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Influência do amido e carragena nas propriedades texturiais de surimi de tilápia (Oreochomis sp.)

Influence of starch and carrageenan on textural properties on tilapia (Oreochomis sp.) surimi

Resumos

Foram utilizadas carcaças residuais da filetagem industrial de tilápias (Oreochomis sp.) na obtenção de carne de pescado separada mecanicamente (CPSM) para elaboração de surimi. Amidos de diferentes fontes, como milho ceroso, milho ceroso modificado e mandioca, e o polissacarídeo carragena foram usados como ingredientes, e estudados seus efeitos no comportamento do gel de surimi. O surimi elaborado a partir de carcaças residuais da filetagem industrial, apresentou um rendimento final de 25% (peso/peso). A análise instrumental de textura apresentou um efeito fortalecedor, em relação à força de penetração dos amidos no gel de surimi, sendo esse efeito proporcional à viscosidade (r = 0,81, p<0,05) dos amidos, estudados por amilograma Brabender; por outro lado, tanto os amidos como a carragena apresentaram uma diminuição da viscoelasticidade (p < 0,05) do gel de surimi.

surimi; amido; carragena; tilapia


Fillet frames from industrial processing of tilapias (Oreochomis sp.) was utilized to obtained minced meat for surimi. Starch from differents sources ( waxy maize starch, modified waxy maize starch and tapioca) and the polysaccharide carrageenan was utilized like additives, and then studied their effects on surimi gel behaviour. Tilapia surimi showed a yield of 25% (weight/weight). The instrumental analysis of texture showed a strong effect of starch in relation to penetration force in surimi gel, these effect was proportional to starches viscosity (r = 0,81, p<0,05), studied by Brabender amylograph, by other hand, both starch and carrageenan showed a decresed in viscoelasticity of surimi gel (p<0,005).

surimi; starch; carrageenan; tilapia


Influência do amido e carragena nas propriedades texturiais de surimi de tilápia (Oreochomis sp.)1 1 Recebido para publicação em 20/06/98. Aceito para publicação em 17/05/99. Parte da Dissertação de Mestrado do primeiro autor.

Pedro Luiz Manique BARRETO2 1 Recebido para publicação em 20/06/98. Aceito para publicação em 17/05/99. Parte da Dissertação de Mestrado do primeiro autor. , Luiz Henrique BEIRÃO3 1 Recebido para publicação em 20/06/98. Aceito para publicação em 17/05/99. Parte da Dissertação de Mestrado do primeiro autor. ,* 1 Recebido para publicação em 20/06/98. Aceito para publicação em 17/05/99. Parte da Dissertação de Mestrado do primeiro autor.

RESUMO

Foram utilizadas carcaças residuais da filetagem industrial de tilápias (Oreochomis sp.) na obtenção de carne de pescado separada mecanicamente (CPSM) para elaboração de surimi. Amidos de diferentes fontes, como milho ceroso, milho ceroso modificado e mandioca, e o polissacarídeo carragena foram usados como ingredientes, e estudados seus efeitos no comportamento do gel de surimi. O surimi elaborado a partir de carcaças residuais da filetagem industrial, apresentou um rendimento final de 25% (peso/peso). A análise instrumental de textura apresentou um efeito fortalecedor, em relação à força de penetração dos amidos no gel de surimi, sendo esse efeito proporcional à viscosidade (r = 0,81, p<0,05) dos amidos, estudados por amilograma Brabender; por outro lado, tanto os amidos como a carragena apresentaram uma diminuição da viscoelasticidade (p < 0,05) do gel de surimi.

Palavras-chave: surimi, amido, carragena, tilapia.

SUMMARY

Influence of starch and carrageenan on textural properties on tilapia (Oreochomis sp.) Surimi. Fillet frames from industrial processing of tilapias (Oreochomis sp.) was utilized to obtained minced meat for surimi. Starch from differents sources ( waxy maize starch, modified waxy maize starch and tapioca) and the polysaccharide carrageenan was utilized like additives, and then studied their effects on surimi gel behaviour. Tilapia surimi showed a yield of 25% (weight/weight). The instrumental analysis of texture showed a strong effect of starch in relation to penetration force in surimi gel, these effect was proportional to starches viscosity (r = 0,81, p<0,05), studied by Brabender amylograph, by other hand, both starch and carrageenan showed a decresed in viscoelasticity of surimi gel (p<0,005).

