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Avaliação da disponibilidade de ferro de feijão comum (Phaseolus vulgaris L.) em comparação com carne bovina

Evaluation of iron availabilty of the common bean in comparson with bovine meat

Resumos

O presente trabalho avaliou a disponibilidade do ferro do feijão comum e os efeitos de suas interações com ácido ascórbico e cistina em comparação a disponibilidade deste metal em carne bovina. Para a determinação do teor de ferro e diálise de ferro in vitro, foram realizadas análises químicas nas amostras de carne bovina (C), feijão comum (F), feijão comum com ácido ascórbico (FA), feijão comum com cistina (FCI) e feijão comum com ácido ascórbico e cistina (FACI). Em F foram determinados taninos, ácido fítico e ácido oxálico. Em F foi encontrado 0,065 g de tanino/100 g; 8,03 mg de ácido fítico/g e 7,12 mg de ácido oxálico/g. A quantidade de ferro variou de 9,64 mg/100 g a 10,37 mg/100 g. A amostra FCI e FA apresentaram os menores teores de ferro. A quantidade de ferro encontrada na amostra C foi de 10,37 mg/100 g. A porcentagem de ferro dialisável variou de 17,33% a 24,31%. As amostras de carne bovina apresentaram a maior porcentagem de ferro dialisável, seguida por FACI. A menor porcentagem de ferro dialisável foi observada nas amostras F e FCI. Portanto, pode-se concluir que a adição simultânea de ácido ascórbico e cistina, tornou o ferro presente no feijão mais biodisponível, equiparando-o ao da carne bovina.

biodisponibilidade; ferro; ácido ascórbico; cisteína; antinutricionais


The present work evaluated iron availability of the common bean and the effects of its interactions with ascorbic acid and cystine in iron availability and compare the results with iron availability of the bovine meat. The determination of iron quantity and iron dialysis in vitro has been done by analysing the samples of bovine meat (M), common bean (B), common bean with ascorbic acid (BA), common bean with cystine (BCY) and common bean with ascorbic acid and cystine (BACY). In B, tannins, phytic acid and oxalic acid were determined. In the B sample, 0.065 g of tannins/100g; 8.03 mg of phytic acid/g and 7.12 mg of oxalic acid/g were found. The iron quantity varied from 9.64 mg/100 g to 10.37 mg/100 g. The BCY and BA samples presented the smallest iron quantity. The iron quantity found in the sample M was 10.37 mg/100 g. The percentage of iron availability varied from 17.33% to 24.31%. The M sample presented the largest percentage of iron availability, followed by BACY. The smallest percentage of iron availability was observed in B and BCY samples. Therefore, in conclusion, the iron bean became more bioavailability because of the simultaneous addition of ascorbic acid and cystine compared with the iron of bovine meat.

bioavailability; iron; ascorbic acid; cystine; antinutritionals


Avaliação da disponibilidade de ferro de feijão comum (Phaseolus vulgaris L.) em comparação com carne bovina

Evaluation of iron availabilty of the common bean in comparson with bovine meat

Neila Camargo de MouraI; Solange Guidolin Canniatti-BrazacaII, * * A quem a correspondência deve ser enviada

IAluna do curso de graduação em Nutrição da Universidade Metodista de Piracicaba e estagiária no Departamento de Agroindústria, Alimentos e Nutrição da Escola Superior de Agricultura "Luiz de Queiroz" da Universidade de São Paulo

IIProfessora-doutora do Departamento de Agroindústria, Alimentos e Nutrição da Escola Superior de Agricultura "Luiz de Queiroz" da Universidade de São Paulo

