Acessibilidade / Reportar erro

Esclerose peritoneal encapsulante: do diagnóstico precoce ao transplante renal bem-sucedido

Resumo

A esclerose peritoneal encapsulante é uma complicação incomum, mas grave, da diálise peritoneal. Na maioria dos casos, os sintomas aparecem após a suspensão da diálise peritoneal, o que dificulta seu diagnóstico. Apresentamos o caso de um homem caucasiano de 44 anos de idade que esteve em diálise peritoneal por 6 anos e 3 meses e foi transferido para hemodiálise devido a falha de ultrafiltração. Durante seus últimos meses em diálise peritoneal, ele desenvolveu anorexia e astenia, que foram inicialmente atribuídas à inadequação da diálise. Após a indução de hemodiálise, o paciente desenvolveu dor abdominal, aumento do volume abdominal, obstipação alternada com diarreia, e perda de peso. A tomografia computadorizada mostrou ascite de novo. Foi considerado um diagnóstico de esclerose peritoneal encapsulante precoce, e o tratamento foi prontamente iniciado com suporte nutricional, prednisolona oral e tamoxifeno por um ano. O paciente progrediu com resolução dos sintomas. Um mês após o término do tratamento, ele foi submetido a um transplante renal bem-sucedido e permanece sem maiores intercorrências. Um alto nível de suspeita clínica é crucial para o diagnóstico precoce da esclerose peritoneal encapsulante, uma vez que a doença pode ser fatal em estágios avançados. Este caso destaca que, com tratamento precoce, o transplante renal pode ser realizado com sucesso após um episódio de esclerose peritoneal encapsulante.

Descritores:
Diálise Peritoneal; Fibrose Peritoneal; Transplante de Rim; Tamoxifeno

Abstract

Encapsulating peritoneal sclerosis is an uncommon but serious complication of peritoneal dialysis. In most cases, the symptoms appear after peritoneal dialysis withdrawal, which hampers its diagnosis. We present the case of a 44-years-old Caucasian male who had been on peritoneal dialysis for 6 years and 3 months and was switched to hemodialysis due to ultrafiltration failure. During his last months on peritoneal dialysis, he developed anorexia and asthenia, which were initially attributed to dialysis inadequacy. After hemodialysis induction, the patient developed abdominal pain, increased abdominal volume, obstipation alternating with diarrhea, and weight loss. Computed tomography showed de novo ascites. A diagnosis of early encapsulating peritoneal sclerosis was considered, and treatment was promptly initiated with nutritional support, oral prednisolone, and tamoxifen for one year. The patient progressed with resolution of the symptoms. One month after the end of the treatment, he underwent a successful kidney transplant and remain without any major intercurrences. A high level of clinical suspicion is crucial for the early diagnosis of encapsulating peritoneal sclerosis as the disease can be fatal in advanced stages. This case highlights that with early treatment, kidney transplantation can be successfully performed after an episode of encapsulating peritoneal sclerosis.

Keywords:
Peritoneal Dialysis; Peritoneal Fibrosis; Kidney Transplantation; Tamoxifen

Introdução

A esclerose peritoneal encapsulante (EPE) é uma complicação grave da diálise peritoneal (DP) causada por um processo inflamatório que afeta difusamente o peritônio, resultando em fibrose que encapsula o intestino delgado e leva à obstrução11 Brown MC, Simpson K, Kerssens JJ, Mactier RA. Scottish Renal Registry. Encapsulating peritoneal sclerosis in the new millennium: a national cohort study. Clin J Am Soc Nephrol. 2009 Jul;4(7):1222-9.

