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Tempo de espera para transplante renal com base em painel de reatividade de anticorpos calculado: experiência de um centro do sul do Brasil

RESUMO

Introdução:

O objetivo foi analisar a lista de espera para transplante renal em nosso hospital segundo o painel de reatividade de anticorpos (PRAc) do candidato e seus desfechos.

Métodos:

Incluímos 1.640 pacientes em lista de espera entre 2015 e 2019. Para a análise, estimou-se a razão de risco (HR) para transplante pelo modelo de regressão de Fine e Gray conforme o painel de reatividade e HR para perda do enxerto e óbito após o transplante.

Resultados:

A idade média foi 45,39 ± 18,22 anos. Sexo masculino foi predominante (61,2%), mas a proporção diminuiu linearmente com o aumento do PRAc (p < 0,001). A distribuição de pacientes conforme os painéis foi: 0% (n = 390), 1% – 49% (n = 517), 50% – 84% (n = 269), e ≥85% (n = 226). O transplante foi realizado em 85,5% da amostra em tempo mediano de 8 meses (IC 95%: 6,9 – 9,1). As HRs estimadas para transplante durante o acompanhamento foram 2,84 (IC 95%: 2,51 – 3,34), 2,41 (IC 95%: 2,07 – 2,80) e 2,45 (IC 95%: 2,08 – 2,90) no intervalo de PRAc de 0%, 1%–49% e 50%–84%, respectivamente, comparadas com PRAc ≥ 85 (p < 0,001). Após o transplante, a HR para perda do enxerto foi semelhante nos diferentes grupos de PRAc, mas HR para óbito (0,46 IC 95% 0,24–0,89 p = 0,022) foi menor no grupo PRAc 0% quando ajustada para idade, sexo e presença de anticorpos doador específico (DSA).

Conclusão:

Pacientes com PRAc abaixo de 85% têm mais que o dobro de probabilidade de receber transplante renal com tempo de espera menor. Risco de perda do enxerto após o transplante foi semelhante nos diferentes grupos PRAc, e risco ajustado de óbito foi menor em receptores não sensibilizados.

Descritores:
Listas de Espera; Transplante de Rim; anticorpos anti-HLA; PRAc

ABSTRACT

Introduction:

The aim of this study was to analyze the waiting list for kidney transplantation in our hospital according to candidate’s panel reactive antibodies (cPRA) and its outcomes.

Methods:

One thousand six hundred forty patients who were on the waiting list between 2015 and 2019 were included. For the analysis, hazard ratios (HR) for transplant were estimated by Fine and Gray’s regression model according to panel reactivity and HR for graft loss and death after transplantation.

Results:

The mean age was 45.39 ± 18.22 years. Male gender was predominant (61.2%), but the proportion decreased linearly with the increase in cPRA (p < 0.001). The distribution of patients according to panels were: 0% (n = 390), 1% – 49% (n = 517), 50% – 84% (n = 269), and ≥ 85% (n = 226). Transplantation was achieved in 85.5% of the sample within a median time of 8 months (CI 95%: 6.9 – 9.1). The estimated HRs for transplantation during the follow-up were 2.84 (95% CI: 2.51 – 3.34), 2.41(95%CI: 2.07 – 2.80), and 2.45(95%CI: 2.08 – 2.90) in the cPRA range of 0%, 1%–49%, and 50%–84%, respectively, compared to cPRA ≥ 85 (p < 0.001). After transplantation, the HR for graft loss was similar in the different cPRA groups, but the HR for death (0.46 95% CI 0.24–0.89 p = 0.022) was lower in the 0% cPRA group when adjusted for age, gender, and presence of donor specific antibodies (DSA).

Conclusion:

Patients with cPRA below 85% are more than twice as likely to receive a kidney transplantation with a shorter waiting time. The risk of graft loss after transplantation was similar in the different cPRA groups, and the adjusted risk of death was lower in nonsensitized recipients.

