Acessibilidade / Reportar erro

Análise comparativa da sobrevida dos pacientes em hemodiálise vs. diálise peritoneal e identificação dos fatores associados ao óbito

Resumo

Introdução:

Há vários estudos que comparam os desfechos de pacientes tratados por diálise peritoneal (DP) e hemodiálise (HD), e a maioria é divergente.

Métodos:

Estudo de coorte que acompanhou pacientes incidentes em DP e HD de modo planejado e não planejado em unidade de diálise do HCFMB de 01/2014 a 01/2019, até o desfecho. Foram coletados dados clínicos e laboratoriais. Comparou-se os grupos DP e HD, óbito e não óbito, por meio do teste qui-quadrado para variáveis categóricas e teste t ou Mann-Whitney para as contínuas. Curva de Kaplan Meier e log-rank test foram utilizados para a sobrevida. A análise multivariada foi realizada por Regressão de Cox. A diferença significante foi de p < 0,05.

Resultados:

Foram estudados 592 pacientes, 290 tratados por HD e 302 por DP. A média de idade foi de 59,9 ± 16,8, com predomínio de sexo masculino (56,3%), principal doença de base, diabetes (45%). Óbito ocorreu em 29% dos pacientes. Não houve diferença na sobrevida de pacientes tratados por HD e DP. A maior idade (1,018 (IC 95% 1,000-1,037; p=0,046)) foi identificada como fator de risco para o óbito, enquanto a maior quantidade de dias livres de infecção (0,999 (IC 95% 0,999-1,000; p=0,003)), como fator de proteção.

Conclusão:

A análise reforçou que a sobrevida dos pacientes em HD e DP é semelhante. Foram associados ao óbito a maior idade e o menor tempo livre de infecção.

Descritores:
Sobrevida; Morte; Diálise Renal; Diálise Peritoneal

Abstract

Introduction:

There are several studies comparing the outcomes of patients treated with peritoneal dialysis (PD) and hemodialysis (HD), and most are divergent.

Methods:

This is a cohort study that followed patients with incident PD and HD in a planned and unplanned way, in a dialysis unit of the HCFMB from 01/2014 to 01/2019, until the outcome. We collected clinical and laboratory data. The PD and HD groups, death and non-death outcomes, were compared using the chi-square test for categorical variables and t-test, or Mann-Whitney test for continuous variables. Kaplan Meier curve and log-rank test were used for survival. Multivariate analysis was performed using the Cox regression. The significant difference was p < 0.05.

Results:

We had 592 patients, 290 treated by HD and 302 by PD. The mean age was 59.9 ± 16.8, with a predominance of males (56.3%), the main underlying disease was diabetes (45%); 29% of the patients died. There was no difference in the survival of patients treated by HD and PD. The oldest age (1.018 (95% CI 1.000-1.037; p=0.046)) was identified as a risk factor for death, while the highest number of infection-free days (0.999 (95% CI 0.999-1.000; p=0.003 )) as a protective factor.

Conclusion:

The analysis reinforced that the survival of patients on HD and PD was similar. Higher age and shorter infection-free time were associated with death.

Keywords:
Survival; Death; Renal Dialysis; Peritoneal Dialysis

Introdução

A doença renal crônica (DRC) é considerada um problema de saúde pública global e suas taxas de incidência e prevalência vêm aumentando. Segundo a Sociedade Brasileira de Nefrologia, as principais causas da DRC são a hipertensão arterial e o diabetes11 Penico MG, Koah Paulo. Cartilha dia Mundial do Rim. [S. l.]: Sociedade Brasileira de Nefrologia, 16 mar. 2016. Disponível em: https://arquivos.sbn.org.br/uploads/dmr2016_cartilha.pdf. Acesso em: 22 set. 2019.
https://arquivos.sbn.org.br/uploads/dmr2...
. Dados de 2018 da Sociedade Brasileira de Nefrologia (SBN) mostram que, no Brasil, a hemodiálise é a modalidade de terapia renal substitutiva (TRS) mais utilizada entre os pacientes com doença renal, 92,7%, sendo a DP o método utilizado em apenas 7,3% dos pacientes22 Censo da Sociedade Brasileira de Nefrologia 2017. Disponível em <www.sbn.org.br> Acesso em: 04, Junho, 2019
www.sbn.org.br...
.

