Acessibilidade / Reportar erro

Efeito de probiótico na modulação dos níveis de colesterol sérico e no peso do fígado de ratos alimentados com dieta rica em colesterol e ácido cólico

Evaluation of the probiotic effect in the modulation of the levels of seric cholesterol and in the weight of the liver of mices fed with rich diet in cholesterol and colic acid

Resumos

Alimentos contendo probióticos são conhecidos como funcionais e têm sido recomendados para indivíduos com hipercolesterolemia. Com o objetivo de avaliar seu efeito na modulação dos níveis de colesterol sérico, foi conduzido um estudo de 28 dias, utilizando-se 90 ratos machos Wistar, distribuídos entre os tratamentos: Padrão, com 30 animais e Controle, LDR (Leite Desnatado Reconstituído) e P (Probiótico), com 20 animais cada. O grupo Padrão recebeu a dieta AIN-93G durante todo o período experimental. Os demais grupos receberam a mesma dieta acrescida de 1% de colesterol e 0,1% de ácido cólico. Do 15º ao 28º dia, o grupo LDR recebeu 0,1mL/dia/animal de leite desnatado reconstituído a 10% de sólidos não gordurosos e o grupo P, recebeu 0,1mL/dia/animal de probiótico contendo 10(10) UFC/mL de Lactobacillus acidophilus NCFM. Avaliou-se o colesterol total, LDL-colesterol e HDL-colesterol e o peso do fígado, imediatamente após o término da administração do probiótico, onde os ratos tiveram o fígado retirado e o sangue coletado por punção cardíaca. A adição de colesterol e ácido cólico à dieta não elevou (p>0,05) os níveis de colesterol do grupo Controle, LDR e P em relação ao grupo Padrão, no entanto, promoveu aumento significativo de peso (p<0,05) do fígado e alteração da coloração normal do mesmo (de vermelho vivo para vermelho pálido) devido à deposição de gordura neste órgão. Assim, a dieta rica em colesterol e ácido cólico não promoveu hipercolesterolemia nos animais, mas induziu fígado gorduroso nos mesmos. Em conseqüência, o consumo de L. acidophilus não alterou (p>0,05) os níveis de colesterol sérico dos animais, uma vez que estes níveis se mantiveram normais durante todo o período experimental. Observou-se também que a administração de probiótico não impediu o acúmulo de gordura no fígado dos animais que receberam dieta rica em colesterol e ácido cólico.

L. acidophilus; modulação; colesterol; hipercolesterolemia


Probiotics are known as functional foods and have been recommended as dietary adjunct for individuals with high serum cholesterol levels. To evaluate probiotics effects on the modulation of serum cholesterol an experiment was carried out during 28 days, using 90 Wistar male rats, distributed in four treatments and individually housed, with initial average weight of 250±32g. The experimental groups were: Standard; Control; LDR and P. The Standard group received the AIN-93G diet during the whole experimental period. The other groups received for 28 days the AIN-93G diet added of 1% of cholesterol and 0,1% of cholic acid. Of the 15th to the 28th day (after an initial period of 14 days of hipercolesterolemia induction) the LDR group received the supplement of 0,1mL/day/animal of reconstituted skimmed milk at 10% of non fat solids and, the group P received 0,1mL/day/animal of a probiotic in the form of a concentrate of cells contends 10(10)UFC/mL of Lactobacillus acidophilus NCFM. Total cholesterol, high density lipoprotein (HDL) and low density lipoprotein (LDL) were evaluated at 28th days of experiment (immediately after the end of probiotic administration). The dietary increment of 1% of crystalline cholesterol and 0,1% of cholic acid did not promote hipercholesterolemia in the animals, evidenced by the non significant difference (p>0,05) of levels of total cholesterol, LDL-cholesterol and HDL-cholesterol among the groups Standard, Control, LDR and P after 14 days receiving hipercholesterolemic diet. However it provoked significant increase of the weight and alteration of normal coloration of liver (of red intense for red yellowish) due to fat accumulation in this organ, in the animals that received rich diet in cholesterol compared to the Standard group. Thus, rich diet in cholesterol and colic acid did not promote hipercholesterolemia in the animals, but it induced fat liver in the same. In consequence, the consumption of L. acidophilus did not alter (p>0,05) the levels of serum cholesterol of the animals, once these levels stayed normal during the whole experimental period. It was also observed that the probiotic administration did not impede the fat accumulation in the liver of the animals that received rich diet cholesterol and colic acid.

