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Viscosidade de pasta, absorção de água e índice de solubilidade em água dos mingaus desidratados de arroz e soja

Pasting viscosity, water absorption and water solubility index of dehydrated rice-soybean porridges

Resumos

Foram estudadas viscosidade de pasta (VP), absorção de água (AA) e índice de solubilidade em água (ISA) dos mingaus desidratados elaborados com arroz e soja em diferentes proporções (100:0; 90:10; 80:20; 70:30; 60:40 e 50:50%), com finalidade de verificar a possibilidade de seus usos em produtos alimentícios. No processo para a obtenção de mingaus desidratados, utilizaram-se as etapas de processo de descascamento dos grãos de soja, branqueamento, desintegração de arroz e soja branqueados, homogeneização e secagem por atomização. Nas determinações, observou-se que houve aumento na temperatura de viscosidade máxima e no ISA, e uma diminuição na viscosidade máxima, na viscosidade mínima em temperatura constante, na viscosidade final no ciclo de resfriamento e na AA com o aumento das proporções de soja. Contudo, os valores numéricos para estas propriedades foram altos, sugerindo a possibilidade de uso dos mesmos como cereais matinais fortificados e alimentos infantis, ou como ingredientes para sua formulação, assim como em produtos cárneos e de panificação.

mingau desidratado; mistura de arroz e soja; viscosidade de pasta; absorção de água; índice de solubilidade em água


Dehydrated porridges containing rice and soybean in different proportions (100:0; 90:10; 80:20; 70:30; 60:40 and 50:50%) were assessed as to their pasting viscosity, water absorption (WA) and water solubility index (WSI) in order to verify their potential use as food ingredients. Steps for manufacture of the dehydrated porridge included: soybean seed dehulling, blanching, disintegration of blanched rice and soybean, homogenization and spray drying. The results indicated that increasing soybean proportions from 0 to 50% showed an increase in maximum viscosity temperature and WSI, a decrease in maximum viscosity, minimum viscosity at constant temperature, final viscosity at cooling cycle and WA. Numeric values associated with the studied properties remained relatively high consequently, the dehydrated rice-soybean porridges may be recommended as infant food or as an ingredient for baking and meat products.

dehydrated porridge; rice-soybean mixture; pasting viscosity; water absorption; water solubility index


Viscosidade de pasta, absorção de água e índice de solubilidade em água dos mingaus desidratados de arroz e soja1 1 Recebido para publicação em 14/04/99. Aceito para publicação em 21/12/99.

Luciana H. MAIA2 2 Departamento de Economia Doméstica – ICHS – UFRRJ. CEP 23851-970, Seropédica, RJ. , Sin H. WANG2 2 Departamento de Economia Doméstica – ICHS – UFRRJ. CEP 23851-970, Seropédica, RJ. ,* * A quem a correspondência deve ser enviada. , José L. R. ASCHERI3 3 CTAA-EMBRAPA, Av. das Américas, nº 29.501, CEP 23020-470, Guaratiba, RJ. , Lair C. CABRAL3 3 CTAA-EMBRAPA, Av. das Américas, nº 29.501, CEP 23020-470, Guaratiba, RJ. , Marilene S. FERNANDES2 2 Departamento de Economia Doméstica – ICHS – UFRRJ. CEP 23851-970, Seropédica, RJ.

RESUMO

Foram estudadas viscosidade de pasta (VP), absorção de água (AA) e índice de solubilidade em água (ISA) dos mingaus desidratados elaborados com arroz e soja em diferentes proporções (100:0; 90:10; 80:20; 70:30; 60:40 e 50:50%), com finalidade de verificar a possibilidade de seus usos em produtos alimentícios. No processo para a obtenção de mingaus desidratados, utilizaram-se as etapas de processo de descascamento dos grãos de soja, branqueamento, desintegração de arroz e soja branqueados, homogeneização e secagem por atomização. Nas determinações, observou-se que houve aumento na temperatura de viscosidade máxima e no ISA, e uma diminuição na viscosidade máxima, na viscosidade mínima em temperatura constante, na viscosidade final no ciclo de resfriamento e na AA com o aumento das proporções de soja. Contudo, os valores numéricos para estas propriedades foram altos, sugerindo a possibilidade de uso dos mesmos como cereais matinais fortificados e alimentos infantis, ou como ingredientes para sua formulação, assim como em produtos cárneos e de panificação.