A TRS é de alta complexidade e implica elevado custo para os cofres públicos - R$ 19,7 bilhões de gastos com TRS e R$ 1,2 bilhão com transplante renal33 Beraldo N. Saúde alerta para prevenção e diagnóstico precoce da Doença Renal Crônica. [S. l.]: Ministério da Saúde, 14 mar. 2019. Disponível em: http://www.saude.gov.br/noticias/agencia-saude/45291-ministerio-da-saude-alerta-para-prevencao-e-diagnostico-precoce-da-doenca-renal-cronica. Acesso em: 22 set 2019.
http://www.saude.gov.br/noticias/agencia...
. O acesso a ambos os métodos ocorre de forma desigual e alguns países têm implementado políticas para melhorar o acesso à DP, que requer menor infraestrutura por poder ser realizada em casa.

A possível explicação para a subutilização da DP é o fato de a HD estar associada ao maior avanço tecnológico, ao receio das complicações infecciosas, mecânicas e metabólicas associadas à DP, às dificuldades de inserção do cateter peritoneal e por fim, ao pior reembolso financeiro na DP44 Niang A; A, Iyengar A, Luychx V. Hemodialysis versus peritoneal dialysis in resource-limited setting. Current Opinion in Nephrology and Hypertension, [S. l.], p. 463-471, 22 nov. 2018. Disponível em: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/30148722.
https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/3014...
.

Vários estudos têm comparado desfechos clínicos de pacientes tratados por DP e HD e, até o momento, não há evidência de superioridade de um método em relação ao outro no que diz respeito à mortalidade geral dentro dos dois primeiros anos de tratamento55 Thiery A, Séverac F, Hannedouche T, Couchoud C, Do VH, Tiple A, et al. Survival advantage of planned haemodialysis over peritoneal dialysis: A cohort study. Nephrol Dial Transplant. 2018.,66 Heaf JG, Lokkegaard H, Madsen M. Initial survival advantage of peritoneal dialysis relative to hemodialysis. Nephrol Dial Transplant 2002; 17: 112-117..

Alguns estudos identificaram que o uso de cateteres venosos centrais (CVC) está diretamente associado à menor sobrevida, principalmente nos primeiros 90 dias de TRS55 Thiery A, Séverac F, Hannedouche T, Couchoud C, Do VH, Tiple A, et al. Survival advantage of planned haemodialysis over peritoneal dialysis: A cohort study. Nephrol Dial Transplant. 2018.

6 Heaf JG, Lokkegaard H, Madsen M. Initial survival advantage of peritoneal dialysis relative to hemodialysis. Nephrol Dial Transplant 2002; 17: 112-117.

7 de Abreu MM, Walker DR, Sesso RC, et al. A cost evaluation of peritoneal dialysis and hemodialysis in the treatment of end-stage renal disease in Sao Paulo, Brazil. Perit Dial Int 2013; 33:304-315.
-88 Genovesi S, Porcu L, Luise MC, Riva H, Nava E, Contaldo G, et al. Sudden Death in End Stage Renal Disease: Comparing Hemodialysis versus Peritoneal Dialysis. Blood Purif. 2017;. Nesse cenário, a DP surge como uma opção de TRS de início não planejado nos pacientes com DRC estádio final sem acesso vascular funcionante, podendo oferecer as vantagens do menor uso dos CVCs temporários66 Heaf JG, Lokkegaard H, Madsen M. Initial survival advantage of peritoneal dialysis relative to hemodialysis. Nephrol Dial Transplant 2002; 17: 112-117..

Há vários estudos que analisam os fatores associados à morte de paciente com DRC em diálise. Em um estudo da Urology and Nephrology Reasearch Center, pacientes em hemodiálise não sobreviventes apresentavam maior taxa de diabetes mellitus (56,5% vs. 34,5% nos sobreviventes, p < 0,001), tinham maior prevalência de isquemia cardíaca (72% vs. 29,5%, p < 0,001), eram mais velhos (63,7 ± 13,2 vs. 53,8 ± 15,3 anos, p < 0,001), tinham maior porcentagem de cateter venoso central (29,8% vs. 17%, p < 0,001), maior índice de comorbidade de Charlson (3,8 ± 1,8 vs. 1,2 ± 1,2, p < 0,001) e menor nível de albumina sérica (3,7 ± 0,4 g/dL vs. 4,0 ± 0,3 g/d, p < 0,001) e creatinina sérica (7,7 ± 2,3 mg/dL vs. 9,1 ± 2,9 mg/dL, p < 0,001)99 Soleymanian T, Niyazi H, Dehkordi SNJ, Savaj S, Argani H, Najafi I. Predictors of clinical outcomes in hemodialysis patients: A multicenter observational study. Iran J Kidney Dis. 2017;.