L. acidophilus; modulation; cholesterol; hipercholesterolemia


Efeito de probiótico na modulação dos níveis de colesterol sérico e no peso do fígado de ratos alimentados com dieta rica em colesterol e ácido cólico

Evaluation of the probiotic effect in the modulation of the levels of seric cholesterol and in the weight of the liver of mices fed with rich diet in cholesterol and colic acid

Dayse Fontes MachadoI,* * A quem a correspondência deve ser enviada Célia Lúcia L.F. FerreiraI; Neuza M. Brunoro CostaII; Tânia Toledo de OliveiraIII

IDepartamento de Tecnologia de Alimentos. Av. Anastácio, 2409, Bloco 2, apto. 81 Parque São Domingos - São Paulo - SP CEP: 05119 - 000 TEL: 11 3902 5480

IIDepartamento de Nutrição e Saúde, Universidade Federal de Viçosa

IIIDepartamento de Bioquímica e Biologia Molecular, Universidade Federal de Viçosa

RESUMO

Alimentos contendo probióticos são conhecidos como funcionais e têm sido recomendados para indivíduos com hipercolesterolemia. Com o objetivo de avaliar seu efeito na modulação dos níveis de colesterol sérico, foi conduzido um estudo de 28 dias, utilizando-se 90 ratos machos Wistar, distribuídos entre os tratamentos: Padrão, com 30 animais e Controle, LDR (Leite Desnatado Reconstituído) e P (Probiótico), com 20 animais cada. O grupo Padrão recebeu a dieta AIN-93G durante todo o período experimental. Os demais grupos receberam a mesma dieta acrescida de 1% de colesterol e 0,1% de ácido cólico. Do 15º ao 28º dia, o grupo LDR recebeu 0,1mL/dia/animal de leite desnatado reconstituído a 10% de sólidos não gordurosos e o grupo P, recebeu 0,1mL/dia/animal de probiótico contendo 1010 UFC/mL de Lactobacillus acidophilus NCFM. Avaliou-se o colesterol total, LDL-colesterol e HDL-colesterol e o peso do fígado, imediatamente após o término da administração do probiótico, onde os ratos tiveram o fígado retirado e o sangue coletado por punção cardíaca. A adição de colesterol e ácido cólico à dieta não elevou (p>0,05) os níveis de colesterol do grupo Controle, LDR e P em relação ao grupo Padrão, no entanto, promoveu aumento significativo de peso (p<0,05) do fígado e alteração da coloração normal do mesmo (de vermelho vivo para vermelho pálido) devido à deposição de gordura neste órgão. Assim, a dieta rica em colesterol e ácido cólico não promoveu hipercolesterolemia nos animais, mas induziu fígado gorduroso nos mesmos. Em conseqüência, o consumo de L. acidophilus não alterou (p>0,05) os níveis de colesterol sérico dos animais, uma vez que estes níveis se mantiveram normais durante todo o período experimental. Observou-se também que a administração de probiótico não impediu o acúmulo de gordura no fígado dos animais que receberam dieta rica em colesterol e ácido cólico.

Palavras-chave:L. acidophilus; modulação; colesterol; hipercolesterolemia.

SUMMARY

Probiotics are known as functional foods and have been recommended as dietary adjunct for individuals with high serum cholesterol levels. To evaluate probiotics effects on the modulation of serum cholesterol an experiment was carried out during 28 days, using 90 Wistar male rats, distributed in four treatments and individually housed, with initial average weight of 250±32g. The experimental groups were: Standard; Control; LDR and P. The Standard group received the AIN-93G diet during the whole experimental period. The other groups received for 28 days the AIN-93G diet added of 1% of cholesterol and 0,1% of cholic acid. Of the 15th to the 28th day (after an initial period of 14 days of hipercolesterolemia induction) the LDR group received the supplement of 0,1mL/day/animal of reconstituted skimmed milk at 10% of non fat solids and, the group P received 0,1mL/day/animal of a probiotic in the form of a concentrate of cells contends 1010UFC/mL of Lactobacillus acidophilus NCFM. Total cholesterol, high density lipoprotein (HDL) and low density lipoprotein (LDL) were evaluated at 28 th days of experiment (immediately after the end of probiotic administration). The dietary increment of 1% of crystalline cholesterol and 0,1% of cholic acid did not promote hipercholesterolemia in the animals, evidenced by the non significant difference (p>0,05) of levels of total cholesterol, LDL-cholesterol and HDL-cholesterol among the groups Standard, Control, LDR and P after 14 days receiving hipercholesterolemic diet. However it provoked significant increase of the weight and alteration of normal coloration of liver (of red intense for red yellowish) due to fat accumulation in this organ, in the animals that received rich diet in cholesterol compared to the Standard group. Thus, rich diet in cholesterol and colic acid did not promote hipercholesterolemia in the animals, but it induced fat liver in the same. In consequence, the consumption of L. acidophilus did not alter (p>0,05) the levels of serum cholesterol of the animals, once these levels stayed normal during the whole experimental period. It was also observed that the probiotic administration did not impede the fat accumulation in the liver of the animals that received rich diet cholesterol and colic acid.