Keywords: surimi, starch, carrageenan, tilapia.

1 – INTRODUÇÃO

Em 1994, a captura mundial de pescado atingiu 110 milhões de toneladas, e para manter os níveis atuais de consumo mundial de pescado, isto é, uma média de 13kg/per capita/ano, até o ano 2010, noventa e um milhões de toneladas de pescado comestível deverão ser adicionadas para alimentar uma população mundial estimada em 7 bilhões de pessoas. Assim, o presente nível de produção deverá ser quase duplicado [3]. No entanto, a produção mundial de pescado capturado nos oceanos tem se mantido quase constante nos últimos anos, apesar do crescimento da aquicultura. O aumento da produção de pescado oriundo da aquicultura, pode diminuir a pressão sobre os estoques oceânicos e permitir um melhor manejo e recuperação dos mesmos.

Em vista disto, a indústria mundial de pescado, nas últimas décadas, vem buscando o desenvolvimento de novos produtos a partir de tecnologias alternativas, dentre os quais se inclui o surimi. A elaboração do surimi permite a utilização de espécies de baixo valor comercial, ou da fauna acompanhante capturada quando o alvo é outra espécie, como por exemplo, quando da pesca do camarão e do atum, bem como de sub-produtos do processamento industrial, a exemplo com o que ocorre com suínos, bovinos e frangos.

Surimi, carne de peixe moída, lavada, drenada e estabilizada pela adição de crioprotetores, é utilizado como matéria-prima na preparação de tradicionais alimentos da cozinha japonesa, como o "kamaboko", e tem sido utilizado, também, para a produção de produtos análogos de frutos do mar, como camarão, lagosta, vieira, ou os já tradicionais "kani kama" – análogos de caranguejo e siri.

A propriedade tecnológica mais apreciada do surimi é sua grande capacidade de retenção de água, o que permite que se obtenha qualquer textura desejável dos produtos à base de surimi. Outras propriedades funcionais do surimi são a capacidade de formar géis termo-irreversíveis de alta firmeza, elasticidade e coesividade, além de ser um ótimo estabilizador de emulsões e atuar como dispersante [1].

O amido é usado como ingrediente principal em produtos à base de surimi, pela sua habilidade em modificar a textura [16], por melhorar a estabilidade em processos de "congelamento-descongelamento" [12] e, por razões econômicas [10]. As propriedades reológicas do gel de surimi podem ser afetadas pelas propriedades físico-químicas do amido, tais como frações amilose e amilopectina, temperatura de gelatinização, retrogradação [10], viscosidade e viscoelasticidade [14].

O uso de gomas alimentícias (polissacarídeos), como, alginato e carragena em produtos cárnicos tem sido de grande interesse para a indústria alimentícia, pela demanda por produtos com baixo teor de gordura e preços acessíveis [8]. A carragena é extraída de algas vermelhas e disponível em três tipos, chamados kappa (k), iota (i) e lambda (l). As carragenas kappa e iota são capazes de formarem géis termo-reversíveis. A quantidade normalmente usada na formulação de produtos análogos à base de surimi varia de 0,1% a 0,5% [14]. A força do gel de surimi pode ser, significativamente, melhorada quando a iota carragena é utilizada até uma concentração de 0,25% com proteína de soro de leite coagulado [6].

O presente trabalho se propõe a estudar o comportamento reológico de vários tipos de amidos comerciais durante o aquecimento, bem como de dispersões contendo amido e uma mistura comercial (1:1) de kappa e iota carragena. Avaliar o comportamento de géis de surimi de tilápia (Oreochomis sp.) extraídos de carcaças residuais da filetagem industrial, bem como de géis contendo surimi/amido e surimi/amido/carragena.

2 – MATERIAIS E MÉTODOS

2.1 – Preparação das amostras

2.1.1 - Surimi

Carcaças residuais da filetagem industrial de tilápias foram obtidas congeladas na indústria Pompéia do Brasil — Importação e Exportação Ltda., na cidade de Rio do Sul, Estado de Santa Catarina. Após descongelamento em temperatura ambiente (± 20ºC), as carcaças foram processadas na Usina Piloto de Pescado e Derivados (UFSC), através de máquina de desossa mecânica, com cilindro perfurado de malha de 5mm de diâmetro.

