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Influência do teor de gordura nas propriedades funcionais do queijo tipo mozarela

Influence of the fat level in the functional properties of mozzarella cheese

Resumos

A composição da matéria-prima, com ênfase especial para o teor de gordura do leite e, por conseguinte do queijo, podem ter influência em propriedades reológicas tais como: fatiabilidade, deformidade e derretibilidade. Leite com teores de gordura de 3,5%, 3,0%, 2,5% e 2,0% foi utilizado para a fabricação do queijo e os melhores resultados foram obtidos com 2,5%. Os valores da coesividade, gomosidade, mastigabilidade e firmeza mostraram um aumento em função da diminuição do teor de gordura enquanto que os da elasticidade diminuíram. Devido à alta correlação entre as medidas sensoriais e instrumentais, concluiu-se que a análise instrumental pode expressar com precisão as avaliações subjetivas.

queijo mozarela; propriedades funcionais; teor de gordura


The composition of raw milk with special enfasis on its fat level may have influence on reologycal properties such as sliceability, deformity and meltability. Milk with fat contents of 3.5%, 3.0%, 2.5% and 2.0% was used in the manufacture of Mozzarella cheese and the best results were obtained whith milk with fat level of 2.5%. The coesitivity, gomositivity and mastigability values showed a increase with the diminution of fat level whereas the elasticity decreased. Due to the high correlation the obtained results showed that instrumentals methods can express very precisely the sensorial evaluation.

mozzarella cheese; functional properties; fat level


Influência do teor de gordura nas propriedades funcionais do queijo tipo mozarela

Influence of the fat level in the functional properties of mozzarella cheese

José Leonardo Etore do Valle* * A quem a correspondência deve ser enviada. ; Sônia Dedeca da Silva Campos; Katumi Yotsunagi; Genevaldo de Souza

Instituto de Tecnologia de Alimentos – ITAL -Campinas –SP

RESUMO

A composição da matéria-prima, com ênfase especial para o teor de gordura do leite e, por conseguinte do queijo, podem ter influência em propriedades reológicas tais como: fatiabilidade, deformidade e derretibilidade. Leite com teores de gordura de 3,5%, 3,0%, 2,5% e 2,0% foi utilizado para a fabricação do queijo e os melhores resultados foram obtidos com 2,5%. Os valores da coesividade, gomosidade, mastigabilidade e firmeza mostraram um aumento em função da diminuição do teor de gordura enquanto que os da elasticidade diminuíram. Devido à alta correlação entre as medidas sensoriais e instrumentais, concluiu-se que a análise instrumental pode expressar com precisão as avaliações subjetivas.

Palavras-chave: queijo mozarela; propriedades funcionais; teor de gordura.

SUMMARY

The composition of raw milk with special enfasis on its fat level may have influence on reologycal properties such as sliceability, deformity and meltability. Milk with fat contents of 3.5%, 3.0%, 2.5% and 2.0% was used in the manufacture of Mozzarella cheese and the best results were obtained whith milk with fat level of 2.5%. The coesitivity, gomositivity and mastigability values showed a increase with the diminution of fat level whereas the elasticity decreased. Due to the high correlation the obtained results showed that instrumentals methods can express very precisely the sensorial evaluation.

Keywords: mozzarella cheese; functional properties; fat level.

1 – INTRODUÇÃO

O queijo tipo Mozarela é de origem italiana conhecido, produzido, apreciado e consumido no mundo todo e, em especial no Brasil. O seu formato pode ser irregular, retangular, esférico, periforme ou ovóide, com pesos variáveis de poucas gramas até vários quilogramas; coloração branca ou levemente amarelado, não maturado consumido puro ou fazendo parte de inúmeros pratos quentes, sanduíches, pizzas, etc., [10]. É um queijo do grupo de massa filada [9], o qual é bastante numeroso, com variações de sabor e forma e de considerável produção e consumo. Neste grupo, os tipos mais conhecidos e apreciados no Brasil, além do Mozarela, são o Provolone e Caciocavalo, possuindo em comum a propriedade de formar fios, de serem filados, em determinadas condições de pH e acidez, quando parte do cálcio é eliminada do complexo fosfocaseinato, caracterizando o processo de desmineralização da coalhada. Segundo o Regulamento da Inspeção Industrial e Sanitária de Produtos de Origem Animal [1], o queijo tipo Mozarela é o produto obtido a partir do leite pasteurizado, de massa filada e não prensada, entregue ao consumo até cinco dias após a fabricação, devendo apresentar-se com: formato variável, entre cilíndrico chato e paralelepipédico; peso de 15g a 4kg; crosta fina, de cor amarelada; consistência de massa semidura; textura compacta e fechada; cor branco-creme e homogênea e odor e sabor suave e salgado, respectivamente.

