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Concorrência e mudança técnica: aportes e limites dos modelos neo-schumpeterianos evolucionários de dinâmica industrial

Competitiveness and technical change: allowances and limits of the neo-Schumpeterian models of industrial dynamics

Resumo

This paper makes a critical survey of some recent evolutionary economic literature dealing with industrial dynamics. Although the evolutionary models of industrial dynamics has explored the relationships among market structure and the innovation process within an analytical context that emphasize non-linearity, behavioral asymmetries and the existence of selective process in the competitive dynamics of markets, have been capable of offering compatible results with industrial organization stylized facts, a lot of limitations in technical change description pointed out have able to alter in a crucial way the results attained.

evolutionary approach; industrial dynamics; firm strategy


evolutionary approach; industrial dynamics; firm strategy

ARTIGOS

Concorrência e mudança técnica: aportes e limites dos modelos neo-schumpeterianos evolucionários de dinâmica industrial

Competitiveness and technical change: allowances and limits of the neo-Schumpeterian models of industrial dynamics

Sérgio Almeida de Sousa

Doutorando em economia da Universidade de Nothingham. E-mail: lexss12@nottingham.ac.uk

ABSTRACT

This paper makes a critical survey of some recent evolutionary economic literature dealing with industrial dynamics. Although the evolutionary models of industrial dynamics has explored the relationships among market structure and the innovation process within an analytical context that emphasize non-linearity, behavioral asymmetries and the existence of selective process in the competitive dynamics of markets, have been capable of offering compatible results with industrial organization stylized facts, a lot of limitations in technical change description pointed out have able to alter in a crucial way the results attained.

Key-words: evolutionary approach, industrial dynamics, firm strategy.

JEL Classification: B52; O31; L10

1. INTRODUÇÃO

É possível especular que a recente retomada do interesse pela questão da mudança técnica — com destaque para a recente difusão do enfoque neo-schumpeteriano evolucionário1 1 Refiro-me ao enfoque de "linhagem" neo-schumpeteriana — e não àquele mais próximo ao mainstream cujas incursões mais conhecidas são na área de teoria de jogos, embora já se registre algumas intervenções "evolucionárias" em economia industrial (cf. nota 3). em economia —, a despeito do ostracismo a que foi relegada até os anos 50, possui várias fontes. Entretanto, duas parecem se destacar: de um lado, o número crescente de estudos empíricos que, seguindo o estudo de Solow (1957) acerca das fontes de crescimento a partir de esquemas analíticos baseados nas premissas teóricas tipicamente ortodoxas (funções de produção agregadas com retorno constantes de escala e substituibilidade contínua entre fatores), apontam para a significativa magnitude do progresso técnico — o famoso resíduo de Solow — como fonte principal do crescimento econômico; de outro lado, o crescente reconhecimento das dificuldades da teoria econômica mainstream em analisar alguns fenômenos econômicos, em particular, processos de mudança tecnológica e diversidade de padrões de crescimento a longo prazo (Nelson e Winter, 1982, cap. 1 e 2; Possas, 1989; Dosi e Nelson, 1994, Higachi et al. 1999), a partir de uma abordagem centrada (1) no pressuposto da racionalidade maximizadora e (2) na eleição do equilíbrio como um pressuposto que, aprioristicamente, descreveria a trajetória resultante da interação intertemporal dos agentes econômicos. É do reconhecimento das dificuldades e restrições decorrentes do uso dessas noções que têm emergido esforços relativamente recentes, para compreender os processos de transformação produtiva e institucional que caracterizam a dinâmica econômica. Destaca-se entre tais esforços o enfoque evolucionário. Sua literatura está, em geral, centrada na análise da mudança tecnológica e nas assimetrias competitivas entre firmas associadas ao processo de concorrência.2 2 Os modelos tributários dessa corrente procuram explicitar a idéia de que a dinâmica competitiva nos mercados possui mecanismos intrínsecos — introdução de inovações, sua difusão via imitação e a existência de processos (por vezes imperfeito) de aprendizado — que operam uma pressão seletiva sobre um conjunto de firmas marcado pela diversidade (estratégica, de base técnica, de competências). Esses processos de seleção acabam provocando alterações ao longo do tempo nas características e na importância relativa das firmas no mercado. Assim, a seleção não apenas é responsável pela alteração do peso econômico ( market share) da firma na estrutura da indústria, ela também enviesa os padrões de organização e operação estratégica que nela se consolidam. Daí porque no enfoque evolucionário o desequilíbrio é uma possibilidade lógica e mesmo teoricamente importante, responsável pela emergência de processos e estados — redirecionamento estratégico e revisão de rotinas operacionais — que são relevantes para a dinâmica econômica e, portanto, para uma teoria econômica da mudança técnica (cf. Possas, 1989; Dosi e Nelson, 1994).

Entre os vários modelos evolucionários existentes, o de dinâmica industrial com progresso técnico proposto por Nelson e Winter (1982, cap. 12) foi o que mais se difundiu e forneceu insights importantes sobre a relação entre o processo de mudança tecnológica e a estrutura de mercado. Outra versão do modelo (Winter, 1984) explora novas fontes de mudança técnica (entrada de novas firmas) e introduz algumas mudanças com a finalidade de dar flexibilidade aos processos decisórios ligado às estratégias de P&D das firmas. A partir daí surgiram outros modelos de dinâmica industrial (Silverberg et al., 1988; Chiaromonte e Dosi, 1993; Possas et al., 2001) que, se por um lado — até por compartilharem das noções teóricas mais fundamentais ali presentes — reforçam e reutilizam a estrutura modelística original daqueles autores, por outro procuram remover suas simplificações mais evidentes e ampliar seu escopo de análise. A proeminência teórica desses modelos3 3 Há outros modelos de dinâmica industrial — e.g. Hopenhayn (1992) e Ericson e Pakes (1995) — que pretendem conciliar uma perspectiva "evolucionária" com uma abordagem equilibrista, no que acabam por compartilhar de hipóteses — expectativas racionais, maximização de lucro, firma representativa, etc — que os distanciam radicalmente dos modelos de natureza neo-schumpeteriana que serão tratados aqui. reside, essencialmente, em três aspectos: (1) a ruptura com os modelos de competição oligopolista tradicionais que têm nas estratégias de preço, ou nas estratégias de (controle) oferta, a dimensão exclusiva da concorrência; (2) a tentativa de ilustrar a complementaridade das características tecnológicas e comportamentais da firma em determinar sua competitividade — parâmetro seletivo que sintetiza uma combinação das características operacionais e técnicas das firmas (e/ou de seus produtos); (3) a ênfase nas implicações de a dinâmica da indústria poder estar condicionada, de modos diferentes, a características path-dependents ou inerciais das firmas.

O objetivo deste trabalho é fazer uma remontagem crítica dos principais modelos4 4 Longe de representar uma lista exaustiva dos modelos existentes, os modelos analisados foram escolhidos em razão de sua significância teórica. No caso do modelo desenvolvido por Nelson e Winter (doravante NW) isto está ligado, basicamente, ao pioneirismo na modelação (dinâmica) da concorrência com mudança técnica endógena e à influência que exerce sobre toda uma corrente de modelos de dinâmica industrial. No caso dos demais, essa significância teórica está mais ligada à contribuição que representam, seja na superação de características analíticas deficientes ou na ampliação do escopo de análise do modelo NW, seja na tentativa de utilizar referências teóricas (consistentes com o enfoque evolucionário) para além de Schumpeter que podem contribuir ao desafio presente de suprir as deficientes ligações entre os níveis micro e macro, em particular, dos modelos macroeconômicos evolucionários. dessa corrente identificando aportes e limitações analíticas desses modelos numa parte crucial — não apenas do ponto de vista teórico para a abordagem evolucionária, mas para os próprios resultados que os modelos podem obter — qual seja, a formalização do processo de busca tecnológica: procedimentos estratégicos que a firma utiliza visando inovar ou imitar tecnologias que possam dar origem a vantagens competitivas.

Além desta, o artigo contém mais quatro seções. Na seção seguinte (2) será feita uma descrição do esquema de modelagem evolucionário a partir do modelo NW, discutindo suas limitações e principais problemas internos; analogamente, na terceira seção serão discutidos os demais modelos evolucionários de dinâmica industrial que procuram ampliar o escopo das questões até então tratadas. Será feita, para cada modelo, uma breve descrição dos principais resultados obtidos através dos exercícios de simulação. Na quarta seção faremos considerações finais apontando algumas implicações teóricas dos problemas levantados.

2. O ESQUEMA DE MODELAGEM EVOLUCIONÁRIA: O MODELO NELSON-WINTER

O modelo apresentado em Nelson e Winter (1982, cap. 12) procura focalizar as relações de causalidade existentes entre a estrutura do mercado, os gastos em P&D e variáveis indicativas do desempenho da indústria — cujo produto é homogêneo, as técnicas se modificam quanto à produtividade do capital e o comportamento das firmas é baseado em diferentes tipos de rotinas (operacionais, tecnológicas, etc). É através da busca5 5 A centralidade desse procedimento deriva de sua importância na criação de assimetrias competitivas, resultantes do impacto diferenciado que o sucesso inovativo e/ou imitativo, traduzido em vantagens de custo ou outras, possui sobre o desempenho das firmas ao longo do tempo. tecnológica que as firmas, seja por imitação, seja por inovação, introduzem novas técnicas no intuito de manter ou obter melhor desempenho no processo competitivo.

O modelo está estruturado em três módulos. Em um módulo é descrito um processo econômico simplificado no qual o cálculo da produção da firma, da indústria, do preço, a estrutura de custos e os lucros líquidos são realizados.

Formalmente, eles podem ser descritos pelas seguintes equações:

(1) e (2) descrevem, respectivamente, a produção da i-ésima firma no período t e o volume total de produção da indústria no mesmo período, calculada por agregação do nível de produção (Qi,t) de cada uma das n firmas da indústria que, por sua vez, é determinada pelo produto do estoque de capital (tKi,t) pelo nível de produtividade (Ai,t).6 6 A tecnologia de produção tem coeficientes fixos de insumo (no que seguem uma função de produção do tipo Leontief), não havendo, portanto, substituição direta de trabalho por capital; como se trata de uma tecnologia complementar, o nível de produção máximo é determinado sempre pelo estoque de capital que cada firma dispõe, sendo os insumos complementares necessários para cada unidade de capital dos mesmos. Quanto ao preço e lucro da firma, temos que,

onde a equação (3) indica o preço P1 ao qual toda a produção da indústria é vendida, cuja determinação é dada pelas condições de demanda com a qual se depara a indústria, representadas pela função demanda, Y(.) (constante com elasticidade unitária) contínua e decrescente. A equação (4) descreve o lucro econômico da i-ésima firma por unidade de capital no período t, que nada mais é do que a receita total por unidade de capital subtraída do custo total de produção por unidade de capital (Ci,t / K), incluídos os gastos com atividade de P&D ().

As decisões de investimento especificam outro módulo do modelo. Interessa aqui apenas observar que a taxa de investimento da firma é limitada superiormente por uma restrição financeira, determinada exclusivamente por seu lucro líquido, e inferiormente por uma condição de não-negatividade, a saber, que os investimentos sejam, no mínimo, suficientes para reposição das máquinas depreciadas.

