Acessibilidade / Reportar erro

Índice de polifenóis, antocianinas totais e atividade antioxidante de um sistema modelo de geléia de uvas

Total polyphenol index, total anthocyanins and antioxidant activity of a model system of grape jelly

Resumos

Antocianinas são pigmentos fenólicos com potencial para substituição dos corantes artificiais vermelhos; porém, estes se apresentam instáveis frente ao processamento de alimentos, sendo a temperatura um dos principais fatores envolvidos na degradação da cor destes pigmentos. O objetivo deste trabalho foi avaliar a concentração de compostos fenólicos e a capacidade antioxidante de um sistema modelo de geléia de uvas (SMG) Isabel (Vitis labrusca) e Refosco (Vitis vinifera L.) elaborado a 45 °C, utilizando como agente espessante uma mistura de gomas xantana e locusta. Nos SMGs elaborados, avaliou-se a estabilidade dos pigmentos antociânicos e determinou-se polifenóis totais (IPT), antocianinas totais (AT). A atividade antioxidante foi medida utilizando os métodos de captura de radicais estáveis como o radical DPPH (2,2-difenil-1-picril-hidrazila) e o radical ABTS (2,2’-azino-bis-(3-etilbenzotiazolina-6-ácido sulfônico)). Avaliou-se também a concentração de AT nos extratos de uvas utilizados na elaboração do SMG. Um alto coeficiente de correlação foi encontrado entre AT e IPT dos SMGs e a atividade antioxidante. Os melhores resultados quanto à concentração de IPT, AT e em relação à atividade antioxidante foram obtidos para o SMG elaborado com uva Refosco. O método utilizado para a elaboração dos SMGs foi efetivo na preservação da cor antocianinas e das propriedades antioxidantes dos compostos fenólicos totais avaliados.

uva; antocianinas; compostos fenólicos; atividade antioxidante; estabilidade


Anthocyanins are phenolic pigments with a potential for replacing synthetic red dyes. However, their stability is affected by food processing, and temperature is one of the main factors involved in these pigments’ color degradation. The aim of this work was to evaluate the concentration of phenolic compounds and the antioxidant capacity of a grape jelly model system (JMS). The grape varieties used here were Isabel (Vitis labrusca) and Refosco (Vitis vinifera L.) and the jelly was cooked at 45 °C, using a mixture of xanthan gum and locust bean gum as the thickening agent. Two JMSs were prepared and analyzed to determine their anthocyanin stability, total polyphenol index (TPI) and total anthocyanin content (TA). The antioxidant activity was measured by the DPPH and ABTS radical-scavenging methods. The TA concentration was also determined in the grape extracts used in the preparation of the JMSs. The best results in terms of TPI, TA and antioxidant activity were obtained for the JMS produced with Refosco grapes. A high correlation coefficient was found between the TA and TPI in the JMSs and the antioxidant activity. The method used in the production of the JMSs was effective in preserving the color of anthocyanins and the antioxidant properties of the total phenolic compounds evaluated here.

grape; anthocyanins; phenolic compounds; antioxidant activity; stability


Índice de polifenóis, antocianinas totais e atividade antioxidante de um sistema modelo de geléia de uvas

Total polyphenol index, total anthocyanins and antioxidant activity of a model system of grape jelly

Ana Paula Falcão; Eduardo Sidinei Chaves; Eugênia Marta Kuskoski; Roseane Fett; Leila Denise Falcão; Marilde Terezinha Bordignon-Luiz* * A quem a correspondência deve ser enviada

Centro de Ciências Agrárias – CCA, Departamento de Ciência e Tecnologia de Alimentos, Universidade Federal de Santa Catarina – UFSC, Rod. Admar Gonzaga, 1346, CEP 88034-001, Itacorubi, Florianópolis - SC, Brasil, E-mail: bordign@cca.ufsc.br