A maior utilização e consumo do queijo tipo Mozarela é como ingrediente para a confecção de inúmeros pratos quentes, sanduíches, pizzas, etc. Nestas preparações, as propriedades de textura do ponto de vista sensorial, seriam aquelas que tem a ver com a percepção complexa quando do seu consumo; entre essas as mais importantes para este produto seriam a firmeza, derretibilidade, mastigabilidade, gomosidade, adesividade e coesividade. Algumas etapas do processamento industrial deste tipo de queijo são de importância crítica no sentido de definir a sua qualidade e adequação para os diferentes tipos de usos [11, 12]. As características de fusão e textura do queijo Mozarela são influenciadas por inúmeros fatores, dos quais um dos mais importantes é a composição da matéria-prima; assim sendo, influem nesta fundibilidade as concentrações de Ca e P presentes na coalhada [3], a umidade do queijo [3, 4], o teor de NaCl [8], a caseína [6] e estudos mais recentes, tem se preocupado com a gordura e sua interação com a caseína [5, 7]. A composição da matéria-prima, com ênfase especial para o teor de gordura do leite e, por conseguinte do queijo, podem influenciar na textura, fatiabilidade, deformidade e derretibilidade e, no posterior manuseio e preparo do queijo, principalmente na forma fatiada, que é a mais usual. Muitos problemas práticos podem ocorrer com o manuseio das fatias de queijos, com as mesmas apresentando-se geralmente "grudadas", sendo difícil a sua separação; também, a fusão do queijo, por ocasião do seu uso, é um fenômeno importante. Assim, pretendeu-se neste estudo verificar a influência do teor de gordura do leite e do queijo, em algumas de suas propriedades funcionais.

2 – MATERIAIS E MÉToDOS

2.1 – Materiais

2.1.1 – Matéria-prima

A matéria-prima utilizada foi o leite tipo "B".

2.1.2 – Coalho

O coalho utilizado nos experimentos foi o do tipo líquido, de origem animal, adquirido no comércio, marca Há-La.

2.1.3 – Fermento láctico

O fermento utilizado foi constituído por cepas de Streptoccus salivarius subsp. thermophilus e Lactobacillus delbrueckie subsp. bulgaricus, provenientes da Coleção de Culturas do Centro de Tecnologia de Laticínios do ITAL.

2.1.4 – Outros ingredientes

Os produtos químicos utilizados ao longo dos ensaios de processamento foram: cloreto de cálcio, solução a 50% e cloreto de sódio, sal moído industrial.

2.2 – Processamento do queijo tipo Mozarela

Os processamentos foram realizados na instalação piloto do Centro de Tecnologia de Laticínios do ITAL, segundo VALLE [10]. Na recepção, caracterizou-se o leite quanto à sua composição físico-química. A pasteurização foi realizada a 63oC durante 30 minutos nos tanques de processo. Após resfriamento a 32oC, foram adicionados: cloreto de cálcio, 50mL de solução a 50% para 100 litros de leite; bactérias lácticas, 1% em relação ao volume de leite e inoculadas à temperatura de incubação; coalho, do tipo líquido, na proporção de 20mL/100 litros de leite, suficiente para coagulá-lo em aproximadamente 45 a 60 minutos. A temperatura de coagulação foi de 32ºC e o corte efetuado com liras tamanho nº1, ou seja, 1cm de aresta. A agitação, iniciada 5 minutos após o corte, foi do tipo lenta. O aquecimento foi até 40ºC, elevando-se a temperatura gradativamente, ou seja, 1ºC a cada 3 minutos. A massa, em condições de ser filada, foi cortada em tiras de 1 centímetro de espessura, para que pudesse atingir a temperatura desejada uniformemente durante a filagem. A operação de filagem foi realizada da seguinte forma: temperatura da água de filagem: 85-88ºC; temperatura da massa: 55-58ºC; tempo de filagem: 5 minutos e proporção massa/água: ½. A massa, após enformada, com peso de 1kg, foi colocada em água fria, à temperatura de 10ºC, por um tempo de 3 horas para atingir a consistência desejada. A salga foi feita pela imersão do queijo em salmoura a 20%, a temperatura de 10-12oC, por 20 horas para atingir 2,0% de sal recomendado.