2 Kawanishi H, Kawaguchi Y, Fukui H, Hara S, Imada A, Kubo H, et al. Encapsulating peritoneal sclerosis in Japan: a prospective, controlled, multicenter study. Am J Kidney Dis. 2004 Oct;44(4):729-37.
-33 Nakamoto H. Encapsulating peritoneal sclerosis-a clinician's approach to diagnosis and medical treatment. Perit Dial Int. 2005 Apr;25(4):30-8.. A EPE é rara, e a incidência relatada está entre 0,7 e 3,3%11 Brown MC, Simpson K, Kerssens JJ, Mactier RA. Scottish Renal Registry. Encapsulating peritoneal sclerosis in the new millennium: a national cohort study. Clin J Am Soc Nephrol. 2009 Jul;4(7):1222-9.. A alta morbidade e mortalidade ocorrem devido à obstrução intestinal e desnutrição. A taxa de mortalidade é reportada como sendo de cerca de 50% e geralmente ocorre dentro de 12 meses após o diagnóstico22 Kawanishi H, Kawaguchi Y, Fukui H, Hara S, Imada A, Kubo H, et al. Encapsulating peritoneal sclerosis in Japan: a prospective, controlled, multicenter study. Am J Kidney Dis. 2004 Oct;44(4):729-37.,33 Nakamoto H. Encapsulating peritoneal sclerosis-a clinician's approach to diagnosis and medical treatment. Perit Dial Int. 2005 Apr;25(4):30-8.. Em 70-90% dos casos, a EPE é diagnosticada após retenção da DP. Os mecanismos envolvidos no desenvolvimento de EPE são complexos e incluem inflamação e desregulação de fatores de crescimento, particularmente o fator de crescimento endotelial vascular (FCEV) e o fator de transformação do crescimento-β (TGF-β, do inglês transforming growth factor-β). Acredita-se que os produtos de degradação da glicose contidos no dialisato e nos múltiplos episódios de peritonite podem desempenhar um papel na inflamação peritoneal e na neoangiogênese, que em última instância levam à fibrose peritoneal 33 Nakamoto H. Encapsulating peritoneal sclerosis-a clinician's approach to diagnosis and medical treatment. Perit Dial Int. 2005 Apr;25(4):30-8.

4 Tarzi RM, Lim A, Moser S, Ahmad S, George A, Balasubramaniam G, et al. Assessing the validity of an abdominal CT scoring system as an aid to the diagnosis of encapsulating peritoneal sclerosis. Clin J Am Soc Nephrol. 2008 Nov;3(6):1702-10.

5 Vlijm A, Stoker J, Bipat S, Spijkerboer AM, Phoa SS, Maes R, et al. Computed tomographic findings characteristic for encapsulating peritoneal sclerosis: a case-control study. Perit Dial Int. 2009;29(5):517-22
-66 Lambie MR, Chess J, Summers AM, Williams PF, Topley N, Davies SJ, et al. Peritoneal inflammation precedes encapsulating peritoneal sclerosis: results from the GLOBAL Fluid Study. Nephrol Dial Transplant. 2016;31(3):480-6.. Os sintomas de EPE não são específicos, o que torna seu diagnóstico clínico desafiador. No estágio inflamatório inicial, os únicos sintomas podem ser saciedade precoce, perda de apetite, náusea, diarreia, perda de peso e dor abdominal. Menos frequentemente, os sinais de EPE começam quando o paciente ainda está em DP com efluente peritoneal sanguinolento, ultrafiltração ineficaz e transição para um estado de alto transportador peritoneal. Os parâmetros laboratoriais, neste estágio, podem mostrar hipoalbuminemia e aumento de marcadores inflamatórios33 Nakamoto H. Encapsulating peritoneal sclerosis-a clinician's approach to diagnosis and medical treatment. Perit Dial Int. 2005 Apr;25(4):30-8.. A tomografia computadorizada (TC) abdominal é o melhor exame de imagem, embora tenha baixa sensibilidade porque as alterações da TC não são específicas e só têm valor no contexto de suspeita clínica. Além disso, na fase inflamatória inicial, a TC abdominal pode não mostrar qualquer alteração intestinal além da ascite. Os sintomas tardios são obstrução intestinal subaguda intermitente (estágio fibroso). Neste ponto, o espessamento peritoneal pode ser reconhecido pelo realce peritoneal após contraste intravenoso de TC, bem como a calcificação peritoneal, coleções de fluidos loculados, adesões do intestino delgado e o espessamento da parede do intestino33 Nakamoto H. Encapsulating peritoneal sclerosis-a clinician's approach to diagnosis and medical treatment. Perit Dial Int. 2005 Apr;25(4):30-8.