Com base nas divergências de estudos, são necessários mais estudos, e mais abrangentes, para identificar os fatores associados à pior sobrevida na TRS.

Hipótese

A sobrevida dos pacientes em HD e DP é semelhante, e os fatores de risco associados à menor sobrevivência são: maior idade, presença de diabetes, menores valores de albumina e hemoglobina no início da terapia.

Objetivo

O objetivo da pesquisa foi estudar comparativamente a sobrevida dos pacientes em TRS (HD vs. DP) utilizando modelos de predição para dados censurados a fim de identificar os fatores de risco/proteção que interferem na sobrevivência da população de pacientes em tratamento dialítico.

Metodologia

O estudo é coorte, observacional, longitudinal, retrospectivo e prospectivo e acompanhou pacientes incidentes em DP e HD de modo planejado e de início urgente em unidade de hospital terciário de janeiro de 2014 a janeiro de 2019. Foram incluídos pacientes maiores de 18 anos e coletados dados gerais de identificação, como nome, sexo e idade, doença de base, presença de comorbidades, data de início de diálise, valores iniciais e de 6 meses de Hb, albumina, P, PTH e creatinina. Também foram coletados dados de internação e infecção (peritonite, infecção do orifício de saída e infecção de corrente sanguínea). Os pacientes foram acompanhados até agosto de 2020, e os desfechos (óbito, recuperação de função, transplante, mudança de método ou transferência) anotados, além de dias de sobrevida.

Os resultados foram analisados e comparados por meio de programa estatístico (Bioestat 5.0, IBM SPSS Statistics 20). Inicialmente, foi realizada a análise descritiva e calculadas as medidas de tendência central e dispersão para variáveis contínuas e frequências (%) para variáveis categóricas. Comparou-se os grupos DP e HD, óbito e não óbito, por meio do teste qui-quadrado para variáveis categóricas e teste t - se distribuição normal - ou Mann-Whitney - se distribuição não normal - para as variáveis contínuas.

Foram definidas como variáveis dependentes a ocorrência de óbito e complicações infecciosas. Curva de Kaplan-Meier e log-rank test foram utilizados para comparar o tempo de sobrevida dos pacientes e da técnica. Foram considerados eventos censurados: óbito, transplante renal, mudança de método, transferência ou recuperação de função renal. A Regressão de Cox foi utilizada para determinar os fatores associados às complicações mecânicas e infecciosas, bem como à sobrevida dos pacientes. Foram selecionadas, para a regressão, as variáveis significativas em análise univariada. A diferença significante foi considerada para p < 0,05. O projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética e Pesquisa (CAAE de número 25875219.0.0000.5411).

Resultados

Durante o período de 1 de agosto de 2020 a 20 de novembro de 2020 foram coletados dados de 592 pacientes (290 em hemodiálise e 302 em diálise peritoneal), que iniciaram diálise de modo urgente e planejado, na unidade de diálise do Estado de São Paulo, no período entre janeiro de 2014 a setembro de 2019.

Na população estudada, a média de idade foi de 59,9 ± 16,8, com predomínio de sexo masculino (56,3%), principal doença de base o diabetes (46,6%) e 43,8% da população apresentando episódio de infecção associado ao tratamento dialítico.

