nos níveis 2, 4 e 6 minutos; e Lavagem nos níveis 1, 2, 3, 4 e 5.

2.6 – Formulações

Em experimentos preliminares foram formulados trinta produtos tendo como base polpa lavada. Os ingredientes utilizados nas formulações foram: proteína vegetal texturizada, proteína isolada de soja, monoglutamato de sódio , condimento a base de sal, sabor e aroma de defumado, gordura vegetal hidrogenada, carragena, pimenta, amido, sal e açúcar. Foram também utilizados saborizantes com sabor de frango, carne assada, porco assado, caldo de carne, tempero grill, sabor e aroma defumado.

Os ingredientes foram pesados e misturados à polpa, observando-se as quantidades dos ingredientes conforme cada formulação. Após a obtenção de uma massa homogênea, os hambúrgueres foram moldados na forma circular, empanados por imersão numa solução de ovo batido seguido de farinha de rosca, sendo posteriormente congelados em potes plásticos.

Os produtos formulados foram caracterizados pela composição proximal e testes microbiológicos para verificar as condições do processamento, higiene e manipulação.

2.7 – Avaliação Sensorial

Foi utilizado o método de aceitação e preferência mediante escala hedônica utilizando uma escala de nove pontos, desde gostei muitíssimo até desgostei muitíssimo.

A avaliação sensorial foi dividida em duas etapas, na primeira cada provador recebia três amostras de hambúrgueres de sabor de frango com diferente formulação, e na segunda etapa recebia três amostras de hambúrgueres com sabor de porco assado também com diferente formulação. Cada provador escolhia sua preferência, identificava o sabor e atribuía uma nota na escala hedônica.

As amostras foram apresentadas em pratos codificados com números aleatórios. Os provadores receberam o mínimo de informações possíveis a fim de evitar respostas induzidas.

Os resultados foram avaliados através de testes estatísticos de análise de variância e diferença de médias, sendo também observados os comentários dos provadores.

3 — RESULTADOS E DISCUSSÃO

3.1 – Composição Centesimal da Matéria-Prima e da Polpa Lavada

A composição centesimal do filé de pescada-olhuda, mostrados na Tabela 1, estão de acordo com dados de literatura [8]. A composição química varia com os tecidos, órgãos, sexo e idade do pescado, estação do ano e desenvolvimento gonadal, o que poderia explicar as pequenas diferenças com a literatura.

TABELA 1.
Composição Centesimal do Filé de Pescada

* Parte Comestível (8)

(m + s ) = valores médios + desvio padrão

A diminuição do teor de proteína na polpa lavada era esperado como resultado da extração das proteínas sarcoplasmáticas, que perfazem entorno de 20-25 % das proteínas totais do músculo e também pode ter ocorrido perda de proteínas miofibrilares durante a extração. A umidade final da polpa lavada está de acordo com outros resultados [40,22].

A retirada parcial do conteúdo de gordura na polpa lavada estava prevista, devido ao arraste da mesma por floculação no processo de lavagem, obtendo-se assim um produto com baixo teor de gordura, diminuindo a probabilidade de oxidação lipídica.

3.2 – Parâmetros Bioquímicos dos Filés de Pescada

O filé de pescada apresentou valor das bases voláteis totais na faixa dos valores permitidos entre 10 - 30 mg % (Tabela 2). Segundo a literatura [8], um valor próximo de 30 mg % tem mostrado ser compatível com os limites de aceitação sensorial e contagem de microrganismos de muitas espécies, levando alguns países a adotarem oficialmente este valor como máximo para a comercialização.

TABELA 2.
Parâmetros Bioquímicos do Filé de Pescada

(m ) = média de 3 repetições.

O uso das bases voláteis totais como indicativo das alterações do pescado e seus produtos, implica em considerar que ocorrem um desdobramento das proteínas do pescado, resultando na formação de produtos de degradação nitrogenados com peso molecular menor, tais como: amônia, aminas ou indol.