4 Tarzi RM, Lim A, Moser S, Ahmad S, George A, Balasubramaniam G, et al. Assessing the validity of an abdominal CT scoring system as an aid to the diagnosis of encapsulating peritoneal sclerosis. Clin J Am Soc Nephrol. 2008 Nov;3(6):1702-10.
-55 Vlijm A, Stoker J, Bipat S, Spijkerboer AM, Phoa SS, Maes R, et al. Computed tomographic findings characteristic for encapsulating peritoneal sclerosis: a case-control study. Perit Dial Int. 2009;29(5):517-22. O diagnóstico definitivo é obtido por biópsia peritoneal33 Nakamoto H. Encapsulating peritoneal sclerosis-a clinician's approach to diagnosis and medical treatment. Perit Dial Int. 2005 Apr;25(4):30-8..

O tratamento precoce, antes da fibrose em estágio avançado, é mais eficaz, portanto, a consciência deste diagnóstico é crucial para desfechos bem-sucedidos77 Kawanishi H, Harada Y, Noriyuki T, Kawai T, Takahashi S, Moriishi M, Tsuchiya S. Treatment options for encapsulating peritoneal sclerosis based on progressive stage. Adv Perit Dial. 2001;17:200-4.,99 Brown EA, Bargman J, van Biesen W, Chang M-Y, Finkelstein FO, Hurst H, et al., Length of Time on Peritoneal Dialysis and Encapsulating Peritoneal Sclerosis - Position Paper for ISPD: 2017 Update. Perit Dial Int. 2017;37(4):362-74.. Embora haja falta de evidências sobre as melhores opções de tratamento médico, um esquema com glicocorticoides e tamoxifeno é o mais consensual 99 Brown EA, Bargman J, van Biesen W, Chang M-Y, Finkelstein FO, Hurst H, et al., Length of Time on Peritoneal Dialysis and Encapsulating Peritoneal Sclerosis - Position Paper for ISPD: 2017 Update. Perit Dial Int. 2017;37(4):362-74.,1111 Balasubramaniam G, Brown EA, Davenport A, Cairns H, Cooper B, Fan SL, et al. The Pan-Thames EPS study: treatment and outcomes of encapsulating peritoneal sclerosis. Nephrol Dial Transplant. 2009; 24(10):3209-15.. O transplante renal continua sendo uma opção valiosa após o tratamento da EPE e, com isso em mente, os pacientes devem ser encaminhados a um centro de transplante logo após a resolução da EPE(2,8,9.)

Apresentação do caso

Um homem caucasiano de 44 anos de idade com doença renal crônica estágio 5 esteve em DP ambulatorial contínua por 5 anos, sem nenhum episódio de peritonite durante esse tempo. Depois disso, ele desenvolveu hipervolemia e foi transferido para DP automatizada, e soluções peritoneais contendo maior teor de glicose foram utilizadas para aumentar a ultrafiltração. Foi realizado um teste de equilíbrio peritoneal modificado (mPET, do inglês modified peritoneal equilibration test), que revelou uma transição de alto transportador (dialisato para plasma (D/P) creatinina 0,83) para médio transportador (D/P creatinina 0,65). Infelizmente, o transporte livre de água não estava disponível devido a um erro na amostragem de fluido da DP. O paciente também desenvolveu sintomas de anorexia, hipoalbuminemia, apesar da eficácia da remoção de creatinina e ureia de acordo com as medições de rotina (Tabela 1).

Tabela 1
Resultados dos dois últimos estudos analíticos sobre diálise peritoneal

O paciente teve então seu primeiro episódio de peritonite, que foi causado por Streptococcus salivarius, e um episódio repetido ocorreu dois meses depois. Neste momento, ele passou para HD noturna (seis horas por sessão, três vezes por semana). Os sintomas de anorexia e astenia permaneceram, e o paciente desenvolveu dor abdominal, aumento do volume abdominal, obstipação alternando com diarreia, e perda de peso não intencional (4 kg em 4 meses). A análise sanguínea mostrou um nível de proteína C reativa de 7 mg/dL, hipoalbuminemia (3 mg/dL), e anemia (hemoglobina 9,4 g/dL). O estudo de imagem mostrou ascite de novo na ecografia abdominal e TC abdominal sem alterações intestinais significativas (Figura 1). O paciente não apresentava sinais de hipervolemia, e a ascite permaneceu apesar do aumento da ultrafiltração.