2.3 – Métodos físicos e químicos de avaliação

2.3.1 – Amostragem

As amostras de leite, soro e do produto em processamento foram retiradas do tanque de fabricação, após prévia agitação para uniformização do material, coletadas em frascos de vidro, em quantidade ou volume suficiente para as análises e sempre em duplicata. As análises foram feitas de preferência imediatamente após a coleta e, quando impossibilitado, as amostras foram armazenadas em "freezer" a -20ºC e analisadas no espaço de 7 dias. No caso dos queijos, as amostras foram cortadas em cunha e maceradas em gral até uniformização, segundo as Normas Britânicas [2].

2.3.2 – Métodos físicos

• Perfil de Textura

A avaliação do Perfil de textura das 4 amostras de queijo mozarela foi realizada pelo equipamento Texturômetro TA-XT2, nas seguintes condições: opção: TPA; velocidade de pré teste: 2,0mm/s; velocidade de teste: 1,0mm/s; velocidade de pós teste: 2,0mm/s; distância de compressão 10,0mm; probe: cilindro de alumínio de 50mm de diâmetro; amostra: cilindros de queijo de 20mm de diâmetro e 20mm de altura, retiradas aleatoriamente dos blocos.

• Resistência ao corte

A avaliação da resistência ao corte das 4 amostras de queijo mozarela foi realizada pelo equipamento Texturômetro TA-XT2, nas seguintes condições: opção: "return to start"; velocidade de pré-teste: 5,0mm/s; velocidade de teste: 2,0mm/s; velocidade de pós teste: 5,0mm/s; distância de corte: 25,0mm; probe: fio metálico; amostra: blocos de queijo, sendo realizadas 3 avaliações por bloco (região central e extremidades); parâmetros avaliados: firmeza (resistência ao corte = força máxima) e adesividade (área sob a porção negativa da curva).

• Avaliação sensorial

As amostras foram avaliadas sensorialmente por meio da análise descritiva quantitativa, segundo a ficha apresentada na Figura 1, utilizando-se escalas lineares de 10cm ancoradas a 1cm de cada extremidade. Os testes foram conduzidos em cabines individuais equipadas com o sistema computadorizado "Compusense Five versão 3.6. para a coleta dos dados".


• Análise estatística

As análises estatísticas de variância e de correlação entre análises físicas e sensoriais foram realizadas por meio do programa SAS.

3 – RESULTADOS E DISCUSSÃO

Os resultados do perfil de textura, resistência ao corte, análise sensorial e correlação entre ambos podem ser observados nas Tabelas 1, 2, 3 e 4 e nas Figuras 2 e 3.



3.1 – Perfil de textura

No teste de perfil de textura, a maioria dos parâmetros avaliados apresentou diferença significativa em função do teor de gordura da matéria-prima.

O queijo fabricado com 3,5% de gordura no leite apresentou menor firmeza e à medida que houve diminuição do teor de gordura, o produto tornou-se significativamente mais firme. Quanto à elasticidade, o queijo produzido com 3,5% de gordura no leite apresentou-se menos elástico, diferindo significativamente dos demais. A adesividade não mostrou um comportamento linear em função do teor de gordura. Todavia, comparando-se as amostras relativas aos valores extremos de teor de gordura, pode-se verificar que o produto produzido com 3,5% de gordura no leite, apresentou uma maior adesividade, enquanto que a coesividade, gomosidade e mastigabilidade, mostraram um aumento em função da diminuição do teor de gordura.

3.2 – Resistência ao corte

Tanto a firmeza como a energia gasta para realizar o corte da peça, numa distância de 25mm, mostraram um aumento em função da diminuição do teor de gordura da matéria-prima, comportamento inverso da adesividade, que apresentou valores mais elevados nas amostras produzidas com leite integral.

