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Composição de amostras de mel de abelha Jataí (Tetragonisca angustula latreille, 1811)

Composition of the honey of samples originated from Jataí bees (Tetragonisca angustula latreille, 1811)

Resumos

As características físico-químicas do mel produzido pelas abelhas sem ferrão ainda são pouco conhecidas, principalmente devido à elevada diversidade da flora apícola e à baixa produção que é inerente a estas espécies. O objetivo deste trabalho foi determinar as características físico-químicas de 20 amostras de mel de Jataí (Tetragonisca angustula), do município de Piracicaba, estado de São Paulo, contribuindo para o estabelecimento de um padrão de qualidade do mel das abelhas sem ferrão brasileiras, possibilitando o controle da fraude deste produto. Desta maneira, as seguintes análises foram realizadas: açúcares totais, açúcares redutores, sacarose aparente, umidade, hidroximetilfurfural, proteínas, cinzas, pH, acidez, índice de formol, condutividade elétrica, cor, atividade diastásica e atividade de água. Os resultados demonstram que a legislação atual, referente ao mel de Apis mellifera, não é adequada para todos os caracteres analisados, reforçando a necessidade de um padrão próprio para os méis de meliponíneos.

abelhas sem ferrão; análises físico-químicas; mel de abelha Jataí


The knowledge regarding the physicochemical characteristics of the honey produced by stingless bees is still limited, mainly due to the high diversity of the floral resources and the low production that is inherent to these species. This research deals with the physicochemical characteristics of 20 samples of Tetragonisca angustula honey, from the municipality of Piracicaba, state of São Paulo, Brazil, contributing to the establishment of a quality standard for the honey produced by Brazilian stingless bees making possible the control of this product. Thus, the following parameters were determined: total sugars, reducing sugars, apparent sucrose, moisture content, hydroxymethylfurfural, proteins, ashes, pH, acidity, formol index, electrical conductivity, color, diastase activity, and water activity. The results indicated that the Brazilian standard rules, referring to the Apis mellifera honey, are not adequate to all parameters analyzed reinforcing the need of a establishment of a proper standard for the honey from meliponids.

stingless bees; physicochemical analysis; Jataí bee honey


Composição de amostras de mel de abelha Jataí (Tetragonisca angustula latreille, 1811)

Composition of the honey of samples originated from Jataí bees (Tetragonisca angustula latreille, 1811)

Daniela de Almeida AnacletoI, * * A quem a correspondência deve ser enviada ; Bruno de Almeida SouzaI; Luis Carlos MarchiniI; Augusta Carolina de Camargo Carmello MoretiII

IDepartamento de Entomologia, Fitopatologia e Zoologia Aplicada, Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz – Esalq, Universidade de São Paulo – USP, CEP 13400-000, Piracicaba - SP, Brasil

IIInstituto de Zootecnia, Agência Paulista de Tecnologia dos Agronegócios – APTA, Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Estado – SAA, Nova Odessa - SP, Brasil, E-mail: daniela@eafsi.gov.br

RESUMO

As características físico-químicas do mel produzido pelas abelhas sem ferrão ainda são pouco conhecidas, principalmente devido à elevada diversidade da flora apícola e à baixa produção que é inerente a estas espécies. O objetivo deste trabalho foi determinar as características físico-químicas de 20 amostras de mel de Jataí (Tetragonisca angustula), do município de Piracicaba, estado de São Paulo, contribuindo para o estabelecimento de um padrão de qualidade do mel das abelhas sem ferrão brasileiras, possibilitando o controle da fraude deste produto. Desta maneira, as seguintes análises foram realizadas: açúcares totais, açúcares redutores, sacarose aparente, umidade, hidroximetilfurfural, proteínas, cinzas, pH, acidez, índice de formol, condutividade elétrica, cor, atividade diastásica e atividade de água. Os resultados demonstram que a legislação atual, referente ao mel de Apis mellifera, não é adequada para todos os caracteres analisados, reforçando a necessidade de um padrão próprio para os méis de meliponíneos.

Palavras-chave: abelhas sem ferrão; análises físico-químicas; mel de abelha Jataí.