Keywords:
Waiting Lists; Kidney Transplantation; anti-HLA antibodies; cPRA

Introdução

Existem cerca de 30 mil pacientes à espera de um transplante renal no Brasil. No estado do Rio Grande do Sul, a lista inclui entre 1.200 e 1.300 pessoas (segundo dados da ABTO – Associação Brasileira de Transplante de órgãos)11. Associação Brasileira de Transplante de Órgãos [site na Internet]. São Paulo: ABTO; [cited 2022/02/14]. Available from: https://site.abto.org.br/.
https://site.abto.org.br/...
. O centro de transplante renal da Santa Casa de Misericórdia de Porto Alegre contribui com cerca de 40% dessa lista. O tempo de espera para um transplante depende não apenas dos órgãos disponíveis, mas também do painel de reatividade de anticorpos (PRAc) do candidato. Quanto maior o PRAc, maior o tempo em lista de espera (TLE) e piores os desfechos esperados. Nos EUA, 97.522 pessoas estavam esperando por um rim em março de 2022, a frequência de pessoas que receberam um órgão de acordo com o PRAc (%) foi 0: 58,6%; 0–19: 12,4%; 20–79: 17,5%; 80–97%: 5,3%; 98–100: 6,2%. A porcentagem de pessoas com TLE superior a 5 anos foi de 13,1%, 11,3%, 12,7%, 12,8%, 15,8% e 28,9%, respectivamente22. National Data [Internet]. [cited 2022/02/27]. Washington: The World Bank Group; 2022. Available from: https://optn.transplant.hrsa.gov/data/view-data-reports/national-data/.
https://optn.transplant.hrsa.gov/data/vi...
. O objetivo deste estudo foi analisar o tempo em lista de espera e desfechos de nosso centro de acordo com o PRAc e o risco de perda do enxerto e óbito dos receptores transplantados.

Métodos

População

Os dados disponíveis de 1.640 pacientes registrados em nosso centro foram recuperados da lista de espera do Sistema Nacional de Transplantes (SNT) durante o período de janeiro de 2015 a dezembro de 2019.

Painel de Reatividade de Anticorpos Calculado (PRAc)

A pesquisa de anticorpos foi feita por meio da tecnologia Luminex33. Moalic-Allain V. Pièges de l’interprétation des anticorps anti-HLA par technologie Luminex™. Ann Biol Clin (Paris). 2014;72(2):178–84. PubMed PMID: 24736137.. A presença de anticorpos anti-HLA, considerada a intensidade média de fluorescência (IMF), foi superior a 1.000. O PRA foi feito usando a frequência de antígenos em uma amostra de 1.447 HLA tipados nos loci A, B, C, DR e DQ em nosso laboratório a partir de uma amostra de doadores falecidos no Brasil, a maioria deles do sul do país. A tipagem DP não foi aplicada a essa calculadora desenvolvida em Portugal. A DP foi baseada na calculadora canadense (2.296 amostras) que apresenta uma frequência de outros alelos semelhante à nossa. A calculadora PRAc canadense é um componente do Canadian Transplant Registry (CTR), um aplicativo baseado na web utilizado pela comunidade de transplantes para estimar a porcentagem de doadores de órgãos falecidos no Canadá com os quais um candidato a transplante pode ser incompatível. Essa calculadora usa a mesma fórmula e dados que o CTR44. Canadian Transplant Registry. Canadian cPRA calculator [Internet]. Canada: CTR; 2021 [cited 2021/12/5-9]. Available from: https://ctr2.transplantregistry.ca/otd-cpra-client/ctr2.jsp.
https://ctr2.transplantregistry.ca/otd-c...
. A inclusão dos UA (Unacceptable Antigens) DQA, DPA e DPB nos cálculos do PRAc canadense melhora a precisão do PRAc quando estes são relevantes na alocação55. Tinckam KJ, Liwski R, Pochinco D, et al. cPRA increases with DQA, DPA, and DPB unacceptable antigens in the Canadian cPRA calculator. Am J Transplant. 2015;15(12):3194–201. doi: http://dx.doi.org/10.1111/ajt.13355. PubMed PMID: 26080906.
https://doi.org/10.1111/ajt.13355...
,66. Lima BA, Alves H. Portuguese calculated panel reactive antibodies online estimator. HLA. 2019;93(6):445–50. doi: http://dx.doi.org/10.1111/tan.13516. PubMed PMID: 30838808.
https://doi.org/10.1111/tan.13516...
. A rotina em nosso programa é realizar o transplante com prova cruzada por citometria de fluxo negativa, com raras exceções, como urgência de transplante por falta de acesso, quando a FCXM B positiva é aceita dentro de certos limites (Tabela 1).