Keywords: L. acidophilus; modulation; cholesterol; hipercholesterolemia.

1 - INTRODUÇÂO

No Brasil, as doenças cardiovasculares são responsáveis por cerca de 300 mil falecimentos por ano, ou seja, 820 por dia. Nos Estados Unidos, são responsáveis por 70 a 80% das mortes de pessoas com mais de 65 anos e de acordo com estimativa, no ano 2003, um em cada cinco indivíduos terá mais de 65 anos [23].

A Organização Mundial de Saúde - OMS [19] ressalta que o aumento da expectativa de vida de uma população está diretamente relacionada com a prevenção das doenças cardiovasculares.

O risco destas doenças, que incluem o infarto e a aterosclerose, tem sido continuamente associado a níveis elevados de colesterol sangüíneo e pequena redução do seu nível plasmático está relacionada a um decréscimo significativo desse risco [2].

Sabe-se que o principal papel da dieta é fornecer nutrientes para satisfazer os requerimentos de uma alimentação balanceada e ao mesmo tempo proporcionar um sentimento de satisfação e bem-estar ao comensal.

Mais recentemente, estudos têm sugerido que a dieta também controla e modula várias funções do corpo e contribui para o estado de boa saúde necessário para reduzir o risco de algumas doenças [24].

O termo probiótico surge neste contexto, como uma forma de garantir benefícios específicos à saúde de diferentes populações [24].

FULLER [9] definiu probiótico como um adjunto dietético, onde o microrganismo viável afeta beneficamente o hospedeiro pelo estabelecimento do balanço desejável da microbiota intestinal produzindo vários efeitos terapêuticos.

Entre os papéis potencialmente benéficos desses microrganismos, são citadas a ativação do sistema imune, efeito na encefalopatia portal sistêmica, atividade anticarcinogênica, síntese de vitaminas do complexo B, melhora na digestão da lactose por indivíduos lactase não persistentes e a modulação dos níveis de colesterol sérico [27].

O primeiro relato científico relacionando bactérias do ácido lático e diminuição do colesterol sérico foi em 1974 por MANN E SPOERRY [18] que observaram que a inclusão de leite fermentado por uma estirpe "selvagem" de lactobacilos na dieta de guerreiros de uma tribo africana que se alimentavam com dieta rica em gordura e colesterol, reduziu em 18% o nível de colesterol sérico total.

Posteriormente, outros trabalhos demonstraram o efeito de microrganismos probióticos na modulação do colesterol sangüíneo, como o de GILLILAND et al [12] que utilizando suínos alimentados com dieta rica em colesterol suplementada com L. acidophilus, revelaram uma redução significativa nas concentrações de colesterol sérico no grupo que recebeu a suplementação, em relação ao grupo controle.

Entretanto, os resultados de vários outros estudos são ainda bastante conflitantes [1, 13, 15, 21] e os mecanismos implicados na modulação dos níveis de colesterol sérico por probióticos ainda são obscuros.

Algumas hipóteses têm sido propostas na tentativa de elucidar o mecanismo envolvido, indicando ainda a necessidade de muita pesquisa para se chegar a um consenso.

Segundo, GILLILAND et al [12] certos microrganismos atuam na redução dos níveis de colesterol sangüíneo de forma indireta, desconjugando ou desidroxilando os sais biliares conjugados e de acordo com Eyssen [8] a diminuição dos ácidos biliares por desconjugação bacteriana é compensada, para manter o equilíbrio necessário ao organismo, pelo aumento do catabolismo do colesterol, que determina uma redução do colesterol total. Além disso, os ácidos biliares desconjugados absorvem baixa quantidade de lipídios no trato-intestinal comparado com os ácidos biliares conjugados. Isso pode influenciar o nível de colesterol sangüíneo, visto que ocorre uma redução na absorção de colesterol no intestino.

Deste modo, o presente estudo objetivou investigar o efeito de probiótico sobre a modulação dos níveis de colesterol sérico em ratos recebendo uma dieta rica em colesterol e ácido cólico, visto que, muitos estudos ainda são necessários para demonstrar, de fato, essa atividade in vivo.

2 - MATERIAL E MÉTODOS

2.1 - Origem e manutenção da cultura

A cultura de Lactobacillus acidophilus NCFM, de origem humana, foi obtida no Banco de Culturas do Laboratório de Culturas Láticas do Departamento de Tecnologia de Alimentos da Universidade Federal de Viçosa.