ABSTRACT

The knowledge regarding the physicochemical characteristics of the honey produced by stingless bees is still limited, mainly due to the high diversity of the floral resources and the low production that is inherent to these species. This research deals with the physicochemical characteristics of 20 samples of Tetragonisca angustula honey, from the municipality of Piracicaba, state of São Paulo, Brazil, contributing to the establishment of a quality standard for the honey produced by Brazilian stingless bees making possible the control of this product. Thus, the following parameters were determined: total sugars, reducing sugars, apparent sucrose, moisture content, hydroxymethylfurfural, proteins, ashes, pH, acidity, formol index, electrical conductivity, color, diastase activity, and water activity. The results indicated that the Brazilian standard rules, referring to the Apis mellifera honey, are not adequate to all parameters analyzed reinforcing the need of a establishment of a proper standard for the honey from meliponids.

Keywords: stingless bees; physicochemical analysis; Jataí bee honey.

1 Introdução

A composição do mel depende, basicamente, da composição do néctar da espécie vegetal produtora e da espécie de abelha que o produz, conferindo-lhe características específicas enquanto que as condições edafo-climáticas e o manejo do apicultor têm menor influência nesta composição (WHITE JÚNIOR, 1978).

A Tetragonisca angustula é uma abelha de pequeno porte, popularmente conhecida como Jataí, possui ampla distribuição geográfica, ocorrendo naturalmente nos Estados do Amazonas, Amapá, Bahia, Ceará, Espírito Santo, Goiás, Maranhão, Minas Gerais, Mato Grosso, Pará, Paraíba, Rio de Janeiro, Rondônia, Rio Grande do Sul, Santa Catarina e São Paulo. É possível obter de 0,5 a 1,5 L de mel/ano de colônias fortes, sendo uma das abelhas mais criadas no Estado de São Paulo (NOGUEIRA-NETO, 1997).

Embora produza mel em menor quantidade, os meliponíneos fornecem um produto diferenciado do mel de Apis mellifera, pela doçura e aroma inigualáveis, possuindo consumidores distintos, dispostos a pagar altos preços pelo produto no mercado (CARVALHO et al., 2005).

No Brasil, é a Instrução Normativa 11, de 20 de outubro/2000 (BRASIL, 2000) que regulamenta a padronização do mel para fins de comercialização. Esta regulamentação, baseada em legislações europeias, só atende às características do mel de A. mellifera, não contemplando o mel das abelhas sem ferrão nativas do País, que apresentam diferenças em alguns parâmetros físico-químicos. A umidade é o principal destes, sendo bastante elevada, tornando-o menos denso que o mel das abelhas africanizadas (AZEREDO et al., 2000) e exigindo maiores cuidados quanto a sua conservação.

Os trabalhos de análises físico-químicas de méis são realizados com o objetivo de comparar os resultados obtidos com padrões ditados por órgãos oficiais internacionais ou com os estabelecidos pelo próprio país, deixando clara não só uma preocupação com a qualidade do mel produzido internamente, como também, tornando possível a fiscalização de méis importados com relação às suas alterações (CARVALHO et al., 2005).

Devido à escassez de informações sobre a composição do mel produzido pelas abelhas sem ferrão e como é reconhecida a necessidade de controle de qualidade do mel destas abelhas (VIT et al., 2006), pesquisas fazem-se necessárias e, para tanto, este trabalho tem como objetivo determinar as características físico-químicas de amostras de méis de Tetragonisca angustula produzidos na região de Piracicaba, Estado de São Paulo, contribuindo para o estabelecimento de uma identidade ou padrão de qualidade para o mel das abelhas sem ferrão.

2 Material e métodos

2.1 Considerações sobre a área de estudo

O estudo foi desenvolvido em uma propriedade rural situada no município de Piracicaba, Estado de São Paulo, com cerca de 7 ha, contando com diversas espécies de plantas frutíferas e ornamentais, além de um pequeno fragmento de mata nativa. As propriedades vizinhas à área são basicamente formadas por pastagens e cultivo de cana-de-açúcar.

2.2 As colônias utilizadas no estudo

Foram utilizadas vinte e oito colônias de T. angustula, acondicionadas em caixas horizontais desenvolvidas por Paulo Nogueira Neto, modelo PNN-1997 (NOGUEIRA-NETO, 1997) para abelhas pequenas, que foram mantidas dentro da respectiva área de estudo e avaliadas, mensalmente, durante o período de um ano, quanto à composição físico-química do mel proveniente dos potes de alimento.