Tabela 1
Características dos pacientes e desfechos de acordo com o PRAc

Tempo na Lista de Espera

O tempo em lista de espera foi considerado o tempo em meses desde o registro do paciente na lista até a data do transplante ou óbito ou ativo na lista até 3 de julho de 2021 (término do estudo). Os pacientes transplantados que retornaram à lista de espera foram incluídos duas vezes no cálculo do tempo como um sujeito diferente (n = 29).

Análise Estatística

A idade é apresentada como média e desvio padrão e o PRAc e desfechos como frequência e porcentagem. A associação do PRAc com variáveis foi analisada pelo qui-quadrado de associação linear e ANOVA. O transplante foi o desfecho de interesse, o óbito foi o evento competitivo e a ausência de ambos foi a censura. Além disso, a curva ROC foi usada para encontrar o melhor ponto de corte do PRAc para prever o transplante. O método de Kaplan-Meier foi usado para analisar o tempo até o transplante, e a comparação foi feita pelo teste de log-rank. Posteriormente, o tempo de acompanhamento em meses dos receptores transplantados foi calculado a partir da data do transplante até o óbito ou perda do enxerto ou perda de acompanhamento ou fim do estudo. O óbito foi o desfecho de interesse, a perda do enxerto, o evento competitivo e a ausência de ambos, censurada. As razões de risco (HR) para transplante de pacientes em lista de espera e para óbito após o transplante foram estimadas pelo modelo de regressão de Fine e Gray com intervalo de confiança de 95% (IC95%). As HR estimadas foram ajustadas por idade e sexo. Nas análises de desfecho após os transplantes, o DSA foi incluído como uma covariável. Foram utilizados para análise o software SPSS (IBM SPSS Statistics for Windows, Versão 25.0. Armonk, NY: IBM Corp) e o pacote cmprsk do software R. O nível de significância estatística adotado foi de 0,05. O estudo foi aprovado pelo comitê de ética local sob o número 3.798.838.

Resultados

A amostra foi composta por 1.640 pacientes em lista de espera de 2015 a 2019. A média de idade foi de 45,39 ± 18,22 anos, sem diferença entre os grupos de PRAc (p = 0,328). O sexo masculino foi o predominante (61,2%) e diminuiu linearmente com maior PRAc (p < 0,001). O PRAc ≥ 85% foi linearmente associado de forma significativa à proporção de pessoas ainda em lista de espera e ao óbito. Os dados são apresentados na Tabela 1. Como pode ser visto na Tabela 2, os painéis com o maior número de pacientes na lista foram: 1% – 49% (n = 517) e 0% (n = 390). Os painéis com o menor número de receptores de transplante foram: ≥ 85% (n = 226) e 50% – 84% (n = 269). O transplante foi realizado em 85,5% da amostra em uma mediana de 8 meses (IC 95%: 6,9 – 9,1). Foi encontrada uma diferença significativa ao comparar o TLE com PRAc (Log Rank = 188,0 p < 0,001). O PRAc ≥ 85% apresentou tempo mediano até o transplante de 36 meses (IC 95%: 28,1 – 43,9), significativamente superior aos outros grupos. O PRAc de 50% – 84% e 1% – 49% não foi diferente (7,0 meses, IC95%: 52 – 8,8 e 6,0 meses, IC95%: 4,8 – 7,2, respectivamente), mas significativamente mais elevado do que o PRAc zero (5,0 meses, IC95%: 6,9 – 9,1) (Tabela 2). O melhor ponto de corte de PRAc para prever o transplante renal foi PRAc inferior a 85,5%, com sensibilidade de 84%, especificidade de 55,0% e área sob a curva de 0,712 (IC 95% 0,486–0,6123; p < 0,001) (Tabela 3). A análise dos PRAc mais elevados mostrou que apenas 54,9% dos pacientes (n = 56/102) com PRAc > 99% foram transplantados durante o tempo de acompanhamento, com um tempo mediano de 47 meses (IC95% 20–74). Em pacientes com PRAc entre 96 e 99%, o transplante foi realizado em 59,3% (n = 86/145) em 47 meses (IC95% 35,8–58,2).