Primeiramente, foram comparadas as variáveis dentro dos grupos HD vs. DP, e o resultado está apresentado na Tabela 1. Na comparação dos dados, foram encontradas semelhanças com relação a idade, níveis de creatinina inicial, níveis de PTH inicial, quantidade de pacientes do sexo masculino, pacientes com diabetes, transplante que apresentou segundo episódio de infecção. Na análise HD vs. DP, foram encontradas diferenças estatisticamente significativas em relação ao valor de creatinina de 6 meses, nível de albumina inicial, nível de albumina de 6 meses, nível de hemoglobina inicial, nível de hemoglobina de 6 meses, PTH de 6 meses, nível inicial de fósforo inicial, nível de fósforo de 6 meses, valor de Kt/V de 6 meses. Com relação ao número de comorbidades, pacientes em HD apresentam mais comorbidades em relação à DP, maior número de dias livres de infecção - foram considerados dados de ICS em pacientes em HD e dados de peritonite em pacientes em DP -, maior número de internação, além de maior sobrevida em relação à DP. Além disso, o grupo de HD apresentou mais pacientes com duas ou mais comorbidades, maior número de internados, maior número de óbitos, menor número de infecções - peritonite para DP e ICS para HD - e menor número de pacientes que recuperaram função em relação ao grupo DP, conforme Tabela 1.

Tabela 1
Análise comparativa hd vs. dp

A população geral foi dividida em grupos óbito e não óbito, e uma análise comparativa foi realizada. Esses grupos apresentaram diferença estatisticamente significativa em relação a fatores como níveis de creatinina iniciais, creatinina de 6 meses, idade, nível de PTH inicial, nível de P inicial, valor de Kt/V de 6 meses, número de internações, número de comorbidades, número de dias livres de infecção, sobrevida, duas ou mais comorbidades, número de diabéticos e número de internados. Dentre as comorbidades, a presença de insuficiência cardíaca foi a mais prevalente (em 75%) nos pacientes. Além disso, apresentaram semelhanças em relação aos níveis de albumina iniciais, nível de albumina de 6 meses, nível de PTH de 6 meses, níveis de hemoglobina iniciais, níveis de hemoglobina de 6 meses, níveis de P de 6 meses, ser do sexo masculino, ter tido infecção - peritonite para pacientes em DP e ICS para pacientes em HD - ou segundo episódio de infecção, conforme Tabela 2.

Tabela 2
Análise comparativa óbito vs. não óbito da população geral

Os grupos de HD e DP foram subdivididos em óbito e não óbito e o resultado obtido foi exposto na Tabela 3. A comparação dentro do grupo de HD, subdividido em óbito e não óbito, encontrou semelhanças com relação ao valor de PTH inicial, valor de PTH de 6, valor de hemoglobina, valor de hemoglobina de 6 meses, valor de fósforo inicial, valor de fósforo de 6, valor de Kt/V de 6 meses, com relação ao paciente ser do sexo masculino e paciente ter tido ICS ou IOS. Além disso, o grupo óbito teve menor creatinina inicial, menor creatinina 6 meses, menor albumina inicial, menor albumina de 6 meses, maior idade, maior número de comorbidades, maior número de internações, menor quantidade de dias livres de ICS, menor quantidade de dias livres de IOS, menor sobrevida, maior número de diabéticos, maior número de comorbidades e maior internação em relação ao grupo não óbito, conforme Tabela 3.

Tabela 3
Análise comparativa óbito vs. não óbito da população em hemodiálise e diálise peritoneal

O grupo DP também foi subdividido em óbito e não óbito e a análise comparativa não encontrou diferenças com relação ao valor de creatinina de 6 meses, albumina inicial, albumina de 6, PTH de 6 meses, hemoglobina inicial, hemoglobina de 6 meses, fósforo inicial, fósforo de 6 meses, com relação ao número de comorbidades, em relação ao Kt/V de 6, em relação ao sexo ser masculino, a ser diabético, apresentar duas ou mais comorbidades, ter tido IOS, ter tido peritonite, ter apresentado complicação mecânica, realocação cirúrgica e início planejado. Quanto às diferenças, o grupo óbito apresentou maior idade, maior número de internações, menor valor de creatinina inicial, menor valor de PTH inicial, menor quantidade de dias livres de peritonite, menor sobrevida e maior número de internados em relação ao grupo não óbito, conforme Tabela 3.

Os grupos DP e HD foram comparados em relação à sobrevida e ao tempo livre de infecção. Não houve diferença quanto à curva de sobrevida dos pacientes tratados por HD e DP (p=0,187). Os pacientes tratados por HD apresentaram maior tempo livre de infecção (p<0,001), conforme mostra a Figura 1. Os dados censurados foram: transplante, mudança de técnica, mudança de endereço e recuperação de função.