RESUMO

Antocianinas são pigmentos fenólicos com potencial para substituição dos corantes artificiais vermelhos; porém, estes se apresentam instáveis frente ao processamento de alimentos, sendo a temperatura um dos principais fatores envolvidos na degradação da cor destes pigmentos. O objetivo deste trabalho foi avaliar a concentração de compostos fenólicos e a capacidade antioxidante de um sistema modelo de geléia de uvas (SMG) Isabel (Vitis labrusca) e Refosco (Vitis vinifera L.) elaborado a 45 °C, utilizando como agente espessante uma mistura de gomas xantana e locusta. Nos SMGs elaborados, avaliou-se a estabilidade dos pigmentos antociânicos e determinou-se polifenóis totais (IPT), antocianinas totais (AT). A atividade antioxidante foi medida utilizando os métodos de captura de radicais estáveis como o radical DPPH (2,2-difenil-1-picril-hidrazila) e o radical ABTS (2,2’-azino-bis-(3-etilbenzotiazolina-6-ácido sulfônico)). Avaliou-se também a concentração de AT nos extratos de uvas utilizados na elaboração do SMG. Um alto coeficiente de correlação foi encontrado entre AT e IPT dos SMGs e a atividade antioxidante. Os melhores resultados quanto à concentração de IPT, AT e em relação à atividade antioxidante foram obtidos para o SMG elaborado com uva Refosco. O método utilizado para a elaboração dos SMGs foi efetivo na preservação da cor antocianinas e das propriedades antioxidantes dos compostos fenólicos totais avaliados.

Palavras-chave: uva; antocianinas; compostos fenólicos; atividade antioxidante; estabilidade.

ABSTRACT

Anthocyanins are phenolic pigments with a potential for replacing synthetic red dyes. However, their stability is affected by food processing, and temperature is one of the main factors involved in these pigments’ color degradation. The aim of this work was to evaluate the concentration of phenolic compounds and the antioxidant capacity of a grape jelly model system (JMS). The grape varieties used here were Isabel (Vitis labrusca) and Refosco (Vitis vinifera L.) and the jelly was cooked at 45 °C, using a mixture of xanthan gum and locust bean gum as the thickening agent. Two JMSs were prepared and analyzed to determine their anthocyanin stability, total polyphenol index (TPI) and total anthocyanin content (TA). The antioxidant activity was measured by the DPPH and ABTS radical-scavenging methods. The TA concentration was also determined in the grape extracts used in the preparation of the JMSs. The best results in terms of TPI, TA and antioxidant activity were obtained for the JMS produced with Refosco grapes. A high correlation coefficient was found between the TA and TPI in the JMSs and the antioxidant activity. The method used in the production of the JMSs was effective in preserving the color of anthocyanins and the antioxidant properties of the total phenolic compounds evaluated here.

Keywords: grape; anthocyanins; phenolic compounds; antioxidant activity; stability.

1 Introdução

A aplicação de pigmentos naturais e a sua correlação com a atividade antioxidante em alimentos é objeto de interesse tanto para a indústria como para os consumidores. Estudos recentes relacionam a ingestão de frutas e vegetais com propriedades antioxidantes e a diminuição do risco e desenvolvimento de algumas doenças crônico-degenerativas25,27. O uso desses pigmentos em produtos alimentícios é um fator essencial para a funcionalidade, bem como para a agregação de valor à imagem final do produto.

As antocianinas presentes em uvas estão concentradas principalmente na casca, com exceção de poucas variedades cuja polpa também é pigmentada6,20. Os pigmentos antociânicos majoritários em uvas são malvidina-3-glicosídio, petunidina-3-glicosídio, cianidina-3-glicosídio, delfinidina-3-glicosídio, peonidina-3-glicosídio11,23. Em soluções aquosas, as antocianinas se apresentam sob diferentes estruturas em equilíbrio. Estas são dependentes do pH da solução e suas estruturas sofrem rearranjos. O pH ácido é favorável para a forma colorida destes pigmentos. A temperatura é um fator importante na degradação da cor das antocianinas5,19. Durante o aquecimento, geralmente a degradação e a polimerização levam à descoloração destes pigmentos16, por este motivo a temperatura e o tempo de aquecimento dos alimentos durante o processamento são parâmetros que merecem considerável atenção.

Devido à complexidade das reações químicas que afetam a estabilidade das antocianinas durante o processamento de alimentos, como por exemplo, na elaboração de sucos concentrados, doces e geléias, torna-se difícil isolar um único fator que explique as mudanças que ocorrem com a cor e as propriedades funcionais destes pigmentos. Conseqüentemente, a avaliação de um parâmetro isolado requer a utilização de sistemas modelos para a obtenção de informações mais precisas em relação à estabilidade destes pigmentos. Tendo em vista as propriedades funcionais das antocianinas, diversas pesquisas são focadas na determinação do conteúdo de antocianinas e sua correlação com a atividade antioxidante9,14,15,17,23,26, buscando, assim, ampliar a aplicação destes pigmentos naturais na indústria de alimentos e cosméticos.