RESUMO

O presente trabalho avaliou a disponibilidade do ferro do feijão comum e os efeitos de suas interações com ácido ascórbico e cistina em comparação a disponibilidade deste metal em carne bovina. Para a determinação do teor de ferro e diálise de ferro in vitro, foram realizadas análises químicas nas amostras de carne bovina (C), feijão comum (F), feijão comum com ácido ascórbico (FA), feijão comum com cistina (FCI) e feijão comum com ácido ascórbico e cistina (FACI). Em F foram determinados taninos, ácido fítico e ácido oxálico. Em F foi encontrado 0,065 g de tanino/100 g; 8,03 mg de ácido fítico/g e 7,12 mg de ácido oxálico/g. A quantidade de ferro variou de 9,64 mg/100 g a 10,37 mg/100 g. A amostra FCI e FA apresentaram os menores teores de ferro. A quantidade de ferro encontrada na amostra C foi de 10,37 mg/100 g. A porcentagem de ferro dialisável variou de 17,33% a 24,31%. As amostras de carne bovina apresentaram a maior porcentagem de ferro dialisável, seguida por FACI. A menor porcentagem de ferro dialisável foi observada nas amostras F e FCI. Portanto, pode-se concluir que a adição simultânea de ácido ascórbico e cistina, tornou o ferro presente no feijão mais biodisponível, equiparando-o ao da carne bovina.

Palavras-chave: biodisponibilidade, ferro, ácido ascórbico, cisteína, antinutricionais

SUMMARY

The present work evaluated iron availability of the common bean and the effects of its interactions with ascorbic acid and cystine in iron availability and compare the results with iron availability of the bovine meat. The determination of iron quantity and iron dialysis in vitro has been done by analysing the samples of bovine meat (M), common bean (B), common bean with ascorbic acid (BA), common bean with cystine (BCY) and common bean with ascorbic acid and cystine (BACY). In B, tannins, phytic acid and oxalic acid were determined. In the B sample, 0.065 g of tannins/100g; 8.03 mg of phytic acid/g and 7.12 mg of oxalic acid/g were found. The iron quantity varied from 9.64 mg/100 g to 10.37 mg/100 g. The BCY and BA samples presented the smallest iron quantity. The iron quantity found in the sample M was 10.37 mg/100 g. The percentage of iron availability varied from 17.33% to 24.31%. The M sample presented the largest percentage of iron availability, followed by BACY. The smallest percentage of iron availability was observed in B and BCY samples. Therefore, in conclusion, the iron bean became more bioavailability because of the simultaneous addition of ascorbic acid and cystine compared with the iron of bovine meat.

Keywords: bioavailability, iron, ascorbic acid, cystine, antinutritionals.

1 - INTRODUÇÃO

Estima-se que quase 40% da população mundial apresentam carência de ferro ou níveis baixos de hemoglobina, estabelecendo uma situação de risco que inclui indivíduos tanto dos estratos sociais mais privilegiados como dos mais carentes, especialmente o grupo materno-infantil: lactentes, pré-escolares, escolares, gestantes e nutrizes. Como pode existir deficiência de ferro sem a presença de anemia, a ocorrência de carência de ferro na população apresenta uma magnitude ainda maior do que a prevalência da anemia ferropriva [2, 9]. A carência desse nutriente prejudica a nutrição e a saúde, o desenvolvimento físico e o aprendizado [14].

BIANCHI, SILVA & DUTRA DE OLIVEIRA [5] ressaltam que, embora a anemia seja um dos maiores problemas mundiais de saúde pública, paradoxalmente, a média de ferro total presente na dieta de diversas regiões encontra-se acima das recomendações diárias necessárias para suprir o uso metabólico normal desse mineral. A anemia é decorrente da baixa biodisponibilidade do ferro nos alimentos, principalmente os de origem vegetal.

Existem duas formas químicas do ferro nos alimentos: o ferro heme e não-heme. O primeiro encontra-se na estrutura do anel porfirina, ligado à hemoglobina e mioglobina, representando cerca de 40% do ferro do tecido animal. Sua absorção é elevada e não é influenciada pelos fatores antinutricionais. As formas inorgânicas ou ferro não-heme estão presentes tanto em tecidos animais como em todos os vegetais que contêm ferro; porém, são de baixa biodisponibilidade [8, 9, 16, 21].