Figura 1
Ascite na TC abdominal que levantou a suspeita de esclerose peritoneal encapsulante

Foi realizada paracentese diagnóstica, e o fluido peritoneal foi um exsudato com aparência sanguinolenta, aumento de leucócitos (200/uL), células mononucleares predominantes (99,5%), eritrócitos elevados (2000 /uL), proteínas a 4,9 g/dL, LDH a 130 U/L, e glicose a 81 mg/dL. As culturas foram negativas, incluindo para bactérias aeróbias, fúngicas e micobactérias, e o resultado da citologia foi negativo para células malignas. Uma colonoscopia não mostrou alterações significativas, e os resultados para o exame de sangue oculto nas fezes, Giardia lamblia, e Cryptosporidium foram negativos.

Embora não houvesse nenhum sinal de imagem óbvio de esclerose peritoneal, suspeitou-se de peritonite encapsulante precoce com base na apresentação clínica (mal-estar, anorexia, perda de peso e dor abdominal), marcadores inflamatórios elevados e ascite de novo em um paciente que esteve em DP por um longo período. O tratamento foi prontamente iniciado com suporte nutricional oral e tamoxifeno 20 mg a cada 12 horas por um ano. Durante o primeiro mês, foi administrado 1 mg/kg/dia de prednisolona, e então lentamente afunilado até 10 mg, aos seis meses, e depois prosseguiu-se por um ano.

Dois meses após o início do tratamento da EPE, o paciente apresentou resolução completa dos sintomas e regularização dos marcadores inflamatórios. A TC abdominal aos 6 meses mostrou resolução completa da ascite e excluiu outros sinais relacionados ao desenvolvimento da EPE. Um mês após o término do tratamento da EPE, foi possível realizar um transplante renal com sucesso, e o transplante permaneceu por quase dois anos até o momento sem quaisquer complicações significativas.

Discussão

Neste caso, a EPE foi diagnosticada após a suspensão da DP, que é o momento mais comum para apresentação. Supõe-se que após a interrupção da DP, a reação inflamatória persiste, e a fibrina depositada não é mais removida pelas trocas da DP, o que leva à formação de fibrose66 Lambie MR, Chess J, Summers AM, Williams PF, Topley N, Davies SJ, et al. Peritoneal inflammation precedes encapsulating peritoneal sclerosis: results from the GLOBAL Fluid Study. Nephrol Dial Transplant. 2016;31(3):480-6.. O maior fator de risco da EPE é o período de tempo em DP, em sua maioria por mais de cinco anos. Outros fatores que podem levar à inflamação peritoneal desregulada são a alta exposição à glicose do dialisato, o uso de soluções convencionais de DP (em oposição às soluções biocompatíveis), episódios graves ou frequentes de peritonite (especialmente por Staphylococcus aureus, Pseudomonas spp., e fungos), idade mais jovem, cirurgia abdominal, uso de β-bloqueador, e maior status de transporte de soluto peritoneal(8,12,13.) Os fatores de risco mais importantes neste caso foram o período de tempo em DP e o maior status de transporte de soluto peritoneal.

Em nosso paciente, os sintomas foram altamente inespecíficos e foram inicialmente atribuídos à inadequação da DP. Em seu último ano em DP, o paciente desenvolveu problemas de controle de volemia que foram inicialmente atribuídos a uma perda da função renal residual. No entanto, houve pouca melhora após a mudança para a DP automatizada e o uso peritoneal contendo maior teor de glicose para melhorar a ultrafiltração. O mPET mostrou falha de ultrafiltração e uma transição de alto transportador peritoneal para médio transportador. Em retrospectiva, estes podem ter sido sinais de EPE precoce.

Após exclusão de patologia gastrointestinal e com o diagnóstico de ascite de novo (embora sem alterações intestinais), parâmetros inflamatórios elevados e hipoalbuminemia, suspeitou-se de EPE, e instituiu-se o tratamento precoce. O diagnóstico de EPE neste estado inflamatório inicial é desafiador. Essas alterações são altamente inespecíficas e, às vezes, não imediatamente associadas à EPE, uma vez que a maioria da literatura e relatos de casos se concentra em sintomas obstrutivos mais graves que ocorrem tardiamente durante o curso da doença 1414 Pereira GC, Vieira IF, Vieira MMC, Romano EM, Amado LEB. Encapsulating peritoneal sclerosis: case report. J Bras Nefrol. 2017, 39(4):470-472.