Dados da literatura sobre o conteúdo de compostos fenólicos em extratos, em sistemas modelos e/ou em geléias de uvas apresentam diferenças significativas. A influência do processamento, assim como a variedade de uva, e as condições climáticas e atmosféricas do local de cultivo podem influenciar no conteúdo destes compostos e, conseqüentemente, nas propriedades antioxidantes1,13.

A uva Isabel, uma das principais variedades Vitis labrusca, é originária do sul dos Estados Unidos. Em 1850 despertou interesse dos viticultores europeus devido à resistência ao oídio23. Devido ao seu aroma ‘foxado’ característico, que mascara a percepção de aromas refinados do vinho, seu uso é limitado para elaboração de vinhos finos. Esta variedade é amplamente utilizada para elaboração de vinhos de mesa comuns, que, devido às suas características típicas, devem ser consumidos jovens, pois não melhoram com o envelhecimento23. Assim, esta variedade de uva possui uma considerável importância sócio-econômica no sul do Brasil. A uva Refosco (Vitis vinifera L.), também conhecida como ‘Refosco dal Paduncolo Roso’, ‘Terrano’ ou ‘Teran’, é uma variedade nativa do norte da Itália, da região de Friuli, Gave e Trentino. Por muito tempo, foi erroneamente considerada ser a variedade francesa Mondeuse Noir. Esta variedade possui alto poder tintorial e é conhecida por produzir vinhos de personalidade forte, tânicos e ‘duros’, com coloração rubi escuro e acidez elevada. Devido a esta coloração atrativa, justifica-se nosso interesse em avaliar o potencial de estabilidade de cor e atividade antioxidante desta variedade. Ambas as variedades Isabel e Refosco, estão implantadas na região do Vale do Rio do Peixe, uma das principais regiões vitícolas do Estado de Santa Catarina. Contudo, pouco se sabe sobre a estabilidade das antocianinas destas variedades em sistemas modelos de alimentos.

O objetivo deste trabalho foi avaliar a concentração de compostos fenólicos totais, a estabilidade das antocianinas e a capacidade antioxidante (radicais DPPH e ABTS) de um sistema modelo de geléia de uvas (SMG) Isabel e Refosco elaborado a 45 °C.

2 Material e métodos

2.1 Amostras

As amostras de uva Isabel e Refosco, safra de 2004, foram provenientes da Empresa de Pesquisa Agropecuária de Santa Catarina (EPAGRI) - Estação Experimental de Videira. As amostras foram lavadas em água corrente, tratadas em uma solução de hipoclorito de sódio (200 ppm), branqueadas com água (100 °C) durante três minutos, e em seguida, colocadas em banho de gelo7. As frutas foram imediatamente congeladas em um congelador de placas (40 °C) (Frigostrella, São Paulo) e armazenadas em um freezer convencional (–18 °C) até a realização das análises.

2.2 Extração das antocianinas, elaboração do sistema modelo de geléia (SMG) e análises físico-químicas

Para a obtenção do extrato bruto de antocianinas, pesaram-se 100 g de uva, que foram esmagadas, transferidas para copo de Bécker e adicionadas de 20 mL de solução de ácido cítrico 6%. Posteriormente, foram submetidas a um tratamento térmico a 70 °C em banho termostatizado, durante diferentes tempos (0, 2, 4 e 6 minutos), designados como extrato zero, 2, 4 e 6, visando avaliar o melhor tempo a ser utilizado para extrair as antocianinas. Os extratos obtidos foram filtrados em papel Whatman nº 2 e submetidos a leituras de absorvância a 540 nm (l máximo), utilizando um espectrofotômetro de absorção UV-Visível (Hitachi U2010, Tokyo, Japão).

O processo de elaboração tradicional de geléias utiliza temperaturas severas, pois o agente gelificante utilizado é a pectina, que necessita de altas temperaturas para gelificar7. Neste trabalho, o agente espessante utilizado foi uma combinação das gomas xantana (Kelko, CA, USA) (0,70%, m.v–1) e locusta (Kerry, Brasil) (0,20%, m.v–1). Foram utilizados ainda na composição do SMG: frutose (Vetec, Rio de Janeiro) e aspartame (comercial), ácido cítrico monohidratado (Nuclear) (até atingir pH final 3,0) e sorbato de potássio. Os extratos antociânicos foram adicionados no final do processo, quando a temperatura se situava entre 40-45 °C.