As equações abaixo (5-9) tratam, por sua vez, do módulo de busca tecnológica, parte do modelo que especifica os processos pelos quais as novas técnicas são "criadas" e como sua incorporação modifica a produtividade da firma e da indústria:

a atividade inovativa é modelada como um processo estocástico de dois estágios, que irá definir os níveis de produtividade alcançáveis pela atividade de P&D: no primeiro estágio, equações (5) e (6), são definidas as respectivas probabilidades de obtenção de sucesso inovativo e imitativo, tanto maiores quanto maior o respectivo gasto (imitativo ou inovativo) em P&D7 7 P(.) é uma medida de probabilidade; am e an são parâmetros setoriais indicadores do grau de oportunidade das firmas imitadoras e/ou inovadoras; d é uma variável binária do tipo Bernoulli com um parâmetro p de sucesso e (1- p) de fracasso, cujo subscrito mais à frente, n ou m, indica se se trata de inovação ou imitação, respectivamente. da firma, Gi,t.

Um sucesso imitativo ( = 1) automaticamente garante à firma incorporar ao seu estoque de capital a produtividade da melhor técnica utilizada na indústria. No caso da firma inovativa, o resultado do esforço de P&D segue-se a dois estágios estocásticos. Sucesso no primeiro (equação 5), isto é, dn = 1, garante acesso ao segundo estágio no qual a firma acessará uma tecnologia cuja produtividade não é conhecida previamente. O resultado segue um processo estocástico.8 8 Nesse sentido, há dupla incerteza nesse processo inovativo: por um lado, o comprometimento permanente das firmas com uma política de gastos em P&D não garante que um algum sucesso tecnológico será obtido; por outro, mesmo que a firma obtenha um sucesso inovativo, o resultado alcançável (o nível de produtividade) pode estar aquém do nível prevalecente de produtividade da firma. Assim, a produtividade a ser obtida, Fi,t, é uma variável aleatória que possui distribuição log normal (equação 7) cuja média, como especificado em (8), cresce a uma taxa exógena (v), onde P0 é a produtividade inicial. Tal taxa v dá a medida do ritmo de expansão da produtividade latente (Nelson e Winter, 1982 p. 283) — uma aproximação do ritmo de crescimento das oportunidades tecnológicas impulsionado pelos desenvolvimentos técnicos e científicos exógenos à indústria. A equação em (9) indica o processo de escolha tecnológica, no qual a firma decide a técnica a ser utilizada dentre o conjunto de técnicas alternativas às quais estão associadas diferentes níveis de produtividade.9 9 A produtividade da técnica "copiada" ( ), a produtividade obtida através do sucesso inovativo (F i,t), além da produtividade da técnica até então utilizada pela firma ( Ai (t-1)).

2.1. Resultados das simulações e aderência aos fatos estilizados

As simulações do modelo NW procuram avaliar o desempenho da indústria em seus diferentes tamanhos e sob diferentes regimes de crédito. Os principais resultados apontaram:

(1) A produtividade média da indústria mostrou-se positivamente relacionada com o grau de concentração da indústria, indicando que os custos médios de produção declinaram mais rapidamente nos casos em que a indústria era constituída de poucas firmas.

(2) Embora a produtividade das firmas inovadoras seja sempre superior à das imitadoras, essa superioridade é menor em uma estrutura mais competitiva (32 firmas) do que é observado numa indústria com oito firmas.

(3) Os custos de produção são maiores no caso em que a estrutura é mais competitiva, já que a produtividade média é relativamente menor que no caso de poucas firmas. Segue daí que o mark-up médio da indústria (razão preço-custo) é tanto menor quanto mais competitiva é a indústria. O resultado é compatível com o fato estilizado de que a concentração da indústria determina em grande medida o poder das firmas de arbitrar preços independentemente do preço médio praticado na indústria (ver Ravenscraft, 1983).

(4) O índice de Hirschman-Herfindahl (uma medida de concentração da produção na indústria) indicou que quanto maior o grau de rivalidade oligopolista do setor, maior é o número de firmas que declinam sua posição competitiva.10 10 O aumento da concentração envolve, então, um número crescente de firmas que não "acompanham" as demais firmas e perdem posição competitiva. Esse aspecto é compatível com o fato estilizado (Lei de Gibrat) de que a distribuição do tamanho das firmas na indústria tende a ser assimétrico, comportando um pequeno número de firmas grandes e um grande número de firmas pequenas (cf. Simon e Bonini, 1958).

2.2. Limitações e problemas internos

Em que pese a relevância do modelo NW, pelo pioneirismo na tentativa integrar analiticamente diferentes elementos,11 11 Grosso modo, (1) o papel das inovações ( lato sensu) como instrumento de competição e seus efeitos dinâmicos sobre a atividade econômica, indutores do processo de mudança estrutural salientado por Schumpeter; (2) o enfoque behaviorista da teoria da firma; (3) os estudos de Simon sobre racionalidade limitada e suas implicações sobre o comportamento decisório dos agentes; e (4) um aprofundamento da análise dos processos de "seleção natural", ainda que como metáfora. ele apresenta algumas deficiências e limitações — além daquelas já identificadas na literatura sobre o tema:12 12 Uma lista deles pode ser encontrada em Andersen (1996, cap. 4).

Primeiro, por supor que as firmas vendem toda a produção (as firmas operam sempre em plena capacidade), o modelo ignora as implicações intertemporais dos ajustamentos realizados no início de cada período de produção sobre as decisões de produção e investimento nos períodos subseqüentes, induzidos pela realização de um valor de vendas diferente dos valores esperados quando do cálculo de produção empreendido pela firma.

Segundo, a formalização do processo de inovação/imitação não captura o efeito da cumulatividade dos avanços tecnológicos, esvaziando a natureza path-dependent da atividade de busca tecnológica — uma importante propriedade da atividade de P&D e do próprio aprendizado tecnológico.13 13 Cf. Dosi (1984), Freeman (1994). Da forma como descrita por Nelson e Winter (1982, cap. 12), apenas a magnitude do gasto em P&D influencia as chances de sucesso inovativo e/ou imitativo de uma certa firma i; ou seja, se supusermos (para o caso inovativo — daí o subscrito n —, embora as considerações sejam válidas para o caso da firma que realiza P&D imitativo) por simplificação que , e ainda que nos restringíssemos apenas aos resultados mais recentes da busca inovativa (), fica valendo a igualdade abaixo:

o que claramente negligencia a influência da acumulação de conhecimento e da competência tecnológica da firma expressa no desempenho (sucessos e fracassos obtidos) passado de suas estratégias tecnológicas. Uma reformulação analítica desse aspecto implicaria ampliar os elementos que influenciam o processo de busca tecnológica de forma a produzir uma desigualdade estrita na equação acima, capturando assim os efeitos dos ganhos de aprendizado decorrentes da cumulatividade da atividade de busca tecnológica; isto é:

e mais geralmente

a formulação em (12) recorre implicitamente à idéia de que

onde é uma variável que indicaria a importância relativa do sucesso inovativo ( = 1) da firma i no momento t-m para o sucesso da busca inovativa no período t.

Quarto, são as limitações ligadas à especificação dos chamados "regimes tecnológicos", em específico, a exogeneidade da taxa de crescimento das oportunidades tecnológicas — taxa que, aliás, tem grande influência sobre o grau de concentração na indústria. Mesmo aceitando-se a justificativa de que isto é uma decorrência do tipo de regime tecnológico (science-based14 14 Cf. Nelson e Winter (1982, cap. 12 e 13). ) da indústria, que condiciona as relações existentes entre a atividade de P&D e o crescimento da produtividade, resta ainda o seguinte problema: o modelo elimina o processo de exploração das oportunidades tecnológicas ao assumir que a fronteira de produtividade da firma (com sucesso inovativo) se desloca seguindo os picos da produtividade "latente" (a fronteira tecnológica), sem que existam fases intermediárias — ou um tipo de ciclo no processo de exploração de oportunidades tecnológicas — que revelem o processo de transição tecnológica entre o nível de produtividade prevalecente da firma e aquele nocionalmente disponível pelas oportunidades tecnológicas que o progresso científico engendrou.15 15 A decorrência lógica é a transmissão da exogeneidade da fronteira da indústria (nocional) para a própria trajetória tecnológica da firma — contrariando claramente seu caráter firm-specific.

Nesse ponto fica evidente uma outra limitação do modelo NW: a inexistência de spillovers de P&D como fonte de conhecimento tecnológico, cujos efeitos permitiriam que firmas, por exemplo, se apropriassem (mesmo que parcialmente) dos possíveis aperfeiçoamentos tecnológicos realizados pela firma que detém a melhor técnica, para além do nível inato de produtividade original do equipamento.

3. AMPLIANDO O ESCOPO DO MODELO NELSON-WINTER E AS LIMITAÇÕES "HERDADAS"

3.1. Estratégias tecnológicas e conduta adaptativa: o modelo Winter

Uma das principais contribuições da extensão do modelo NW proposta por Winter (1984) — além de incorporar ao modelo a entrada de novas firmas e permitir a análise de diferentes regimes tecnológicos (fontes de inovação) —, foi a introdução de uma espécie de "aprendizado comportamental" por meio de mecanismos que, a depender do desempenho competitivo, modificam as estratégias de busca tecnológica das firmas. Além daquelas já observadas, uma outra limitação do modelo NW era a total rigidez da política tecnológica das firmas, que sempre investiam em P&D uma fração fixa de seu estoque de capital.16 16 É possível argumentar, em defesa desse procedimento, que a rigidez da estratégia de investimento em P&D é uma prática defensiva motivada pela incerteza dos resultados da atividade inovativa e refletiria mesmo a inércia das rotinas organizacionais. O problema é que a ausência de um mecanismo de adaptação decisória que seja sensível aos resultados efetivos obtidos pelas firmas não só viola o conteúdo processual da racionalidade17 17 Comportamentos racionais no sentido processual exigem, pelo menos, dois requisitos: (1) resultar de uma deliberação apropriada a partir dos meios que se julgam adequados; e (2) incorporar mecanismos que permitam uma "realimentação" contínua das decisões a partir dos resultados obtidos; cf. Simon (1987). empregada por elas, como também simplifica excessivamente o que seria uma aplicação modelística da noção de racionalidade limitada.

Na versão de Winter, os ajustes nas decisões de gasto em P&D seguem uma regra tipo satisficing: se a variável que indica o desempenho da firma Xi,t,(uma distribuição defasada do lucro) está abaixo do nível de aspiração considerado satisfatório para a firma — o lucro médio da indústria —, a firma fará modificações marginais em suas decisões de gasto em P&D; os ajustamentos "estratégicos" são desencadeados apenas nesse caso; formalmente: seja o seguinte evento (a performance da firma é menor que o retorno médio da indústria) e denominemos por (.) uma função indicadora do evento tal que (w)=1 se w Î e (w)=0 se w Î , onde w pode ser interpretado como o resultado da variável performance no período t. Definido os valores iniciais que indicam as estratégias de P&D das firmas e seu estoque de capital, fica também determinado os valores médios da indústria (ponderado pelo peso relativo do estoque de capital de cada firma) das estratégias de P&D por unidade de capital (); a revisão das estratégias de cada firma é feita segundo as seguintes regras:

para o P&D inovativo e, semelhantemente,

para P&D imitativo, onde b(0 < b < 1) é um parâmetro que indica quanto da regra média será "copiada" e é uma variável aleatória i.i.d. Ambas as regras indicam que se a performance da firma Xi,t estiver abaixo do seu nível de aspiração, isto é, se (w)=1, a firma ajusta sua política de gasto em P&D em direção aos valores médios da indústria, caso contrário, repete no período seguinte a mesma estratégia utilizada no período anterior.