O número de TBA é usado como indicador da oxidação lipídica de pescado e seus produtos, por sua alta concentração de ácidos graxos insaturados que podem ser oxidados facilmente desenvolvendo a rancidez. Alguns dos diversos produtos resultantes da oxidação dos lipídeos reagem com ácido 2-tiobarbitúrico desenvolvendo cor, que pode ser medida colorimetricamente.

O teor de nitrogênio não protéico, para a maioria das espécies demersais, pescados de carne clara e quantidades reduzidas de músculo vermelho, representa em torno de 9,3 % do nitrogênio total, aproximadamente 264 mg %, verificando-se assim a aproximação do resultado teórico para o experimental [8].

Nitrogênio Solúvel em Água representa os compostos nitrogenados de baixo peso molecular, como aminoácidos ou ainda algumas proteínas globulares comumente encontradas em pescados.

3.3 – Características Microbiológicas dos Filés e da Polpa

Não foram encontrados Coliformes Fecais, Salmonella nem Staphylococcus aureus, tanto nos filés quanto na polpa lavada, indicando o estado do pescado fresco e sem contaminação, como se verifica pela legislação na Tabela 3.

TABELA 3.
Caracterização Microbiológica do Filé de Pescada e Polpa

onde: UFC/g - Unidades Formadoras de Colônia/grama NMP - Número mais Provável

* Compêndio da Legislação de Alimentos, 1988

3.4 – Extração de Proteínas

O teor de proteínas dos extratos aquosos de cada batelada permitiu a escolha da melhor relação soluto:solvente, número de ciclos de lavagens e tempo de cada ciclo, utilizando-se este resultado como um parâmetro do grau de extração de proteínas solúveis.

A curva-padrão de BSA apresentou a seguinte função:

C = mg/ml; e com r = 0,9999, l = 550 nm.

Os resultados foram tratados estatisticamente para verificar a interação entre cada variável analisada.

3.4.1 - Delineamento Experimental

Analisando os resultados do tratamento estatístico (Figuras 2 e 3), verificou-se que há diferença significativa entre as relações soluto:solvente testadas (1:1, 1:2, 1:3, 1:5), como também entre as lavagens; ao contrário dos três diferentes tempos empregados (2, 4 e 6 minutos), os quais não demonstraram diferença significativa entre eles. Repetiu-se a batelada dos ciclos de lavagem e os resultados foram tratados estatisticamente para avaliar a melhor relação soluto:solvente e o número de ciclos.

FIGURA 2.
Interação relação solvente soluto x lavagens - 1o experimento F(12, 120)=8,47 ; p<.0000 (altamente significativo) Os círculos representam grupos de médias estatisticamente semelhantes
FIGURA 3.
Interação relação solvente soluto x lavagens - 2o experimento F(12,40)=4,40 ; p<.0002 (altamente significativo) Os círculos representam grupos de médias estatisticamente semelhantes.

O tratamento estatístico permitiu verificar a interdependência do tempo com relação aos ciclos de lavagem e a relação soluto:solvente, adotando-se portanto 2 minutos como tempo de lavagem para cada ciclo. No gráfico de Duncan, no primeiro tratamento estatístico, observou-se que houve uma extração irregular de proteína do músculo do pescado, pois à medida que realizavam-se as lavagens, a concentração de proteína não tinha uma distribuição uniforme, o que não era esperado. Constatou-se então que a peneira utilizada não estava adequada ao tamanho da partícula obtida na trituração da matéria-prima, perdendo-se com isto proteína de origem miofibrilar. Adotou-se assim uma peneira mais fina de 0,06 mm (250 mesh), para que não ocorressem perdas de proteína do músculo, proporcionando uma melhor distribuição dos resultados. Posteriormente pôde-se avaliar qual a melhor relação soluto:solvente através do gráfico de Duncan (Figuras 2 e 3).