As análises físico-químicas do SMG realizadas foram: sólidos solúveis totais (SST), pH, umidade e cinzas. A determinação de SST (°Brix a 25 °C) foi realizada com refratômetro de bancada Abbe. O pH foi medido diretamente, com auxílio de um pHmetro previamente calibrado (Metler–Toledo, MP 220 Schwerznbach, Switzerland). As determinações de umidade e cinzas foram realizadas de acordo com normas estabelecidas pela AOAC2.

2.3 Estabilidade dos pigmentos antociânicos

As amostras dos SMG elaboradas com os extratos extraídos em diferentes tempos (0, 2, 4 e 6 minutos) foram mantidas em temperatura ambiente (25 ± 3 °C), entre duas lâmpadas fluorescentes (40 W, ~2500 lumens), a 40 cm de distância de cada lâmpada. O estudo da estabilidade dos pigmentos em SMG foi realizado da seguinte maneira: uma alíquotade 2,0 g dos SMGs foi extraída com 10 mL de etanol absoluto durante uma hora; após isso, as amostras foram centrifugadas a 5700 g (Janetzki K-24, Germany) por 30 minutos. O sobrenadante foi utilizado para as leituras espectrofotométricas no comprimento de onda de máxima absorção para antocianinas (l = 540 nm), em intervalos de tempos regulares (a cada 24 horas), até ser observado um valor de absorvância correspondente a 50%, ou mais, do valor inicial (‘tempo zero’) (384 horas). O etanol absoluto foi utilizado como branco. Os valores do tempo de meia vida (t1/2) (Equação 1)14 e os valores de percentagem de retenção de cor (% R, Equação 2) 10 foram calculados de acordo com as seguintes equações:

onde: t = tempo (horas), At = Absorvância final (tempo t) e At0 = Absorvância inicial (tempo zero).

2.4 Antocianinas monoméricas totais (AT), índice de polifenóis totais (IPT) e atividade antioxidante do SMG

Os SMGs foram elaborados utilizando os extratos de uvas Refosco e Isabel que apresentaram os maiores valores de tempo de meia vida em relação aos pigmentos antociânicos. A extração dos pigmentos antociânicos dos SMGs foi realizada da seguinte forma: amostras (cinco gramas) foram maceradas por 1 hora, utilizando dois diferentes solventes extratores, acetona 70% e etanol 70%, posteriormente os extratos foram filtrados em papel Whatman nº 2 e utilizados para determinação de AT, IPT e atividade antioxidante.

Para determinação de Polifenóis totais foi utilizado o método de Folin-Ciocalteu, de acordo com KIRALP e TOPPARE13. Diluiu-se 0,10 mL do extrato em 7,90 mL de água deionizada, adicionou-se 0,50 mL de reagente Folin-Ciocalteu e após 3-8 minutos, adicionou-se 1,50 mL de solução saturada de Na2CO3 20% (m.v–1). Após 2 horas, foi lida a absorvância a 765 nm utilizando espectrofotômetro de absorção UV-Visível (Hitachi U2010, Tokyo, Japão). A determinação do IPT foi realizada utilizando uma curva de calibração com ácido gálico (0-500 mg.L–1) e os resultados expressos em mg de equivalente de ácido gálico (GAE) por 100 g SMG (peso fresco).

Para quantificação das AT, utilizou-se o método de pH diferencial8. A absorvância foi medida em um espectrofotômetro de absorção UV-Vis (Hitachi U2010, Tokyo, Japão) a 540 e 700 nm em soluções tampões em pH 1,0 e 4,5, utilizando Abs = [(A = (Almax– A700) pH 1,0 – (Almax– A700) pH 4,5], com o coeficiente de extinção molar da malvidina 3-glicosidio (29,500) e o peso molecular de 562,5 g.mol–1. Resultados foram expressos em mg de equivalentes de malvidina 3-glicosídio por 100 g de SMG.

Para determinar a atividade antioxidante nestes extratos, dois métodos foram utilizados. Método ABTS (2,2’-azino-bis-(3-etilbenzotiazolina-6-ácido sulfônico)), descrito por RE et al.22: as medidas foram realizadas a 754 nm em espectrofotômetro UV-Vis (Hitachi U2010, Tokyo, Japão) nos tempos 1, 4 e 7 minutos após a adição da amostra. Preparou-se uma curva padrão com Trolox (6-hidroxi-2,5,7,8-tetrametilcromo-2-ácido carboxílico) e os resultados foram expressos em atividade antioxidante equivalente ao Trolox (TEAC) (µmol TEAC.g–1 de amostra). No segundo método (2,2-difenil-1-picril-hidrazila), conforme descrito por BRAND-WILLIAMS, CUVELIER e BERSET3 e utilizando as adaptações de KIM et al.12, leituras de absorvância foram realizadas a 517 nm, com medidas nos tempos de 30 e 60 minutos ao reagir com amostra. Os resultados foram expressos em equivalente de atividade antioxidante ao Trolox (TEAC) (µmol TEAC.g –1 de amostra).