Conquanto o mecanismo utilizado resolva o problema da rigidez18 18 E a implicação (i)lógica dali derivada de que o desempenho da firma (insatisfatório) não produz uma revisão das estratégias das firmas percebidas como mais diretamente ligadas ao seu desempenho competitivo. da política de P&D das firmas no modelo NW, não deixa de ser uma regra conservadora, já que apenas um mau desempenho é considerado um estímulo apropriado (triggering effects) para acionar um procedimento automático de revisão estratégica. É razoável que a regra produzisse ajustamentos mesmo quando o desempenho da firma está acima do "nível de aspiração", como forma de incorporar uma certa "agressividade" estratégica da firma em explorar suas vantagens competitivas sinalizadas por algum indicador de seu desempenho (e.g. a taxa de crescimento de sua participação de mercado).

Contudo, o fato é que os principais resultados das simulações não exploram as implicações do ajustamento nas decisões de gasto em P&D que o modelo introduziu. Focaram principalmente as diferenças de concentração na indústria e não em diferentes "regimes de inovação".19 19 Mais detalhes veja-se Winter (1984, p. 221-8). Os resultados obtidos não diferem, como se esperava, daqueles já obtidos pelo modelo básico apresentado em Nelson e Winter (1982, cap. 12).

3.2. Aprendizado e difusão tecnológica: o modelo Silverberg-Dosi-Orsenigo

Diferentemente das questões tratadas no modelo NW e mesmo em sua versão modificada, o modelo Silverber-Dosi-Orsenigo (doravante SDO) procura investigar os aspectos decisórios envolvidos no processo de difusão de novas tecnologias e a relação que a distribuição temporal das decisões de adoção da nova tecnologia pelas firmas tem com a posição competitiva (intertemporal) assumida e com o próprio ritmo de sua difusão na indústria — tudo isto em um ambiente evolucionário caracterizado por diversidade tecnológica e estratégica, incerteza forte, aprendizado e desequilíbrio dinâmico.20 20 No sentido de que não há como definir, prévia e independentemente das demais decisões dos agentes, uma configuração de equilíbrio que possa orientar as decisões dos agentes e torná-las mutuamente consistentes (com tal equilíbrio) em algum sentido dinamicamente estável.

Há pelo menos quatro aspectos das especificações analíticas do modelo SDO que se destacam, seja porque superaram limitações de especificações no modelo NW, seja porque exerceram ampla influência sobre os modelos evolucionários de dinâmica industrial posteriores, a saber:

1) o processo de formação de preços — agora mais próximo da tradição teórica que se baseia no princípio do custo total [cf. Hall e Hitch (1939)];

2) a utilização de um mecanismo de seleção que torna mais claro como o incremento da competitividade se traduz em crescimento da firma dentro da indústria;

3) a utilização de uma estrutura de safras na composição do estoque de capital;21 21 O que permite uma representação mais realista do progresso técnico do tipo incorporado ( embodied), uma vez que apenas parte do estoque de capital (os novos equipamentos adquiridos, seja para expandir a capacidade produtiva, seja para fazer reposição das máquinas obsoletas) terá sua produtividade modificada, e não todo o estoque, como no modelo NW. e

4) a introdução de mecanismos de aprendizado (e suas externalidades) que influenciam a eficiência produtiva da firma e as próprias decisões de mudança técnica.

Vejamos mais de perto tais aspectos. A indústria possui uma demanda (DT) que cresce a uma taxa exponencial, distribuída entre as firmas conforme o market share que cada uma detém: denotando por fi a parcela da demanda atendida pela firma i, por Ei sua competitividade e por a competitividade média da indústria, tem-se que

uma equação do tipo replicator que faz uma representação estilizada do processo de seleção, onde a "aptidão" da firma na competição de mercado é dada por um indicador de sua competitividade (Ei), representado por uma combinação linear do logaritmo do preço e do indicador de atraso de entrega,

onde ddi = é a razão entre os pedidos acumulados (L) e a produção corrente (y).

O preço praticado pelas firmas segue uma regra de ajustamento que combina, de um lado, a influência de seu planejamento estratégico, presente na aplicação de um mark-up sobre o custo, e de outro, a influência da posição competitiva da firma no setor, tal que:

o que seria um compromisso entre o preço estratégico da firma (pci) — determinado pelo mark-up desejado sobre seus custo unitário — se o preço prevalecente no mercado refletido em sua competitividade relativa (Ei - ) . pci é o produto.

Outros dois aspectos singulares do modelo, vis à vis o modelo NW (e a versão em Winter, 1984), são a natureza do processo de mudança tecnológica e a introdução de mecanismos de aprendizado que influenciam a eficiência da firma na utilização de certa tecnologia. As firmas não realizam gastos em P&D para — como um resultado estocástico — acessar níveis de produtividade relativamente superiores que, como naqueles modelos, são assimilados por todo o estoque de capital da firma: o progresso técnico é do tipo incorporado, introduzido através da aquisição de máquinas que pertencem a diferentes safras de uma certa trajetória tecnológica.22 22 Cf. Malerba e Orsenigo (1993). Assim, o estoque de capital da firma i(Ki,t) é uma medida agregada da capacidade produtiva que pode ser obtida com as diferentes safras de máquinas e equipamentos entre o período corrente t e sua data de "sucateamento"23 23 As decisões de "sucateamento" dos equipamentos — Quando um equipamento deve ser reposto por obsolescência tecnológica? — seguem uma regra de payback; mais detalhes cf. Silverberg et al. (1988, p. 1038). A regra de payback period permite ao modelo captar uma importante característica de ambientes inovativos: tanto maior é o ritmo inovativo na indústria, maior é a "pressão" sobre a firma para que "inutilize" parte do seu estoque de capital antes que sua vida potencial tenha sido atingida. (Ti):

onde Ii (t) é o investimento bruto em t'.

O modelo assume que há duas tecnologias (I e II), a cada qual está associada uma trajetória tecnológica que indica a produtividade máxima potencial que pode ser obtida pelos equipamentos de cada safra. Os produtores sabem que a tecnologia II é potencialmente mais produtiva24 24 E inicialmente seu preço, por unidade de capacidade produtiva, é também mais elevado do que a tecnologia I, embora decresça 1% a cada período. (100%), mas a efetiva obtenção desses ganhos potenciais depende dos níveis de habilidade e experiência (skills) específicos à firma (si) na exploração da tecnologia. Ao migrarem para uma nova tecnologia, a produtividade que a firma utiliza efetivamente é apenas um percentual (0 < si < 1) da produtividade "inata"25 25 Inicialmente, todas as firmas no modelo utilizam a tecnologia I e a tecnologia II torna-se disponível apenas no período t* quando a eficiência na utilização da tecnologia II já terá "saturado" ( Si = 1) (Silverberg et al., 1988, p. 1041). do novo equipamento.26 26 Essa é a razão pela qual as decisões de investimento em uma tecnologia encerrem elementos expectacionais envolvidos em incerteza, seja quanto ao grau de apropriabilidade dos ganhos obtidos, seja quanto aos níveis alcançáveis de eficiência na utilização de uma nova tecnologia apenas potencialmente superior. E é aqui onde entra a influência do aprendizado. É aqui onde entra a influência do aprendizado.

É o aprofundamento da "fase de exploração" de certa tecnologia que permite à firma extrair todo o seu potencial produtivo. À medida que cresce a produção acumulada (CPi) da firma utilizando tal tecnologia, cresce também sua eficiência na apropriação do potencial produtivo incorporado à tecnologia em questão. Assim, sendo Pi a produção corrente da firma utilizando tal tecnologia (II, digamos) e C uma constante proporcional ao estoque de capital, a variação no tempo da "habilidade" da firma na utilização de tal técnica é dada por,

Mas esse processo de aprendizado interno gera externalidades positivas para as firmas concorrentes, mesmo que no momento não estejam utilizando tal tecnologia (retomaremos esse ponto adiante). Isso porque os ganhos de eficiência que a firma adquire à medida que explora sua "curva de aprendizado" também aumentam (com alguma defasagem) o conhecimento de domínio público27 27 Mesmo as firmas que, no momento, não estão utilizando tal tecnologia, quando o fizerem, será com a "eficiência" dada por sp, isto é, a qualquer período min{ si} = sp(" = 1,2,...n). Observe-se que essa variável dá alguma medida (inversa) dos níveis de apropriabilidade das oportunidades de lucro associadas à adoção "pioneira" de certa tecnologia potencialmente mais produtiva do que a tecnologia utilizada. , public skills (Sp), na utilização daquela tecnologia, tal que:

Assim, o período "ótimo" de adoção de uma tecnologia superior difere entre as firmas porque ponderam distintamente dois elementos expectacionais dessa decisão: de um lado, o custo que a firma incorrerá para alcançar os níveis máximos de eficiência produtiva da tecnologia II — os gastos associados à aquisição de experiência e aperfeiçoamento tecnológico —, que é tanto maior quanto mais rapidamente o produtor decide adotar a tecnologia; de outro lado, as vantagens competitivas que o pioneirismo na utilização de uma inovação podem render (e.g. aumento da participação de mercado), o que pressionaria a firma a acelerar uma "conversão" tecnológica de seu estoque de capital. Assim, as estratégias escolhidas acabam por depender, em grande medida, do grau de apropriabilidade dos ganhos de produtividade na utilização da nova tecnologia, ou seja, dos níveis de spillover da experiência e conhecimento tecnológico da firma para suas rivais.

3.2.1. Resultados das simulações

Os principais resultados dos exercícios de simulação destacam que:

(1) As duas medidas de difusão mostraram resultados semelhantes, compatíveis com fatos estilizados na literatura sobre difusão tecnológica (Cf. Jovanovic e Lach, 1989; Gort e Klepper, 1982): a trajetória intertemporal do percentual dos adotantes potenciais da indústria que já utilizam alguma quantidade da nova tecnologia possui um padrão familiar, exibindo um formato muito próximo da clássica curva de difusão "epidêmica", em forma de "S".28 28 A evolução do percentual da capacidade produtiva das firmas realizada com a nova tecnologia, que permite observar o tempo transcorrido para a conversão total da capacidade produtiva da indústria, também mostra uma trajetória em forma de "S".

(2) Firmas que decidem adotar com algum atraso a nova tecnologia (estratégia "fast second") terminam por aumentar sua participação no mercado. Seja porque se beneficiaram dos equívocos das primeiras firmas a adotarem, seja porque não incorreram nos custos de desenvolvimento e aperfeiçoamento comumente associados à adoção de novas tecnologias (efeitos de lock in).29 29 Cf. Arthur, B. (1989).

(3) Alterações do nível de capacitação e aprendizado da firma não produzem alterações na distribuição no tempo das decisões de adoção das firmas, alterando apenas o market share de cada firma (pela aceleração que produz na internalização dos ganhos de aprendizado e suas conseqüências imediatas sobre o nível de produção da firma).

(4) A realização de todo o potencial produtivo da inovação depende das externalidades de aprendizado: baixos valores tornam mais atrativa uma estratégia second-in, mas elas são possíveis apenas porque existe alguma firma que é pioneira na adoção.

(5) Mesmo com micro-heterogeneidade e desequilíbrio como características permanentes do sistema, observou-se nas simulações uma estrutura estável e invariante dos processos de difusão (a curva em "S").