Tabela 2
Tempo em lista de espera até o transplante por PRAc
Tabela 3
Curva ROC e tempo em lista de espera até o transplante por PRAc

As HRs estimadas de transplante renal durante o acompanhamento foram de 84 (IC95%: 2,51 – 3,34), 2,41 (IC95%: 2,07 – 2,80) e 45 (IC95%: 2,08 – 90) no intervalo de PRAc de 0%, 1%–49% e 50%–84%, respectivamente, em comparação com PRAc ≥ 85 (p < 0,001). Após o ajuste por sexo e idade, as HRs permaneceram semelhantes, conforme mostrado na Tabela 4.

Tabela 4
Estimativa da razão de risco de pacientes em lista de espera para transplante por PRAc (n = 1.640)

Os desfechos do subgrupo de pacientes (n = 1129) submetidos a transplante renal com doador falecido entre janeiro de 2015 e dezembro de 2019 não mostraram diferença significativa na HR para óbito e perda de enxerto com diferentes PRAc. No entanto, após o ajuste por idade, sexo e presença de DSA, o grupo PRAc 0% apresentou menor risco de óbito. (Tabela 5).

Tabela 5
Estimativa da razão de risco de óbito e perda do enxerto após o transplante renal por intervalo de PRAc (n = 1.129)

Discussão

Esse estudo mostrou um TLE significativamente maior para pacientes com PRAc acima de 85% e, especialmente, acima de 95%. O ponto de corte do PRAc para prever o aumento do risco de permanência na lista de espera difere por centro, dependendo da sensibilidade dos métodos utilizados para pesquisar anticorpos HLA e do ponto de corte da intensidade média de fluorescência (IMF). PRAc acima de 85% esteve presente em 21,7% e acima de 95% esteve presente em 17,7% dos pacientes em lista de espera, uma frequência maior do que os dados dos EUA, provavelmente porque eles implementaram um novo sistema de alocação de rins (KAS, por sua sigla em inglês) desde 2014 e aumentaram a taxa de transplante nesse grupo de pacientes de 2,4% para 12,3% após o primeiro ano. A tecnologia Luminex, que define a presença de anticorpos anti-HLA como IMF acima de 1.000, é muito mais sensível para detectar a pré-sensibilização em potenciais receptores de transplante que não é detectada por outros métodos de detecção de anticorpos HLA, o que pode ser outro motivo para a maior taxa de pacientes sensibilizados em nossa amostra77. Tait BD, Hudson F, Cantwell L, et al. Luminex technology for HLA antibody detection in organ transplantation. Nephrology (Carlton). 2009;14(2):247–54. doi: http://dx.doi.org/10.1111/j.1440-1797.2008.01074.x. PubMed PMID: 19207861.
https://doi.org/10.1111/j.1440-1797.2008...
,88. Moreira SS. Uso da técnica de Crossmatch por citometria de fluxo comparado o método utilizado no laboratório com o protocolo Halifaster e doadores vivos [dissertação]. Curso de Especialização em Imunohematoterapia e Transplantação, Escola Superior de Saúde, Instituto Politécnico do Porto; 2021..