2.5 Análise estatística

Os resultados de t , %R, IPT, AT e atividade antioxidante foram submetidos à Análise de Variância (ANOVA) utilizando o programa STATISTICA, versão 6.0 (2001) (StatSotft Inc., Tulsa, OK, USA). O Teste Tukey (HSD) foi aplicado quando detectada diferença entre os fatores ao nível 5% de significância (p < 0,05). Todo o experimento foi realizado com duas repetições em duplicata.

3 Resultados e discussão

O SMG elaborado com uvas Isabel apresentou pH 3,15, 80% de umidade, teor de cinzas de 0,4% e 20,5 °Brix. O SMG elaborado com a uva Refosco apresentou pH 3,25, umidade de 83,65%, 0,5% de cinzas e 23 °Brix.

Os resultados da estabilidade dos pigmentos antociânicos em SMG são apresentados na Tabela 1. Observa-se uma correlação positiva entre o aumento do tempo de exposição dos extratos de uva ao tratamento térmico (70 °C), o aumento do tempo de meia vida (t1/2) e a percentagem de retenção de cor (% R) dos pigmentos antociânicos (extratos 0, 2, 4 e 6). Isto ocorre, porque o aumento da temperatura auxilia na transferência dos pigmentos das cascas de uvas para o ‘mosto’, bem como, auxilia na inativação de enzimas que degradam as antocianinas, preservando-as. GASPAR, LAUREANO e SOUSA7 observaram que para uvas da variedade Napoleão, expostas por diferentes tempos (0, 2, 2,5, 3 e 4 minutos) sob vapor fluente (± 100 °C), o tempo de três minutos, conferiu maior estabilidade da cor e evitou alterações durante o processamento das geléias como também reduziu 95,5% da enzima PPO no mosto.

O conteúdo de compostos fenólicos que prevalece nos produtos elaborados com uva pode ser dependente de vários fatores, entre eles, a variedade da uva, o método aplicado na extração destes compostos e as condições de armazenamento. Os valores de IPTs dos SMGs elaborados com extratos de uva Isabel e Refosco são apresentados na Tabela 2. O maior valor observado foi para o SMG elaborado com uva Refosco utilizando como solvente extrator a acetona 70%. Em relação aos solventes aplicados, em ambas as variedades de uvas avaliadas, observou-se que a acetona 70% foi mais eficaz para a extração de polifenóis totais. Para SMG elaborados com uva Refosco, observa-se que houve diferença estatisticamente significativa entre as amostras extraídas com etanol e acetona (p < 0,05), enquanto que para uva Isabel esta diferença não foi significativa (p > 0,05). Estes resultados são superiores aos obtidos por DÁVALOS, BARTOLOMÉ e GÓMEZ-CORDOVÉS4 em sucos de uvas comercializados na Espanha, os quais verificaram IPT entre 70,5 ± 1,0 e 117,7 ± 2,0 mg GAE.100 mL–1. PASTRANA-BONILLA et al.20 avaliaram o conteúdo de compostos fenólicos e atividade antioxidante de uvas Muscadine (Vitis rotundifolia Michx.). Estes pesquisadores encontraram IPT entre 169,1 e 309,7 mg GAE.100 g–1 para uvas Muscadine bronze (variedades Carlos, Early Fry, Fry, Summit, Late Fry) e 184,7 a 425,7 mg GAE.100 g–1 para de uvas Muscadine púrpura (variedades Paulk, Cowart, Supreme, Ison, Noble). PLESSI, BERTELLI e ALBASINI21 avaliaram o conteúdo de polifenóis totais em geléias elaboradas com algumas variedades de frutos em baga (blackberry, raspberry e red currant) e verificaram resultados de IPT em média de 402, 286, 333 e 737 mg.100 g–1 para as geléias de blackberry, raspberry, red currant e black currant, respectivamente. Em relação aos resultados para uva Refosco nesta pesquisa, nos dois diferentes solventes avaliados, notam-se valores atrativos de IPT para esta variedade de uva quando comparados aos estudos acima citados, sugerindo uma possível propriedade funcional desta variedade.