A absorção do ferro se dá do seguinte modo: o ferro absorvido no trato gastrointestinal se liga a uma glicoproteína: a transferrina. Ligado a esta proteína, o ferro circula pelo organismo. Na superfície das células, o ferro liga-se a receptores específicos. O complexo transferrina-ferro ligado a receptores penetra na célula. A transferrina libera o ferro deixando a outra parte (apotransferrina) voltar à superfície celular, retornando em seguida à circulação, continuando então o seu ciclo [3, 9].

O ácido ascórbico, quando ingerido juntamente com o ferro não-heme, potencializa sua absorção, mantendo-o na forma de quelato solúvel no intestino delgado [1]. O ácido ascórbico e a carne ou tecido animal são os dois maiores promotores dietéticos, conhecidos, da biodisponibilidade de ferro. O ácido ascórbico, como agente redutor, mantém o ferro dos alimentos no estado ferroso, que é mais solúvel. Também, forma quelato ferro-ascorbato, que se mantém solúvel mesmo com o aumento do pH no intestino delgado proximal [25]. O ferro da alimentação contido nas frutas e vegetais, que são ricos em ácido ascórbico, normalmente, é 15% disponível. A absorção do ferro aumenta de 3,7% para 10,4% em refeições com pão, ovo e chá quando se adiciona de 40 a 50 mg de ácido ascórbico [4, 5].

As carnes podem aumentam de duas a quatro vezes a absorção do ferro não-heme, este fato ocorre pela presença de altas quantidades de aminoácidos sulfurados em conjunto com a ausência de fatores que inibam a absorção do ferro. Entretanto, as proteínas contidas no queijo e leite, reduzem significativamente a absorção de ferro devido a altas concentrações do cálcio. No ovo a baixa disponibilidade ocorre devido às proteínas ligadoras de ferro, como a fosvitina [16]. O mecanismo exato pelo qual os tecidos facilitam a absorção do ferro não-heme é ainda desconhecido, mas tem sido proposto que aminoácidos livres na luz intestinal, como a histidina, lisina e cistina, aumentam a absorção da espécie férrica, por formarem quelatos solúveis com o ferro [4]; foi sugerido que os peptídeos, liberados durante a digestão proteolítica pela pepsina no estômago, podem melhorar a solubilidade do ferro inorgânico. Esse aumento da absorção pode ser atribuído à propriedade dos aminoácidos, especialmente os sulfurados, como a cistina, a qual se liga ao ferro inorgânico, mantendo-o solúvel e disponível para a absorção [21].

Alguns fatores intraluminais afetam negativamente a quantidade de ferro disponível para absorção. Entre esses pode-se citar os fatores antinutricionais, tais como o ácido oxálico, o ácido fítico e polifenóis (taninos por exemplo), que podem formar precipitados, quelatos insolúveis ou macromoléculas que diminuem a absorção do ferro [3, 4, 5].

O consumo de proteína animal, especialmente a carne bovina, é freqüentemente associado aos malefícios à saúde humana. A carne bovina magra, similarmente à carne branca das aves (sem pele) e o lombo suíno, são fontes importantes de proteína e devem fazer parte de uma dieta balanceada com os nutrientes dos demais grupos de alimentos [21, 25].

O feijão constitui a base alimentar da maioria dos brasileiros, é uma fonte de proteína de baixo valor biológico, porém apresenta elevado teor de lisina, carboidratos complexos, além da presença de vitaminas do complexo B e de ferro. Com relação à proteína, o feijão apresenta deficiência de aminoácidos sulfurados metionina e cistina, ambos essenciais na alimentação [2, 16].

O feijão pode e dever compor os cardápios, sobretudo os econômicos, porém deve ser complementado com alimentos com teor adequado de aminoácidos essenciais, que são as carnes, ovos ou outras combinações vegetais [25, 28]. A biodisponibilidade do ferro nos alimentos depende da forma química em que o elemento se encontra e das possíveis interações com outros constituintes dos alimentos [1]. CANNIATTI-BRAZACA & SILVA [6] observaram que o tipo de leguminosa, bem como a presença de alimentos promotores, influenciaram na disponibilidade do ferro. De acordo com os autores, o grão-de-bico e o feijão comum apresentaram as melhores disponibilidades de ferro.