Figura 1
Análise de sobrevivência e tempo livre de infecção dos pacientes em HD e DP.

As variáveis que em análise univariada apresentavam p < 0,05 foram selecionadas para o modelo de Regressão de Cox. As Tabelas 4, 5 e 6 apresentam a Regressão de COX para os eventos óbito na população geral, óbito na população em HD e óbito na população em DP, respectivamente.

Para a população dialítica geral, ou seja, em DP e HD, a menor quantidade de dias livres de infecção (0,999 (IC 95% 0,999 - 1,000; p = 0,003)), e a maior idade (1,02 (IC 95% 1,00 - 1,04; p = 0,046)) foram fatores de risco para o óbito, conforme Tabela 4. Para pacientes em HD, a presença de mais de duas comorbidades também se associou ao óbito (1,2 (IC 95% 1,01 - 1,5; 0,034)), conforme mostra a Tabela 5. Para os pacientes em DP, a maior idade (1,04 (IC 95% 1,02 - 1,07; p = 0,04)) e menor quantidade de dias livres de infecção (0,997 (IC 95% 0,996 - 0,999; p = 0,002)) também foram fatores de risco para o óbito, conforme Tabela 6.

Tabela 4
Regressão de Cox para óbito na população geral em diálise (hd e dp)
Tabela 5
Regressão de Cox para óbito na população em hemodiálise
Tabela 6
Regressão de Cox para óbito na população em diálise peritoneal

Discussão

Vários estudos têm comparado desfechos clínicos de pacientes tratados por DP e HD e, até o momento, não há evidência de superioridade de um método em relação ao outro no que diz respeito à mortalidade geral dentro dos dois primeiros anos de tratamento. Quando analisadas subpopulações, alguns estudos têm mostrado melhores resultados com DP no grupo de pacientes jovens sem comorbidades, enquanto outros estudos apontam menor mortalidade após dois anos de diálise em pacientes idosos e com comorbidades tratados com HD44 Niang A; A, Iyengar A, Luychx V. Hemodialysis versus peritoneal dialysis in resource-limited setting. Current Opinion in Nephrology and Hypertension, [S. l.], p. 463-471, 22 nov. 2018. Disponível em: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/30148722.
https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/3014...
,66 Heaf JG, Lokkegaard H, Madsen M. Initial survival advantage of peritoneal dialysis relative to hemodialysis. Nephrol Dial Transplant 2002; 17: 112-117.,1010 United States Renal Data System. 2015 USRDS Annual Data Report: Epidemiology of Kidney Disease in the United States. Bethesda: National Institutes of Health, National Institute of Diabetes and Digestive and Kidney Diseases; 2015.

Neste estudo, a análise univariada mostrou que a mortalidade dos pacientes em HD foi maior do que a mortalidade dos pacientes em DP, porém a população em HD apresentava maior número de comorbidades. Quando foi considerado o fator tempo para o óbito, não houve diferença na sobrevida dos pacientes em HD e DP. De fato, o resultado da análise comparativa da sobrevivência, do presente estudo, corrobora com a hipótese inicial de que a sobrevida dos pacientes em HD e DP é semelhante.

As doenças de base mais comuns dentre os pacientes em diálise foram diabetes e hipertensão, semelhante ao descrito na literatura, além de um grande número de doença de base indeterminada, principalmente em pacientes em DP, o que pode ser justificado pela ausência de seguimento pré-dialítico de muitos.

A análise univariada mostrou que diabetes, maior idade, menor tempo livre de infecção, comorbidades e menores níveis de albumina e de hemoglobina estariam associados à ocorrência de óbito na população em diálise. Dentre as comorbidades, a presença de insuficiência cardíaca foi a mais prevalente (em 75%) dos pacientes. Entretanto, após a realização da Regressão de Cox, apenas as variáveis idade, tempo livre de infecção e mais de duas comorbidades associaram-se ao desfecho óbito.