Palavras-chave: mingau desidratado, mistura de arroz e soja, viscosidade de pasta, absorção de água, índice de solubilidade em água.

SUMMARY

Pasting viscosity, water absorption and water solubility index of dehydrated rice-soybean porridges. Dehydrated porridges containing rice and soybean in different proportions (100:0; 90:10; 80:20; 70:30; 60:40 and 50:50%) were assessed as to their pasting viscosity, water absorption (WA) and water solubility index (WSI) in order to verify their potential use as food ingredients. Steps for manufacture of the dehydrated porridge included: soybean seed dehulling, blanching, disintegration of blanched rice and soybean, homogenization and spray drying. The results indicated that increasing soybean proportions from 0 to 50% showed an increase in maximum viscosity temperature and WSI, a decrease in maximum viscosity, minimum viscosity at constant temperature, final viscosity at cooling cycle and WA. Numeric values associated with the studied properties remained relatively high consequently, the dehydrated rice-soybean porridges may be recommended as infant food or as an ingredient for baking and meat products.

Keywords: dehydrated porridge, rice-soybean mixture, pasting viscosity, water absorption, water solubility index.

1 – INTRODUÇÃO

A soja tem sido reconhecida como excelente fonte de proteína para fortificar produtos de cereais como arroz, através da complementação mútua de aminoácidos e do aumento no teor de proteínas totais [3, 9, 28].

Entretanto, o interesse da indústria de alimentos por produtos desenvolvidos a partir de ingredientes protéicos, não se deve somente às suas características nutricionais, senão também às suas propriedades funcionais, as quais definem as suas aplicações comerciais [16, 18, 33]. O conhecimento das propriedades funcionais não é importante só para determinar a qualidade de um produto final, mas também para delinear e otimizar processos [18].

GANTWERKER & LEONG [12] obtiveram um mingau desidratado e instantâneo, através da utilização de uma mistura gelatinizada de farinha de cereal-água, submetida posteriormente a uma deformação mecânica.

Géis de amido são compostos de grânulos de amido intumescidos numa matriz de amilose, sendo que grânulos gelatinizados reforçam as suas estruturas [23]. A viscosidade inicial, dureza, fraturabilidade e capacidade de retenção de água do gel de isolado protéico de soja mostraram correlações positivas com a absorção de água do isolado protéico. A coesividade, entretanto, foi negativamente afetada [11].

Os produtos extrusados produzidos com farinha de arroz fortificada com isolado protéico de soja apresentaram uma ligeira diminuição na capacidade de absorção de água, quando comparados com o extrudado apenas à base da farinha de arroz [21].

A absorção de água e a solubilidade do isolado protéico de soja foram afetadas diferentemente em conseqüência da modificação dos seguintes parâmetros: a) grau de desnaturação de proteína, b) hidrofobicidade superficial e c) número de grupos de sulfidrila [32].

A solubilidade é uma das propriedades físicas mais importantes da proteína de soja. A maior parte das proteínas são as globulinas solúveis em água ou em soluções salinas diluídas em pHs acima ou abaixo do seu ponto isoelétrico, as quais são proteínas hidrofílicas [33].

Pelo fato das proteínas da soja apresentarem propriedades funcionais de crescente aplicação e importância na industrialização de alimentos, realizou-se o presente trabalho. O objetivo foi estudar a viscosidade de pasta, a absorção de água e o índice de solubilidade na água dos mingaus desidratados de arroz e soja em diferentes proporções, verificando-se suas contribuições na melhoria de características tecnológicas de diversos produtos alimentares.

2 – MATERIAL E MÉTODOS

2.1 – Matéria-prima

As matérias-prima utilizadas para os estudos foram: grãos de arroz Oryza sativa, L. branco e de soja Glycine max (L.) Merril (cultivar BR-16, safra de 1998), adquiridos do comércio e da Embrapa-SPSB (Ponta Grossa - PR), respectivamente.

Todas as análises químicas, a obtenção do mingau desidratado e a atividade do inibidor de tripsina que se seguem, foram feitas em triplicata.

2.2 – Composição centesimal aproximada dos grãos de arroz e soja

As seguintes determinações foram realizadas: umidade, extrato etéreo, proteína bruta e cinzas, segundo AACC [1], e fibra bruta, conforme VAN DE KAMER & VAN GINKEL [30].