3.2.2. O problema do beneficiamento simétrico e da apropriabilidade dos ganhos de aprendizado

Há dois aspectos problemáticos no modelo, ambos ligados à apropriabilidade e difusão das externalidades (spillovers). Primeiro, dado que as assimetrias tecnológicas condicionam o grau de eficiência da firma na internalização do nível "público" de habilidade na utilização de certa tecnologia, não faz sentido que as firmas se beneficiem igualmente das externalidades de aprendizado.30 30 O argumento é simples: se a capacidade de absorção de externalidades envolvendo oportunidades inovativas (radicais ou incrementais) depende da capacitação prévia, da estrutura de P&D (como fonte formal de aprendizado) e dos níveis de educação formal de recursos humanos que a firma dispõe é razoável que os benefícios apropriados a partir do aprendizado das demais firmas, seja via atividade de P&D, seja por meio da atividade produtiva, sejam específicos a cada firma. Como decorrência lógica das capacitações heterogêneas, devem ser também distribuídos assimetricamente.

Segundo, é questionável que os incrementos de produtividade associados ao fenômeno da aprendizagem31 31 Mas não os incrementos de produtividade ligados ao aperfeiçoamento do equipamento (que são de natureza técnico-física, e não cognitiva, ligados à automatização de tarefas), sem que isso seja considerado um tipo de inovação. no manuseio e operação de certo equipamento/tecnologia (na verdade, um fenômeno de aprimoramento cognitivo e mecânico decorrente da repetição), possam "vazar" (leak out) por meio de publicações, instruções operacionais ou mesmo por mobilidade entre firmas de mão-de-obra especializada (Silverberg et al.,1988; p. 1041), que, em tese, transferiria consigo sua experiência.32 32 O que seria verdadeiro apenas nos casos em que as firmas operam equipamentos idênticos; mas isso não é uma condição suficiente; é possível que certo tipo de experiência na operação prática de equipamentos seja funcional apenas conjuntamente, ou dentro de certos arranjos organizacionais, de forma articulada, donde segue que membros desse conjunto tomados isoladamente não são capazes de reproduzir ou mesmo transferir os benefícios desse esquema operacional. Não que esses não sejam instrumentos comuns de propagação de conhecimento técnico e científico, o problema aqui estaria nos supostos benefícios que uma firma (que ainda não está operando com certa tecnologia) faria do aprendizado por experiência (learning by doing) oriundo das firmas rivais, cuja capacidade produtiva já opera, pelo menos em parte, com tal tecnologia, já que, por definição, tais benefícios são resultantes da intensidade e duração de uma atividade específica.33 33 Em termos cognitivos, a experiência acumulada através da repetição de certa tarefa permite que um processo (inicialmente) controlado — tarefas realizadas de forma relativamente lenta, de natureza seqüencial, exigindo esforço e sob controle consciente — se converta em um processo automatizado, passando a exigir níveis relativamente baixos de processamento cognitivo e atenção. Sobre os efeitos da prática sobre a automatização, os psicólogos formularam o que se chama de "curva de aceleração negativa", que evidencia o efeito positivo, embora decrescente, da prática sobre a automatização de certa tarefa (Sternberg, 1996, caps. 3 e 4) — , ou seja, a taxa de aprendizagem decresce monotonamente à medida que aumenta a experiência. Mesmo tarefas complexas — que exigem esforço consciente intenso — podem ser relativamente automatizadas. Sobre o processo de automatização de tarefas, cf. Logan (1988). O que sustenta-se, em oposição à formulação dos autores, é que os ganhos de produtividade resultantes do aprendizado tipo by doing são completamente apropriáveis pelas firmas; para tanto, basta reconhecer que a natureza dos ganhos de produtividade associados ao aprendizado do tipo by doing, produto da eficiência e agilidade com que a firma opera seu processo produtivo e crescentes à proporção que a firma faz "mais do que já está fazendo", torna impraticável e, até por definição, inconsistente a apropriação, mesmo que parcial, desses benefícios por firmas que não operam tal tecnologia. Nesse sentido, curvas de aprendizagem (ou learning by doing) são fenômenos da rotinização de tarefas dentro do processo produtivo sob uma certa configuração organizacional e técnica, ou seja, são efeitos da prática, e embora seu resultado seja o aumento da produção por unidade de tempo ou homem-hora, é de natureza distinta (porque é "quase" involuntário) do aperfeiçoamento técnico das máquinas e equipamentos, que requer esforço intencional, conhecimento especializado e envolve tarefas complexas e não necessariamente conhecidas nem muito menos rotinizáveis.

3.3. Mudança de paradigma tecnológico e dinâmica micro-macroeconômica: o modelo Chiaromonte-Dosi

Em Chiaromonte e Dosi (1993) os autores utilizam uma estrutura bissetorial para analisar as implicações macroeconômicas intertemporais — particularmente, sobre renda e produtividade média — provocadas pelos ajustes intersetoriais de preço e demanda induzidos pelos processos de geração/difusão de inovações.34 34 A vantagem frente aos modelos unissetoriais é óbvia: permite não só uma idéia mais clara de como eventos ao nível micro podem, pelos impulsos cumulativos que provocam, influenciar resultados ao nível macro, mas, também, uma representação mais clara dos processos de geração e difusão de inovações. O modelo é explicitamente uma tentativa de integração de elementos do modelo NW — cuja influência direta fica restrita à formalização do processo inovativo — com o modelo SDO; mas o resultado analítico, em pelo menos dois aspectos, supera ou desenvolve aqueles: primeiro, na formalização do processo de mudança tecnológica, porque fornece uma contrapartida analítica que permite compatibilizar a exploração progressiva de trajetórias tecnológicas e a ocorrência de mudanças de paradigmas tecnológicos.35 35 Ver Dosi (1984, 1988). Segundo, porque o modelo possui uma importante característica Keynesiana ausente dos modelos anteriores:36 36 No modelo NW era suposto implicitamente que as firmas vendiam tudo que produziam — e operavam sempre a plena capacidade produtiva. No modelo SDO, também não há qualquer influência direta das condições de demanda sobre as decisões de produção: o nível de produção é ajustado apenas para compensar desvios entre o atraso de entrega da firma e o nível "padrão" dessa mesma variável para a indústria. Mesmo as decisões de ampliação da capacidade produtiva são determinadas por uma taxa exógena. a idéia de que são as decisões de produção e de investimento, condicionadas pelas expectativas acerca da demanda, que determinam o nível de emprego agregado da economia (ou do setor). De ambas, interessa detalhar a primeira para analisar em que medida a formalização do processo de busca tecnológica reproduz limitações do modelo NW.

3.3.1. Inovação incremental e radical: a "mudança" de paradigma tecnológico

A fonte de progresso técnico no modelo é a inovação cuja geração é restrita às firmas do setor 1 (produtor de máquinas e equipamentos heterogêneos). A atividade inovativa é descrita como um processo probabilístico à la Nelson-Winter, com a diferença de que a busca inovativa ocorre em um espaço bidimensional.37 37 Já que as firmas no setor 1 inovam para desenvolver novos tipos de máquinas mais eficientes para o setor 2 (incremental) e para encontrar técnicas mais eficientes de produzir tais máquinas (radical). As oportunidades de inovação das firmas do setor 2 (produtor de bens de consumo homogêneos) são do tipo incorporada: reduzem-se à aquisição das máquinas, produzidas pelo setor 1, que possuem maior capacidade produtiva por unidade de trabalho. A estrutura analítica do setor 2 praticamente reproduz as mesmas equações do modelo SDO, exceto por ter sido introduzido, em ambos os setores, a influência do lado da demanda nas decisões de produção das firmas.

As máquinas produzidas (x) possuem duas propriedades técnicas: a produtividade por unidade de trabalho da técnica utilizada na produção de bens finais A1, e a produtividade por unidade de trabalho da técnica utilizada para produzir máquinas A2; ou seja,

o que permite uma distinção, ainda que simplificada, entre mudanças ao longo de uma trajetória tecnológica (dentro de um certo paradigma) e mudanças do próprio paradigma: a primeira, para um dado A2 = (Î N), seria representada por incrementos em A1; a segunda, por envolver modificações substanciais na organização produtiva e na competência tecnológica da firma, seria representada por mudanças em A1 e A2.

As "oportunidades nocionais" são representadas por um conjunto T(.) de potenciais paradigmas tecnológicos — na verdade, uma coleção de valores para A2 —, além dos já utilizados, que podem ser descobertos pelas firmas do setor 1. A ampliação desse conjunto de oportunidades é representado por um processo estocástico de dois estágios que depende do crescimento da renda (Ym)38 38 Ym ( t) é uma média móvel da renda agregada até o período t — o que pode ser visto como uma proxy do desenvolvimento econômico e científico. A idéia incorporada no modelo é que padrões sustentados de crescimento da renda tornam mais prováveis os desenvolvimentos de possibilidades tecnológicas superiores potencialmente utilizáveis. e de um parâmetro r:39 39 É um parâmetro que procura representar o estado das oportunidades científicas (Chiaromonte e Dosi, 1993 p. 118), amplificando, ou não, o efeito do crescimento da renda sobre a probabilidade de sucesso nesse estágio.

onde AT ~ B(1,p)— ou seja, AT é uma V.A. com distribuição de Bernoulli que representa o evento acessar (AT(.)=1), ou não (AT(.)=0), a criação de um novo "paradigma" em um dado período, com parâmetro de sucesso p. O sucesso nesse primeiro estágio resulta na adição de uma nova "tipologia" (um valor para A2) ao conjunto T — uma variável aleatória com distribuição uniforme no intervalo discreto limitado inferiormente por m e superiormente por n. Assim, se AT(t)=1, então

tal que m = (t - 1) e n = (1 + h)(t - 1)40 40 Onde h é uma taxa exógena à qual se desloca a "fronteira" potencial do conjunto de oportunidades inovativas, representando, grosso modo, a eficiência da economia em traduzir a exploração das oportunidades científicas em "padrões" tecnológicos superiores aos padrões atualmente explorados — do ponto de vista produtivo. , onde = max(T(t - 1)).

As firmas exploram esse conjunto de oportunidades tecnológicas por meio de seu investimento em P&D inovativo.41 41 Que para um dado salário determina o número de trabalhadores no "departamento" de P&D. Aqui, a inspiração no trabalho de Nelson-Winter (1982, cap. 12) é evidente: a possibilidade de, em um momento t, gerar uma máquina() cuja técnica incorporada pertence a um novo paradigma tecnológico também obedece a um processo estocástico de dois estágios, estando o acesso ao segundo estágio condicionado ao sucesso no primeiro (AGi(t)=1), onde

de modo que se a firma obtiver um sucesso nesse estágio poderá, então, "processar" máquinas cujas propriedades técnicas — os valores de A1 e A2 — são resultados aleatórios obtidos de uma distribuição de probabilidades uniforme com suporte definido pelo conjunto de pontos ( = (A1,A2))que possuem segunda coordenada

e primeira coordenada extraída do ponto máximo definido em

onde a=(1/l).((xi(t))/Ai(t)));

note que indica o grau de "esgotamento" — para uma certa máquina xi com valor fixo de A2— da trajetória tecnológica (do "paradigma") à qual a máquina pertence e l é um parâmetro que regula a produtividade máxima "potencial" da máquina para produzir bens finais, resultante da inovação incremental. Essa operacionalização do processo inovativo possui duas implicações importantes: primeiro, que as trajetórias percorridas pelas firmas do setor 1 são condicionadas por um elemento específico à firma — seu esforço de P&D — e um elemento "sistêmico" — o ritmo de crescimento da economia, que amplia o conjunto de "oportunidades nocionais" (valores de A2); segundo, que à medida que a firma faz avanços ao longo de uma trajetória (maiores valores de A1), ocorre uma expansão proporcional no conjunto de técnicas que representam outros "paradigmas" tecnológicos.

