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Transplante renal em pacientes HIV positivos: relato de dois casos da experiência inicial do Hospital de Clínicas de Porto Alegre

Kidney transplantation in HIV positive patients: two case reports from Hospital de Clínicas de Porto Alegre initial experience

Resumos

Recentemente, o transplante renal passou a ser uma modalidade terapêutica aceita para o tratamento de pacientes renais crônicos terminais infectados pelo HIV. Para tal, há necessidade de estabilidade de parâmetros clínicos e laboratoriais relacionados à infecção pelo HIV e do uso de terapia antiretroviral de elevada eficiência. Neste relato, apresentamos os dois primeiros casos no Brasil de pacientes portadores de infecção pelo HIV transplantados com órgãos de doadores falecidos realizados com sucesso em nossa instituição. As interações entre os imunossupressores e as drogas antiretrovirais, as coinfecções, o perfil de risco cardiovascular e a elevada incidência de rejeição aguda permanecem os maiores problemas a serem equacionados nestes pacientes.

anti-retrovirais; hiv; imunossupressores; transplante de rim


Recently kidney transplantation has become an accepted treatment modality for the treatment of HIV infected patients with end-stage renal diseases. For such treatment it is required stability of clinical and laboratory parameters related to HIV infection and the use of highly active antiretroviral therapy. In this report we present the first two cases in Brazil of patients with HIV infection transplanted with organs from deceased donors performed successfully in our institution. The interactions between immunosuppressive and antiretroviral drugs, the co-infections, cardiovascular risk profile and the high incidence of acute rejection remain the major problems to be dealt with in these patients.

anti-retroviral agents; hiv; immunosuppressive agents; kidney transplantation


RELATO DE CASO CASE REPORT

Transplante renal em pacientes HIV positivos. Relato de dois casos da experiência inicial do Hospital de Clínicas de Porto Alegre

Kidney transplantation in HIV positive patients. Two case reports from Hospital de Clínicas de Porto Alegre initial experience

Fábio SpuldaroI; Adriana Reginato RibeiroII; Alessandra Rosa VicariIII; Nancy Tamara DenicolIII; Leonardo Infantini DiniIII; Emanuel Burck dos SantosIII; Karla Laís PegasIV; Luiz Felipe Santos GonçalvesIII; Roberto Ceratti ManfroIII,V

IPrograma de Transplante Renal do HCPA (Hospital de Clínicas de Porto Alegre)

IIHCPA (Hospital de Clínicas de Porto Alegre)

IIIUnidade de Transplante Renal do HCPA (Hospital de Clínicas de Porto Alegre)

IVServiço de Patolologia do HCPA (Hospital de Clínicas de Porto Alegre)

VServiço de Nefrologia do HCPA (Hospital de Clínicas de Porto Alegre)

Correspondência para Correspondência para: Roberto Ceratti Manfro Hospital de Cínicas de Porto Alegre Rua Av. Ramiro Barcelos, nº 2350 Porto Alegre, RS, Brasil. CEP: 90035-903 E-mail: rmanfro@hcpa.ufrgs.br

RESUMO

Recentemente, o transplante renal passou a ser uma modalidade terapêutica aceita para o tratamento de pacientes renais crônicos terminais infectados pelo HIV. Para tal, há necessidade de estabilidade de parâmetros clínicos e laboratoriais relacionados à infecção pelo HIV e do uso de terapia antiretroviral de elevada eficiência. Neste relato, apresentamos os dois primeiros casos no Brasil de pacientes portadores de infecção pelo HIV transplantados com órgãos de doadores falecidos realizados com sucesso em nossa instituição. As interações entre os imunossupressores e as drogas antiretrovirais, as coinfecções, o perfil de risco cardiovascular e a elevada incidência de rejeição aguda permanecem os maiores problemas a serem equacionados nestes pacientes.

Palavras-chave: anti-retrovirais, hiv, imunossupressores, transplante de rim.

ABSTRACT

Recently kidney transplantation has become an accepted treatment modality for the treatment of HIV infected patients with end-stage renal diseases. For such treatment it is required stability of clinical and laboratory parameters related to HIV infection and the use of highly active antiretroviral therapy. In this report we present the first two cases in Brazil of patients with HIV infection transplanted with organs from deceased donors performed successfully in our institution. The interactions between immunosuppressive and antiretroviral drugs, the co-infections, cardiovascular risk profile and the high incidence of acute rejection remain the major problems to be dealt with in these patients.