2.3 – Obtenção do mingau desidratado

Os grãos de soja foram descascados, usando-se um descascador mecânico para grãos. Os grãos de soja descascados e o arroz foram, separadamente, branqueados com água em ebulição na proporção de matéria-prima:água de 1:5 e 1:4, durante 20 e 10min, respectivamente. Em seguida, a água de branqueamento da soja foi drenada. Entretanto, a água de branqueamento do arroz foi utilizada. O arroz e os grãos de soja descascados, ambos branqueados, foram misturados nas respectivas proporções de 100:0; 90:10; 80:20; 70:30; 60:40 e 50:50% (base seca), correspondendo, respectivamente, ao controle e às fórmulas I, II, III, IV e V. As misturas foram desintegradas com água em ebulição, num moinho de facas e martelo, passando em peneira de 0,5mm., obtendo-se assim suspensões com aproximadamente 6-8% de sólidos. Estas misturas foram homogeneizadas a 70ºC e 5.000 psi, obtendo-se, então, os mingaus líquidos. O controle e as cinco fórmulas de mingau líquido assim obtidos foram secos por atomização com temperatura de entrada e saída de 200 e 90ºC, respectivamente, tendo como produtos finais mingaus desidratados controle, I, II, III, IV e V.

2.4 – Classificação granulométrica do mingau desidratado

Sessenta gramas de mingau desidratado foram peneirados, durante 15min, num conjunto de sete peneiras arredondadas vibratórias, com as aberturas das malhas variando de 20mesh (0,84 mm) a 200mesh (0,074 mm). As quantidades retidas em cada peneira foram pesadas e expressas em percentagens.

2.5 – Composição centesimal aproximada do mingau desidratado

Foi feita conforme métodos definidos no item 2.2.

2.6 – Determinação da atividade do inibidor de tripsina do mingau desidratado

Foi determinada segundo o método original de Kunitz, conforme descrito por KAKADE et al. [17], consistindo na digestão da caseína pela enzima tripsina, onde se determinou sua atividade pela introdução do inibidor dos mingaus submetidos ou não, à fervura.

Considerando-se a definição de unidade de tripsina (UT) como sendo o aumento de 0,01 unidade de absorbância a 280nm nas condições do teste, calcularam-se as unidades de tripsina inibida (UTI) pela diferença entre as unidades de tripsina totais (UT) da atividade máxima e as da amostra contendo o inibidor.

2.7 – Viscosidade de pasta

A viscosidade de pasta foi determinada num viscoamilógrafo Brabender, seguindo-se basicamente, a metodologia de MAZURS et al. [19]. Foram utilizadas suspensões de mingau desidratado a 20% (base seca) em água destilada e os resultados obtidos foram expressos em unidades amilográficas (U.A.).

2.8 – Absorção de água (AA)

A absorção de água foi determinada segundo o método descrito por SOSULSKI [27].

2.9 – Índice de solubilidade em água (ISA)

O índice de solubilidade em água foi determinado conforme o método descrito por ANDERSON et al. [2].

2.10 – Análise estatística

Para a obtenção de dados de granulometria e composição centesimal aproximada, usou-se o Delineamento Inteiramente Casualizado (DIC), onde foram feitas análises de variância, com posterior comparação das diferenças entre as médias pelo teste de Tukey ao nível de 5% de probabilidade.

Para os resultados da VP, da AA e do ISA, foram feitas análises estatísticas quantitativas, através de equações de regressão a 95% de confiabilidade com base nos coeficientes de determinação (R2) apresentados. Foram determinados os coeficientes de correlação entre os parâmetros relacionados.

Todas as análises estatísticas foram realizadas, segundo os métodos descritos em PIMENTEL-GOMES [22].

3 – RESULTADOS E DISCUSSÃO

A Tabela 1 apresenta, em base seca, a composição centesimal aproximada dos grãos de arroz e soja.

Através desta tabela, verifica-se que a soja apresentou maiores teores de proteína, extrato etéreo, cinzas e fibra bruta que o arroz. Entretanto, os grãos de soja descascados mostraram teor de extrato etéreo maior que os da soja integral. O alto teor de fibra bruta encontrado para a soja integral indica que a casca contém maior quantidade deste componente. O arroz mostrou o maior teor de carboidratos.