A interação entre relação (Solvente:Soluto) x (Lavagens) (Figuras 2 e 3), indica que não há diferença significativa entre as relações soluto:solvente 1:2 e 1:3, havendo um decréscimo uniforme na quantidade de proteína extraída. Por este motivo, adotou-se a relação 1:2 por ser menos dispendiosa em relação à quantidade de solvente utilizado, o que era esperado.

O decréscimo uniforme na quantidade de proteína extraída e as características sensoriais como o odor, sabor, cor, textura, transparência, capacidade de absorção de água e nitrogênio total em base seca são muito importantes para a formulação do produto.

A polpa resultante da extração com a relação soluto:solvente 1:1 apresentou odor e sabor característicos a pescado. No entanto, a polpa resultante da relação 1:5 apresentou essas características aceitáveis, mas apresentou uma acentuada absorção de água, pelo que essa relação soluto:solvente foi descartada.

3.5 – Teor de Nitrogênio da Polpa Lavada

A relação soluto:solvente 1:2 permitiu obter conteúdo de nitrogênio, Tabela 4, utilizando ciclos de 2 minuto de extração.

TABELA 4.
Nitrogênio Total, Porcentagem em Base Seca

NF = nitrogênio nos filés

NP = nitrogênio na polpa

3.6 – Rendimento

O peso final da polpa, Tabela 5, permitiu estimar rendimento até que quase 9,5 vezes o peso inicial dos filés, indicando que houve grande absorção de água durante o processo de lavagem, provavelmente devido à troca de proteínas sarcoplasmáticas pela incorporação de água, sendo este aumento proporcional à quantidade de água adicionada.

TABELA 5.
Estimativa do Rendimento *

* batelada de 50,0 g de filé

Parâmetros (%) Produto Formulado Umidade 69,50 Proteína 13,90 Lipídeos 4,70 Cinzas 2,30 Carboidratos 9,60

TABELA 6. Composição Centesimal do Produto Formulado

3.7 – Produto Formulado

Pelo teor de umidade o produto formulado pode ser caracterizado como um produto com atividade de água intermediária, provavelmente sem deterioração precoce. A adição de proteínas de outras fontes aumentou a concentração final da proteína no produto formulado, no entanto é aproximadamente 2% menor que nos hambúrgueres comerciais, que está em torno de 16%, porém, o produto comercial apresenta quatro vezes mais gordura ( em torno de 15%) que o produto formulado, o que representa um bom índice que pode evidenciar uma baixa oxidação lipídica. O aumento de cinzas e carboidratos no produto formulado é consequência da adição dos ingredientes.

Observou-se um aumento no número de coliformes totais nos hambúrgueres formulados, provalvelmente devido a adição de ingredientes na formulação.

A análise microbiológica evidenciou que o produto formulado está dentro dos padrões exigidos pela legislação, como pode-se observar na Tabela 7, a seguir:

TABELA 7.
Caracterização Microbiológica do Produto Formulado

onde: UFC/g - Unidades Formadoras de Colônia/grama

NMP - Número mais Provável

3.8 – Avaliação Sensorial dos Produtos Formulados

Uma avaliação preliminar, em painel aberto para determinar a preferência entre 30 diferentes produtos formulados permitiu selecionar três produtos com sabor de frango (I, II, III) e três com sabor de porco assado (IV, V, VI). Estes foram avaliados por dois painéis, um para os hambúrgueres com sabor de frango e o outro para os com sabor de porco. Cada produto diferia na quantidade de ingredientes utilizados.

O painel composto por 14 mulheres, 10 homens e 6 adolescentes afirmou que o sabor e a consistência eram fatores importantes na escolha da formulação, sendo que aproximadamente 45 % dos julgadores preferiram o produto I, 27 % preferiram os produtos II e III. Os sabores identificados foram o frango, queijo e bacon. Cabe-se ressaltar que 6,67% dos julgadores identificaram sabor de pescado em uma das três amostras apresentadas no painel. No entanto, nas outras duas, o sabor de pescado não foi identificado. Poucos julgadores não identificaram um sabor específico, indicando apenas sabor indefinido.