O conteúdo de antocianinas totais, determinado nos extratos iniciais (antes de serem adicionados aos SMGs) e dos SMGs é apresentado na Tabela 3. Avaliando a influência dos solventes extratores observou-se que houve diferença significativa entre os dois solventes avaliados, sendo a acetona 70% a mais eficaz na extração de antocianinas (p < 0,05). Quanto às variedades de uvas, observou-se que a uva Refosco apresentou um conteúdo de AT significativamente superior a uva Isabel (p < 0,05), sendo que este foi 2,4 e 2,6 vezes superior quando extraído com acetona 70% e etanol 70%, respectivamente. Avaliando a influência da temperatura utilizada na elaboração dos SMGs observou-se que não houve diferença significativa em relação ao teor de AT antes e após a elaboração do SMG (p > 0,05), independente do solvente extrator e da variedade de uva. Isto indica que o processamento utilizado para elaboração do SMG manteve a concentração inicial das antocianinas, o que normalmente não ocorre no processamento tradicional de geléias de uva, que utiliza pectina como agente espessante e, assim, necessita temperaturas elevadas para conferir a consistência desejada. Verifica-se, portanto, um alto potencial de aplicação deste método de elaboração de SMG de uvas, com o intuito de preservar a cor e a funcionalidade das antocianinas. Contudo, estudos de vida de prateleira devem ser realizados, visando avaliar a qualidade destes SMGs em função do tempo. Em relação ao teor de AT, destaca-se também a variedade de uva Refosco, que apresentou um alto conteúdo de AT, se comparado ao estudo de PLESSI, BERTELLI e ALBASINI21, no qual as concentrações médias de antocianinas em geléias de frutas foram de 58,0 mg.100 g–1 para blackberry, 17,0 mg.100 g–1 para raspberry, 12,0 mg.100 g–1 para red currant.

A atividade antioxidante de frutas e geléias está diretamente relacionada ao conteúdo de compostos fenólicos e estes compostos podem ser degradados por fatores físico-químicos comuns ao processamento de alimentos4,24. Dessa forma, a análise da atividade antioxidante após o processamento de alimentos é relevante.

Os resultados obtidos através do método ABTS foram superiores aos obtidos com método DPPH (Tabela 2 e 3). Contudo, os valores obtidos em 1 minuto de reação no método ABTS e os valores obtidos em 60 minutos com método DPPH, não apresentam diferença significativa (p < 0,05). Pelo método ABTS, não houve diferença significativa entre os resultados, para ambas as variedades de uvas (p < 0,05), nos tempos 1, 4 e 7 minutos. OU et al.19, em um estudo comparativo, avaliaram diferentes métodos de determinação da atividade antioxidante e observaram resultados discrepantes.

PASTRANA-BONILLA et al.20 determinaram a atividade antioxidante de uvas da variedade Muscadine (Vitis rotundifolia Michx.) e encontraram valores TEAC que variaram entre 9,8 e 18,2 µmol.g–1 para variedades bronze (Carlos, Early Fry, Fry, Summit, Late Fry), e entre 11,2 e 27,8 µmol.g–1 para variedades púrpura (Paulk, Cowart, Supreme, Ison, Noble). Estes resultados são semelhantes aos encontrados em nosso trabalho. Analisando as variedades de uvas estudadas, observou-se que a uva Refosco apresentou maior atividade antioxidante no SMG, independente do método utilizado.

Visando correlacionar os resultados das análises de atividade antioxidante determinados nos SMGs pelos métodos de DPPH e ABTS (µmol TEAC.g–1) com o conteúdo de polifenóis e antocianinas totais, análises de regressão foram realizadas (Figuras 1 e 2).



Verificou-se um alto coeficiente de determinação entre os resultados de atividade antioxidante obtidos pelos métodos ABTS e DPPH e os valores de IPT e AT nos SMGs (Figuras 1 e 2). Uma relação positiva foi observada entre estes resultados, sendo esta superior para a concentração de IPT no SMG (r2 = 0,9926 e r2 = 0,9672, para os métodos DPPH e ABTS, respectivamente) quando comparado ao conteúdo de AT (r2 = 0,9719 e r2 = 0,9393, para os métodos DPPH e ABTS, respectivamente). Estes resultados estão de acordo com resultados prévios de DÁVALOS, BARTOLOMÉ e GÓMEZ-CORDOVÉS4 e de SILVA et al.25 que correlacionaram positivamente a atividade antioxidante ao conteúdo de compostos fenólicos em frutas e geléias.