O objetivo deste trabalho foi avaliar a disponibilidade do ferro do feijão comum (Phaseolus vulgaris L.) variedade carioca e suas interações com ácido ascórbico e cistina e comparar com a disponibilidade do ferro de carne bovina. Além disso, propôs verificar a quantidade de antinutricionais presentes no feijão e averiguar sua interferência na biodisponibilidade do ferro.

2 - MATERIAL E MÉTODOS

2.1 - Amostras

Foram utilizados grãos de feijão comum (Phaseolus vulgaris), variedade Carioca, recém-colhidos e doados pelo Departamento de Produção Vegetal da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz da Universidade de São Paulo. O músculo bovino fresco picado em cubos de aproximadamente 1 cm, foi adquirido no comércio local. Utilizou-se também ácido L-Ascórbico e L-Cistina, ambos da marca Synth de grau analítico (99 e 98% de pureza, respectivamente).

2.2 - Preparo das amostras

2.2.1 - Feijão

O feijão foi lavado, deixado sob maceração por 12 h em água deionizada na proporção de 1:3 (feijão:água) sendo a água descartada e adicionada na proporção 1:2 (feijão:água) para posterior cozimento em autoclave por 10 min a 121ºC, conforme metodologia descrita por MOLINA, FUENTE & BRESSANI [20].

2.2.2 - Músculo bovino

O músculo bovino foi cozido em panela de inox aberta, em fogo médio, por 30 min, utilizando 434 g de músculo e 500 mL de água deionizada, que foi acrescentada aos poucos durante a cocção da carne.

2.2.3 - Preparo das amostras para análise

Para as análises de diálise de ferro in vitro, as amostras dos diferentes tratamentos foram homogeneizadas e armazenadas em congelador a -18ºC. Para a realização dessa análise, as amostras não foram desidratadas.

Já, para as demais análises, as amostras foram desidratadas em estufa a 55ºC a 60ºC, moídas em moinhos de facas da marca Marconi modelo especial 60 ciclos, peneiradas a 30 mesh, acondicionadas em embalagem plástica de polietileno e mantidas refrigeradas à aproximadamente 11ºC para análises posteriores. Todas as determinações foram realizadas em triplicata.

2.2.4 - Tratamentos

As amostras de carne foram analisadas isoladamente e as amostras de feijão foram analisadas isoladamente e também com o acréscimo de ácido ascórbico e cistina. Deste modo, foram testados os seguintes tratamentos:

T1 - Carne bovina

T2 - Feijão comum

T3 - Feijão comum:ácido ascórbico, na proporção 200 g: 100 mg

T4 - Feijão comum:cistina, 200 g: 5 mg

T5 - Feijão comum: ácido ascórbico:cistina, 200 g:100 mg: 5 mg

2.3 - Fatores antinutricionais

A determinação de fatores antinutricionais foi realizada somente no tratamento 2, na amostra de feijão.

2.3.1 - Taninos

Os taninos foram analisados segundo a metodologia descrita por PRICE, HAGERMAN & BUTLER [23], através da extração de 0,2 g de amostra com 10 mL de metanol em agitação por 20 min e centrifugação a 15.232 g por 10 min. Em seguida foi realizada a reação colorimétrica, com solução de vanilina a 1% em metanol e 8% de HCl em metanol na proporção de 1:1 e com incubação a 30ºC por 20 min. Então, a partir de 1 mL de extrato e 5 mL de solução de vanilina foi realizada a leitura a 500 nm em espectrofotômetro Beckman modelo DU 640, obtendo-se assim a concentração de taninos a partir de uma curva padrão de catequina, sendo os resultados expressos em mg/g.

2.3.2 - Ácido fítico

O teor de ácido fítico nas amostras foi determinado segundo o método descrito por GRYNSPAN & CHERYAN [13]. A Figura 1 mostra como a análise foi realizada.