2.3 Coleta e análise do mel

O mel, quando disponível, foi coletado diretamente dos potes de alimento presentes no interior das colônias, por meio de seringas, nas quais eram acoplados pequenos pedaços de cânulas de soro, para que não ocorressem prejuízos às abelhas e aos próprios potes de alimento. As amostras foram acondicionadas em frascos plásticos esterilizados, com fechamento hermético, e mantidas sob refrigeração para a posterior realização das seguintes análises físico-químicas: açúcares (totais, redutores e sacarose aparente), umidade, hidroximetilfurfural (HMF), proteínas, cinzas, pH, acidez, índice de formol, condutividade elétrica, cor, atividade diastásica e atividade de água. Estas análises foram realizadas no Laboratório de Insetos Úteis, Setor de Entomologia, do Departamento de Entomologia, Fitopatologia e Zoologia Agrícola da Escola Superior de Agricultura "Luiz de Queiroz", Campus de Piracicaba, da Universidade de São Paulo.

2.4 Açúcares totais, açúcares redutores e sacarose aparente

A determinação dos açúcares totais (%), redutores (%) e sacarose aparente (%) foi realizada conforme o método Copersucar (1987) com modificações de Marchini et al. (2004). Este método é baseado na capacidade de açúcares redutores, como glicose e frutose, reduzirem o cobre presente na solução cuproalcalina (solução de Fehling), passando-o da forma Cu2+ para Cu+ (redução de íons cúpricos em cuprosos), sendo que os açúcares são oxidados a ácidos orgânicos.

2.5 Umidade

A umidade foi determinada logo após a colheita das amostras por refratômetro manual ATAGO, específico para mel (luz natural, temperatura ambiente). O referido aparelho foi adaptado do refratômetro Abbé e dispõe de uma escala, que expressa o valor em Brix, a partir do qual foi calculado o valor da umidade (%). O método baseia-se no fenômeno da refração (relação entre as velocidades da luz no vácuo e numa substância) que um raio de luz incidente sofre ao incidir na solução de mel, que contém sólidos solúveis (ATAGO Co, 1988).

2.6 Hidroximetilfurfural (HMF)

O hidroximetilfurfural (mg.kg–1) foi determinado conforme o método 980.23 da A.O.A.C (1998), logo após a colheita do mel. A determinação do HMF é baseada na leitura da absorbância UV em espectrofotômetro Metrolab 1700 modelo UV Vis, com diferentes comprimentos de onda (de 284 a 336 nm).

2.7 Proteínas

O método de análise das proteínas (%) do mel (SILVA; QUEIROZ, 2002) baseia-se na transformação do nitrogênio da amostra em sulfato de amônio em bloco digestor infravermelho Marcon, modelo MA 4001, o qual é fixado em solução ácida e titulada. Determina-se o nitrogênio e por meio de um fator de conversão (6,25), transforma-se o resultado em proteína bruta.

2.8 Cinzas

O teor de cinzas (%) foi determinado pelo método 4.8 das Normas Analíticas do Instituto Adolfo Lutz (INSTITUTO ADOLFO LUTZ, 1985), o qual se fundamenta na perda de peso ocorrida na incineração do produto por meio da calcinação em mufla a 550 °C, com destruição da matéria orgânica, sem apreciável decomposição dos constituintes do resíduo mineral ou perda por volatilização.

2.9 pH, acidez e índice de formol

Os três parâmetros pH, acidez (meq.kg–1) e índice de formol (mL.kg–1) foram determinados em sequência, segundo as metodologias de Moraes e Teixeira (1998) e Moraes (1994) adotadas pelo Laboratório da APTA-Regional de Pindamonhangaba-SP, utilizando medidor de pH Digimed, modelo DMPH-1.

2.10 Condutividade elétrica

A condutividade elétrica (µS.cm–1) fundamentada no fato de que soluções de sais conduzem corrente elétrica entre dois eletrodos foi medida em solução de 20% de matéria seca de mel, segundo o método de B.O.E. (1986). Para tanto se utilizou o condutivímetro, Hanna, modelo HI8820, Digimed, na obtenção dos dados.

2.11 Cor

Para a verificação da cor do mel foi utilizado o método de Bianchi (1986) com medição em espectrofotômetro Metrolab 1700 modelo UV Vis, sendo a cor estabelecida pela tabela de Pfund.

2.12 Atividade diastásica

A atividade diastásica (escala Gothe) foi determinada segundo o método 7.7 descrito no Codex Alimentarius (C.A.C., 1990), que consiste no uso de uma solução tamponada de amido-mel que é mantida em banho-maria (a 40 °C) o tempo necessário para ser obtido o ponto final específico (absorbância menor que 0,235 nm) determinado espectrofotometricamente (Espectrofotômetro Metrolab 1700 modelo UV Vis).