A distribuição do tamanho de partícula e a composição centesimal aproximada (base seca) dos mingaus desidratados elaborados com arroz e soja em diferentes proporções estão apresentadas nas Tabelas 2 e 3, respectivamente.

Observa-se pela Tabela 2, que houve um aumento nos tamanhos de partículas dos mingaus desidratados com o aumento das proporções de soja (0 a 50%). Para os mingaus desidratados IV e V, contendo respectivamente 40 e 50% de soja, 89,82 e 93,20% das partículas foram retidos nas peneiras de 20 e 40 mesh, enquanto que para os mingaus desidratados II e III, correspondentes a 20 e 30% de soja respectivamente, 96,57 e 94,11% foram retidos nas peneiras de 40 e 60 mesh. Por outro lado, o mingau desidratado I, contendo 10% de soja, mostrou sua maior retenção de partículas (96,48%) nas peneiras de 40 a 80mesh. Quanto ao mingau desidratado controle (0% de soja), 86,11% das partículas foram retidas nas peneiras de 80 a 200mesh.

Verifica-se pela Tabela 3, que os teores de proteína (9,52 a 27,69%), extrato etéreo (0,35 a 7,94%), cinzas (0,62 a 2,07%) e fibra bruta (0,44 a 1,64%) aumentaram com o incremento das proporções de soja (0 a 50%), sendo que o aumento mais notável foi nos teores de proteína. Concomitantemente, o percentual de carboidrato (89,07 a 60,66%) diminuiu com o aumento das proporções de soja. Estes resultados eram esperados e concordam com os encontrados por CRUZ et al. [8].

Atividade residual do inibidor de tripsina não foi observada nos mingaus desidratados estudados, mostrando que o branqueamento da soja em água fervente durante 20min antes de sua desintegração foi o suficiente para inativá-lo. Resultado semelhante foi verificado por SOETRISNO et al. [26] e BORGES et al. [5].

Os resultados da viscosidade de pasta, da absorção de água (AA) e do índice de solubilidade em água (ISA) dos mingaus desidratados elaborados com arroz e soja estão apresentados nas Tabelas 4 e 5.

Nos resultados das Tabelas 4 e 5, observa-se que com o aumento das proporções de soja (0 a 50%) nos mingaus desidratados, houve um aumento na temperatura de viscosidade máxima e uma diminuição na viscosidade máxima, na viscosidade mínima à temperatura constante e na viscosidade final no ciclo de resfriamento, sendo todas elas representadas pelas equações lineares exceto para a temperatura de viscosidade máxima que é representada pela equação quadrática.

A temperatura de viscosidade máxima (57,5ºC) do mingau desidratado do arroz (100%, controle) foi maior que aquela (44,5ºC) da canjiquinha encontrada por BORGES et al. [5]. Este resultado entretanto, é contrário ao observado por TSAI et al. [29], os quais verificaram que o amido de milho começa seu intumescimento a 60-85ºC, enquanto que o de arroz intumesce moderadamente a 55-65ºC. Os resultados diferentes se devem ao fato de que, tanto o amido de arroz quanto o de canjiquinha tenham sido pré-gelatinizados durante o processo de branqueamento para a obtenção de seus respectivos mingaus desidratados, sendo que o grau de pré-gelatinização para o arroz foi, provavelmente, menor que o da canjiquinha.

A temperatura de viscosidade máxima aumentou (de 57,5 a 84ºC) com o aumento das proporções de soja nos mingaus desidratados de arroz e soja. Resultado semelhante foi encontrado por BORGES et al. [5], os quais relataram que a adição de soja (0 a 50%) à canjiquinha resultou num aumento de temperatura da viscosidade máxima.

Segundo SILVEIRA et al. [25], o amido é o principal componente responsável pela viscosidade e, com o aumento da soja nas farinhas compostas de arroz e soja, diminui-se a quantidade de amido presente, resultando na diminuição de viscosidade. Outro fator que pode também contribuir para o decréscimo da viscosidade, é a diminuição da água disponível para a gelatinização do amido por sua interação com a proteína.

De acordo com VIJAYAGOPAL et al. [31], a presença de amidos solúveis e a interação entre os grânulos intumescidos são responsáveis pela viscosidade de uma suspensão de amido gelatinizado, de tal forma que a diminuição da concentração de amido causa decréscimo no número de grânulos e conseqüentemente, na viscosidade numa mesma temperatura.