Nossos dados reforçam as evidências de que a sobrevida declina com o aumento da idade, porém não corroboram com resultados prévios que apontam o diabetes, a hipoalbuminemia, a inadequação dialítica, a anemia e os maiores níveis de PTH como preditores de mortalidade1010 United States Renal Data System. 2015 USRDS Annual Data Report: Epidemiology of Kidney Disease in the United States. Bethesda: National Institutes of Health, National Institute of Diabetes and Digestive and Kidney Diseases; 2015,1111 Acchiardo SR, Moore LW, Latour PA. Malnutrition as the main factor in morbidity and mortality of hemodialysis patients. Kidney Int Suppl. 1983 Dec; 16:S199-203..

Acchiardo et al.1111 Acchiardo SR, Moore LW, Latour PA. Malnutrition as the main factor in morbidity and mortality of hemodialysis patients. Kidney Int Suppl. 1983 Dec; 16:S199-203. verificaram que a má-nutrição (representada pela baixa albumina) é o mais significativo preditor de óbito em diálise. A USRDS (United States Renal Data System) encontrou relação linear da diminuição da mortalidade com o aumento de dose de diálise (Kt/V de 0,8 para 1,4)1212 Held PJ, Port FK, Wolfe RA, Stannard DC, Carroll CE, Daugirdas JT, et al. The dose of hemodialysis and patient mortality. Kidney Int. 1996 Aug;50(2):550-6, enquanto o HEMO, um estudo clínico randomizado prospectivo, não detectou melhora na sobrevida de pacientes cuja dose de diálise era mais alta (Kt/V = 1,65), comparados com aqueles com dose convencional (Kt/V = 1,25)1313 Allon M, Depner TA, Radeva M, Bailey J, Beddhu S, Butterly D, et al. Impact of dialysis dose and membrane on infection-related hospitalization and death: Results of the HEMO study. J Am Soc Nephrol. 2003;14:1863-70.. Portanto, é possível que doses muito elevadas de Kt/V não contribuam para melhor sobrevida. A anemia é uma complicação frequente e precoce da DRC e contribui para alterações cardiovasculares em pacientes com DRC, promovendo, principalmente, hipertrofia ventricular esquerda e associando-se ao óbito1414 Locatelli F, Pisoni RL, Akizawa T, Cruz JM, DeOreo PB, Lameire NH, Held PJ. Anemia in hemodialysis patients of five European Countries: association with morbidity and mortality in the Dialysis Outcomes and Practice Patterns Study (DOPPS). Nephrol Dial Transplant. 2004;19:121-32.,1515 Pisoni RL, Bragg-Gresham JL, Young EW, Akizawa T, Asano Y, Locatelli F, et al. Anemia management and outcomes from 12 countries in the Dialysis Outcomes and Practice Patterns Study (DOPPS). Am J Kidney Dis. 2004;44:94-111..

Entre os fatores envolvidos no metabolismo mineral, enfatizou-se que os diferentes valores do PTH interferem diretamente na sobrevida dos pacientes em diálise, por aumentar o risco de morte cardiovascular, já que está associado à aceleração na formação de aterosclerose e calcificações arteriais1616 Steingrimsdottir Le et al. Relationship between serum parathyroid hormone levels, vitamin D sufficiency, and calcium intake. JAMA. 2005; 294: 2336-2341.

Pode ser explicação para essas variáveis não permanecerem significativas na análise multivariada a colinearidade com a idade ou com a presença de múltiplas comorbidades.

No presente estudo, o maior número de comorbidades está relacionado ao óbito na HD, tanto na análise univariada como na multivariada. A população analisada nesse estudo apresenta uma média de idade mais avançada, sendo possível comparar os resultados aqui obtidos com estudo focado para a análise de mortalidade de idosos em diálise, que relaciona o diabetes e maior tempo de diálise à mortalidade em idosos1717 Han SS, Park JY, Kang S, Kim KH, Ryu DR, Kim H, et al. Dialysis modality and mortality in the elderly: A meta-analysis. Clin J Am Soc Nephrol. 2015;. Dentre as comorbidades, a presença de insuficiência cardíaca foi a mais prevalente (em 75%) dos pacientes.

Por meio da análise multivariada, é possível perceber que a maior idade e menor quantidade de dias livres de infecção são fatores de risco para o óbito na população geral (DP + HD) e na DP. Já na HD, a menor quantidade de dias livres de infecção e o maior número de comorbidades são fatores de risco.