Para a confirmação de sua identidade, a cultura foi submetida à coloração de Gram, e aos testes da catalase e da fermentação dos principais açúcares.

2.2 - Obtenção do concentrado de células de L. acidophilus NCFM

A cultura de L. acidophillus NCFM foi ativada em caldo MRS. Após crescimento, seguiu-se centrifugação a 2000 x g por 20 minutos e ressuspensão em LDR 10% de sólidos não gordurosos. O concentrado celular, que constitui-se de 1010 UFC/mL, foi preparado a cada dois dias e mantido sob refrigeração até o momento da administração aos animais.

2.3 - Dietas experimentais

As dietas experimentais foram preparadas de acordo com a dieta padrão para roedores AIN-93G, segundo Reeves et al [22] modificada pela substituição de 3,5% de óleo de soja por gordura hidrogenada, como fonte de gordura saturada para intensificar o efeito hipercolesterolêmico da dieta. A composição das dietas experimentais (Padrão, Controle, LDR e P) está indicada no Quadro 1.


Adicionaram-se colesterol cristalino (1g/100g de dieta) e ácido cólico (0,1g/100g de dieta) às dietas Controle, LDR e P, para a produção de hipercolesterolemia nos animais, com base no estudo feito por COSTA [6] onde esta adição foi eficaz em induzir hipercolesterolemia moderada em ratos. A elevação do nível de colesterol total foi de 49% para o grupo Controle (dieta hipercolesterolêmica) em relação ao Padrão (dieta livre de colesterol).

2.4 - Ensaio Biológico

Utilizaram-se 90 ratos machos Wistar, com peso médio inicial de 250 ± 32g, os quais foram mantidos por 28 dias em gaiolas individuais em ambiente com temperatura de 26 ± 2ºC e ciclo claro-escuro de 12 horas. Os animais foram distribuídos em quatro grupos experimentais, sendo Padrão (dieta AIN-93G); Controle (dieta Padrão + 1% de colesterol cristalino + 0,1% de ácido cólico); LDR (dieta Controle + 0,1mL/dia de leite desnatado reconstituído a 10% de sólidos não gordurosos) e P (dieta Controle + 0,1mL/dia de probiótico, na forma de um concentrado de células contendo 1010 UFC/mL de L. acidophilus NCFM viáveis).

No 1º dia de experimentação, 10 animais do grupo Padrão foram sacrificados para a determinação dos níveis basais de colesterol sangüíneo.

A seguir, o estudo foi dividido em 2 fases de monitoramento, sendo:

1a fase: Indução da hipercolesterolemia

Esta fase teve duração de 14 dias (do 1º ao14º dia). Segundo vários estudos [6, 20, 26], este tempo foi suficiente para promover hipercolesterolemia moderada em ratos recebendo dieta rica em colesterol e ácido cólico. Nesta fase, o grupo Padrão, recebeu dieta Padrão (AIN-93G) e os grupos Controle, LDR e P, receberam dieta Padrão acrescida de colesterol + ácido cólico. Ao final destes 14 dias, 40 animais (10 de cada grupo) foram sacrificados para a avaliação dos níveis sangüíneos de colesterol total e frações.

2a fase: Administração do probiótico e tempo 0 de monitoramento do efeito do probiótico sobre os níveis de colesterol sérico

Após a fase de indução da hipercolesterolemia, iniciou-se, então a administração do probiótico durante 14 dias (do 15º ao 28º dia). Nesta fase as dietas administradas foram: grupo Padrão (dieta padrão AIN-93G); grupo Controle, (dieta Padrão + colesterol + ácido cólico); grupo LDR (dieta Controle + LDR 10%) e grupo P (dieta Controle + probiótico). No 28º dia, que constituiu o tempo 0 de monitoramento do efeito do probiótico na modulação dos níveis de colesterol sérico, 10 animais de cada grupo (40 animais) foram analisados quanto ao colesterol total e frações e peso do fígado. Doses de 0,1mL de LDR 10% e probiótico foram administrados diariamente, via oral, aos animais dos respectivos grupos.

As dietas experimentais e água destilada foram oferecidas ad libitum durante todo o período experimental. Ao final de cada fase, os animais foram mantidos em jejum por doze horas, e então, sacrificados sob asfixia em gás CO2 seguida da incisão das cavidades torácica e abdominal para coleta de sangue, por punção cardíaca e retirada do fígado. As amostras de sangue foram centrifugadas para retirada do soro, que foi analisado quanto a colesterol total, LDL-colesterol e HDL-colesterol. Os fígados foram lavados em solução salina 0,9%, pesados e estocados a - 80ºC.