Keywords: anti-retroviral agents, hiv, immunosuppressive agents, kidney transplantation.

Introdução

Nas últimas décadas, a morbimortalidade dos indivíduos portadores do vírus da imunodeficiência humana (HIV) tem decaído progressivamente graças ao advento da terapia antiretroviral de elevada eficiência1 (HAART, do inglês highly active antiretroviral therapy), proporcionando-lhes importante aumento no tempo de vida e, dessa forma permitindo também maior sobrevida aos portadores de doença renal crônica secundária à infecção pelo HIV (HIVAN) e de outras nefropatias. Em pacientes afrodescendentes norte-americanos, a HIVAN já é a terceira causa de doença renal terminal.2 Concomitantemente, tem sido também observada maior sobrevida destes pacientes nos programas de terapia renal substitutiva, e neste contexto, houve a necessidade de se reconsiderar a possibilidade do transplante renal para estes pacientes que inicialmente não eram considerados candidatos aos transplantes de órgãos.3

As experiências iniciais, antes da HAART, resultaram em baixas sobrevidas tanto dos pacientes como dos enxertos,4 no entanto, a partir da década de 1990, observou-se em séries de casos aumento na sobrevida dos pacientes transplantados renais portadores do HIV.5 Entretanto, a sobrevida dos enxertos renais ainda é descrita como significativamente menor comparando-se aos pacientes transplantados renais HIV soro negativos.6

Atualmente, embora ainda não seja uma prática corriqueira em todos os centros, não é incomum que se coloque pacientes HIV + em lista de espera para transplante renal desde que certos pré-requisitos, descritos adiante neste artigo, estejam satisfeitos. Neste relato, apresentamos a experiência inicial do Hospital de Clínicas de Porto Alegre com transplante renal em receptores infectados pelo HIV.

Relato dos casos

Caso 1. Paciente feminina de 51 anos, afrodescendente, em programa de hemodiálise há 3 anos. A causa da doença renal crônica foi atribuída a nefroesclerose hipertensiva. Há 8 anos sabia ser portadora de infecção pelo vírus da hepatite C (HCV) e pelo HIV. No mesmo ano do diagnóstico, iniciou terapia antiretroviral com zidovudina, lamivudina e efavirenz, tendo este último sido substituído por atazanavir 2 anos após, devido à hipertrigliceridemia grave. Em seu histórico de eventos imunogênicos, havia cinco gestações, três transfusões sanguíneas e não fora submetida a transplante prévio. No momento da avaliação para a lista de espera para transplante renal e ao realizar o mesmo, apresentava carga viral indetectável e contagem de células CD4 299 células/mm3. Na avaliação pré-transplante, apresentava reatividade contra painel de 73% em classe I e de 23% em classe II (single antigen beads) e MICA positivo pelo método Luminex®. Não apresentava anticorpos dirigidos a antígenos HLA do doador. A prova cruzada foi negativa por linfotoxicidade dependente de complemento e por citometria de fluxo. O transplante renal com órgão de doador falecido ocorreu em agosto de 2010. O doador foi um homem de 35 anos, cujo óbito ocorreu por traumatismo crânio-encefálico e a creatinina sanguínea no momento da retirada dos órgãos era de 1,0 mg/dL. O transplante ocorreu após 22 horas de isquemia fria, sem intercorrências e com boa perfusão imediata do enxerto. A imunossupressão, iniciada no pré-operatório imediato foi feita com Tacrolimo (0,15 mg/Kg), micofelonato sódico (MFS) 720 mg e Metilprednisolona 500 mg no transoperatório. A paciente evoluiu com diurese imediata, mas sem função inicial do enxerto, necessitando suporte dialítico até 12º dia pós-operatório (PO), quando tornou-se independente de diálise (Figura 1). No PO, foi reintroduzida a medicação antiretroviral, sendo necessários ajustes na dose do tacrolimo. Foi também necessário o início de insulinoterapia durante a internação, sendo mantida até o momento atual de acompanhamento da paciente.