Quanto aos resultados alcançáveis pelas firmas que fazem P&D imitativo, a formulação é semelhante àquela presente no modelo NW, com a diferença43 43 Essa idéia de que a capacitação tecnológica da firma limita seu espaço de busca e que o processo imitativo é facilitado pelo grau de difusão de uma técnica, já estava, ainda que de forma mais simplificada, presente no modelo de crescimento — mas não no de competição "schumpeteriana" — introduzido no capítulo 9. Cf. Nelson e Winter (1982, p. 211). de que o sucesso imitativo (primeiro estágio) não garante à firma acessar, automaticamente, a melhor técnica disponível na indústria: é introduzido um novo estágio (estocástico) que condiciona o resultado — a máquina a ser copiada — à (1) uma medida de "distanciamento" tecnológico entre a técnica que a firma domina (xi) e àquelas que pertencem ao conjunto z de técnicas potencialmente copiáveis44 44 O conjunto de técnicas potencialmente copiáveis para a firma i no momento t, Zi( t), é representado pelo conjunto de máquinas/técnicas conhecidas (não necessariamente utilizadas na produção) dos agentes no setor 1, X( t), exclusive as técnicas já conhecidas pela própria firma i. Formalmente : (D(z,xi)), e ao (2) grau de difusão entre os produtores do setor 1 dessas técnicas, expresso pelo percentual de produtores que, no momento t, conhecem as máquinas que pertencem a tal conjunto (g(z,t)). Se a busca imitativa for bem sucedida, a máquina copiada que será incorporada () é definida como uma variável aleatória com uma medida de probabilidade dada por

Essa formalização pretende traduzir a idéia — com uma fundamentação mais lógica do que empírica — de que é mais fácil copiar as máquinas que possuem maior proximidade "tecnológica" com as técnicas já conhecidas pela firma.

3.3.2. Resultados das simulações e aderência aos fatos estilizados

A modelagem Chiaromonte-Dosi procurou ser compatível com alguns fatos estilizados microeconômicos (cf. Chiaromonte e Dosi, 1993, p. 41). Em que pese o número diminuto de possibilidades paramétricas testadas pelo modelo, a análise feita através de simulações destaca três resultados:

(1) as inovações afetam a dinâmica das variáveis agregadas através de dois processos co-relacionados: o tempo consumido para difusão entre produtores e usuários do setor de bens finais e os estímulos sobre a demanda gerados pela inovação e difusão;

(2) as variações nos níveis de apropriabilidade acima de certos patamares possuem efeitos ambíguos: se por um lado beneficiam o desempenho da lucratividade das firmas inovadoras, por outro tornam mais lento o processo de difusão tecnológica e afetam negativamente o crescimento da renda e da produtividade média;

(3) assumindo agentes idênticos houve muito pouco progresso técnico e a renda agregada de longo prazo decresceu.45 45 As simulações mostram também um efeito lock-in: os ganhos de produtividade associados ao desenvolvimento da competência tecnológica (via aprendizado) da firma operando certo tipo de máquina impede que as firmas possam descobrir, explorar e desenvolver um número elevado de paradigmas tecnológicos, embora o conjunto de potenciais paradigmas esteja permanentemente se expandindo.

3.3.3. Limitações e problemas internos ao modelo Chiaromonte-Dosi

As limitações do modelo Chiaromonte-Dosi derivam essencialmente de uma especificação analítica que ignora características importantes do comportamento competitivo das firmas ou do processo inovativo; resumidamente:

(1) há rigidez nas estratégias tecnológicas das firmas — os parâmetros que definem os gastos em cada tipo de P&D —, o que implica uma irrealista ausência de retroalimentação entre o desempenho (lucrativo ou participação no mercado) da firma e suas principais decisões de investimentos em P&D, característica claramente "herdada" do modelo NW;

(2) o modelo deixa de explorar os efeitos dinâmicos sobre o desempenho da renda agregada, e mesmo sobre o mercado de trabalho, de padrões de crescimento permanentemente diferentes entre os setores — ou mesmo de explicitar os efeitos de uma inovação com viés "poupador" de trabalho sobre a demanda de bens de consumo;46 46 No entanto, o modelo não especifica qualquer tipo de dependência entre a demanda do setor de bens finais (para onde se dirige os gastos dos trabalhadores) e a massa salarial paga em ambos os setores. Por isso, não explora o efeito de uma redução do emprego (causado, e.g., por progresso técnico com viés "poupador" de trabalho) sobre o nível de produção das firmas do setor 2 e, por extensão, sobre o nível de produção do setor de máquinas e equipamentos (em ambos os casos, via demanda): esse processo, claramente retroalimentado de forma seqüencial, tenderia a reforçar permanentemente ( ceteris paribus) a redução do nível de emprego e o rebaixamento das expectativas de demanda em ambos os setores. Duas implicações óbvias e conexas poderiam ser observadas: primeiro, que o salário é, antes de tudo, um componente de demanda; segundo, que o progresso técnico, em geral, pode envolver (dependendo de seu "viés", que em geral é "poupador" de trabalho) permanente realocação da força de trabalho entre setores — não necessariamente garantindo o mesmo nível de ocupação anterior.

(3) a capacidade inovativa da firma a cada período, expressa pela probabilidade de acessar um conjunto de máquinas que pertencem a outro paradigma tecnológico (potencialmente superior), não exibe qualquer tipo de cumulatividade (veja equação 24), além do que está em flagrante oposição com indicações presentes em outros textos de um dos autores:47 47 Cf., por exemplo, Dosi (1984, 1988). eliminando a influência dos gastos realizados em P&D ou mesmo de outra medida de desempenho histórico que sirva como proxy da eficiência com que a firma historicamente utiliza tais recursos, a formulação fica logicamente fragilizada ao permitir a equalização de firmas que possuem diferentes níveis de "competência" tecnológica;48 48 Um exemplo ilustrativo: suponha duas firmas, A e B, operando no mercado há k períodos e que em um certo período t > k possuem gastos equivalentes em P&D — conquanto possuam "históricos" inovativos diferentes: ainda assim, a capacidade inovativa de A e B — a probabilidade de ter um sucesso inovativo — seriam equivalentes pela formulação utilizada, o que é flagrantemente irrealista. Esse problema ficaria mais evidente caso se comparasse firmas que já operam no mercado — já possuem experiência em P&D — com firmas que entraram recentemente no mercado.

3.4. Demanda efetiva e ajustamento intertemporal de mark-up : o modelo Possas-Koblitz

O principal propósito do modelo Possas-Koblitz49 49 Muito embora as referências feitas ao modelo remetam ao paper publicado por Possas et al. (2001), o modelo foi originalmente desenvolvido principalmente por Possas e Koblitz, daí porque PK [cf. também Possas e Koblitz (2001)]. (doravante PK) é fundir características de dois de seus antecedentes diretos: o tratamento do processo de mudança tecnológica presente no modelo NW e o efeito do aprendizado do tipo by doing, presente no modelo SDO, adicionando alguns elementos de inspiração kaleckiana e keynesiana.

Analiticamente, a principal contribuição do modelo PK é o aprofundamento dos mecanismos de retroalimentação nesse tipo de modelo, conferindo maior adaptabilidade da firma às condições de mercado. Diferentemente de seus antecedentes, nesse modelo existe um mecanismo de ajustamento dinâmico do mark-up desejado da firma (logo, dos preços) que, ao permitir uma interação contínua entre desempenho e estratégia, torna a formulação estratégica das firmas mais sensível ao ritmo do processo seletivo na indústria. A idéia é que a estratégia de preço permita à firma explorar oportunidades de lucro derivadas das vantagens de custo, ao mesmo tempo em que exiba adaptabilidade em razão do grau de rivalidade existente no mercado. Como indicam Possas, Koblitz et al. (2001, p. 368), "a regra, muito simples, aqui adotada para esses ajustes é igualar o mark-up desejado () de cada período de investimento ao mark-up efetivo médio do último período [de investimento]". Formalmente, para um período de investimento de tamanho arbitrário m, teríamos então que:

onde Tt indica o período de investimento (composto de m períodos de produção) e m indica a duração de um período de investimento — no modelo suposto igual a quatro períodos de produção).

Teoricamente, ele se diferencia dos modelos anteriores por incorporar referenciais teóricos praticamente ausentes, talvez pela maior vinculação que possuem com temas macroeconômicos, do conjunto de modelos evolucionários tributários do modelo Nelson-Winter. De Keynes incorpora o princípio da demanda efetiva ao estabelecer o modo como as decisões de produção corrente e, portanto, as decisões de gasto50 50 Mas não só; a presença de uma variável (nível desejado de recursos líquidos) que representa uma espécie de demanda precaucional por moeda para fazer frente a ocorrências não esperadas — erros de previsão de demanda, flutuações inesperadas de taxa de juro — também reflete a influência keynesiana no modelo. são influenciadas pela demanda prevista, calculada por meio de uma regra extrapolativa51 51 São passíveis de discussão a razoabilidade desse tipo de expectativa e o tipo de regra que ele implica como aproximação dos procedimentos reais dominantes utilizados pelas firmas, em uma economia descentralizada e interdependente, para realizar cálculos preditivos. Talvez a simples extensão do horizonte temporal que serve de referência para o cálculo projetivo — de forma a torná-lo sensível a sazonalidades nos padrões de comportamento, no caso, das vendas — fosse suficiente para reduzir o grau aparente de miopia da regra. Por outro lado, se de fato esse padrão expectacional é pouco representativo daquele utilizado pelas firmas, é preciso saber se, teoricamente, a regra extrapolativa utilizada é responsável, mesmo que indiretamente, por uma amplificação artificial dos desequilíbrios "normais" (sob um padrão expectacional não-míope, mas nem por isso "racional" no sentido de Lucas) da dinâmica competitiva de uma indústria — pelo pessimismo (ou otimismo) que incorpora. Em todo o caso, é razoável acreditar que eventos como um "excesso" (ou "insuficiência") recente de encomendas devem exibir algum grau de persistência antes de induzirem as firmas a modificarem suas estratégias; o que, aliás, parece compatível com sugestões do próprio Keynes. A questão se reduz, ao que parece, ao saber se tomar em conta os resultados observados, por exemplo, no mesmo período do ano anterior, remete a um passado longo o suficiente para que seja rejeitada sua influência sobre as expectativas a curto prazo. baseada nas encomendas efetivadas nos períodos passados mais recentes. A formação de preços segue de perto a formulação kaleckiana de preços para firmas sob condições de concorrência monopolística: o preço da firma é o resultado de uma ponderação envolvendo, de um lado, o nível de preço que satisfaz as estratégias de longo prazo da firma () e, de outro, o nível de preço (médio, ) que reflete as condições competitivas vigentes. Se não, vejamos: como a dinâmica dos preços no modelo PK é descrita por

e sabendo que a razão entre a competitividade da firma e a competitividade média no setor () é idêntica (ignorando o atraso de entrega) à razão entre preço médio e preço da firma, isto é,

é possível reescrever a equação (30) – e torná-la mais próxima à formulação de Kalecki — para obter uma equação de preços que torna claro o que foi dito:52 52 Tornando clara também a influência das firmas com maior market share sobre a determinação do preço médio na indústria.

que, dividida, em ambos os lados, pelo custo unitário ui,t , resulta na equação de mark-up da firma para uma firma i qualquer:

que mostra como o progresso técnico, no que afeta de forma diferenciada os custos variáveis de produção e, portanto, permite diferentes estratégias de preços,53 53 Os ajustes que a firma realiza em seu mark-up desejado em razão da redução de custos provocado pela incorporação de uma técnica mais produtiva podem determinar em que medida sua competitividade será alterada e, portanto, a variação que pode ocorrer em seu market share. pode alterar o poder de mercado da firma, pelo reordenamento no padrão de alocação dos gastos dos agentes entre os produtos das diferentes firmas.54 54 Ainda que no modelo PK esse processo de mercado apareça apenas implicitamente. O aumento da participação de mercado das firmas que aumentam sua competitividade relativa — em razão, indiretamente, de um sucesso inovativo — apenas ratifica a migração para estas firmas, em função de preços mais atrativos, de parte dos consumidores "fiéis" a outras firmas naquela indústria.