A carne de pescado obtida foi objeto de três ciclos de lavagem, com uma proporção carne:água de 1:3. O excesso de água, absorvida pela carne de pescado, foi retirado através de prensa hidráulica. Em seguida foram adicionados os aditivos, sorbitol (4%) e tripolifosfato de sódio (0,5%), em relação ao peso do surimi. Logo após a umidade do surimi foi equilibrada, com adição de água, para 80%. Porções individuais de amostras de 500 gramas foram embaladas em sacos de polietileno e congeladas a -18ºC, para análises posteriores.

2.1.2 - Sistema amido/água

As amostras desses sistemas foram preparadas para a realização da técnica de amilograma Brabender. Conforme o manual de instruções do amilógrafo Brabender Visco/Amylo/Graphä , foram preparadas dispersões, em água destilada, dos seguintes amidos: amido de milho ceroso modificado (Firm-tex - National Starch Co.), amido de milho ceroso modificado com ligações intercruzadas de fosfato (Snow-flake - Refinações Milho do Brasil), amido de milho ceroso (Amisol - Refinações Milho do Brasil) e fécula de mandioca, com uma concentração de 5,6% de sólidos totais.

2.1.3 - Sistema amido/carragena/água

Primeiramente foram realizadas misturas dos componentes sólidos (amido e carragena), com uma relação de 100:0,2 (amido:carragena). A carragena utilizada foi uma mistura comercial de kappa e iota carragena. Em seguida, foram preparadas dispersões conforme descrito em 2.1.2, para análises de amilograma Brabender.

2.1.4 - Sistema surimi/amido

O surimi, previamente preparado como descrito no item 2.1.1, foi descongelado a 4ºC, misturado e triturado em graal e pistilo com 5% (p/p) de amido (Firm-tex, Snow-flake, Amisol e Fécula de mandioca), por 10 minutos. Durante o processo a temperatura do sistema foi sempre mantida abaixo de 4ºC.

2.1.5 - Sistema surimi/amido/carragena

O surimi, como descrito anteriormente, foi misturado e triturado, com 5% (p/p) de amido (Firm-tex, Snow-flake, Amisol e Fécula de mandioca) e com 0,2% (p/p) de uma mistura comercial de kappa e iota carragena. A temperatura do sistema durante todo o processo foi sempre mantida abaixo de 4ºC.

2.2 – Técnicas e tipos de medidas realizadas

2.2.1 - Amilograma Brabender

Os amilogramas dos sistemas amido/água e amido/carragena/água, descritos nos itens 2.1.2 e 2.1.3, foram realizados na cidade de Trombudo Central, Estado de Santa Catarina, nas dependências da Empresa National Starch Co. Ltda, em Brabender Visco/Amylo/Graph ä . As amostras foram aquecidas a partir de 25ºC até 95ºC, sendo em seguida resfriadas até 50ºC, a uma razão de 1,5ºC por minuto, como recomendado pelo fabricante do aparelho.

2.2.2 - Análise de propriedades texturiais medidas instrumentalmente

Com o texturômetro Stevens LFRA Texture Analyser, do Laboratório de Análise Sensorial do Departamento de Ciência e Tecnologia de Alimentos - UFSC, utilizando-se sonda cilíndrica de acrílico de 3,75cm de diâmetro , para o teste de compressão e sonda de aço inox de 5mm de diâmetro para o teste de penetração, foram analisados os parâmetros de dureza, coesividade, elasticidade e firmeza, segundo o modelo proposto por Bourne [5] e Pons & Finszman [17], para géis dos sistemas surimi, surimi/amido e surimi/amido/carragena, descritos anteriormente. Às pastas dos sistemas foi acrescentado 3% (p/p) de NaCl, e embutidas em sacos de polietileno com 2,5cm de diâmtro e 18cm de comprimento, tendo sido deixadas por 24 horas a uma temperatura de 4ºC. Em seguida acondicionadas dentro de um tubo de aço inox, e aquecidas a temperatura constante de 90ºC por 30 minutos, em banho-maria, para obtenção dos géis.