3.3 – Análise sensorial

Sensorialmente, apenas a firmeza e a resistência à mastigação mostraram diferença significativa em função do teor de gordura do produto. Dessa forma, tem-se que o produto fabricado com 2,0% de gordura no leite é mais firme, e apresenta maior resistência à mastigação, não diferindo quanto aos demais parâmetros.

3.4 – Correlação entre parâmetros instrumentais e subjetivos

Analisando-se os valores encontrados, observa-se que há uma alta correlação entre as medidas instrumentais (perfil de textura) e sensoriais de firmeza, elasticidade, mastigabilidade e adesividade e uma menor correlação (não significativa) quanto à coesividade. Estes resultados demonstram que a análise instrumental pode expressar com precisão as avaliações subjetivas.

4 – CONCLUSÕES

Com base nos resultados obtidos concluiu-se que a maioria dos parâmetros avaliada em conjunto apresentou uma melhor performance quando o teor de gordura no leite foi de 2,5%, o qual é recomendado na fabricação do queijo Mozarela para o seu consumo na forma fatiada. Também, em virtude da alta correlação entre as medidas sensoriais e instrumentais, concluiu-se que a análise instrumental pode expressar com precisão as avaliações subjetivas.

5 – REFERÊNCIAS BIBLIOGRáFICAS

Recebido para publicação em 10/11/2003. Aceito para publicação em 05/11/2004 (001239).

  • [1] BRASIL. MINISTÉRIO DA AGRICULTURA. Regulamento da Inspeção Industrial e Sanitária de Produtos de Origem Animal (RISPOA). Brasilia, 1980, p. 113.
  • [2] BRITISH STANDARD'S INSTITUTION. Sampling of Cheese. British Standard's Institution. BS: 809, 12, London, 1974.
  • [3] KELLER, B.; OLSON, N.F.; RICHARDSON, T. Mineral retention and rheological properties of mozzarella cheese made by direct acidification. Journal of Dairy Science, v. 57, p. 174, l974.
  • [4] KINDSTEDT, P.S.; RIPPE, J.K.; DUTHIE, C.M. Aplication of helical viscometry to study commercial Mozzarella cheese melting properties. Journal of Dairy Science, v. 72, n. 12, p. 3123, 1989.
  • [5] KINDSTEDT, P.S.; RIPPE, J.K. Rapid quantitative test for free oil (oiling off) in melted Mozzarella cheese. Journal of Dairy Science, Champaign, v. 73, p. 867, l990.
  • [6] LAWRENCE, R.C.; CREAMER, C.L.K.; GILLES, J. Texture development during cheese ripening. Journal of Dairy Science, v. 70, p. 1748, 1987.
  • [7] LELIÈVRE, J.; SHAKER, R.R.; TAYLOR, M.W. The role of homogenization in the manufacture of Halloumi and Mozzarella cheese from recombined milk. Journal of Dairy Science, v. 43, n. 1, p. 21. l990.
  • [8] OLSON, N.F. The effect of salt levels on the caracteristics of Mozarella cheese before and after frozen storage. Page 1 In: Proceedings 19th Annual Marschall Invitation Italian Cheese Seminar, Marschall Products, Madison, WI. 1982.
  • [9] VALLE, J.L.E. do; TAKAHASHI, S.; KEATING, P.F.; FIGUEIREDO, I.B. Modificação da tecnologia clássica do queijo tipo "Mozzarella" para melhorar e padronizar a filagem. Boletim do Instituto de Tecnologia de Alimentos, v. 16, n. 1, p. 65-70, 1979.
  • [10] VALLE, J.L.E. do. Influência de parâmetros físico-químicos na fermentação e filagem do queijo Mozarela São Paulo, 1991, 88p. Tese de Doutorado, USP/FCF.
  • [11] VALLE, J.L.E. do; LEITÃO, M.F. de F.; SOUZA, G. Aspectos tecnológicos da filagem do queijo Mozarela. Coletânea do Instituto de Tecnologia de Alimentos, v. 26, n. 1, p. 71-79, 1996.
  • [12] VALLE, J.L.E. do; SOUZA, G. Modificações no processo de salga do queijo tipo Mussarela. Revista Industrial de Laticínios, v. 19, n. 57, p. 60,2000.
  • *
    A quem a correspondência deve ser enviada.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      09 Mar 2005
    • Data do Fascículo
      Dez 2004

    Histórico

    • Recebido
      10 Nov 2003
    • Aceito
      05 Nov 2004
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