2.13 Atividade de água (aw)

A atividade de água foi determinada por meio do aparelho AquaLab Série 3 modelo TE, que utiliza a técnica de determinação do ponto de orvalho em espelho encapsulado (DECAGON, 2003).

3 Resultados e discussão

Como resultado de duas coletas, realizadas em março e outubro/2005, foram obtidas 20 amostras de mel, retiradas apenas das colônias em que havia excedente, de forma a não causar prejuízos à sua manutenção. Os resultados das análises físico-químicas podem ser verificados nas Tabelas 1 e 2.

3.1 Açúcares totais, açúcares redutores e sacarose aparente

As porcentagens de açúcares redutores totais variaram de 50,63 a 59,60% (valor médio de 56,46%), e para açúcares redutores a variação encontrada foi de 48,66 a 57,97% (valor médio de 55,46%). Com relação às porcentagens obtidas para sacarose aparente, os resultados variaram de 0,13 a 1,87% (valor médio de 0,95%). Os valores médios observados (Tabela 1) estão próximos aos obtidos por Rodrigues et al. (1998) para mel de T. angustula, 59,42% para açúcares totais, 58,19% para açúcares redutores e 1,17% para sacarose aparente, e aos encontrados em méis de diferentes espécies de meliponíneos (CARVALHO et al., 2006a), variando entre 42,55 e 55,61% para açúcares redutores e 0,85 e 2,15% para sacarose. Porém, os açúcares redutores apresentam valores bem inferiores aos encontrados por Souza et al. (2006a) nas 152 amostras de méis de diferentes espécies de meliponíneos de oito países do continente americano, cuja amplitude constatada foi de 58,0 a 75,7%. Com relação à porcentagem de sacarose aparente, estes mesmos autores apontam variação de 1,1 a 4,8%, valores superiores aos do presente estudo.

A norma vigente (BRASIL, 2000) elaborada a partir de méis de A. mellifera estabelece um valor mínimo de 65% para açúcares redutores e máximo de 6% para sacarose aparente, enquanto os valores sugeridos para mel de abelhas sem ferrão no Brasil (VILLAS-BÔAS; MALASPINA, 2005) são de mínimo de 50% para açúcares redutores e máximo de 6% para sacarose.

Neste trabalho foi observado que todas as amostras de mel apresentaram valores de açúcares redutores inferiores ao mínimo estabelecido pelas normas brasileiras e uma amostra (5%) não alcançou o valor mínimo sugerido para os méis de meliponíneos do Brasil. Com relação à sacarose aparente todas as amostras encontram-se abaixo do máximo permitido.

3.2 Umidade

As porcentagens de umidade, observadas na Tabela 1, variaram de 23,00 a 32,50% (valor médio de 24,37%). Resultados semelhantes foram obtidos por Iwama (1977) em méis de T. angustula, com amplitude de 22,7 a 35,4% e média de 27,4%; Rodrigues et al. (1998) e Souza et al. (2006b) encontraram valor médio de 26,10 e 26,62% de umidade, respectivamente, para méis desta mesma espécie; análise de amostras de méis de diferentes espécies de abelhas sem ferrão (CORTOPASSI-LAURINO; GELLI, 1991) aponta valores variando entre 18 e 36%, e Souza et al. (2006a) também com diferentes espécies de meliponíneos constataram variação entre 19,9 e 41,9% de umidade.

Todos os valores obtidos neste trabalho excederam o valor máximo (20%) permitido pela legislação vigente (para A. mellifera), porém todas as amostras encontram-se dentro do limite máximo (35%) sugerido para os méis de meliponíneos do Brasil (VILLAS-BÔAS; MALASPINA, 2005).

3.3 Hidroximetilfurfural

Os valores de hidroximetilfurfural (HMF) apresentaram variação de 0,75 a 30,58 mg.kg–1 (média de 9,39 mg.kg–1), conforme Tabela 1, sendo os resultados encontrados neste trabalho compatíveis aos constatados por diversos autores: variação de 0,17 a 28,06 mg.kg–1 para méis de M. subnitida foi encontrada por Camargo et al. (2006); valores entre 3,14 a 6,64 mg.kg–1 em méis de diferentes espécies de meliponíneos obtidas por Carvalho et al. (2006a); e variação do HMF de 0,4 a 31,6 mg.kg–1 para Meliponini e 4,2 a 20,4 mg.kg–1 para Trigonini, apresentadas por Vit et al. (1998).