15 Vieira, MB, Pereira, M, Pinto de Abreu, C. Intestinal obstruction in a patient on chronic hemodialysis. Portuguese Journal of Nephrology & Hypertension 2018, 32(3), 293-298.
-1616 Davenport A. Late presentation of encapsulating peritoneal sclerosis following renal transplantation and the potential under-reporting of the incidence and prevalence of encapsulating peritoneal sclerosis. Nephrology (Carlton). 2015;20(7):499-501..

Há falta de evidências sobre o melhor manejo da EPE. As opções de tratamento incluem suporte nutricional, terapia medicamentosa e cirurgia em casos refratários, bem como outros tratamentos mais controversos, como lavagem peritoneal regular88 Habib SM, Betjes MG, Fieren MW, Boeschoten EW, Abrahams AC, Boer WH, et al. Management of encapsulating peritoneal sclerosis: a guideline on optimal and uniform treatment. The Netherlands Journal of Medicine. 2011;69(11):500-507.

9 Brown EA, Bargman J, van Biesen W, Chang M-Y, Finkelstein FO, Hurst H, et al., Length of Time on Peritoneal Dialysis and Encapsulating Peritoneal Sclerosis - Position Paper for ISPD: 2017 Update. Perit Dial Int. 2017;37(4):362-74.

10 Korte MR, Fieren MW, Sampimon DE, Lingsma HF, Weimar W, Betjes MGH, et al. Tamoxifen is associated with lower mortality of encapsulating peritoneal sclerosis: results of the Dutch Multicentre EPS Study. Nephrol Dial Transplant. 2011;26(2):691-7.
-1111 Balasubramaniam G, Brown EA, Davenport A, Cairns H, Cooper B, Fan SL, et al. The Pan-Thames EPS study: treatment and outcomes of encapsulating peritoneal sclerosis. Nephrol Dial Transplant. 2009; 24(10):3209-15.,1717 Kawanishi H, Watanabe H, Moriishi M, Tsuchiya S. Successful surgical management of encapsulating peritoneal sclerosis. Perit Dial Int. 2005;25(4):39-47.,1818 El-Sherbini N, Duncan N, Hickson M, Johansson L, Brown EA. Nutrition changes in conservatively treated patients with encapsulating peritoneal sclerosis. Perit Dial Int. 2013;33(5):538-43..

Neste caso, foi utilizado o tratamento com tamoxifeno e glicocorticoides. Um grande estudo retrospectivo holandês demonstrou redução da mortalidade em pacientes com EPE tratados com tamoxifeno em comparação com pacientes que não foram tratados com este medicamento (45,8 versus 74,4%, p=0,03)1010 Korte MR, Fieren MW, Sampimon DE, Lingsma HF, Weimar W, Betjes MGH, et al. Tamoxifen is associated with lower mortality of encapsulating peritoneal sclerosis: results of the Dutch Multicentre EPS Study. Nephrol Dial Transplant. 2011;26(2):691-7.. Em contraste, o estudo de Pan-Thames sobre EPE não mostrou melhora na taxa de sobrevida quando o tamoxifeno foi usado 1111 Balasubramaniam G, Brown EA, Davenport A, Cairns H, Cooper B, Fan SL, et al. The Pan-Thames EPS study: treatment and outcomes of encapsulating peritoneal sclerosis. Nephrol Dial Transplant. 2009; 24(10):3209-15.. A discrepância nos desfechos pode ser devida à inclusão de casos mais graves no estudo holandês. Após a introdução de terapia com tamoxifeno, os desfechos clínicos favoráveis são frequentemente observados dentro de dois a seis meses 88 Habib SM, Betjes MG, Fieren MW, Boeschoten EW, Abrahams AC, Boer WH, et al. Management of encapsulating peritoneal sclerosis: a guideline on optimal and uniform treatment. The Netherlands Journal of Medicine. 2011;69(11):500-507.. Os corticosteroides são particularmente importantes no estágio inflamatório. No estudo holandês sobre EPE, a análise multivariada com ajuste para o uso concomitante de prednisona no grupo tratado com tamoxifeno confirmou a tendência de melhora da sobrevida1010 Korte MR, Fieren MW, Sampimon DE, Lingsma HF, Weimar W, Betjes MGH, et al. Tamoxifen is associated with lower mortality of encapsulating peritoneal sclerosis: results of the Dutch Multicentre EPS Study. Nephrol Dial Transplant. 2011;26(2):691-7..