2.5 - Dosagens dos constituintes sangüíneos

As dosagens de colesterol total, LDL-colesterol e HDL-colesterol foram realizadas no equipamento de dosagens multiparamétrico Alisê, utilizando-se o Kit enzimático Biolab, da Biolab-Mérieux S/A.

2.6 - Análise estatística

Procedeu-se a análise de variância (ANOVA), ao nível de 5% de probabilidade, para a determinação do valor de "F". Para "F" significativo, utilizou-se o teste de Tukey ao nível de 5% de probabilidade para comparação entre as médias.

A dispersão da média foi expressa, nas tabelas de resultados, como desvio-padrão da média.

3 - RESULTADOS E DISCUSSÂO

3.1 - Caracterização da cultura

A identidade da cultura utilizada no preparo do concentrado celular foi confirmada como Lactobacillus acidophilus. As colônias apresentaram-se gram-positivas, catalase-negativas, com morfologia e perfil de fermentação característicos de L. acidophilus, de acordo com KLANDLER E WEISS [16] sendo positivo para maltose, glicose, galactose e lactose e negativo para sorbitol, rafinose e manitol.

3.2 - Colesterol sérico total e frações na fase de indução da hipercolesterolemia

A Tabela 1 mostra os valores de colesterol total, LDL-colesterol, HDL-colesterol para os grupos experimentais, obtidos no 1º dia de experimentação (valor basal para o grupo Padrão) e no 14º dia (após período de indução da hipercolesterolemia).

Para produzir hipercolesterolemia nos ratos, adicionou-se à dieta, 1% de colesterol cristalino + 0,1% de ácido cólico, com base no estudo feito por COSTA [6], onde esta adição foi eficaz na elevação dos níveis de colesterol sérico em ratos, produzindo uma hipercolesterolemia moderada (49%), sem contudo promover grandes acúmulos de colesterol no fígado. A deposição de colesterol neste órgão foi de 52%, quando se comparou o grupo Padrão (que não recebeu colesterol na dieta) e o Controle (que recebeu dieta hipercolesterolêmica). No entanto, ROSA et al [26] seguindo o mesmo protocolo, observaram que ratos que consumiram esta mesma dieta, por 28 dias, tiveram um aumento similar de 58% (p<0,05) nos níveis séricos de colesterol total, porém, uma grande (p>0,05) deposição de colesterol no fígado. No grupo Padrão, o teor de colesterol no órgão foi de 0,19g/100g e no grupo Controle, de 0,40g/100g, portanto, um aumento de 110%.

Apesar dos resultados citados, ratos são bastante resistentes em desenvolver hipercolesterolemia e aterosclerose em razão possivelmente, do aumento na conversão de colesterol em ácidos biliares no fígado [27, 30], resistência esta, confirmada neste estudo, onde observou-se um aumento de 15,31% (p>0,05) no colesterol total e de 7,19% (p>0,05) na fração LDL-colesterol (Tabela 1) de ratos alimentados com a dieta Controle quando comparados com a Padrão, indicando que a adição de 1% de colesterol cristalino + 0,1% de ácido cólico à dieta foi ineficaz na elevação dos níveis de colesterol sangüíneo dos animais.

Embora, o colesterol não tivesse se elevado no sangue, em concentrações significativas (p>0,05), acumulou-se no fígado, corroborando os resultados de PORTMAN E BRUNO [20] onde o ácido cólico foi mais eficaz na deposição de colesterol no fígado do que em sua elevação no sangue, em ratos que receberam dieta rica em colesterol e ácidos biliares. Do mesmo modo, Beher et al [3] constataram um acúmulo de lipídios no fígado e nenhuma elevação do colesterol sérico, em ratos alimentados com dieta rica em colesterol e ácido cólico.

Segundo estes autores [3, 20] o ácido cólico, além de potencializar o efeito do colesterol dietético, aumentando sua absorção, pode, por outro lado, inibir a conversão de colesterol a ácidos biliares, favorecendo o acúmulo de lipídios no fígado e promovendo o chamado "fígado gorduroso" nos animais, como observado neste estudo.

A Figura 1 demonstra este acúmulo através da alteração na coloração do fígado. Nos animais dos grupos Controle (grupo II), LDR (grupo III) e P (grupo IV) que receberam dieta acrescida de colesterol e ácido cólico, este órgão apresentou uma coloração vermelho amarelado em comparação aos do grupo Padrão (grupo I), que receberam dieta sem colesterol e sem ácido cólico e mantiveram o órgão com a coloração normal (vermelho intenso).