4 Conclusões

Os melhores resultados de estabilidade (t1/2 e %R) dos pigmentos antociânicos nos SMG foram observados para o extrato 6 (6 minutos a 70 °C). Não houve diferença significativa entre o conteúdo de AT determinado nos extratos antes e depois de serem adicionados aos SMGs, indicando que o método utilizado para a elaboração dos SMGs preservou significativamente os pigmentos. Houve influência do solvente na extração dos compostos fenólicos, sendo que a acetona 70% foi utilizada como solvente extrator. A variedade de uva Refosco apresentou melhores resultados tanto para a atividade antioxidante (métodos ABTS e DPPH), quanto para o IPT e AT quando comparada à variedade Isabel. Contudo, estudos visando avaliar a vida-de-prateleira, bem como a capacidade antioxidante utilizando um maior número de amostras, ainda são necessários para confirmar a qualidade destes SMGs em função do tempo e seu potencial antioxidante.

Agradecimentos

À CAPES e ao CNPq pelo auxílio financeiro e à EPAGRI, Estação Experimental de Videira, pelas amostras de uvas Isabel e Refosco.

Recebido para publicação em 16/11/2006

Aceito para publicação em 7/6/2007 (002036)

  • 1. AMAKURA, Y. et al. Influence of jam processing on the radical scavenging activity and phenolic content in berries. Journal of Agricultural and Food Chemistry, v. 48, n. 12, p. 6292-6297, 2000.
  • 2
    ASSOCIATION OF OFFICIAL ANALYTICAL CHEMISTS. Official methods of analysis of analysis of association of official analytical chemists 18 ed. Maryland: AOAC, 2005.
  • 3. BRAND-WILLIAMS W.; CUVELIER, M. E.; BERSET, C. Use of a free radical method to evaluate antioxidant activity. Lebensmittel-Wissenschaft und Technologie, v. 28, n. 1, p. 25-30, 1995.
  • 4. DÁVALOS, A.; BARTOLOMÉ, B.; GÓMEZ-CORDOVÉS, C. Antioxidant properties of commercial grape juices and vinegars. Food Chemistry, v. 93, n. 2, p. 325-330, 2005.
  • 5. DELGADO-VARGAS, F.; JIMÉNEZ, A. R.; PAREDES-LÓPEZ, O. Natural pigments: carotenoids, anthocyanins and betalains characteristics, biosynthesis, processing and stability. Critical Reviews in Food Science and Nutrition, v. 40, n. 3, p. 231-250, 2000.
  • 6. FERNÁNDEZ-LÓPEZ, J. A. et al. Dependence between colour and individual anthocyanin content in ripening grapes. Food Research International, v. 31, n. 9, p. 667-672, 1998.
  • 7. GASPAR, C.; LAUREANO, O.; SOUSA, I. Production of reduced-calorie grape juice jelly with gellan, xanthan and locust bean gums: sensory and objective analysis of texture. Z Lebensm Unters Forsch A, v. 206, n. 3, p. 169-174, 1998.
  • 8. GIUSTI M. M.; WROLSTAD, R. E. Characterization and measurement of anthocyanins by UV-Visible spectroscopy. Current Protocols in Food Analytical Chemistry, John Wiley e Sons, Inc. Unit F1.2, 2001.
  • 9. GORINSTEIN, S. et al. Comparison of the contents of the main antioxidant compounds and the antioxidant activity of white grapefruit and his new hybrid. Lebensmittel-Wissenschaft und Technologie, v. 37, n. 3, p. 337-343, 2001.
  • 10. KATSABOXAKIS, K.; PAPANICOLAOU, D.; MELANITOU, M. Stability of pigmented orange anthocyanins in model and real food systems. Italian Journal of Food Science, v. 10, n. 1, p. 17-25, 1998.
  • 11. KELEBEK, H. et al. Influence of different maceration times on the anthocyanins composition of wines made from Vitis vinifera L. cvs. Bogazkere and Öküzgözü. Journal of Food Engineering, v. 77, n. 4, p. 1012-1017, 2006.
  • 12. KIM, D. O. et al. Vitamin C equivalent antioxidant capacity (VCEAC) of phenolics phytochemicals. Journal of Agricultural and Food Chemistry, v. 50, n. 13, p. 3713-3717, 2002.