A análise de variância dos resultados de cada julgador e as notas atribuídas para cada produto formulado indicou que não existe diferença significativa a nível de 5% e 1% respectivamente entre os três primeiros produtos formulados (I, II e III), com valor Fcalculado de 0, 362 e com Ftabelado de 3,158 e 5,00 respectivamente.

A análise da diferença de médias indica que não existe diferença entre os produtos formulados I, II e III, (Tabela 8).

TABELA 8.
Análise de Médias para os Produtos I, II e III

A maioria dos julgadores do painel composto por 16 mulheres, 9 homens e 5 adolescentes afirmaram que o sabor e a consistência foram fatores importantes na escolha da formulação, sendo que aproximadamente 40 % dos julgadores preferiram os produtos IV e V, enquanto que 20 % preferiram o produto VI. Os sabores identificados foram bacon, torresmo, queijo e frango; não foi percebido o sabor a porco assado, apenas 2 julgadores identificaram o sabor a pescado em apenas uma das três amostras apresentadas.

A análise de variância dos resultados obtidos de cada julgador e observando-se as notas atribuídas para cada produto formulado, obteve-se um Fcalculado de 0, 40 que comparado com os Ftabelado de 5,00 e 3,158, ao nível de significância de 1% e 5% respectivamente, indica que não há diferença entre os produtos formulados IV, V e VI; e a análise de diferença de médias indica que não existe diferença entre as médias dos produtos formulados IV, V e VI, (Tabela 9).

TABELA 9.
Análise de Médias para os Produtos IV, V e VI

3.9 – Estimativa de Custo do Produto Formulado

Os resultados experimentais, obtidos no laboratório e estimando custos por Kg dos ingredientes R$ 0,80, empanamento R$ 1,30 e polpa R$ 0,21, estimou-se um valor de R$ 2,31 por Kg de produto formulado, indicando um baixo custo quando comparado com valores de hambúrgueres comercializados no mercado.

4 — CONCLUSÕES

Obteve-se uma base protéica de pescado (BPP) sem as características próprias de odor e sabor a pescado a que pode ser utilizada na formulação de produtos alimentícios tendo em vista suas características microbiológicas e seu conteúdo protéico.

Os hambúrgueres formulados com BPP apresentaram um incremento de nitrogênio em base seca e menor teor de gordura, quando comparado com os comerciais. Estes produtos encontraram-se dentro dos limites microbiológicos exigidos por legislação, estando próprios para consumo humano.

Avaliação sensorial dos hambúrgueres indicou uma boa aceitação, não havendo diferença comprovada pelo teste de médias, nas seis formulações testadas, verificando assim que não houve preferência por uma única formulação. O sabor de pescado não foi identificado pelos julgadores nos produtos formulados.

O custo estimado do produto formulado, indica que sua elaboração poderia ser viável; no entanto é necessário a experimentação em escala piloto.

O processo utilizado na elaboração dos hambúrgueres pode agregar valor a uma espécie de pescado de baixo valor comercial, bem como possibilitou a diversificação de produtos derivados desta matéria-prima.

5 — REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

2 Engenharia de Alimentos – FURG.

3 Depto. de Química – FURG, C.P. 474, CEP 96.201-900, Rio Grande, RS. E-mail: war@inter-rotas.com.br

4 Depto. de Matemática – FURG, C.P. 474, CEP 96.201-900, Rio Grande, RS.

* A quem a correspondência deve ser endereçada.