3.3 - Peso do fígado dos animais experimentais

Como esperado, as médias de peso do fígado dos animais que receberam dieta hipercolesterolêmica, suplementada ou não com probiótico (Controle, LDR e P), foram superiores (p<0,05) a dos que receberam dieta sem colesterol (grupo Padrão) (Tabela 2).

Similarmente ao observado no presente estudo, onde verificou-se um aumento de 27,9% no peso do fígado dos animais alimentados com colesterol e ácido cólico em relação ao Padrão, BEYEN et al [5] constataram um aumento de 30% no peso deste órgão em ratos consumindo a mesma dieta. Segundo os autores [5] este aumento de peso é devido ao acúmulo de colesterol no fígado causado pelo ácido cólico, que inibe a conversão de colesterol a ácidos biliares.

Além disso, o grupo que recebeu probiótico (P) apresentou média de peso do fígado superior (p>0,05) à observada para o grupo Controle (Tabela 2). Embora essa diferença não seja significativa, é indicativo da tendência de que leites fermentados podem provocar o desvio do colesterol sérico para o fígado, promovendo sua deposição neste órgão [4].

BERNSTEIN et al [4] se referiram à diminuição do colesterol sérico pelo leite fermentado, no entanto, a essa redução, seguiu-se a indução de fígado gorduroso. Kinsella, 1967 citado por BERNSTEIN et al [4] demonstrou que ratos alimentados com leite fermentado desenvolviam fígado gorduroso após decréscimo do colesterol plasmático, corroborando o desvio das concentrações séricas deste esterol para o fígado.

3.4 - Colesterol sérico total e frações após consumo do probiótico

Os níveis de colesterol total, LDL-colesterol e HDL-colesterol no soro sangüíneo dos animais, imediatamente após o término da administração do probiótico (tempo 0) estão apresentados na Tabela 3.

As concentrações médias dos parâmetros avaliados não diferiram estatisticamente (p>0,05) entre os grupos testados, no tempo avaliado, indicando que os animais não foram afetados pelo consumo de L. acidophilus, pois se mantiveram normocolesterolêmicos durante todo o período experimental, devido a não elevação dos níveis séricos de colesterol após consumo de dieta rica em colesterol e ácido cólico.

O efeito positivo dos probióticos na modulação dos níveis de colesterol sérico em modelos animais e humanos tem sido constatado por vários estudos [7, 10, 11, 29] mas, nestes estudos, os animais ou indivíduos avaliados se apresentavam hipercolesterolêmicos no início do tratamento com o probiótico, diferindo das condições da presente experimentação, onde os animais se encontravam normocolesterolêmicos no início da administração do microrganismo.

Vários trabalhos têm indicado que o efeito hipocolesterolemiante de bactérias láticas, é bem menor ou quase nenhum, em indivíduos e animais normocolesterolêmicos [14, 17, 25].

ROOS et al [25] utilizando iogurte enriquecido com L. acidophilus, constataram que este não reduziu os níveis séricos de lipídios em homens e mulheres normocolesterolêmicos. Lin et al [17] não encontraram alteração significativa nos níveis séricos de lipídios em indivíduos do grupo que recebeu suplementação com Lactobacillus (192mg/dL), com média de colesterol inicial menor do que grupo que recebeu placebo (221mg/dL).

HAYAKAWA et al [14] estudando o efeito de leite de soja fermentado com Bifidobacterium nos lipídios séricos, em ratos, constataram que entre os animais que receberam dieta livre de colesterol, os níveis de colesterol sérico total após o tratamento, não foram afetados. Já nos animais que foram alimentados com dieta enriquecida com colesterol cristalino, os níveis de colesterol sérico foram cerca de 15% inferior, nos grupos que receberam leite de soja ou leite de soja fermentado c/Bifidobacterium, em relação ao grupo controle.

Os resultados dos estudos citados corroboram o encontrado neste trabalho, onde a suplementação com L. acidophilus não afetou os níveis de colesterol plasmático de ratos normocolesterolêmicos

4 - CONCLUSÕES

A adição de 1% de colesterol cristalino + 0,1% de ácido cólico à dieta, não promoveu hipercolesterolemia, em níveis significativos, no entanto, promoveu fígado gorduroso nos animais, com aumento de peso e alteração de sua coloração normal.

Em conseqüência, os animais apresentado-se normocolesterolêmicos por todo o período experimental, não tiveram seus níveis de colesterol total, LDL-colesterol e HDL-colesterol afetados pelo consumo do L. acidophilus.