As limitações do estudo foram a própria análise estatística, que, por exemplo, relaciona o número de internações a uma maior ocorrência de infecções, quando, na verdade, é a própria infecção que vai ser a causa da internação desse paciente; e também não foram avaliados dados de complicações mecânicas relacionadas aos acessos dialíticos e à presença de função renal residual ao longo das terapias. Além disso, não foi analisado o início planejado ou não para HD e o acesso hemodialítico, fatores que podem impactar no prognóstico dos pacientes.

Quanto às comorbidades, pode haver necessidade de, em futuros estudos, especificá-las, a fim de obter quais estão diretamente relacionadas à ocorrência de óbito. Por último, é importante ressaltar que o hospital terciário, que foi sede do estudo, apresenta a excepcionalidade de ter uma maior quantidade de pacientes em DP do que em HD1212 Held PJ, Port FK, Wolfe RA, Stannard DC, Carroll CE, Daugirdas JT, et al. The dose of hemodialysis and patient mortality. Kidney Int. 1996 Aug;50(2):550-6,1313 Allon M, Depner TA, Radeva M, Bailey J, Beddhu S, Butterly D, et al. Impact of dialysis dose and membrane on infection-related hospitalization and death: Results of the HEMO study. J Am Soc Nephrol. 2003;14:1863-70., pois a DP é a terapia dialítica de início preferencial, pela ausência de vaga na HD e pelo fato de a DP ter a vantagem de não necessitar de CVC - cateter que está associado a uma menor sobrevida1818 Bittencourt Dias D, Mendes ML, Alves CA, Caramori JT, Ponce D. Peritoneal Dialysis as an Urgent-Start Option for Incident Patients on Chronic Renal Replacement Therapy: World Experience and Review of Literature. Blood Purification. 2020.

19 Dias DB, Mendes ML, Caramori JT, Falbo dos Reis P, Ponce D. Urgent-start dialysis: Comparison of complications and outcomes between peritoneal dialysis and haemodialysis. Perit Dial Int. 2020;
-2020 Perl J, Wald R, McFarlane P, Bargman JM, Vonesh E, Na Y, et al. Hemodialysis vascular access modifies the association between dialysis modality and survival. J Am Soc Nephrol. 2011.

Conclusões

A sobrevida dos pacientes em HD e DP foi semelhante, conforme a hipótese inicial. Foram associados ao óbito: maior idade, menor tempo livre de infecção e número de comorbidades.

Agradecimentos

Agradecemos à Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP) pelo financiamento do estudo, por meio de bolsa de iniciação científica (Número do Processo: 2019/25724-8). Agradecemos a Daniela Ponce, por todo ensinamento, dedicação e paciência.