2.2.3 - Análises Estatísticas

Os dados das propriedades texturiais, medidas instrumentalmente, foram analisados por análise de variância e de correlação linear ( r ), com o auxílio do software estatístico Statgraphics 7.0 (Statgraphics STSC Inc.).

3 – RESULTADOS E DISCUSSÃO

No presente estudo foi realizado amilograma Brabender, dos amidos utilizados, que apresentaram diferentes temperaturas de gelatinização e viscosidade, apresentados na Tabela 1.

O amido Firm-tex (amido de milho ceroso modificado) foi o que apresentou o menor ponto gel (58ºC) e a 65ºC atingiu viscosidade máxima 1310 VB (Viscosidade Brabender), tendo apresentado uma viscosidade no período final de aquecimento de 1060 VB. Snow-flake (fosfato de diamido), também um amido de milho ceroso modificado, no entanto, apresentou um ponto gel mais elevado do que o Firm-tex (amido de milho ceroso modificado), a 70ºC e atingiu a temperatura de 95ºC sob contínuo aumento de viscosidade, fato este que permaneceu durante o período de resfriamento, tendo apresentado sua viscosidade máxima no final do período de resfriamento, ou seja, a 50ºC por 30 minutos, porém foi o amido que apresentou a mais baixa viscosidade em relação aos outros amidos, quando do ponto gel. O Amisol (amido de milho ceroso - quase 100% de amilopectina) apresentou o ponto gel mais alto entre todos os amidos (71ºC), atingindo uma viscosidade máxima de 720 VB a 80ºC, porém apresentou uma queda brusca da viscosidade após essa temperatura, e com 95ºC a viscosidade caiu para 330 VB. A Fécula de mandioca apresentou ponto gel e viscosidade intermediários entre os amidos. Seu ponto gel foi a 63ºC e atingiu uma viscosidade máxima de 750 VB a 80ºC, tendo, assim como o Amisol, sofrido uma diminuição brusca da viscosidade à temperatura de 95ºC (temperatura máxima do amilograma Brabender), tendo atingido o valor de 400 VB.

Seguindo o proposto por MAZURS et al. [15], analisamos os amilogramas dos diferentes amidos, a fim de obter a estabilidade térmica e a tendência de associação das moléculas ou retrogradação, para tal é preciso destacar dos amilogramas os seguintes resultados:

a) pico de viscosidade;

b) viscosidade da pasta quando atinge 95ºC;

c) viscosidade da pasta após 30 minutos a 95ºC;

d) viscosidade da pasta quando resfriada até 50ºC; e

e) viscosidade da pasta após 30 minutos a 50ºC.

Assim, se obtém a estabilidade térmica diminuindo-se o valor obtido no pico de viscosidade com a viscosidade da pasta quando atinge 95ºC, e a tendência de associação das moléculas diminuindo-se a viscosidade apresentada pela pasta quando resfriada até 50ºC pela viscosidade da pasta após 30 minutos a 95ºC, estando os resultados apresentados na Tabela 2, e Figura 1.


Analisando os dados da Tabela 2 e Figura 1, observa-se que o amido modificado Firm-tex apresentou a maior tendência de associação das moléculas, bem como maior estabilidade ao aquecimento. Outro amido modificado, Snow-flake, também apresentou grande estabilidade ao aquecimento, disso deduz-se que esses amidos (Firm-tex e Snow-flake) são os amidos que apresentam uma menor queda dos valores de viscosidade quando aquecidos, porém o amido Snow-flake apresentou um aumento da viscosidade constante durante todo o período de aquecimento no procedimento do amilograma, sendo isso resultado das ligações cruzadas com grupamento fosfato presentes nesse amido modificado. Segundo RASPER [18] isso é típico para amidos com moléculas adjacentes, ou amidos com ligações cruzadas. As ligações cruzadas reduzem significativamente a habilidade do amido em inchar, o que parece ser o caso desse amido (Snow-flake), pois foi o que apresentou a menor viscosidade no ponto de gelificação.

Segundo HOSENEY [9] amidos com ligações cruzadas incham menos e são menos solúveis do que o mesmo amido não-modificado. Assim, o amido com ligação cruzada produz uma pasta com viscosidade menor. Além disso, a cristalização é mais rápida nos amidos cujas cadeias sejam menores e mais móbeis. Assim a retrogradação, isto é, a recristalização do amido, é retardada pela presença de ligações cruzadas, pois torna as cadeias moleculares menos móveis devido ao impedimento conformacional, provavelmente atribuído ao intercruzamento.