Sugere-se que novos modelos animais, como coelhos e aves, que tendem a responder melhor à indução de hipercolesterolemia por componentes dietéticos, com uma maior elevação dos níveis séricos de colesterol, sejam testados, já que ratos têm grande tendência ao acúmulo de gordura no fígado e resistência à elevação do colesterol plasmático, quando submetidos a uma dieta rica em colesterol e ácido cólico.

Do mesmo modo, novos protocolos para indução da hipercolesterolemia devem ser pesquisados, visando uma melhor avaliação do efeito de probióticos no metabolismo lipídico. O ácido cólico, por causar a inibição da conversão de colesterol a acidos biliares, pode interferir na ação de componentes dietéticos que agem no metabolismo do colesterol influenciando esta conversão, como é o caso dos microrganismos probióticos. Portanto, sugere-se que a adição, de somente colesterol cristalino à dieta, poderia proporcionar resultados mais satisfatórios na elevação dos níveis do colesterol plasmático, em estudos de indução da hipercolesterolemia por constituintes dietéticos, em modelo animal.

6 - AGRADECIMENTOS

Os autores agradecem o apoio financeiro da FAPEMIG e CAPES

5 - REFERÊNCIAS

Recebido para publicação em 04/04/2002. Aceito para publicação em 26/12/2002 (000826)