Os primeiros resultados das simulações desse modelo destacaram que:

(1) a introdução de aprendizado garante sobrevivência e melhor desempenho relativo às firmas imitadoras;

(2) a taxa de juros está correlacionada negativamente com o desempenho competitivo das firmas inovativas. Aumento do serviço da dívida dessas firmas compromete recursos financeiros para financiar as decisões de investimento;

(3) conforme alguns fatos estilizados sobre mudança tecnológica (cf. Silverberg e Verspagen, 2003), as simulações mostraram que o aumento na taxa exógena de deslocamento da fronteira tecnológica acelera concentração na indústria.

3.4.1. Busca tecnológica, expectativas de vendas e financiamento da modernização tecnológica: problemas internos do modelo PK e algumas reformulações

Limitaremos-nos55 55 Já que a geração de inovação e imitação no modelo PK segue a mesma formulação presente no modelo NW, compartilhando, nesses aspectos, das suas mesmas limitações, de resto já comentadas. agora a examinar aspectos teóricos problemáticos do modelo, que não foram herdados de seus antecessores teóricos, ligados ao financiamento do investimento em modernização tecnológica.56 56 Sobre as limitações ligadas à formação de expectativas cf. Almeida (2004, cap. 2).

Passemos agora ao problema da hierarquia alocativa dos recursos financeiros no modelo. Observando a regra de decisão para investimento em reposição por obsolescência tecnológica ("modernização"), e, dentro do módulo de busca tecnológica, a determinação da "fronteira" tecnológica (potencial) da i-ésima firma57 57 — a produtividade da melhor técnica disponível —, que nada mais é que a opção de maior valor dentre as possibilidades de escolha existentes: ; onde as duas últimas possibilidades representam os resultados obtidos quando de um sucesso inovativo e imitativo, respectivamente. , constata-se o seguinte: mesmo que a firma tenha obtido um sucesso inovativo em um certo período t, a incorporação do equipamento mais produtivo ao seu estoque de capital fica completamente condicionada à existência de recursos financeiros depois de realizado o investimento (bruto) desejado em capital fixo () — que corresponde às necessidades previstas de ampliação de capacidade, e às aquisições para fins de reposição de equipamentos por depreciação física, , como indica a equação de determinação do investimento do modelo a seguir:

pk,t onde é o preço dos bens de capital (que pertencem à k-ésima safra) adquiridos no período t.

Todavia, é razoável admitir que pelo menos parte do aumento da capacidade produtiva desejada () seria atendida simplesmente com a reestruturação do estoque de capital produzida pelos investimentos em modernização58 58 Não há menção sobre o aumento da produtividade média da firma — e, portanto, de sua capacidade produtiva — resultante do investimento em modernização (cf. Possas et al pp. 351-6). Ao que parece, o investimento em modernização também possui um tempo de "maturação" (idêntico àquele relativo ao investimento desejado em ampliação da capacidade) até que a mudança de produtividade que implica se efetive; isto, se verdade, dispensaria modificações no próprio cálculo da firma sobre o aumento desejado de capacidade produtiva, caso o aumento da capacidade produtiva provocado pelo investimento em modernização fosse imediato. — o que tornaria plausível a inversão da aparente hierarquia existente na utilização dos recursos financeiros totais (Fi,t) para investimento, pela atualização tecnológica que também permite na estrutura de capital da firma. Manter essa hierarquia na utilização dos recursos financeiros (ampliação de capacidade produtiva e depois, e somente então, modernização do maquinário) tem implicações problemáticas porque introduz inconsistências nas decisões de investimento e elementos ilógicos no modelo. Se não, vejamos: o investimento em modernização, pelo postulado no modelo, ampliaria a capacidade produtiva da firma, mas note, que para além do nível que, à luz de suas expectativas de demanda, acabou de julgar adequado.59 59 Decorreria, então, ou que a firma ignora a superioridade do potencial produtivo das novas máquinas vis à vis as máquinas que possui (ilógico), ou que promoveu uma revisão repentina (praticamente instantânea) do nível de capacidade produtiva desejado, seja porque ocorreram mudanças igualmente bruscas e céleres das expectativas, seja porque percebeu o cometimento de erros no dimensionamento de sua capacidade produtiva corrente (inconsistente). Essa rigidez hierárquica na alocação dos recursos financeiros é artificial e apenas empobrece uma regra que, em si, contém as determinações e os elementos mais relevantes do processo decisório de investimento (ampliação induzida e reposição por depreciação). Ora, sabendo das implicações competitivas que a atualidade tecnológica de seu estoque de capital possui, parece não menos que óbvia a provável decisão que a firma tomaria ao realizar a ampliação de capacidade produtiva, se confrontada com as possibilidades (excludentes, suponha-se) de fazê-la, ou sem qualquer mudança nas características tecnológicas do seu estoque de capital, ou com algum grau de atualização tecnológica de parte de seus equipamentos.

No caso em que os recursos financeiros totais (Fi,t) não são suficientes para realizar o investimento desejado () e a modernização do estoque de capital (), uma reformulação que evitaria esse problema (a fortiori, válida para as demais posições financeiras, desde que Fi,t > > 0)60 60 Na situação em que > Fi,t > 0, a solução torna-se um pouco mais complicada, porque pode envolver preferências sobre certas alocações de recursos financeiros que privilegiem alguma modernização do maquinário, ainda que o percentual da ampliação de capacidade desejada e necessidades de reposição por depreciação assim obtida possam ser inferiores ao resultado obtido sem qualquer modernização. Definindo vs, e vm, e como o percentual de ( ) obtido com o investimento (que pode ser financiado por Fi,t) (1) sem modernização do capital, (2) apenas modernizando o capital e (3) com algum grau de modernização, respectivamente, teríamos o seguinte problema de escolha: se A( v 0) é a alocação dos recursos financeiros associada à v 0, então a alocação ótima feita pela i-ésima firma seria A( ), em que = max{ vs, , vm}. seria a seguinte: como a substituição dos equipamentos mais antigos existentes no estoque de capital da firma irá, por si só, proporcionar algum incremento em sua produtividade (média), a firma investiria em modernização, seguindo a regra de payback (cf. Possas et al., 2001, p. 356), até o montante que ainda garantisse um certo resíduo de recursos suficiente para realizar a ampliação da capacidade produtiva não-contemplada pelo investimento em modernização. Formalmente, trata-se de um problema de programação. Suponha-se que, pela regra de payback, o investimento desejado em modernização da i-ésima firma no período t seja e que t(j) seja a parcela percentual de Fi,t gasta com j unidades de equipamentos que contemplem alguma parte de , tal que b(j) é a variação de capacidade produtiva da firma proporcionada pela introdução de j unidades de maquinário mais produtivo, de modo que

em que Pi,t = e B Í N. A alocação ótima dos recursos financeiros será, então, dada por

sujeito a Pi,t - b(j) > 0 e e pk,t(Pi,t - b(j))<(1-t(j))Fi,t,

em que g:Â ® [0,1]. Note-se que, dado o objetivo de realizar Pi,t, será sempre vantajoso investir na aquisição de r unidades de equipamento mais moderno (logo, na realização de alguma parte positiva de ), enquanto

de modo que, definindo B' = {n Î B|pk,t(Pi,t - bn)>(1 - tn)Fi,t}, a alocação ótima de recursos financeiros é t (s), já que s = sup(sBB') e Pi,t - b(s) > 0.

4. CONCLUSÕES

Neste artigo procurou-se mostrar uma série de limitações e problemas internos de alguns dos principais modelos evolucionários de dinâmica industrial. Avaliando mais pormenorizadamente a descrição analítica do processo de mudança técnica que contêm, mostrou-se como o "módulo" de busca tecnológica desses modelos compartilha das mesmas limitações do modelo Nelson-Winter: a ausência (1) de spillovers de P&D, (2) de um processo específico à firma de exploração das oportunidades tecnológicas e (3) de cumulatividade tecnológica. Esses aspectos são cruciais porque têm a capacidade de alterar crucialmente os resultados dos modelos; senão vejamos.

No primeiro caso, a introdução de spillovers tecnológicos não apenas poderiam funcionar como mecanismo de catching-up das firmas tecnologicamente "atrasadas" (inovadoras ou imitadoras), como também (a) aumentaria do grau de rivalidade entre as firmas e (b) abriria espaço para aspectos institucionais, já que a possibilidade de beneficiar-se do conhecimento tecnológico de firmas rivais demandaria arranjos institucionais que protegessem os direitos de exploração restrita dos resultados de P&D das firmas, ainda que, do ponto de vista setorial, isso viesse a produzir efeitos adversos sobre o ritmo de mudança técnica e, por extensão, sobre sua eficiência produtiva.

No segundo caso, sob a justificativa de um contínuo progresso científico, a fronteira tecnológica da indústria cresce exógena e continuamente conforme a taxa de crescimento da média da distribuição escolhida. Como os resultados das firmas inovadoras, em termos de produtividade, dependem do ritmo de evolução da fronteira, a exogeneidade dessa acaba sendo transmitida diretamente para o ritmo de crescimento da fronteira de produtividade das firmas. A implicação é crucial: a fronteira de produtividade da firma (com sucesso inovativo) se desloca seguindo os picos da produtividade "latente", (isto é, seguindo a fronteira tecnológica) sem que existam fases intermediárias — ou um tipo de ciclo no processo de exploração de oportunidades tecnológicas — que revelem o processo de transição tecnológica entre o nível de produtividade prevalecente da firma e aquele nocionalmente disponível pelas oportunidades tecnológicas que o progresso científico engendrou.61 61 Além do que, mesmo em uma indústria do tipo science-based, parece normal admitir que as firmas levam algum tempo para alcançar os "picos" potenciais de produtividade que, pelos desenvolvimentos na pesquisa científica (básica e/ou aplicada), tornam-se nocionalmente factíveis.

Por fim, no terceiro caso, sustentamos que a inexistência de um mecanismo de realimentação estritamente tecnológico nos modelos62 62 É verdade que existe nele (e nos que incorporaram sua formalização do processo de mudança técnica) uma realimentação positiva do potencial inovativo/imitativo da firma, mas ela não é tecnológica, isto é, ela não é diretamente derivada do sucesso tecnológico prévio, mas sim, uma realimentação repleta de mediações que a tornam, ao fim de tudo, muito mais próxima a uma espécie de efeito-tamanho. e o uso apenas do investimento corrente em P&D como determinante exclusivo da probabilidade de sucesso tecnológico das firmas têm, ambos, implicações cruciais para a lógica interna do modelo: (i) compromete a aderência do modelo a fatos estilizados da literatura em Economia Industrial, já que o potencial inovativo/imitativo das firmas também depende dos investimentos realizados e das capacitações adquiridas no passado; e (ii) significa a existência de uma descontinuidade contínua na atividade de busca tecnológica, incompatível com a natureza cumulativa da atividade de P&D: ou seja, os resultados alcançáveis pelo esforço tecnológico da firma em cada período se esgotam ali mesmo, não afetando por si mesmo os resultados que podem ser obtidos no futuro próximo, que dependem da realização de um novo esforço de P&D.