De acordo com a norma vigente, todas as amostras de mel apresentaram valores dentro do limite para HMF (máximo de 60,0 mg.kg–1), e o mesmo ocorre quando observamos o valor sugerido para mel brasileiro de meliponíneos (máximo de 40,0 mg.kg–1) (VILLAS-BÔAS; MALASPINA, 2005).

3.4 Proteínas

As porcentagens de proteínas variaram de 0,27 a 0,57%, com valor médio de 0,37% (Tabela 1). Para méis de A. mellifera consta na literatura uma variação de 0,02 a 2,79% de proteínas, com relação às abelhas sem ferrão, no entanto, são poucos os trabalhos que analisaram a porcentagem de proteínas. Dentre estes se encontra o de Denadai et al. (2002) que obtiveram valor médio de 0,9% em méis de T. angustula, e o de Souza et al. (2004) apontando variação de 0,2 a 0,8% de proteínas para méis de abelhas do gênero Melipona.

Para proteínas não existe valor estabelecido na legislação em vigor, tampouco sugestão para méis das espécies de abelhas sem ferrão.

3.5 Cinzas

As porcentagens de cinzas variaram de 0,21 a 0,60%, com valor médio de 0,39% (Tabela 1). Pamplona (1989), comparando amostras de méis de A. mellifera e meliponíneos constatou que o valor de minerais é 2 a 3 vezes maior nas amostras de meliponíneos, fato não confirmado neste estudo e em outros como Souza et al. (2006b) e Denadai et al. (2002) que analisando méis de T. angustula encontraram valores médios de 0,37 e 0,45%, respectivamente; e as análises de méis de diferentes espécies de abelhas sem ferrão, realizadas por Carvalho et al. (2006a) com variação entre 0,04 e 0,50% de cinzas.

O valor para porcentagem de cinzas determinado pela norma vigente (máximo de 0,6%) é o mesmo sugerido para as amostras de méis de meliponíneos brasileiros (VILLAS-BÔAS; MALASPINA, 2005) e coincide com o maior valor encontrado no presente trabalho. Desta forma todas as amostras encontram-se dentro destes padrões.

3.6 pH, acidez e índice de formol

Os valores obtidos para pH, acidez e índice de formol variaram de 3,54 a 4,64 (valor médio de 4,1), 17,0 a 98,0 meq.kg–1 (valor médio de 45,23 meq.kg–1) e 7,0 a 17,20 mL.kg–1 (valor médio de 12,14 mL.kg–1), respectivamente (Tabela 2). IWAMA (1977), analisando méis de T. angustula, obteve valor médio de pH de 4,2, variando de 3,2 a 7,4.

Os resultados obtidos para pH e acidez neste trabalho estão dentro da amplitude de valores encontrada em amostras de méis de diferentes espécies de meliponíneos (CORTOPASSI-LAURINO; GELLI, 1991), sendo de 3,2 a 4,8 e de 30,0 a 90,0 meq.kg–1, respectivamente. Foram obtidos valores entre 3,15 e 4,66 para pH e de 5,9 a 109,0 meq.kg–1 para acidez, na compilação de resultados de 152 amostras de méis de diversas espécies de meliponíneos provenientes de oito países do continente americano (SOUZA et al., 2006a). Em trabalho com diferentes espécies de abelhas sem ferrão, Azeredo et al. (2000) constataram valores médios de pH e acidez (3,5 e 27,15 meq.kg–1) inferiores aos obtidos neste estudo.

Com relação ao índice de formol em análise de méis de meliponíneos do cerrado paulista realizada por Almeida (2002), foram encontrados valores superiores aos obtidos neste estudo (4,0 a 21,5 mL.kg–1); fato também constatado por Souza et al. (2006b) que obtiveram valor médio de 41,3 mL.kg–1 para méis de T. angustula, do Estado da Bahia.

Para pH e índice de formol não há normas vigentes, já para acidez a legislação atual estabelece o valor máximo de 50 meq.kg–1, enquanto o valor sugerido para méis de abelhas sem ferrão no Brasil é máximo de 80 meq.kg–1, desta forma, 50% das amostras de mel se apresentam acima do limite estabelecido pela legislação brasileira e 15% delas não se enquadram na sugestão para o limite de acidez em méis de meliponíneos (VILLAS-BÔAS; MALASPINA, 2005).