O transplante foi realizado em 85,5% dessa amostra de pacientes em uma mediana de 8 meses. No entanto, os pacientes com PRAc ≥ 85% tiveram uma mediana de tempo até o transplante de 36 meses, significativamente maior do que os outros grupos e do que pacientes com PRAc acima de 99%, dos quais apenas cerca de 50% transplantaram com uma mediana de 47 meses. Em análise anterior elaborada por Marinho et al.99. Marinho A, Cardoso SDS, Almeida VVD. Disparidades nas filas para transplantes de órgãos nos estados brasileiros. Cad Saude Publica. 2010;26(4):786–96. doi: http://dx.doi.org/10.1590/S0102-311X2010000400020. PubMed PMID: 20512218.
https://doi.org/10.1590/S0102-311X201000...
, o tempo médio de espera por um transplante renal no Brasil foi de 1,32 anos. Eles apresentaram discrepâncias entre as regiões do país, sendo as regiões Sul e Sudeste aquelas com os intervalos de tempo mais curtos. Entretanto, as taxas não foram separadas por PRAc. Lim et al.1010. Lim WH, Chapman JR, Wong G. Peak panel reactive antibody, cancer, graft, and patient outcomes in kidney transplant recipients. Transplantation. 2015;99(5):1043–50. doi: http://dx.doi.org/10.1097/TP.0000000000000469. PubMed PMID: 25539466.
https://doi.org/10.1097/TP.0000000000000...
, que usaram o Australian and New Zealand Dialysis and Transplant Registry (ANZDATA), descobriram que altos níveis de PRA pré-transplante estão associados a efeitos prejudiciais nos desfechos do enxerto. Tradicionalmente, o PRA elevado, o retransplante e os enxertos de doador falecido têm sido associados a um risco aumentado. A dessensibilização para prevenir a rejeição precoce mediada por anticorpos pode ser uma opção em alguns centros1111. Keith DS, Vranic GM. Approach to the highly sensitized kidney transplant candidate. Clin J Am Soc Nephrol. 2016;11(4):684–93. doi: http://dx.doi.org/10.2215/CJN.05930615. PubMed PMID: 26915916.
https://doi.org/10.2215/CJN.05930615...
. Para pacientes com PRAc > 95% e, especialmente, aqueles que se aproximam de PRAc de 100%, o número de doadores necessários para se ter uma probabilidade elevada de encontrar uma compatibilidade aceitável aumenta exponencialmente. Por exemplo, para atingir uma probabilidade de 95% de encontrar um doador aceitável, um candidato com PRAc de 99% precisaria participar de 300 ofertas de doadores, enquanto um candidato com PRAc de 99,5% precisaria de 600 ofertas, com PRAc de 99,9%, 3.000, e > 99,99% precisaria de 30.000 ofertas de doadores, o que enfatiza a necessidade de um pool maior de doadores.

Nossos dados mostraram que, na ausência de dessensibilização, os pacientes com PRAc ≥ 85% apresentaram uma proporção significativamente maior de status ativo e óbito na lista de espera. No entanto, pacientes altamente sensibilizados, com ausência de DSA e uma prova cruzada de fluxo negativo, tiveram sobrevida do enxerto semelhante em comparação com intervalos mais baixos de PRAc, mostrando que, ao aumentar o pool de doadores, é possível encontrar um doador compatível e realizar um transplante bem-sucedido. Neste estudo, após o ajuste para sexo e idade, a chance de transplante durante o acompanhamento para pacientes com painel de 0% em comparação com ≥ 85% foi aumentada em 288%. Para Lim et al.1212. Lim WH, Chapman JR, Wong G. Peak panel reactive antibody, cancer, graft, and patient outcomes in kidney transplant recipients. Transplantation. 2015;99(5):1043–50. doi: http://dx.doi.org/10.1097/TP.0000000000000469. PubMed PMID: 25539466.
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, receptores de transplante renal altamente sensibilizados com um pico de PRA superior a 80% apresentaram risco maior de rejeição (pelo menos 1,8 vezes em comparação com receptores com um pico de PRA de 0%), falha do enxerto, câncer e óbito, independentemente da idade e do tempo em diálise. Eles chamam a atenção para a necessidade de implementar estratégias para reduzir o tempo de espera do transplante e evitar a sensibilização em todos os potenciais candidatos a transplante, a fim de melhorar a sobrevida geral do enxerto e do paciente. Para Lan et al.1313. Lan JH, Kadatz M, Chang DT, Gill J, Gebel HM, Gill JS. Pretransplant calculated panel reactive antibody in the absence of donor-specific antibody and kidney allograft survival. Clin J Am Soc Nephrol. 2021;16(2):275–83. doi: http://dx.doi.org/10.2215/CJN.13640820. PubMed PMID: 33495290.
https://doi.org/10.2215/CJN.13640820...
, os pacientes com PRAc ≥ 98% apresentaram um risco maior de perda do enxerto por qualquer causa, incluindo falha do aloenxerto censurada por óbito. Na análise estratificada, o maior risco de perda do enxerto entre os pacientes com PRAc ≥ 98% foi observado em retransplantes, mas não em primeiros transplantes. Não houve associação entre PRAc e perda do enxerto entre receptores de transplante com doador vivo aparentado.