5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

Submetido: Abril 2004; aceito: Abril 2005.

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  • WINTER, S. (1984). "Schumpeterian Competition in Alternative Technological Regimes". Journal of Economic Behavior and Organization, v. 5, issue 3-4, pp. 287-320.
  • 1
    Refiro-me ao enfoque de "linhagem" neo-schumpeteriana — e não àquele mais próximo ao
    mainstream cujas incursões mais conhecidas são na área de teoria de jogos, embora já se registre algumas intervenções "evolucionárias" em economia industrial (cf. nota 3).
  • 2
    Os modelos tributários dessa corrente procuram explicitar a idéia de que a dinâmica competitiva nos mercados possui mecanismos intrínsecos — introdução de inovações, sua difusão via imitação e a existência de processos (por vezes imperfeito) de aprendizado — que operam uma pressão seletiva sobre um conjunto de firmas marcado pela diversidade (estratégica, de base técnica, de competências). Esses processos de seleção acabam provocando alterações ao longo do tempo nas características e na importância relativa das firmas no mercado. Assim, a seleção não apenas é responsável pela alteração do peso econômico (
    market share) da firma na estrutura da indústria, ela também enviesa os padrões de organização e operação estratégica que nela se consolidam. Daí porque no enfoque evolucionário o desequilíbrio é uma possibilidade lógica e mesmo teoricamente importante, responsável pela emergência de processos e estados — redirecionamento estratégico e revisão de rotinas operacionais — que são relevantes para a dinâmica econômica e, portanto, para uma teoria econômica da mudança técnica (cf. Possas, 1989; Dosi e Nelson, 1994).
  • 3
    Há outros modelos de dinâmica industrial — e.g. Hopenhayn (1992) e Ericson e Pakes (1995) — que pretendem conciliar uma perspectiva "evolucionária" com uma abordagem equilibrista, no que acabam por compartilhar de hipóteses — expectativas racionais, maximização de lucro, firma representativa, etc — que os distanciam radicalmente dos modelos de natureza neo-schumpeteriana que serão tratados aqui.
  • 4
    Longe de representar uma lista exaustiva dos modelos existentes, os modelos analisados foram escolhidos em razão de sua significância teórica. No caso do modelo desenvolvido por Nelson e Winter (doravante NW) isto está ligado, basicamente, ao pioneirismo na modelação (dinâmica) da concorrência com mudança técnica endógena e à influência que exerce sobre toda uma corrente de modelos de dinâmica industrial. No caso dos demais, essa significância teórica está mais ligada à contribuição que representam, seja na superação de características analíticas deficientes ou na ampliação do escopo de análise do modelo NW, seja na tentativa de utilizar referências teóricas (consistentes com o enfoque evolucionário) para além de Schumpeter que podem contribuir ao desafio presente de suprir as deficientes ligações entre os níveis micro e macro, em particular, dos modelos macroeconômicos evolucionários.
  • 5
    A centralidade desse procedimento deriva de sua importância na criação de assimetrias competitivas, resultantes do impacto diferenciado que o sucesso inovativo e/ou imitativo, traduzido em vantagens de custo ou outras, possui sobre o desempenho das firmas ao longo do tempo.
  • 6
    A tecnologia de produção tem coeficientes fixos de insumo (no que seguem uma função de produção do tipo Leontief), não havendo, portanto, substituição direta de trabalho por capital; como se trata de uma tecnologia
    complementar, o nível de produção máximo é determinado sempre pelo estoque de capital que cada firma dispõe, sendo os insumos complementares necessários para cada unidade de capital dos mesmos.
  • 7
    P(.) é uma medida de probabilidade;
    am e an são parâmetros setoriais indicadores do grau de oportunidade das firmas imitadoras e/ou inovadoras;
    d é uma variável binária do tipo Bernoulli com um parâmetro
    p de sucesso e (1-
    p) de fracasso, cujo subscrito mais à frente,
    n ou
    m, indica se se trata de inovação ou imitação, respectivamente.
  • 8
    Nesse sentido, há dupla incerteza nesse processo inovativo: por um lado, o comprometimento permanente das firmas com uma política de gastos em P&D não garante que um algum sucesso tecnológico será obtido; por outro, mesmo que a firma obtenha um sucesso inovativo, o resultado alcançável (o nível de produtividade) pode estar aquém do nível prevalecente de produtividade da firma.
  • 9
    A produtividade da técnica "copiada" (
    ), a produtividade obtida através do sucesso inovativo (F
    i,t), além da produtividade da técnica até então utilizada pela firma (
    Ai
    (t-1)).
  • 10
    O aumento da concentração envolve, então, um número crescente de firmas que não "acompanham" as demais firmas e perdem posição competitiva. Esse aspecto é compatível com o fato estilizado (Lei de Gibrat) de que a distribuição do tamanho das firmas na indústria tende a ser assimétrico, comportando um pequeno número de firmas grandes e um grande número de firmas pequenas (cf. Simon e Bonini, 1958).
  • 11
    Grosso modo, (1) o papel das inovações (
    lato sensu) como instrumento de competição e seus efeitos dinâmicos sobre a atividade econômica, indutores do processo de mudança estrutural salientado por Schumpeter; (2) o enfoque
    behaviorista da teoria da firma; (3) os estudos de Simon sobre racionalidade limitada e suas implicações sobre o comportamento decisório dos agentes; e (4) um aprofundamento da análise dos processos de "seleção natural", ainda que como metáfora.
  • 12
    Uma lista deles pode ser encontrada em Andersen (1996, cap. 4).
  • 13
    Cf. Dosi (1984), Freeman (1994).
  • 14
    Cf. Nelson e Winter (1982, cap. 12 e 13).
  • 15
    A decorrência lógica é a transmissão da exogeneidade da fronteira da indústria (nocional) para a própria trajetória tecnológica da firma — contrariando claramente seu caráter
    firm-specific.
  • 16
    É possível argumentar, em defesa desse procedimento, que a rigidez da estratégia de investimento em P&D é uma prática defensiva motivada pela incerteza dos resultados da atividade inovativa e refletiria mesmo a inércia das rotinas organizacionais.
  • 17
    Comportamentos racionais no sentido processual exigem, pelo menos, dois requisitos: (1) resultar de uma deliberação apropriada a partir dos meios que se julgam adequados; e (2) incorporar mecanismos que permitam uma "realimentação" contínua das decisões a partir dos resultados obtidos; cf. Simon (1987).
  • 18
    E a implicação (i)lógica dali derivada de que o desempenho da firma (insatisfatório) não produz uma revisão das estratégias das firmas percebidas como mais diretamente ligadas ao seu desempenho competitivo.
  • 19
    Mais detalhes veja-se Winter (1984, p. 221-8).
  • 20
    No sentido de que não há como definir, prévia e independentemente das demais decisões dos agentes, uma configuração de equilíbrio que possa orientar as decisões dos agentes e torná-las mutuamente consistentes (com tal equilíbrio) em algum sentido dinamicamente estável.
  • 21
    O que permite uma representação mais realista do progresso técnico do tipo
    incorporado (
    embodied), uma vez que apenas parte do estoque de capital (os novos equipamentos adquiridos, seja para expandir a capacidade produtiva, seja para fazer reposição das máquinas
    obsoletas) terá sua produtividade modificada, e não todo o estoque, como no modelo NW.
  • 22
    Cf. Malerba e Orsenigo (1993).
  • 23
    As decisões de "sucateamento" dos equipamentos — Quando um equipamento deve ser reposto por obsolescência tecnológica? — seguem uma regra de
    payback; mais detalhes cf. Silverberg
    et al. (1988, p. 1038). A regra de
    payback period permite ao modelo captar uma importante característica de ambientes inovativos: tanto maior é o ritmo inovativo na indústria, maior é a "pressão" sobre a firma para que "inutilize" parte do seu estoque de capital antes que sua vida potencial tenha sido atingida.
  • 24
    E inicialmente seu preço, por unidade de capacidade produtiva, é também mais elevado do que a tecnologia I, embora decresça 1% a cada período.
  • 25
    Inicialmente, todas as firmas no modelo utilizam a tecnologia I e a tecnologia II torna-se disponível apenas no período
    t* quando a eficiência na utilização da tecnologia II já terá "saturado" (
    Si = 1) (Silverberg
    et al., 1988, p. 1041).
  • 26
    Essa é a razão pela qual as decisões de investimento em uma tecnologia encerrem elementos expectacionais envolvidos em incerteza, seja quanto ao grau de apropriabilidade dos ganhos obtidos, seja quanto aos níveis alcançáveis de eficiência na utilização de uma nova tecnologia apenas potencialmente superior. E é aqui onde entra a influência do aprendizado.
  • 27
    Mesmo as firmas que, no momento, não estão utilizando tal tecnologia, quando o fizerem, será com a "eficiência" dada por
    sp, isto é, a qualquer período min{
    si} =
    sp(" = 1,2,...n). Observe-se que essa variável dá alguma medida (inversa) dos níveis de apropriabilidade das oportunidades de lucro associadas à adoção "pioneira" de certa tecnologia potencialmente mais produtiva do que a tecnologia utilizada.
  • 28
    A evolução do percentual da capacidade produtiva das firmas realizada com a nova tecnologia, que permite observar o tempo transcorrido para a conversão total da capacidade produtiva da indústria, também mostra uma trajetória em forma de "S".
  • 29
    Cf. Arthur, B. (1989).
  • 30
    O argumento é simples: se a capacidade de absorção de externalidades envolvendo oportunidades inovativas (radicais ou incrementais) depende da capacitação prévia, da estrutura de P&D (como fonte formal de aprendizado) e dos níveis de educação formal de recursos humanos que a firma dispõe é razoável que os benefícios apropriados a partir do aprendizado das demais firmas, seja via atividade de P&D, seja por meio da atividade produtiva, sejam específicos a cada firma. Como decorrência lógica das capacitações heterogêneas, devem ser também distribuídos assimetricamente.
  • 31
    Mas não os incrementos de produtividade ligados ao aperfeiçoamento do equipamento (que são de natureza técnico-física, e não cognitiva, ligados à automatização de tarefas), sem que isso seja considerado um tipo de inovação.
  • 32
    O que seria verdadeiro apenas nos casos em que as firmas operam equipamentos idênticos; mas isso não é uma condição suficiente; é possível que certo tipo de experiência na operação prática de equipamentos seja funcional apenas conjuntamente, ou dentro de certos arranjos organizacionais, de forma articulada, donde segue que membros desse conjunto tomados isoladamente não são capazes de reproduzir ou mesmo transferir os benefícios desse esquema operacional.
  • 33
    Em termos cognitivos, a experiência acumulada através da repetição de certa tarefa permite que um processo (inicialmente) controlado — tarefas realizadas de forma relativamente lenta, de natureza seqüencial, exigindo esforço e sob controle consciente — se converta em um processo automatizado, passando a exigir níveis relativamente baixos de processamento cognitivo e atenção. Sobre os efeitos da prática sobre a automatização, os psicólogos formularam o que se chama de "curva de aceleração negativa", que evidencia o efeito positivo, embora decrescente, da prática sobre a automatização de certa tarefa (Sternberg, 1996, caps. 3 e 4) — , ou seja, a taxa de aprendizagem decresce monotonamente à medida que aumenta a experiência. Mesmo tarefas complexas — que exigem esforço consciente intenso — podem ser relativamente automatizadas. Sobre o processo de automatização de tarefas, cf. Logan (1988).