A alta hospitalar ocorreu no 23º dia pós-operatório com creatinina sanguínea em 2,7 mg/dL e em uso de tacrolimo 1 mg a cada 24 horas, MFS 360 mg 2x/dia e prednisona 20 mg/dia. Nível sérico de tacrolimo na alta hospitalar foi de 7,9 ng/mL. Após a alta, apresentou como intercorrências um episódio de herpes zoster no 28º dia PO, quadro de infecção respiratória no 48º PO, resolvida com antibioticoterapia oral e um episódio de trombose venosa profunda em perna esquerda no 74º dia PO manejada com anticoagulação sistêmica por 6 meses. Ao fim do primeiro ano pós-transplante, a paciente apresenta função renal estável, com creatinina sanguínea de 1,0 mg/dL, a relação proteínas totais/creatinina na urina é de 0,1. O nível sérico de tacrolimo tem variado entre 8-13 ng/mL com seu uso na dose de 1 mg a cada 48 horas. O MFS está mantido na dose de 360 mg 2x/dia e a prednisona em 5 mg/dia. A medicação antiretroviral foi mantida com zidovudina, lamivudina e atazanavir. Durante todo o primeiro ano de pós-transplante, a carga viral se manteve indetectável e a contagem de células CD4+ se manteve elevada e estável.

Caso 2. Paciente feminina, branca, 33 anos, portadora de hipertensão arterial sistêmica e lúpus eritematoso sistêmico com diagnóstico de nefrite lúpica classe III há 13 anos. Há 9 anos foi feito o diagnóstico de infecção pelo HIV em uma avaliação de rotina. Foi, inicialmente, mantida sem terapia antiretroviral, a qual foi iniciada 3 anos após o diagnóstico, sendo que no momento do transplante vinha em uso de Lamivudina, Didanosina e Efavirenz. Evoluiu com deterioração progressiva da função renal, iniciando terapia renal substitutiva com hemodiálise 5 anos após a descoberta da doença. Em seu histórico de eventos imunogênicos houve uma gestação que resultou em aborto, seis transfusões sanguíneas e não fora submetida a transplante prévio. No momento da avaliação para a lista de espera para transplante renal e ao realizar o mesmo apresentava carga viral indetectável e contagem de células CD4 894 células/mm3. Não apresentava anticorpos anti-HLA de classe I ou II na avaliação da reatividade contra painel. A prova cruzada foi negativa por linfotoxicidade dependente de complemento não tendo sido realizada por citometria de fluxo. O transplante renal ocorreu em março de 2011 com órgão de doador falecido, 22 anos, masculino, cujo óbito ocorreu por traumatismo crânio-encefálico. A creatinina sanguínea no momento da retirada dos órgãos foi de 2,8 mg/dL. A biópsia renal pré-implante, com 25 glomérulos mostrou rim normal. Doador e receptor compartilhavam dois antígenos HLA no lócus A, 1 no lócus B e 2 no lócus DR. A cirurgia ocorreu sem intercorrências após um tempo de isquemia fria de 27 horas. A imunossupressão, iniciada no pré-operatório imediato foi feita com MFS 720 mg, metilprednisolona 500 mg e globulina antitimócitos (ATG) 1,5 mg/Kg indicada esta pelo tempo prolongado de isquemia fria e para evitar dano adicional ao órgão transplantado que já apresentava injúria renal aguda. Não apresentou diurese no pós-operatório imediato, necessitando suporte dialítico até o 6º dia PO. A imunossupressão foi mantida com MFS 720 mg 12/12hs, prednisona 20 mg/dia, tendo recebido quatro doses de ATG no intervalo de 6 dias (dose cumulativa total 4,7 mg/Kg) conforme contagem diária de células CD3+. Iniciou o tacrolimo na dose de 0,1 mg/Kg/2x ao dia no terceiro dia PO com ajustes posteriores conforme nível sérico.

Durante a internação apresentou episódio de infecção urinária no 6º dia PO, sem outras intercorrências. A alta hospitalar ocorreu no 24º dia com creatinina sanguínea de 1,3 mg/dL usando tacrolimo 10 mg a cada 12 horas, nível sérico em 7,5 ng/mL, MFS 360 mg 12/12hs e prednisona 20 mg/d. Foi também mantida a terapia antiretroviral com as mesmas drogas do período pré-transplante. No seguimento ambulatorial realizou biópsia renal protocolar, no 3º mês, cujo exame anatomopatológico mostrou ausência de infiltrado inflamatório significativo, fibrose intersticial ou atrofia tubular e vasos sem anormalidades (Figura 2). Atualmente, aos nove meses de pós-transplante, mantém função renal estável com creatinina sanguínea em 1,4 mg/dL e ao longo do primeiro ano pós-transplante a carga viral se manteve indetectável e manteve contagens elevadas de células CD4+.