Uma revisão sistemática e meta-análise compilou dados de sete estudos retrospectivos. O transplante renal realizado na presença de anticorpos doador específico (DSAs) pré-formados (n = 429) com prova cruzada por citometria de fluxo (FCXM) negativa apresentou taxa de rejeição e sobrevida do paciente e do enxerto semelhantes em comparação com 10.677 transplantes DSA-negativos1414. Buttigieg J, Ali H, Sharma A, Halawa A. Positive Luminex and negative flow cytometry in kidney transplantation: a systematic review and meta-analysis. Nephrol Dial Transplant. 2019;34(11):1950–60. doi: http://dx.doi.org/10.1093/ndt/gfy349. PubMed PMID: 30508114.
https://doi.org/10.1093/ndt/gfy349...
. Uma prova cruzada citotóxica dependente de complemento positiva representa um elevado risco imunológico, enquanto uma FCXM negativa está na extremidade inferior do espectro de risco. Então, especialmente no caso de pacientes que estão na lista de espera há muito tempo, a presença de uma prova cruzada de fluxo negativo deve ser considerada, independentemente da presença de baixos níveis de DSAs. O transplante com incompatibilidade HLA, incluindo FCXM positiva dentro de um limite de alterações de canal, ainda oferece um benefício significativo de sobrevida1515. Neumann J, Montagner J, Schiavo T, Keitel E, Garcia V. OR45 Is it safe to transplant a kidney from deceased donors in the presence of DSAs But with a negative flow cross match? Hum Immunol. 2018;79:50. doi: http://dx.doi.org/10.1016/j.humimm.2018.07.050.
https://doi.org/10.1016/j.humimm.2018.07...
1717. Silva CK, Meinerz G, Bruno RM, et al. Late impact of preformed anti-HLA antibodies on kidney graft outcome. Transpl Immunol. 2019;55:101212. doi: http://dx.doi.org/10.1016/j.trim.2019.06.004. PubMed PMID: 31254612.
https://doi.org/10.1016/j.trim.2019.06.0...
.

A limitação deste estudo foi o acesso apenas a dados parciais do banco de dados do SNT. Não foi possível analisar outros fatores, como dados clínicos e a doença primária. No entanto, observou-se que os pacientes do sexo feminino foram mais sensibilizados do que os do sexo masculino, conforme esperado.

Conclusão

O transplante renal é a terapia renal substitutiva de melhor custo-benefício para a doença renal crônica. Entretanto, o número insuficiente de doadores e a presença de anticorpos anti-HLA atuam como barreiras ao acesso ao transplante. Nossos dados confirmam observações anteriores de que o tempo em lista de espera é bastante afetado pelo grau de sensibilização anti-HLA. Os receptores não sensibilizados apresentaram menor risco de óbito, mas o risco de perda do enxerto foi semelhante nos diferentes grupos de PRAc após o transplante. Este estudo enfatiza a necessidade de encontrar soluções para esse grupo de pacientes que é altamente prejudicado no que se refere ao acesso a um transplante.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    25 Set 2023
  • Data do Fascículo
    Jan-Mar 2024

Histórico

  • Recebido
    09 Maio 2022
  • Aceito
    07 Abr 2023
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