Os dados dos amilogramas confirmam a observação de HOSENEY [9], pois o amido Snow-flake (fosfato de diamido) é um amido modificado através de ligações cruzadas e foi o amido que apresentou a menor viscosidade Brabender (580 VB). Assim como uma baixa tendência de associação das moléculas, similar à tendência apresentada pela fécula de mandioca, reconhecidamente um dos mais estáveis à retrogradação, conforme dados de AMANTE [2]. Além disso, o amido Snow-flake (fosfato de diamido) apresentou um aumento constante da viscosidade até 95ºC, o que segundo BOBBIO e BOBBIO [4], é devido a presença de ligações intermoleculares através de grupamentos fosfato, que esses amidos são mais resistentes ao calor e apresentam uma diminuição do tamanho ou intumescimento do grânulo.

A fécula de mandioca e o amido Amisol, apresentaram os menores valores para a estabilidade térmica, sendo isso provocado pelo rompimento do grânulo devido a grande absorção de água durante o período de gelatinização, exibindo, assim, uma diminuição significativa da viscosidade, após atingirem o valor máximo. Importante fato a ser destacado, é a pequena tendência à associação das moléculas presentes do amido Amisol, amido com alto teor de amilopectina. Segundo AMANTE [2], o tempo para a formação das associações entre as moléculas de amilose é consideravelmente pequeno, ocorrendo o inverso com a amilopectina, sendo isso atribuído à conformação linear da amilose, o que facilita associações através de pontes de hidrogênio entre grupos hidroxila das moléculas adjacentes.

Ao analisar os amilogramas dos amidos adicionados de carragena (0,2%), nota-se que os cinco pontos destacados por MAZURS et al. [15], ou seja: a) pico de viscosidade máxima; b) viscosidade da pasta quando atinge 95ºC; c) viscosidade da pasta após 30 minutos a 95ºC; d) viscosidade da pasta quando resfriada a 50ºC; e, e) viscosidade da pasta após 30 minutos a 50ºC, para o sistema amido Firm-tex/carragena, diminuíram de valor, ou seja, as viscosidades nesses pontos baixaram de valor; enquanto que para a fécula de mandioca houve um aumento da viscosidade para os mesmos, resultados esses apresentados na Tabela 2 e Figura 1, quando comparados aos amilogramas desses sistemas sem adição de carragena. Em relação ao ponto gel, o mesmo não modificou para o sistema Firm-tex/carragena (58ºC), sofrendo uma variação de 2ºC entre os sistemas fécula de mandioca/água (63º) e fécula de mandioca/água/carragena (61ºC).

Quanto à estabilidade térmica, segundo os parâmetros de MAZURS et al. [15], observa-se uma diminuição para o sistema fécula de mandioca/carragena, pois a diferença entre o pico de viscosidade e a viscosidade ao atingir 95ºC, foi maior para esse sistema do que para o sistema fécula de mandioca/água, conforme dados da Tabela 2.

A exemplo dos amilogramas dos amidos sem adição de carragena, o amido modificado (Firm-tex) adicionado de carragena também mostrou uma maior tendência de associação de moléculas, bem como uma grande estabilidade térmica.

3.1 – Características De Textura Dos Géis De Surimi E Surimi-Amido De Tilápia

Os resultados das propriedades dos géis de surimi e surimi-amido aparecem na Tabela 3, e os resultados dos géis do sistema surimi-amido-carragena, na Tabela 4.

Segundo LANIER [11], a coesividade do gel é o melhor parâmetro para representar a qualidade e funcionalidade das proteínas do surimi e reduções desse atributo são interpretadas como perdas da habilidade de formação do gel resultante da redução de ligações cruzadas (cross-linking) intermoleculares das cadeias protéicas causadas por desnaturação protéica e/ou outros fatores.