Discussão

O prognóstico dos pacientes infectados com o HIV melhorou significativamente com a introdução da HAART, tendo esta melhora também sido observada em pacientes HIV+ com insuficiência renal crônica em tratamento com diálise. A taxa de sobrevida de pacientes em diálise aumentou de 56% para 74%, respectivamente antes e após 1990. Estas observações levaram à reconsideração sobre o transplante renal como opção terapêutica para pacientes HIV+ com doença renal crônica terminal.

Atualmente, os critérios utilizados para se considerar pacientes HIV+ elegíveis para o transplante renal são: contagem de CD4 acima de 200 células/mm,3 carga viral inferior a 50 cópias de RNA/mL e tratamento regular com HAART todos por pelo menos seis meses, além da ausência de condição que defina o diagnóstico de AIDS após inicio da HAART.7 Os pacientes apresentados neste relato apresentavam estas condições ao serem inscritos na lista de espera para o transplante renal e as mantiveram, sendo assim considerados aptos e submetidos ao procedimento do transplante com doadores falecidos.

Em uma recente coorte com pacientes seguidos por três anos, foram observadas sobrevidas de 94% e 83%, respectivamente, para pacientes e enxertos. Estes resultados são similares aos da população em geral de receptores de transplante renal. Entretanto, foi observada elevada incidência de rejeição aguda, 52% e 70% no primeiro e terceiro anos.8 Estas elevadas taxas de rejeição são também observadas em outros estudos, variando entre 43% e 67%. Os fatores relacionados a essa elevada incidência permanecem obscuros, sendo as possibilidades aventadas a possível desregulação da resposta imune decorrente da infecção pelo HIV e a inadequada exposição aos imunossupressores devido à complexa interação entre esses e os antiretrovirais. Tal como no presente relato, é importante que se mencione que os estudos que apresentam melhores resultados são aqueles que incluíram pacientes com a doença controlada. Como já mencionado, em pacientes adequadamente selecionados, as sobrevidas dos pacientes e dos enxertos em médio prazo é similar a dos controles HIV negativos.8-10

Houve, inicialmente, o receio de que a imunossupressão pudesse desencadear aumento da replicação do HIV e assim agravar a doença. No entanto, diferentes estudos mostraram que os inibidores de calcineurina, sirolimus e o micofelonato possuem ação antiretroviral. A ciclosporina possui ação antiretroviral demonstrada.9 O bloqueio da infectividade do HIV parece ocorrer por dois mecanismos independentes, o primeiro envolvendo a ciclofilina A em células alvo e o segundo diz respeito à incorporação do envelope glicoproteico do HIV.11 A ação antiretroviral do tacrolimo foi descrita por Briggs et al. em pacientes infectados pelo HIV. O sirolimo reduz a expressão linfocitária do cofator (CCR5), que é essencial para a replicação do HIV. Adicionalmente, em uma recente série prospectiva de casos em que receptores de transplante hepático anti-HIV+ receberam monoterapia com sirolimo, observou-se melhor controle da replicação do HIV e do vírus da hepatite C (HCV). Por fim, o micofelonato mofetil tem efeito inibitório na replicação do HIV e age sinergicamente com os demais análogos aos nucleotídeos, inibidores da transcriptase reversa.12

Um aspecto de fundamental importância no uso das medicações são as possíveis interações medicamentosas, mostrando-se essencial a monitorização dos níveis sanguíneos das drogas imunossupressoras. A interação que merece mais atenção é entre os inibidores de protease, inibidores de calcineurina e inibidores da mTOR, levando-se em consideração que essas classes de drogas são metabolizadas na via sistema do citocromo P450 contribuindo, assim, para elevação dos níveis séricos dos imunossupressores. Estes aspectos farmacológicos e interações foram cuidadosamente revisados por Moreno et al.13