3.7 Condutividade elétrica

Os valores de condutividade elétrica apresentaram variação de 1061 a 2700 µS.cm–1, com média de 1337,20 µS.cm–1 (Tabela 2), sendo superiores aos constatados por diversos autores, como Carvalho et al. (2006b) com méis de diferentes espécies de abelhas sem ferrão registrando a variação de 384,78 a 954,95 µS.cm–1; Cavalcante et al. (2006), trabalhando com méis de M. scutellaris obtiveram valor médio de 264,2 µS.cm–1; e o de Oliveira et al. (2006), que apontaram para condutividade elétrica valor médio de 294 µS.cm–1 para méis de M. mandacaia. Em amostras de méis de T. angustula, Souza et al. (2006a) encontraram o valor médio de 1362,67 µS.cm–1 para condutividade elétrica; resultado semelhante ao obtido neste estudo.

Para condutividade elétrica não há valores estabelecidos nas normas vigentes, tampouco sugestão para méis das espécies de abelhas sem ferrão.

3.8 Cor

As porcentagens das amostras classificadas nas diferentes classes de cores podem ser verificadas na Figura 1, variando do âmbar ao âmbar-extra-claro, prevalecendo a cor âmbar (50% das amostras).


Em amostras de méis de T. angustula, Iwama (1977) observou a coloração do mel variando de praticamente incolor a castanho-escura, enquanto âmbar-claro foi a cor predominante em outros estudos como Azeredo et al. (2000), Pamplona (1989) e Cavalcante et al. (2006).

3.9 Atividade diastásica

Os valores para atividade diastásica apresentaram variação de 7,16 a 54,11 na escala Gothe, com média de 32,28 (Tabela 2). Este trabalho revelou resultados superiores em relação a diversos outros autores, tais como Cavalcante et al. (2006), que apresentaram valor médio de 3,98 na escala Gothe para méis de M. scutellaris; Souza et al. (2006a), que encontraram amplitude entre 0,9 e 23,0 na escala Gothe para méis de diferentes espécies de abelhas sem ferrão; Oliveira et al. (2006), com valores médios de 1,75 na escala Gothe para mel de M. mandacaia; e Vit e Pulcini (1996), analisando os méis de diversas espécies de meliponíneos, concluíram que a atividade da enzima diastase é considerada mais baixa nas abelhas do gênero Melipona.

De acordo com a norma vigente (BRASIL, 2000), uma amostra (5%) apresentou valor inferior ao limite para atividade diastásica (mínimo de 8,0 na escala Gothe), mas quando observamos o valor sugerido para mel brasileiro de meliponíneos (mínimo de 3,0 na escala) (VILLAS-BÔAS; MALASPINA, 2005), 100% das amostras se encontram dentro deste limite.

3.10 Atividade de água

Os valores para atividade de água apresentaram variação de 0,59 a 0,82aw, com média de 0,66aw (Tabela 2), sendo a variação encontrada neste estudo expressivamente maior à encontrada em méis de abelhas do gênero Melipona, em amostras de mel analisadas por Almeida-Muradian et al. (2007) cuja variação foi de 0,74 a 0,76aw.

A atividade de água é um parâmetro de recente abordagem no mel, não constando da legislação atual e também sem sugestões de limites para amostras de méis de abelhas sem ferrão do Brasil.

4 Conclusões

Os resultados demonstram que a legislação atual, referente ao mel de Apis mellifera (BRASIL, 2000), não é adequada para todos os caracteres analisados, reforçando a necessidade de um padrão próprio para os méis de meliponíneos, a fim de evitar as constantes fraudes e possibilitar sua comercialização no mercado formal.

Com referência à sugestão para legislação de méis de meliponíneos (VILLAS-BÔAS; MALASPINA, 2005), 5% das amostras de mel de Jataí não se enquadram na legislação para o caractere açúcares e 15% delas para o caractere acidez, desta forma seria necessário um maior número de dados para elaboração de uma legislação própria para as diferentes espécies de meliponíneos.

Agradecimentos

À CAPES pela bolsa de doutorado concedida à primeira autora; e ao CNPq pela concessão de bolsa de produtividade em pesquisa e de doutorado concedidas aos segundo e terceiro autores, respectivamente.

À FAPESP pelo suporte tecnológico, com fornecimento de equipamentos e reagentes, tornando viável o desenvolvimento do trabalho.

Recebido para publicação em 9/11/2007

Aceito para publicação em 3/7/2008 (003000)

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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      04 Nov 2009
    • Data do Fascículo
      Set 2009

    Histórico

    • Aceito
      03 Jul 2008
    • Recebido
      09 Nov 2007
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