Quando os sistemas gelificados surimi/amido foram comparados ao gel de surimi, houve diferença significativa (p<0,05) entre os valores de coesividade (Tabela 3), quando estavam presentes os amidos, fécula de mandioca (FM) e Snow-flake (SF - fosfato de diamido), sendo a coesividade do gel de surimi (0,951) menor do que os géis de surimi contendo fécula de mandioca (1,006) e Snow-flake (0,998). Todos os sistemas gelificados surimi/amido apresentaram uma coesividade maior do que o gel de surimi, demonstrando o poder dos amidos em aumentar a coesividade do gel de surimi.

A coesividade dos géis surimi/amido quando comparados entre si, mostraram resultados menores para os sistemas gelificados contendo Firm-tex e Amisol. Houve uma diferença significativa (p<0,05) entre os sistemas contendo Firm-tex-fécula de mandioca; Firm-tex/Snow-flake; Amisol-fécula de mandioca; e Amisol/Snow-flake.

A carragena, adicionada aos sistemas surimi/amido, submetidos à gelificação (cozimento), apresentou um aumento significativo da coesividade (p<0,05) para os géis de surimi contendo Amisol e Firm-tex. Porém não apresentou diferença significativa (Tabela 4) para os sistemas contendo fécula de mandioca e Snow-flake, entretanto, cabe ressaltar que os sistemas surimi/amido contendo tanto a fécula de mandioca como o amido Snow-flake já apresentavam altos índices de coesividade, e que apesar de não haver diferença significativa, a carragena também elevou os valores de coesividade para os sistemas surimi/fécula de mandioca e surimi/Snow-flake.

A resposta de um material à penetração pode ser afetado pela densidade e uniformidade da matriz, já que somente uma região da seção transversal é submetida à penetração, e a resistência à essa força, mede o grau de compactação ou densidade, chamado firmeza. A variação na densidade e qualquer defeito ou não-homogenidade da matriz, como bolsas de ar ou ingredientes adicionados, podem alterar à força de penetração, o que pode ter influenciado os presentes resultados, já que os sistemas foram preparados e misturados em graal e pistilo, sem vácuo. É por isso que as curvas de penetração apresentam vários picos [13].

Medindo a força de penetração (firmeza) aos vários sistemas, mostram os resultados, que o gel de surimi apresentou a menor resistência à penetração (163,85 g), sendo significativamente menor (p<0,01) do que todos os sistemas surimi/amido e surimi/amido/carragena. Demonstrando o grande poder dos amidos em aumentar a firmeza do gel.

Na comparação da firmeza ou força de penetração medida entre os sistemas surimi/amido houve diferença significativa (p<0,05) em quase todos os sistemas, quando comparados dois a dois, somente não havendo entre os sistemas contendo Amisol e Snow-flake.

Foi encontrado um bom coeficiente de correlação entre as viscosidades dos amidos com a força de penetração (r = 0,81, p<0,05) dos sistemas gelificados de surimi com adição de amido, bem como para os sistemas contendo carragena (r = 0,84, p<0,05). Esses resultados significam o importante papel das propriedades reológicas dos amidos na textura dos géis de surimi. Segundo KIM & LEE [10], o efeito do amido nas propriedades texturiais dos géis de surimi pode ser explicado pela seguinte teoria. Os grânulos de amido distribuídos na matriz protéica absorvem água, drenando-a das proteínas, à medida que incham durante o cozimento. Ao mesmo tempo, a matriz protéica perde umidade e se torna mais firme. Conforme os autores, essa teoria é suportada por estudos usando microscopia ótica e eletrônica para determinar a estrutura de géis de surimi aquecidos, incorporados de amido.

A análise de variância para os diferentes tipos de sistemas surimi/amido, sem adição de carragena, para o teste de compressão a 50% de deformação (dureza), resultou em diferença significativa (p<0,05) para o sistema surimi/Firm-tex (FT) em relação a todos os outros sistemas surimi/amido (Amisol, Fécula de mandioca e Snow-flake) e para o gel de surimi puro. Esse resultado já poderia ser esperado, pois o amido Firm-tex foi o que apresentou a mais alta viscosidade quando analisado em amilograma Brabender. Em relação ao surimi puro, o sistema surimi/Firm-tex apresentou uma diferença significativa a 99% de confiança (p<0,01).