EL-SAIED et al. [10] constataram que o conteúdo de proteína é negativamente correlacionado com a viscosidade máxima. A proteína pode atuar como uma barreira física para o intumescimento do amido, uma vez que os grânulos de amido são encaixados na matriz de proteína.

Desta forma, sugere-se que no presente trabalho, a diminuição dos teores de amido e o aumento dos conteúdos de proteína (de 9,52 a 27,69%) nos mingaus desidratados, tenha explicado os resultados verificados. Acredita-se também que, o aumento dos teores de extrato etéreo (de 0,35 a 7,94%) tenha contribuído para o decréscimo da viscosidade, pois conforme HIBI [14], o lipídio se complexa com a amilose, causando uma diminuição na quantidade de carboidrato solubilizado e no intumescimento do amido, sendo os mesmos importantes na viscosidade.

De acordo com MAZURS et al. [19], a viscosidade final no ciclo de resfriamento reflete o grau de retrogradação da amilose. Com base nos resultados apresentados nas Tabelas 4 e 5, verifica-se que ocorreu a retrogradação da amilose, pois os valores numéricos de viscosidade final no ciclo de resfriamento foram maiores que aqueles da viscosidade mínima à temperatura constante. A tendência à retrogradação é menor com o aumento das proporções de soja. Estes resultados são semelhantes aos observados por BORGES et al. [5]. No entanto, a retrogradação da amilose foi menor nos mingaus desidratados de arroz e soja que nos de canjiquinha e soja.

TSAI et al. [29] relataram que o milho apresenta maior conteúdo de amilose ( 33%) do que o arroz ( 20%). HIBI [14] constatou que a formação de um complexo helicoidal insolúvel entre amilose e lipídio resulta num retardamento da lixiviação da amilose dos grânulos e conseqüentemente, uma menor retrogradação. Acredita-se portanto, que a diminuição no teor de amido (especialmente no de amilose) e/ou aumento no conteúdo de lipídio tenham contribuído para o decréscimo da retrogradação.

Os mingaus desidratados III, IV e V, contendo respectivamente 30, 40 e 50% de soja, mostraram valores relativamente altos de viscosidade máxima (de 255 a 185 U.A.) e pouca retrogradação, indicando a possibilidade de sua utilização como cereais matinais fortificados, alimentos infantis, ou ingredientes para seus preparos.

As Tabelas 4 e 5 apresentam efeitos do aumento das proporções de soja sobre a absorção de água (AA) dos mingaus desidratados de arroz e soja. Nota-se que os valores da AA diminuíram de forma linear, à medida que aumentava a proporção de soja. Este resultado é semelhante aos encontrados por CHAUHAN & BAINS [6] e NOGUCHI et al. [21] em produtos extrudados feitos com mistura de arroz e soja.

De acordo com NOGUCHI et al. [21] o isolado protéico de soja diminuiu a AA do amido de arroz, indicando que a proteína não contribuiu para a AA de produtos extrudados. A AA é o resultado, não só do amido gelatinizado, mas também dos componentes insolúveis.

NATH & RAO [20] constataram a existência de uma conformação de proteína, que permite que os sítios ligantes sejam estericamente disponíveis para a interação com as moléculas de água. O impedimento estérico destes sítios resulta em baixos valores de AA.

Conforme WAGNER & AÑON [32], a alta hidrofobicidade superfícial das proteínas desnaturadas do isolado protéico de soja promove a formação de uma matriz protéica (estabilizada pelas interações hidrofóbicas) capaz de reter quantidade significativa de água na sua estrutura. Além disso, o baixo número de grupos sulfidrila (-SH) também é um fator determinante da AA. Num conteúdo semelhante de grupos -SH, aumento na hidrofobicidade da estrutura protéica produz incremento da AA; enquanto que na mesma hidrofobicidade, o aumento de grupos -SH induz à perda da AA. Por outro lado, numa proteína completamente desnaturada, é encontrada uma baixa AA.

Assim, no presente trabalho sugere-se que, o efeito do amido de arroz sobre a AA seja mais importante do que o da proteína da soja, pois a diminuição dos teores de amido, associada ao aumento de proteína dos mingaus resultou na redução da AA.