Não existe, atualmente, consenso sobre qual o melhor esquema de drogas antiretrovirais a ser utilizado. Recomenda-se que sua combinação contenha dois inibidores da transcriptase reversa associados ao raltegravir. Em relação aos imunossupressores, na ausência de estudos controlados, sugere-se a indução com basiliximab em combinação a um inibidor de calcineurina, micofelonato e corticosteroides. Anticorpos policlonais depletadores de linfócitos podem ser utilizados, devendo-se estar atento à possibilidade de linfocitopenia profunda que, quando ocorre, deve ser cuidadosamente monitorizada. Esses anticorpos têm se mostrado de grande valia no tratamento das rejeições.14 A contagem de células CD4+ nos pacientes que recebem ATG é significativamente menor no pós-transplante e recuperam-se aos níveis basais em geral até o terceiro ano pós-transplante. Peculiar ao presente relato, apesar da pequena casuística, foi a ausência de episódios de rejeição, mesmo como no caso 1 em que o receptor era sensibilizado a antígenos HLA que não recebeu terapia de indução.

A coinfecção pelo vírus da hepatite C (HCV) tem importante papel nesta população, posto que a hepatopatia pode progredir mais rapidamente nos receptores HIV+ que, além disso, apresentam maior morbidade e mortalidade relacionada com infecções e complicações hepáticas.9 Há evidências de que receptores de transplante renal infectados pelo HCV têm risco significativamente maior de doença hepática crônica, proteinúria, e nefropatia crônica do enxerto.9 Porém, ainda não está bem estabelecido se os resultados de pacientes receptores de transplante renal com coinfecção HCV/HIV são piores do que pacientes unicamente infectados pelo HCV. Além disso, não há experiência clínica suficiente para definir a eficácia e segurança do tratamento com interferon nesta população.9

Neste primeiro relato brasileiro de transplante renal em receptores HIV+ com doador falecido, concluímos que o transplante renal mostra-se como uma terapia aceitável. Apesar de um curto período de acompanhamento dos casos, a ausência de infecções graves mostra que o transplante também se constitui em uma terapia segura em pacientes HIV+ cuidadosamente selecionados, sendo importante ainda, neste sentido, a utilização dos protocolos corriqueiramente utilizados na profilaxia de doenças oportunistas. A terapia imunossupressora não parece ter impacto negativo no curso da infecção pelo HIV neste período inicial em que os pacientes foram acompanhados. Apesar de não ter ocorrido nenhum episódio de rejeição nesses dois casos apresentados, o melhor regime imunossupressor permanece por ser determinado. Esquemas que sofram menor interferência da terapia antiretroviral e que propiciem diminuição nas elevadas taxas de rejeição aguda são desejados. Os resultados em longo prazo ainda são desconhecidos, no entanto, muito possivelmente também estejam relacionados com a seleção inicial adequada dos pacientes e com o regime imunossupressor.

A ampla utilização de HAART levou ao aumento de condições não primariamente relacionadas ao HIV. Entre estas, destacam-se o diabetes mellitus, a hipertensão arterial sistêmica e as doenças cardiovasculares. É importante que se note que as condições citadas têm elevada frequência em receptores de transplante renal e agregam significativa morbimortalidade.15 Assim sendo, elas devem ser cuidadosamente manejadas, em especial neste subgrupo de receptores HIV+, com o objetivo de reduzir a mortalidade cardiovascular.

Concluímos que o transplante renal é uma terapia aceitável e segura em pacientes HIV+ cuidadosamente selecionados. A terapia imunossupressora não parece ter impacto negativo no curso da infecção pelo HIV nestes pacientes, não havendo evidências de que induza a progressão da doença para AIDS, infecções oportunistas ou neoplasias, sendo importante que se utilizem os protocolos de profilaxia de doenças oportunistas corriqueiramente usados em receptores de transplante renal. O melhor regime imunossupressor permanece por ser determinado. Esquemas que sofram menor interferência da terapia antiretroviral e que propiciem diminuição nas elevadas taxas de rejeição aguda são desejados. Além disso, os resultados em longo prazo ainda são desconhecidos.

Data de submissão: 31/03/2012.

Data de aprovação: 25/09/2012.

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  • Correspondência para:

    Roberto Ceratti Manfro
    Hospital de Cínicas de Porto Alegre
    Rua Av. Ramiro Barcelos, nº 2350
    Porto Alegre, RS, Brasil. CEP: 90035-903
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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      07 Jan 2013
    • Data do Fascículo
      Dez 2012

    Histórico

    • Recebido
      31 Mar 2012
    • Aceito
      25 Set 2012
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