  • 13. KIRALP, S.; TOPPARE L. Polyphenol content in selected Turkish wines, an alternative method of detection of phenolics. Process Biochemistry, v. 41, n. 1, p. 236-239, 2006.
  • 14. KIRCA, A.; CEMEROGLU, B. Degradation kinetics of anthocyanins in blood orange juice and concentrate. Food Chemistry, v. 81, n. 4, p. 583-588, 2003.
  • 15. KUSKOSKI, E. M. et al. Characterization of anthocyanins from the fruits of baguaçu (Eugenia umbelliflora Berg). Journal of Agricultural and Food Chemistry, v. 51, n. 18, p. 5450-5454, 2003.
  • 16. MARKAKIS, P. Anthocyanins as food colors New York: Academic Press, Inc., 1982, 263 p.
  • 17. MORAIS, H. et al. Influence of storage conditions of monomeric anthocyanins studied by reversed-phase high-performance liquid chromatography. Journal of Chromatography B - Analytical Technologies in the Biomedical and Life Sciences, v. 770, n. 1, p. 297-301, 2002.
  • 18. ÖZKAN, M.; YEMENICIOGLU, A.; CEMEROGLU, B. Degradation of various fruit juice anthocyanins by hydrogen peroxide. Food Research International, v. 38, n. 8-9, p. 1015-1021, 2005.
  • 19. OU, B. et al. Analysis of antioxidant activity of common vegetables employing oxygen radical absorbance capacity (ORAC) and ferric reducing antioxidant power (FRAP) assays: a comparative study. Journal of Agricultural and Food Chemistry, v. 50, n. 11, p. 3122-3128, 2002.
  • 20. PASTRANA-BONILLA, E. et al. Phenolic content and antioxidant capacity of Muscadine grapes. Journal of Agricultural and Food Chemistry, v. 51, n. 18, p. 5497-5503, 2003.
  • 21. PLESSI, M.; BERTELLI, D.; ALBASINI, A. Distribution of metals and phenolic compounds as a criterion to evaluate variety of berries and related jams. Food Chemistry, v. 100, n. 1, p. 419-427, 2007.
  • 22. RE, R. et al. Antioxidant activity applying an improved ABTS radical cation decolorization assay. Free Radical Biology and Medicine, v. 26, n. 9-10, p. 1231-1237, 1999.
  • 23. RIZZON, L. A., MIELE, A., MENEGUZZO, J. Avaliação da uva cv. Isabel para a elaboração de vinho tinto. Ciência e Tecnologia de Alimentos, v. 20 n. 1, p. 115-121, 2000
  • 24. RUBERTO, G. et al. Polyphenol constituents and antioxidant activity of grape pomace extracts from five Sicilan red grape cultivars. Food Chemistry, v. 100, n. 1, p. 203-210, 2007.
  • 25. SILVA, B. M. et al. Quince (Cydonia oblonga Miller) Fruit (Pulp, Peel and Seed) and Jam: antioxidant activity. Journal of Agricultural and Food Chemistry, v. 52, n. 15, p. 4705-4712, 2004.
  • 26. SRIVASTAVA, A.; HARISH, S. R.; SHIVANANDAPPA, T. Antioxidant activity of the roots of Decalepis hamiltonii (Wight & Arn.). Lebensmittel-Wissenschaft und Technologie, v. 39, n. 15, p. 1059-1065, 2006.
  • 27. WICKLUND, T. et al. Antioxidant capacity and colour of strawberry jam as influenced by cultivar and storage conditions. LWT - Lebensmittel-Wissenschaft und Technologie, v. 38, n. 4, p. 387-391, 2005.
  • 28. ZHOU, K.; YU, L. Total phenolic contents and antioxidant properties of commonly consumed vegetables grown in Colorado. Lebensmittel-Wissenschaft und Technologie, v. 39, n. 10, p. 1155-1162, 2006.
  • *
    A quem a correspondência deve ser enviada
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      29 Out 2007
    • Data do Fascículo
      Set 2007

    Histórico

    • Aceito
      07 Jun 2007
    • Recebido
      16 Nov 2006
    Sociedade Brasileira de Ciência e Tecnologia de Alimentos Av. Brasil, 2880, Caixa Postal 271, 13001-970 Campinas SP - Brazil, Tel.: +55 19 3241.5793, Tel./Fax.: +55 19 3241.0527 - Campinas - SP - Brazil
    E-mail: revista@sbcta.org.br