  • [1] AKALIN SIBEL, A; GONÇ, S.; DUZEL, S. Influence of yogurt and acidophilus yogurt on serum cholesterol levels in mice. J. Dairy Sci, v.34; p:2721-2725, 1997.
  • [2] ANDERSON, J. W.; GUSTAFSON, N.J.; SPENCER, D.B; TIETYEN. J.; BRYANT, C.A. Serum lipid response of hypercholesterolemic men to single and divided doses of canned beans. Am. J. Clin. Nutr., v.51, p.1013-1019, 1990.
  • [3] BEHER, W.T.; BAKER, G.D.; PENNEY, D.G. A comparative study of the effects of bile acids and cholesterol on cholesterol metabolism in the mouse, rat, hamster and guinea pig. J. Nutr v.79, n.63, p.523-530, 1962.
  • [4] BERSNTEIN, B.A; RICHARDSON, T.; AMUNDSON, C.H. Inhibition of cholesterol biosynthesis and acetyl-coenzyme A synthetase by bovine milk and orotic acid. J. Dairy Sci, v.60, p.1846-1853, 1977.
  • [5] BEYNEN, A C.; LEMMENS, A G.; DE BRUIJNE, J.J.; KATAN, M.B.; VAN ZUTPHEN, L.F.M. Interaction of dietary cholesterol with cholate in rats: effect on serum cholesterol, liver cholesterol and liver function. Nutr. Rep. Inter v.34, n.4, p.557-563, 1986.
  • [6] COSTA, N.M.B. Investigation into the cholesterol lowering property of baked bean (Phaselous vulgaris). Reading: University of Reading, 1992; 200p. tese (Doutorado em Ciência de Alimentos - Nutrição Humana).
  • [7] DE RODAS, B.Z.; GILLILAND, S.E.; MAXWELL, C.V. Hypocholesterolemic action of Lactobacillus acidophilus ATCC 42121 and calcium in swine with hypercholesterolemia induced by diet.. J. Dairy Sci., v.79, p.2121-2128, 1996.
  • [8] EYSSEN, H. Role of the gut microflora in metabolism of lipids and sterols. Proc. Nutr. Soc., v.32, p.59-63, 1973.
  • [9] FULLER, R.A. review: probiotics in man and animals. Journal of Applied bacteriology, v.66, p.365-378, 1989.
  • [10] FUKUSHIMA, M.; MASUO, N. Effects of mixture of organisms, Lactobacillus acidophilus or Streptococcus faecalis on cholesterol metabolism in rats fed on a fat- on cholesterol -enriched diet. Brit. J. Nutr. v. 76, p.857-867, 1996.
  • [11] FUKUSHIMA, M.; MASUO, N. The effect of a probiotic on faecal and liver lipid classes in rats. Brit. J. Nutr. v. 73, p.701-710, 1995.
  • [12] GILLILAND, S.E. Fators to consider when selecting a culture of Lactobacillus acidophilus as a dietary adjunct to produce a hypocholesterolemic effect in humans. J. Dairy Sci., v.73, p.905-911, 1990.
  • [13] GRUNEWALD, K.K. Serum cholesterol levels in rats fed skim milk fermented by Lactobacillus acidophilus. J. Food Sci., v.47, p.2078-2079, 1982.
  • [14] HAYAKAWA, H.K.; ONODERA, N.; MATSUBARA, S.; YASUDA, E.; SHIMAKAWA, Y.; ISHIKAWA, F. Effects of soya milk and Bifidobacterium-fermented soya milk on plasma and liver lipids, and faecal steroidsin hamsters fed on a cholesterol-free or cholesterol-enriched diet. Br. J. Nutr v.79, p.97-105, 1998.
  • [15] JASPERS, D.A; MASSEY, L.K.; LUEDECKE, L.O. Effect of consuming yogurts prepared with three culture strains on humam serum lipoproteins. J. Food Sci., v.49, p.1178-1181, 1984.
  • [16] KANDLER, O.; WEISS, N. Regular, nonsporing Gram-positive rods. In: BERGEY, D.H. Bergey's manual of sistematic bacteriology Baltimore: Willians e Wilkins, 9 ed., v.2, p.1208-1223, 1993.
  • [17] LIN, S.Y.; AYRES, J.W.; WINKLER, W.J.R.; SANDINE, W.E. Lactobacillus effects on cholesterol: in vitro and in vivo results. J. Dairy Sci v.72, p.2885-2899, 1989.
  • [18] MANN, G.V; SPOERRY, A. Studies of surfactant and holesterolemia in the Maasai. Am. J. Clin. Nutr v.27, p.464-469, 1974.
  • [19] ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DE SAÚDE - OMS. Prevention of coronary heart disease, report of a Who Expert Committee. Geneva, p.53 (Technical report series, 678), 1992.
  • [20] PORTMAN, O.W.; BRUNO, D. Various natural and modified bile acids in cholesterol metabolism. J. Nutr., v.73, n.61, p. 329-336, 1960.
  • [21] PULUSANI, S.R; RAO, D.R. Whole body, liver and plasma cholesterol levels in rats fed Thermophilus, Bulgaricus and Acidophilus milks. J. Food Sci., v.48, p.280-281, 1983.
  • [22] REEVES, P.G.; FORREST, H.N.; FAHEY, G.C.JR. AIN-93 Purified diets for laboratory rodents: final report of the American Institute of Nutrition Ad Hoc Writing Committee on the Reformulation of the AIN-76 A Rodent Diet, J. Nutr., v.123, p.1939-1951, 1993.
  • [23] REVISTA SAÚDE - Especial, (s.a.) n.1, p.37, out. 1997.
  • [24] ROBERFROID, M.B. Prebiotics and symbiotics: Concepts and nutritional properties. British J. Nutrition, v.80, suppl.2, p.S197-S202, 1998.
  • [25] ROOS, N.M.; SCHOUTEN, G.; KATAN, M.B. Yogurt enriched with Lactobacillus acidophilus does not lower blood lipids in healthy men and women with normal to bordeline high serum cholesterol levels. Eur.J. of Clin. Nutr v.53, p.277-280, 1999.
  • [26] ROSA, C.O B.; COSTA, N.M.B.; LEAL, P.F.G.; OLIVEIRA, T.T. Efeito do feijão preto (Phaseolus vulgaris, L)sem casca na redução do colesterol sangüíneo de ratos hipercolesterolêmicos. Archivos Latino Americanos de Nutrition, v. 48, n.4, p.299-305, 1998.
  • [27] SANDERS, M.E. Effect of consumption of lactic cultures on health. Adv. Food and Nutr. Research. v. 37, p.92-98, 1993.
  • [28] SIPERSTEIN, M.D.; JAYKO, M.E.; CHAIKOFF, I.L.; DAUBEN, W.G. Nature of the metabolic products of C14 cholesterol excreted in bile and feces. Proc. Soc. Exp. Biol. Med, v.81, p.720-724, 1952.
  • [29] TARANTO, M.P.; MEDICI, M.; PERDIGON, G.; RUIZ HOLGADO, A P.; VALDEZ, G.F. Evidence for hypocholesterolemic effect of Lactobacillus reuteri in hypercholesterolemic mice. J. Dairy Sci. v.81, p.2336-2340, 1998.
  • [30] WILSON, J.D. The quantification of cholesterol excretion and degradation in the isotopic steady state in the rat: the influence of dietary cholesterol. J. Lipid Res, v.5, p.409-417, 1964.
  • *
    A quem a correspondência deve ser enviada
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      12 Abr 2004
    • Data do Fascículo
      Ago 2003

    Histórico

    • Aceito
      26 Dez 2002
    • Recebido
      04 Abr 2002
    Sociedade Brasileira de Ciência e Tecnologia de Alimentos Av. Brasil, 2880, Caixa Postal 271, 13001-970 Campinas SP - Brazil, Tel.: +55 19 3241.5793, Tel./Fax.: +55 19 3241.0527 - Campinas - SP - Brazil
    E-mail: revista@sbcta.org.br