O teor de ácido fítico foi obtido a partir da construção de curva padrão. Os resultados foram expressos em mg de ácido fítico/g de amostra.

2.3.3 - Ácido oxálico

O ácido oxálico foi determinado pelo método de MOIR [19]. A Figura 2 mostra como a análise foi realizada.


Para a obtenção do conteúdo de ácido oxálico, multiplicou-se o volume gasto (em mL) por 1,80:

2.4 - Minerais

Os minerais foram determinados pelo método de SARRUGE & HAAG [26], sendo utilizado o ácido nítrico para a digestão nitro-perclórica das amostras a 50ºC por 10 a 15 min, a 100ºC até digerir todo o material e atingir a temperatura de 150ºC, sendo reduzida a solução pela metade, foi acrescentado 1 mL de ácido perclórico e a temperatura foi elevada até 250ºC gradativamente. Após resfriamento e diluição do material com água desmineralizada, foi realizada a leitura em espectrofotômetro de absorção atômica.

2.5 - Diálise de ferro in vitro

A análise da diálise de ferro foi realizada segundo método proposto por LUTEN, CREWS & FLYNN [15]. As Figuras 3, 4 e 5 demonstram como a análise foi realizada.




A quantidade de ferro dialisado foi obtida através de curva padrão com cloreto de ferro.

2.6 - Análise estatística

O delineamento experimental empregado foi inteiramente ao acaso, com três repetições por tratamento, totalizando 15 amostras. Os resultados foram submetidos à análise de variância, com teste F. Quando significativo no teste F a 5% de probabilidade, foi aplicado teste de Tukey, sendo utilizado para os cálculos o software SAS [27].

3 - RESULTADOS E DISCUSSÃO

Os antinutricionais foram avaliados somente na amostra de feijão Carioca, visto que a carne não apresenta estes fatores (Tabela 1).

O teor de taninos encontrada, em feijão comum, por MARTINI [18] foi de 0,18%. WEDER et al. [29] encontraram, para o grão cru de feijão, variação de 0,57 a 0,73% de taninos. CANNIATTI-BRAZACA & SILVA [6] encontraram 0,034% de taninos no feijão. OLIVEIRA, QUEIROZ & HELBING [22] observaram que somente o processo de cozimento ocasionou redução do conteúdo de tanino, e que o melhor tratamento para a remoção de tanino foi a maceração, seguida da cocção sem a água de maceração, chegando a 88% a redução no teor de taninos. Como foi utilizado o processo de maceração e descarte da água, ocasionou a diminuição dos teores de taninos na amostra, como pode ser observado na Tabela 1.

A quantidade de ácido fítico encontrada por MARTINI [18] foi de 10,66 mg/g. CANNIATTI-BRAZACA & SILVA [6] encontraram 6,38 mg/g para o feijão Carioca.

Já GUZMÁN-MALDONADO, ACOSTA-GALLEGO & PAREDES-LÓPEZ [12], verificaram para o feijão cozido, variação entre 10,0 a 18,3 mg/g para espécies de feijões selvagens e 7,3 a 10,8 mg/g para os feijões comuns. Portanto, os valores encontrados (Tabela 1) para ácido fítico estão dentro dos valores apresentados por outros autores.

GERMANO [11] avaliou a disponibilidade de ferro e ácido oxálico na presença de b-caroteno em combinações de alimentos fontes de ferro (espinafre, feijão e ovo) e de alimentos fonte de b-caroteno (cenoura, abóbora e couve). O teor de ácido oxálico encontrado variou de 0,14 a 0,27%, sendo que a mistura com espinafre apresentou maiores concentrações. Porém, o teor de ácido fítico variou de 0,00 a 1,03 mg/g, sendo que as maiores concentrações predominaram nas amostras com feijão. Isso revela que o feijão apresentou índices mais elevados para o ácido fítico que para o ácido oxálico, como também ocorreu na presente pesquisa (Tabela 1).