O aumento dos teores de extrato etéreo (0,35 a 7,94%) com o aumento das proporções de soja pode diminuir também a AA, uma vez que, SCHAFFNER & BEUCHAT [24] constataram que o conteúdo alto de lipídio pode reduzir a AA do leite de amendoim em pó liofilizado, por não ter afinidade com a água.

Segundo BAKAR & HIN [3] e BÄR [4], quanto menor a granulometria da farinha, maior é a AA. Assim, como o resultado já apresentado na Tabela 2, todos os mingaus desidratados contendo de 0 a 50% de soja, mostraram respectivamente, ordem crescente quanto ao tamanho de partícula, indicando a sua importante contribuição para a AA.

A AA é uma propriedade relevante para aplicações em produtos cárneos, pães e bolos, segundo JAMES & SLOAN [16], para os quais, valores altos da AA são importantes para ajudar a manter umidade dos mesmos. Desta forma, os valores altos da AA encontrados em todos os mingaus desidratados de arroz e soja estudados são considerados bastante desejáveis na utilização destes nos produtos cárneos e da panificação, pois permite a adição de mais água à massa, melhorando suas características de manuseio.

As Tabelas 4 e 5 ilustram também os resultados do índice de solubilidade em água (ISA) dos mingaus desidratados de arroz e soja. Observa-se que o ISA aumentou linearmente com o aumento das proporções de soja nos mingaus desidratados. Resultado semelhante foi encontrado por CHAUHAN & BAINS [6] e SILVEIRA et al. [25], respectivamente, em produtos extrudados e farinhas compostas de arroz e soja, sendo que, CHAUHAN & BAINS [6] atribuíram esse aumento ao maior conteúdo de proteínas solúveis na farinha de soja desengordurada.

Acredita-se que, o ISA esteja também relacionado com a retrogradação da amilose, pois segundo HIBI [14], a retrogradação da amilose diminui a solubilidade em água.

O ISA dos mingaus desidratados se correlacionou negativamente com a AA, apresentando coeficiente de correlação = -0,9510, significativo ao nível de 5% de probabilidade.Segundo HUTTON & CAMPBELL [15], a solubilidade e a AA podem ser relacionadas até certo ponto, talvez até a máxima hidratação, além da qual a solubilidade pode continuar a aumentar, mas a hidratação não. Pode também ocorrer o contrário, CHEFTEL et al. [7] afirmaram que a AA aumenta com a diminuição de solubilidade.

WAGNER & AÑON [32] constataram que, a AA e a solubilidade envolvem diferentes mecanismos que dependem de diversos fatores. De acordo com HAYAKAWA & NAKAI [13], não é só a hidrofobicidade que determina a solubilidade da proteína, mas também os grupos -SH estão relacionados com a insolubilização de proteínas de soja. Quanto à AA, conforme WAGNER & AÑON [32], a alta hidrofobicidade superficial combinada com o baixo número de grupos - SH na estrutura, contribuem para a alta AA.

4 – CONCLUSÕES

  • aumento das proporções de soja (0 a 50%) nos mingaus desidratados de arroz e soja resultou em aumento da temperatura de viscosidade máxima e do índice de solubilidade em água. Contudo, a viscosidade máxima, a viscosidade mínima à temperatura constante, a viscosidade final no ciclo de resfriamento e a absorção de água diminuíram com o aumento das proporções de soja (0 a 50%).

  • Os mingaus desidratados de arroz e soja com até 40% de soja são recomendados para o uso em cereais matinais fortificados, alimentos infantis, bolos, pães e produtos cárneos, enquanto que aqueles com 70:30; 60:40 e 50:50% de arroz:soja, respectivamente, são considerados mais importantes para o uso de bebidas.

5 – REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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    Recebido para publicação em 14/04/99. Aceito para publicação em 21/12/99.
  • 2
    Departamento de Economia Doméstica – ICHS – UFRRJ. CEP 23851-970, Seropédica, RJ.
  • 3
    CTAA-EMBRAPA, Av. das Américas, nº 29.501, CEP 23020-470, Guaratiba, RJ.
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    A quem a correspondência deve ser enviada.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      21 Ago 2000
    • Data do Fascículo
      Dez 1999

    Histórico

    • Aceito
      21 Dez 1999
    • Recebido
      14 Abr 1999
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