O teste de compressão para os sistemas surimi/amido com adição de carragena (0,2%) quando comparados com os mesmos sistemas sem adição de carragena, apresentou uma alteração significativa (p<0,05) entre os sistemas surimi/Fécula de mandioca - surimi/Fécula de mandioca/carragena, e para os sistemas surimi/Fécula de mandioca - surimi puro. No teste de penetração, a presença de diferença significativa (p<0,05) só ocorreu também entre os sistemas surimi/fécula de mandioca e surimi/fécula de mandioca/carragena, não ocorrendo nas comparações entre os demais sistemas com o mesmo tipo de amido, com ou sem adição de carragena. Além disso, o sistema surimi/fécula de mandioca contendo carragena aumentou em 37,47% os valores obtidos no teste de penetração.

Em relação à elasticidade Sret (elasticidade recuperável retardada), verificamos que a adição de carragena diminuiu significativamente (p < 0,05) a elasticidade de todos os sistemas surimi/amido.

Os resultados de Sinst (elasticidade recuperável instantaneamente) também diminuíram para os sistemas surimi/amido/carragena, porém sendo significante somente para os sistemas contendo fécula de mandioca.

Ao compararmos os sistemas surimi/Firm-tex e surimi/Amisol com o surimi puro, não houve alterações significativas nos resultados obtidos para a Sret, porém quando adicionados de carragena, esses sistemas apresentaram mudanças significativas, diminuindo os valores em relação ao surimi puro. O que nos permite concluir que para todos os sistemas surimi/amido/carragena ocorreram uma diminuição da elasticidade Sret, provocada pelas moléculas de carragena.

Na Tabela 5, são dispostos os coeficientes de correlação entre os testes de penetração e compressão entre os diferentes sistemas. Observa-se, que quanto mais ingredientes possui um gel, menor o coeficiente de correlação entre penetração e compressão, pois o gel de surimi apresentou um coeficiente de 0,949, enquanto para o conjunto dos sistemas surimi/amido um coeficiente de 0,837 e para o conjunto dos sistemas surimi/amido/carragena um coeficiente de 0,675. A correlação entre as forças de penetração e compressão, para os sistemas surimi/amido, isoladamente, mostra o mais alto coeficiente de correlação para o sistema contendo o amido Amisol (0,906), e sendo decrescente na seguinte ordem: Fécula de mandioca (0,819) > Snow-flake (0,804) > Firm-tex (0,719). O que vem de encontro ao anunciado por LEE & CHUNG [13], onde o baixo coeficiente de correlação entre os testes de penetração e compressão visto nos géis com adição de ingredientes pode ser explicado por um aumento na capacidade de retenção de água da matriz do gel após a adição de amido ou proteínas.

CHUNG & LEE [7], afirmam que para uma formulação com sucesso no desenvolvimento de novos produtos a base de surimi, é importante a compreensão dos efeitos funcionais dos ingredientes na textura do produto final. As propriedades texturiais do produto refletem as características da estrutura de rede a qual se forma através da gelificação de proteínas, onde estão presentes interações proteína-proteína, proteína-solvente e proteína-ingredientes (biopolímeros).

4 – CONCLUSÕES

  1. O rendimento e a qualidade do surimi, como dos géis de surimi obtidos de carcaças residuais da filetagem industrial de tilápia (

    Oreochromis sp.) indicam o aproveitamento desse material como fonte de matéria-prima para a indústria de produtos à base de surimi.

  2. Os ensaios com géis de sistemas surimi/amido, provaram que houve fortalecimento do gel, quando comparado com o gel de surimi. Esse fortalecimento foi diretamente proporcional à viscosidade dos géis de amidos.

  3. A carragena provou ser um ingrediente que também pode ser utilizado, no entanto, apresentou um efeito marcante na diminuição da elasticidade dos géis.

5 – REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

2 Estudante Doutorando em química, UFSC.

3 PhD, Prof. Titular do Departamento de Ciência e Tecnologia de Alimentos da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), Rodovia Admar Gonzaga, 1346. Florianópolis/SC - 88034-001. beirão@cca.ufsc.br

*A quem a correspondência deve ser enviada.

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    Recebido para publicação em 20/06/98. Aceito para publicação em 17/05/99. Parte da Dissertação de Mestrado do primeiro autor.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      09 Fev 2000
    • Data do Fascículo
      Maio 1999

    Histórico

    • Aceito
      17 Maio 1999
    • Recebido
      20 Jun 1998
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