A quantidade de ferro encontrada (Tabela 2) coincide com FRANCO [10] que apresentou o teor de 0,1023 mg de ferro/100 g de carne bovina.MALDONADO & SAMMÁN [17] verificaram em 10 variedades de feijão cru variação de 0,0891 a 0,7600 mg/g de ferro. SAMMÁN et al. [25] encontraram concentração de ferro em torno de 0,0533 a 0,2002 mg/g. CANNIATTI-BRAZACA & SILVA [6] encontraram 0,0931 m/g de ferro em feijão Carioca cozido expressos na base seca. MARTINI [18] encontrou 0,0587 mg de ferro/g de alimento. Esses dados apontam similaridades com os resultados encontrados no presente estudo (Tabela 2).

A Tabela 3 apresenta os valores de diálise de ferro para carne bovina, o feijão e feijão com os promotores de absorção.

Considerando os alimentos de forma isolada, a carne bovina apresentou a maior porcentagem de ferro dialisável. Isto já era esperado, pelo fato deste alimento conter em sua estrutura ferro na forma heme e aminoácidos que propiciam sua absorção. O feijão cozido, acrescido de ácido ascórbico e cistina, se igualou à carne, mostrando efeito aditivo quando há presença dessas duas substâncias. As menores porcentagens de ferro dialisável foram observadas nas amostras de feijão carioca cozido e feijão carioca cozido acrescido apenas de cistina. Quando foram simultaneamente adicionados ao feijão o ácido ascórbico e a cistina, elevou-se a porcentagem do ferro dialisável, igualando-se ao da carne bovina, que contêm aminoácidos sulfurados. Porém pelos resultados encontrados, somente o ácido ascórbico não foi suficiente para promover a disponibilidade do ferro do feijão no mesmo nível do que a da carne e somente a cistina não apresentou efeito de melhora na absorção do ferro não-heme do feijão a nível semelhante ao encontrado na carne.

REEVES et al. [24] avaliaram ratos machos, deficientes em cobre, alimentados com uma dieta contendo cobre, ferro, manganês e cistina e uma dieta com cobre, ferro, manganês e metionina. Nos ratos deficientes, após a ingestão da dieta contendo cistina, passaram a apresentar maiores concentrações de hemoglobina no sangue do que os ratos alimentados com a dieta contendo metionina.

Em um outro estudo, COSTA, TERTO & SANTOS [7] avaliaram a prevalência de deficiência de vitamina C em 104 crianças de 2 a 6 anos de creches municipais de João Pessoa (PB). Para 72 crianças com níveis baixos de vitamina C foi oferecido durante 35 dias, 150 mL de suco de acerola. Após esse período, ocorreu um aumento significativo na concentração média de hemoglobina, evidenciando a relação entre ácido ascórbico e ferro.

A aplicabilidade desse estudo, em nível doméstico, dá-se através da combinação, numa mesma refeição, entre alimentos ricos em vitamina C e alimentos que contenham cistina, como os cereais. Por exemplo, 50 g de feijão Carioca acompanhados de 100 g de arroz e de 100 g de salada de pimentão verde cru, ofertam quantidades iguais ou superiores de cistina e ácido ascórbico (84 mg/ 100 mg, respectivamente) utilizadas na pesquisa. Porém é apropriado lembrar que outras substâncias presentes nesses alimentos interferirão na biodiponibilidade desses nutrientes.

4 - CONCLUSÕES

A quantidade de antinutricional encontrada exerceu efeito inibitório sobre a disponibilidade de ferro da amostra de feijão, porém com acréscimo simultâneo da cistina e do ácido ascórbico melhorou a absorção do ferro do feijão, igualando-o à absorção do ferro da carne bovina.

5 - AGRADECIMENTOS

Ao Departamento de Solos e Nutrição de Plantas Esalq/USP pelo auxílio na análise de ferro.

6 - REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

Recebido para publicação em 23/07/2004 Aceito para publicação em 25/04/2006 (001382)

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    A quem a correspondência deve ser enviada
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      03 Ago 2006
    • Data do Fascículo
      Jun 2006

    Histórico

    • Aceito
      25 Abr 2006
    • Recebido
      23 Jul 2004
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