  • 1. ASSOCIATION OF OFFICIAL ANALYTICAL CHEMISTS. Official Methods of Analysis. 15a ed., Washington, 1990.
  • 2. BURGESS, G. H.; CUTTING, C. L. et alii. O pescado e as Indústrias Derivadas da Pesca. Editoria Acribia, Espanha.
  • 3. CHEFTEL, J. C. ; CUQ, J. L. & LORIENT, D. Proteinas Alimentarias Bioquímica. Propriedades Funcionales. Valor Nutritivo. Modificaciones Químicas, Editorial Acribia S.A. Espańa, 1989.
  • 4
    COMISSÃO NACIONAL DE NORMAS E PADRÕES. In: Compêndio da Legislação de Alimentos, publicado pela Associação Brasileira da Indústria de Alimentos - ABIA. São Paulo, 1988.
  • 5. CONNEL, J. J. Advances in Fish Science and Technology. Fishing News Books, Farnham, 1980.
  • 6. CONNELL, J. Fish Muscle Proteins and Some Effects on the Processing. In: Proteins and their Reactions. Ed. By H.W.Schultz & A. F. Anglemier. The AVI Publishing Company. Wesport, 1994.
  • 7. CONTRERAS, E. S. G. Bioquímica de Pescados e Derivados, Editora FUNEP. Jaboticabal, 1994.
  • 8
    ECOLOGIA MICROBIANA DE LOS ALIMENTOS 2. Produtos Alimentícios - ICMSF. Ed. Acribia - vol II, 1985.
  • 9. DILLON, R. M. & PATEL, T. R. Listeria in Seafoods: A Review, Journal of Food Protection, vol 55, 1992.
  • 10. FONTCUBERTA, E. Umami - O Quinto Sabor, ITAL - Instituto de Tecnologia de Alimentos Campinas, 1994.
  • 11. FOOD INGREDIENTS DIVISION - FMC CORPORATION, Folheto Informativo.
  • 12. FOOD INGREDIENTS SPECIALITIES / FIS S.A. Nestlé Industrial e Comercial Ltda. Săo José do Rio Pardo - SP, 1996.
  • 13. GERHARDT, U. Ciencia y Tecnología de la Carne. Teoria y Práctica. Aditivos e Ingredientes, Como Coadyuvantes de la "Kutter", Emulgentes y Estabilizadores de Productos Cárnicos. Editorial Acribia, Espańa.
  • 14. GILLIES, M. T. Fish and Shelfish Processing. Noyes Data Corp. London, 1975.
  • 15. GOFTON, L. Dollar rich and time poor? British Food Jour, 1995.
  • 16. GRAHAM, H. D. Food Colloids. The AVI Publishing Company, Inc. United States, 1977.
  • 17. HALL, G. M. Fish Processing Technology. New York, VCH Publishers, 1992.
  • 18. HOLLINGSTWORTH, P. The High Tech Consumer. Food Technology, 1995.
  • 19. LABUZA, T. P. Shifting food research paradigms for the 21st century. Food Technology, 1994.
  • 20. LANARA. Métodos Analíticos Oficiais para Controle de Produtos de Origem Animal e Seus Ingredientes: Métodos Microbiológicos. Brasília: Ministério da Agricultura, 1981.
  • 21. LANIER, T. C. & LEE, C. M. Surimi Technology. Marcel Dekker, Inc. New York, 1992.
  • 22. LEES, R. Análisis de los Alimentos, Editoral Acribia. Espańa.
  • 23. MACHADO, I. Surimi e Produtos Derivados. ITAL - Instituto de Tecnologia de Alimentos Campinas, 1994.
  • 24. MARTELLI, H. L. & PANEK, A. D. Bioquímica Experimental. Ao Livro Técnico S.A. Rio de Janeiro, 1968.
  • 25. McLLVEE, H. Product development and the consumer: the reality of managing creativity. Nutrition and Food Science No 6, 1994.
  • 26. MINISTÉRIO DA AGRICULTURA, DO ABASTECIMENTO E DA REFORMA AGRÁRIA, SECRETARIA DO DESENVOLVIMENTO RURAL. Unidade de Processamento de Carnes, Série Perfis Agroindustriais. Brasília, 1995.