A desnutrição é uma consequência frequente da EPE, e o suporte nutricional é um componente importante do manejo. Melhorar o estado nutricional desses pacientes é de suma importância, pois pode aprimorar a resposta ao manejo conservador ou evitar complicações cirúrgicas subsequentes88 Habib SM, Betjes MG, Fieren MW, Boeschoten EW, Abrahams AC, Boer WH, et al. Management of encapsulating peritoneal sclerosis: a guideline on optimal and uniform treatment. The Netherlands Journal of Medicine. 2011;69(11):500-507.,1818 El-Sherbini N, Duncan N, Hickson M, Johansson L, Brown EA. Nutrition changes in conservatively treated patients with encapsulating peritoneal sclerosis. Perit Dial Int. 2013;33(5):538-43.. Neste paciente, foi possível fornecer suplementos nutricionais orais com bons resultados.

O diagnóstico prévio e o tratamento da EPE não são contraindicações para o transplante renal. A EPE ocorre após o transplante somente em pacientes que foram expostos à DP por vários anos, portanto, por si só, o transplante não aumenta o risco de desenvolvimento da EPE88 Habib SM, Betjes MG, Fieren MW, Boeschoten EW, Abrahams AC, Boer WH, et al. Management of encapsulating peritoneal sclerosis: a guideline on optimal and uniform treatment. The Netherlands Journal of Medicine. 2011;69(11):500-507.. Há relatos isolados de resolução dramática de EPE estabelecida após o transplante renal, que é possivelmente o resultado do uso de imunossupressão1919 Hawley CM, Wall DR, Johnson DW, Campbell SB, Griffin AD, Rigby RJ, et al. Recovery of gastrointestinal function after renal transplantation in a patient with sclerosing peritonitis secondary to continuous ambulatory peritoneal dialysis. Am J Kidney Dis. 1995;26:658-61.. Em nosso paciente, o transplante renal foi possível um mês após a conclusão do tratamento da EPE, e o transplante continua há dois anos sem maiores complicações.

Em conclusão, a EPE é uma complicação devastadora da DP. Após a suspensão da DP, um alto nível de suspeita clínica é crucial para o diagnóstico precoce (antes do estágio fibroso) e o tratamento bem-sucedido. Não há evidências para a triagem da EPE de pacientes em DP de longa duração, portanto estratégias para melhorar o diagnóstico precoce são particularmente importantes, incluindo informações do paciente sobre a doença e a conscientização entre os nefrologistas. O transplante renal pode ser realizado com segurança e continua a ser uma opção valiosa nestes pacientes.