References

  • 1
    Penico MG, Koah Paulo. Cartilha dia Mundial do Rim. [S. l.]: Sociedade Brasileira de Nefrologia, 16 mar. 2016. Disponível em: https://arquivos.sbn.org.br/uploads/dmr2016_cartilha.pdf. Acesso em: 22 set. 2019.
    » https://arquivos.sbn.org.br/uploads/dmr2016_cartilha.pdf
  • 2
    Censo da Sociedade Brasileira de Nefrologia 2017. Disponível em <www.sbn.org.br> Acesso em: 04, Junho, 2019
    » www.sbn.org.br
  • 3
    Beraldo N. Saúde alerta para prevenção e diagnóstico precoce da Doença Renal Crônica. [S. l.]: Ministério da Saúde, 14 mar. 2019. Disponível em: http://www.saude.gov.br/noticias/agencia-saude/45291-ministerio-da-saude-alerta-para-prevencao-e-diagnostico-precoce-da-doenca-renal-cronica. Acesso em: 22 set 2019.
    » http://www.saude.gov.br/noticias/agencia-saude/45291-ministerio-da-saude-alerta-para-prevencao-e-diagnostico-precoce-da-doenca-renal-cronica
  • 4
    Niang A; A, Iyengar A, Luychx V. Hemodialysis versus peritoneal dialysis in resource-limited setting. Current Opinion in Nephrology and Hypertension, [S. l.], p. 463-471, 22 nov. 2018. Disponível em: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/30148722.
    » https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/30148722
  • 5
    Thiery A, Séverac F, Hannedouche T, Couchoud C, Do VH, Tiple A, et al. Survival advantage of planned haemodialysis over peritoneal dialysis: A cohort study. Nephrol Dial Transplant. 2018.
  • 6
    Heaf JG, Lokkegaard H, Madsen M. Initial survival advantage of peritoneal dialysis relative to hemodialysis. Nephrol Dial Transplant 2002; 17: 112-117.
  • 7
    de Abreu MM, Walker DR, Sesso RC, et al. A cost evaluation of peritoneal dialysis and hemodialysis in the treatment of end-stage renal disease in Sao Paulo, Brazil. Perit Dial Int 2013; 33:304-315.
  • 8
    Genovesi S, Porcu L, Luise MC, Riva H, Nava E, Contaldo G, et al. Sudden Death in End Stage Renal Disease: Comparing Hemodialysis versus Peritoneal Dialysis. Blood Purif. 2017;
  • 9
    Soleymanian T, Niyazi H, Dehkordi SNJ, Savaj S, Argani H, Najafi I. Predictors of clinical outcomes in hemodialysis patients: A multicenter observational study. Iran J Kidney Dis. 2017;
  • 10
    United States Renal Data System. 2015 USRDS Annual Data Report: Epidemiology of Kidney Disease in the United States. Bethesda: National Institutes of Health, National Institute of Diabetes and Digestive and Kidney Diseases; 2015
  • 11
    Acchiardo SR, Moore LW, Latour PA. Malnutrition as the main factor in morbidity and mortality of hemodialysis patients. Kidney Int Suppl. 1983 Dec; 16:S199-203.
  • 12
    Held PJ, Port FK, Wolfe RA, Stannard DC, Carroll CE, Daugirdas JT, et al The dose of hemodialysis and patient mortality. Kidney Int. 1996 Aug;50(2):550-6
  • 13
    Allon M, Depner TA, Radeva M, Bailey J, Beddhu S, Butterly D, et al Impact of dialysis dose and membrane on infection-related hospitalization and death: Results of the HEMO study. J Am Soc Nephrol. 2003;14:1863-70.
  • 14
    Locatelli F, Pisoni RL, Akizawa T, Cruz JM, DeOreo PB, Lameire NH, Held PJ. Anemia in hemodialysis patients of five European Countries: association with morbidity and mortality in the Dialysis Outcomes and Practice Patterns Study (DOPPS). Nephrol Dial Transplant. 2004;19:121-32.
  • 15
    Pisoni RL, Bragg-Gresham JL, Young EW, Akizawa T, Asano Y, Locatelli F, et al Anemia management and outcomes from 12 countries in the Dialysis Outcomes and Practice Patterns Study (DOPPS). Am J Kidney Dis. 2004;44:94-111.
  • 16
    Steingrimsdottir Le et al. Relationship between serum parathyroid hormone levels, vitamin D sufficiency, and calcium intake. JAMA. 2005; 294: 2336-2341
  • 17
    Han SS, Park JY, Kang S, Kim KH, Ryu DR, Kim H, et al. Dialysis modality and mortality in the elderly: A meta-analysis. Clin J Am Soc Nephrol. 2015;
  • 18
    Bittencourt Dias D, Mendes ML, Alves CA, Caramori JT, Ponce D. Peritoneal Dialysis as an Urgent-Start Option for Incident Patients on Chronic Renal Replacement Therapy: World Experience and Review of Literature. Blood Purification. 2020.
  • 19
    Dias DB, Mendes ML, Caramori JT, Falbo dos Reis P, Ponce D. Urgent-start dialysis: Comparison of complications and outcomes between peritoneal dialysis and haemodialysis. Perit Dial Int. 2020;
  • 20
    Perl J, Wald R, McFarlane P, Bargman JM, Vonesh E, Na Y, et al. Hemodialysis vascular access modifies the association between dialysis modality and survival. J Am Soc Nephrol. 2011

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    04 Maio 2022
  • Data do Fascículo
    Jan-Mar 2023

Histórico

  • Recebido
    24 Out 2021
  • Aceito
    13 Mar 2022
Sociedade Brasileira de Nefrologia Rua Machado Bittencourt, 205 - 5ºandar - conj. 53 - Vila Clementino - CEP:04044-000 - São Paulo SP, Telefones: (11) 5579-1242/5579-6937, Fax (11) 5573-6000 - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: bjnephrology@gmail.com