  • 27. MORAES, M. A. C. Métodos para Avaliaçăo Sensorial dos Alimentos. Editora da UNICAMP, 8a ed. Campinas, 1993.
  • 28. MORI, E. M. Análise Sensorial de Carne de Pescado Separada Mecanicamente. ITAL - Instituto de Tecnologia de Alimentos Campinas, 1994.
  • 29. MULTON, J. L. Aditivos y Auxiliares de Fabricación en las Industrias Agro-alimentarias. Editorial Acribia, S.A. Espańa, 1988.
  • 30. OCKERMAN, H. W. & HANSEN, C. L. Industrializacion de Subproductos de Origen Animal. Editorial Acribia, S. A. Espańa, 1994.
  • 31. PEARSON, D. The Chemical Analysis of Foods. Churchill Livingstone. 7a ed. New York, 1976.
  • 32. RAIMUNDO, M. G. M. Formulaçőes e Valor Nutricional de Produtos Elaborados a Base de Carne de Pescado Separada Mecanicamente (CPSM). ITAL - Instituto de Tecnologia de Alimentos Campinas, 1994.
  • 33. RANKEN, M. D. Manual de Industrias de los Alimentos. Editorial Acribia, S.A. 2a ed. Espańa, 1993.
  • 34. RUIVO, U. E. Controle de Pontos Críticos no Processamento e na Conservaçăo de Carcaças e Aparas para Obtençăo da Carne de Pescado Separada Mecanicamente. ITAL - Instituto de Tecnologia de Alimentos Campinas, 1994.
  • 35. RUIZ ALOR, F. A. Qualidade Microbiológica da Carne de Pescado Separada Mecanicamente e Controle Sanitário no Processo. ITAL - Instituto de Tecnologia de Alimentos Campinas, 1994.
  • 36. SIKORSKI, Z. E. Seafood: Resources, Nutritional, Composition and reservation. Boce Raton CRC Press, 1990.
  • 37. SLOAN, A. E. Memes map the future. Food Technology, 1995.
  • 38. SLOAN, A. E. Regional spins pays off... Food Technology, 1995.
  • 39. SGARBIERI, V. C. Alimentaçăo e Nutriçăo. Fator de Saúde e Desenvolvimento. ALMED Editora e Livraria Ltda, 1987.
  • 40. SUZUKI, T. Tecnología de las Proteínas de Pescado y Krill. Editorial Acribia S.A. Espańa, 1987.
  • 41. TAVARES, M. Métodos Físicos e Químicos na Avaliaçăo da Qualidade da Carne de Pescado Separada Mecanicamente e Produtos Derivados, ITAL - Instituto de Tecnologia de Alimentos Campinas, 1994.
  • 42. TRAELNES, K. R. Challenges for R & D in food processing. World of Ingredients, 1994.
  • 43. WAGNER, J.The best new food products of 1994. Food Processing USA, 1994.
  • 44. WHEATON, F. W. & LAWSON, T. B. Processing Aquatic Food Products. AVI Publishing, Wesport, 1982.
  • 45. YU, T. C. & SINNHUBER, R. O. Thiobarbituric acid method for the measurement of rancidity in fishery products,2. Food Technology, 1957.
  • 1
    Recebido para publicação em 18/05/98. Aceito para publicação em 13/11/98.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      24 Maio 1999
    • Data do Fascículo
      Out 1998

    Histórico

    • Recebido
      18 Maio 1998
    • Aceito
      13 Nov 1998
    Sociedade Brasileira de Ciência e Tecnologia de Alimentos Av. Brasil, 2880, Caixa Postal 271, 13001-970 Campinas SP - Brazil, Tel.: +55 19 3241.5793, Tel./Fax.: +55 19 3241.0527 - Campinas - SP - Brazil
    E-mail: revista@sbcta.org.br