References

  • 1
    Brown MC, Simpson K, Kerssens JJ, Mactier RA. Scottish Renal Registry. Encapsulating peritoneal sclerosis in the new millennium: a national cohort study. Clin J Am Soc Nephrol. 2009 Jul;4(7):1222-9.
  • 2
    Kawanishi H, Kawaguchi Y, Fukui H, Hara S, Imada A, Kubo H, et al. Encapsulating peritoneal sclerosis in Japan: a prospective, controlled, multicenter study. Am J Kidney Dis. 2004 Oct;44(4):729-37.
  • 3
    Nakamoto H. Encapsulating peritoneal sclerosis-a clinician's approach to diagnosis and medical treatment. Perit Dial Int. 2005 Apr;25(4):30-8.
  • 4
    Tarzi RM, Lim A, Moser S, Ahmad S, George A, Balasubramaniam G, et al. Assessing the validity of an abdominal CT scoring system as an aid to the diagnosis of encapsulating peritoneal sclerosis. Clin J Am Soc Nephrol. 2008 Nov;3(6):1702-10.
  • 5
    Vlijm A, Stoker J, Bipat S, Spijkerboer AM, Phoa SS, Maes R, et al. Computed tomographic findings characteristic for encapsulating peritoneal sclerosis: a case-control study. Perit Dial Int. 2009;29(5):517-22
  • 6
    Lambie MR, Chess J, Summers AM, Williams PF, Topley N, Davies SJ, et al. Peritoneal inflammation precedes encapsulating peritoneal sclerosis: results from the GLOBAL Fluid Study. Nephrol Dial Transplant. 2016;31(3):480-6.
  • 7
    Kawanishi H, Harada Y, Noriyuki T, Kawai T, Takahashi S, Moriishi M, Tsuchiya S. Treatment options for encapsulating peritoneal sclerosis based on progressive stage. Adv Perit Dial. 2001;17:200-4.
  • 8
    Habib SM, Betjes MG, Fieren MW, Boeschoten EW, Abrahams AC, Boer WH, et al. Management of encapsulating peritoneal sclerosis: a guideline on optimal and uniform treatment. The Netherlands Journal of Medicine. 2011;69(11):500-507.
  • 9
    Brown EA, Bargman J, van Biesen W, Chang M-Y, Finkelstein FO, Hurst H, et al., Length of Time on Peritoneal Dialysis and Encapsulating Peritoneal Sclerosis - Position Paper for ISPD: 2017 Update. Perit Dial Int. 2017;37(4):362-74.
  • 10
    Korte MR, Fieren MW, Sampimon DE, Lingsma HF, Weimar W, Betjes MGH, et al. Tamoxifen is associated with lower mortality of encapsulating peritoneal sclerosis: results of the Dutch Multicentre EPS Study. Nephrol Dial Transplant. 2011;26(2):691-7.
  • 11
    Balasubramaniam G, Brown EA, Davenport A, Cairns H, Cooper B, Fan SL, et al. The Pan-Thames EPS study: treatment and outcomes of encapsulating peritoneal sclerosis. Nephrol Dial Transplant. 2009; 24(10):3209-15.
  • 12
    Johnson DW, Cho Y, Livingston BER, Hawley CM, McDonald SP, Brown FG, et al. Encapsulating peritoneal sclerosis: incidence, predictors, and outcomes. Kidney Int. 2010;77(10):904-12.
  • 13
    Habib AM, Preston E, Davenport A. Risk factors for developing encapsulating peritoneal sclerosis in the icodextrin era of peritoneal dialysis prescription. Nephrol Dial Transplant. 2010;25:1633-8.
  • 14
    Pereira GC, Vieira IF, Vieira MMC, Romano EM, Amado LEB. Encapsulating peritoneal sclerosis: case report. J Bras Nefrol. 2017, 39(4):470-472.
  • 15
    Vieira, MB, Pereira, M, Pinto de Abreu, C. Intestinal obstruction in a patient on chronic hemodialysis. Portuguese Journal of Nephrology & Hypertension 2018, 32(3), 293-298.
  • 16
    Davenport A. Late presentation of encapsulating peritoneal sclerosis following renal transplantation and the potential under-reporting of the incidence and prevalence of encapsulating peritoneal sclerosis. Nephrology (Carlton). 2015;20(7):499-501.
  • 17
    Kawanishi H, Watanabe H, Moriishi M, Tsuchiya S. Successful surgical management of encapsulating peritoneal sclerosis. Perit Dial Int. 2005;25(4):39-47.
  • 18
    El-Sherbini N, Duncan N, Hickson M, Johansson L, Brown EA. Nutrition changes in conservatively treated patients with encapsulating peritoneal sclerosis. Perit Dial Int. 2013;33(5):538-43.
  • 19
    Hawley CM, Wall DR, Johnson DW, Campbell SB, Griffin AD, Rigby RJ, et al. Recovery of gastrointestinal function after renal transplantation in a patient with sclerosing peritonitis secondary to continuous ambulatory peritoneal dialysis. Am J Kidney Dis. 1995;26:658-61.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    23 Abr 2021
  • Data do Fascículo
    Oct-Dec 2022

Histórico

  • Recebido
    01 Fev 2021
  • Aceito
    02 Fev 2021
Sociedade Brasileira de Nefrologia Rua Machado Bittencourt, 205 - 5ºandar - conj. 53 - Vila Clementino - CEP:04044-000 - São Paulo SP, Telefones: (11) 5579-1242/5579-6937, Fax (11) 5573-6000 - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: bjnephrology@gmail.com