  • 34
    A vantagem frente aos modelos unissetoriais é óbvia: permite não só uma idéia mais clara de como eventos ao nível micro podem, pelos impulsos cumulativos que provocam, influenciar resultados ao nível macro, mas, também, uma representação mais clara dos processos de geração e difusão de inovações.
  • 35
    Ver Dosi (1984, 1988).
  • 36
    No modelo NW era suposto implicitamente que as firmas vendiam tudo que produziam — e operavam sempre a plena capacidade produtiva. No modelo SDO, também não há qualquer influência
    direta das condições de demanda sobre as decisões de produção: o nível de produção é ajustado apenas para compensar desvios entre o atraso de entrega da firma e o nível "padrão" dessa mesma variável para a indústria. Mesmo as decisões de ampliação da capacidade produtiva são determinadas por uma taxa exógena.
  • 37
    Já que as firmas no setor 1 inovam para desenvolver novos tipos de máquinas mais eficientes para o setor 2 (incremental)
    e para encontrar técnicas mais eficientes de produzir tais máquinas (radical). As oportunidades de inovação das firmas do setor 2 (produtor de bens de consumo homogêneos) são do tipo incorporada: reduzem-se à aquisição das máquinas, produzidas pelo setor 1, que possuem maior capacidade produtiva por unidade de trabalho. A estrutura analítica do setor 2 praticamente reproduz as mesmas equações do modelo SDO, exceto por ter sido introduzido, em ambos os setores, a influência do lado da demanda nas decisões de produção das firmas.
  • 38
    Ym (
    t) é uma média móvel da renda agregada até o período
    t — o que pode ser visto como uma
    proxy do desenvolvimento econômico e científico. A idéia incorporada no modelo é que padrões sustentados de crescimento da renda tornam mais prováveis os desenvolvimentos de possibilidades tecnológicas superiores potencialmente utilizáveis.
  • 39
    É um parâmetro que procura representar o estado das oportunidades científicas (Chiaromonte e Dosi, 1993 p. 118), amplificando, ou não, o efeito do crescimento da renda sobre a probabilidade de sucesso nesse estágio.
  • 40
    Onde
    h é uma taxa exógena à qual se desloca a "fronteira" potencial do conjunto de oportunidades inovativas, representando,
    grosso modo, a eficiência da economia em traduzir a exploração das oportunidades científicas em "padrões" tecnológicos superiores aos padrões atualmente explorados — do ponto de vista produtivo.
  • 41
    Que para um dado salário determina o número de trabalhadores no "departamento" de P&D.
  • 42
    As firmas possuem uma regra para decidir quanto da receita do período prévio (
    Si) será destinado para investimentos em P&D (
    Ii(
    t)) no período seguinte:
    Ii(
    t) = µ
    i . Si(
    t - 1)/
    w(
    t) onde 0 < µ
    i << 1 e é específico à firma; e possuem uma regra alocativa desses recursos entre os dois tipos de P&D, inovativo e imitativo:
    e
    onde z
    i Î (0,1) também é específico à firma.
  • 43
    Essa idéia de que a capacitação tecnológica da firma limita seu espaço de busca e que o processo imitativo é facilitado pelo grau de difusão de uma técnica, já estava, ainda que de forma mais simplificada, presente no modelo de crescimento — mas não no de competição "schumpeteriana" — introduzido no capítulo 9. Cf. Nelson e Winter (1982, p. 211).
  • 44
    O conjunto de técnicas potencialmente copiáveis para a firma
    i no momento
    t, Zi(
    t), é representado pelo conjunto de máquinas/técnicas
    conhecidas (não necessariamente utilizadas na produção) dos agentes no setor 1,
    X(
    t), exclusive as técnicas já conhecidas pela própria firma
    i. Formalmente
    :
  • 45
    As simulações mostram também um efeito
    lock-in: os ganhos de produtividade associados ao desenvolvimento da competência tecnológica (via aprendizado) da firma operando certo tipo de máquina impede que as firmas possam descobrir, explorar e desenvolver um número elevado de paradigmas tecnológicos, embora o conjunto de potenciais paradigmas esteja permanentemente se expandindo.
  • 46
    No entanto, o modelo não especifica qualquer tipo de dependência entre a demanda do setor de bens finais (para onde se dirige os gastos dos trabalhadores) e a massa salarial paga em ambos os setores. Por isso, não explora o efeito de uma redução do emprego (causado, e.g., por progresso técnico com viés "poupador" de trabalho) sobre o nível de produção das firmas do setor 2 e, por extensão, sobre o nível de produção do setor de máquinas e equipamentos (em ambos os casos, via demanda): esse processo, claramente retroalimentado de forma seqüencial, tenderia a reforçar permanentemente (
    ceteris paribus) a redução do nível de emprego e o rebaixamento das expectativas de demanda em ambos os setores. Duas implicações óbvias e conexas poderiam ser observadas: primeiro, que o salário é, antes de tudo, um componente de demanda; segundo, que o progresso técnico, em geral, pode envolver (dependendo de seu "viés", que em geral é "poupador" de trabalho) permanente realocação da força de trabalho entre setores — não necessariamente garantindo o mesmo nível de ocupação anterior.
  • 47
    Cf., por exemplo, Dosi (1984, 1988).
  • 48
    Um exemplo ilustrativo: suponha duas firmas, A e B, operando no mercado há
    k períodos e que em um certo período
    t > k possuem gastos equivalentes em P&D — conquanto possuam "históricos" inovativos diferentes: ainda assim, a capacidade inovativa de A e B — a probabilidade de ter um sucesso inovativo — seriam equivalentes pela formulação utilizada, o que é flagrantemente irrealista. Esse problema ficaria mais evidente caso se comparasse firmas que já operam no mercado — já possuem experiência em P&D — com firmas que entraram recentemente no mercado.
  • 49
    Muito embora as referências feitas ao modelo remetam ao
    paper publicado por Possas
    et al. (2001), o modelo foi originalmente desenvolvido principalmente por Possas e Koblitz, daí porque PK [cf. também Possas e Koblitz (2001)].
  • 50
    Mas não só; a presença de uma variável (nível desejado de recursos líquidos) que representa uma espécie de demanda precaucional por moeda para fazer frente a ocorrências não esperadas — erros de previsão de demanda, flutuações inesperadas de taxa de juro — também reflete a influência keynesiana no modelo.
  • 51
    São passíveis de discussão a razoabilidade desse tipo de expectativa e o tipo de regra que ele implica como aproximação dos procedimentos reais dominantes utilizados pelas firmas, em uma economia descentralizada e interdependente, para realizar cálculos preditivos. Talvez a simples extensão do horizonte temporal que serve de referência para o cálculo projetivo — de forma a torná-lo sensível a sazonalidades nos padrões de comportamento, no caso, das vendas — fosse suficiente para reduzir o grau aparente de miopia da regra. Por outro lado, se de fato esse padrão expectacional é pouco representativo daquele utilizado pelas firmas, é preciso saber se, teoricamente, a regra extrapolativa utilizada é responsável, mesmo que indiretamente, por uma amplificação artificial dos desequilíbrios "normais" (sob um padrão expectacional não-míope, mas nem por isso "racional" no sentido de Lucas) da dinâmica competitiva de uma indústria — pelo pessimismo (ou otimismo) que incorpora. Em todo o caso, é razoável acreditar que eventos como um "excesso" (ou "insuficiência") recente de encomendas devem exibir algum grau de persistência antes de induzirem as firmas a modificarem suas estratégias; o que, aliás, parece compatível com sugestões do próprio Keynes. A questão se reduz, ao que parece, ao saber se tomar em conta os resultados observados, por exemplo, no mesmo período do ano anterior, remete a um passado longo o suficiente para que seja rejeitada sua influência sobre as expectativas a curto prazo.
  • 52
    Tornando clara também a influência das firmas com maior
    market share sobre a determinação do preço médio na indústria.
  • 53
    Os ajustes que a firma realiza em seu
    mark-up desejado em razão da redução de custos provocado pela incorporação de uma técnica mais produtiva podem determinar em que medida sua competitividade será alterada e, portanto, a variação que pode ocorrer em seu
    market share.
  • 54
    Ainda que no modelo PK esse processo de mercado apareça apenas implicitamente. O aumento da participação de mercado das firmas que aumentam sua competitividade relativa — em razão, indiretamente, de um sucesso inovativo — apenas ratifica a
    migração para estas firmas, em função de preços mais atrativos, de parte dos consumidores "fiéis" a outras firmas naquela indústria.
  • 55
    Já que a geração de inovação e imitação no modelo PK segue a mesma formulação presente no modelo NW, compartilhando, nesses aspectos, das suas mesmas limitações, de resto já comentadas.
  • 56
    Sobre as limitações ligadas à formação de expectativas cf. Almeida (2004, cap. 2).
  • 57
    — a produtividade da melhor técnica disponível —, que nada mais é que a opção de maior valor dentre as possibilidades de escolha existentes:
    ; onde as duas últimas possibilidades representam os resultados obtidos quando de um sucesso inovativo e imitativo, respectivamente.
  • 58
    Não há menção sobre o aumento da produtividade média da firma — e, portanto, de sua capacidade produtiva — resultante do investimento em modernização (cf. Possas
    et al pp. 351-6). Ao que parece, o investimento em modernização também possui um tempo de "maturação" (idêntico àquele relativo ao investimento desejado em ampliação da capacidade) até que a mudança de produtividade que implica se efetive; isto, se verdade, dispensaria modificações no próprio cálculo da firma sobre o aumento desejado de capacidade produtiva, caso o aumento da capacidade produtiva provocado pelo investimento em modernização fosse imediato.
  • 59
    Decorreria, então, ou que a firma ignora a superioridade do potencial produtivo das novas máquinas
    vis à vis as máquinas que possui (ilógico), ou que promoveu uma revisão repentina (praticamente instantânea) do nível de capacidade produtiva desejado, seja porque ocorreram mudanças igualmente bruscas e céleres das expectativas, seja porque percebeu o cometimento de erros no dimensionamento de sua capacidade produtiva corrente (inconsistente).
  • 60
    Na situação em que
    >
    Fi,t > 0, a solução torna-se um pouco mais complicada, porque pode envolver
    preferências sobre certas alocações de recursos financeiros que privilegiem
    alguma modernização do maquinário, ainda que o percentual da ampliação de capacidade desejada e necessidades de reposição por depreciação assim obtida possam ser inferiores ao resultado obtido
    sem qualquer modernização. Definindo
    vs,
    e
    vm, e como o percentual de (
    ) obtido com o investimento (que pode ser financiado por
    Fi,t) (1) sem modernização do capital, (2) apenas modernizando o capital e (3) com algum grau de modernização, respectivamente, teríamos o seguinte problema de escolha: se
    A(
    v
    0) é a alocação dos recursos financeiros associada à
    v
    0, então a alocação
    ótima feita pela
    i-ésima firma seria
    A(
    ), em que
    = max{
    vs,
    ,
    vm}.
  • 61
    Além do que, mesmo em uma indústria do tipo
    science-based, parece normal admitir que as firmas levam algum tempo para alcançar os "picos" potenciais de produtividade que, pelos desenvolvimentos na pesquisa científica (básica e/ou aplicada), tornam-se nocionalmente factíveis.
  • 62
    É verdade que existe nele (e nos que incorporaram sua formalização do processo de mudança técnica) uma realimentação positiva do potencial inovativo/imitativo da firma, mas ela não é tecnológica, isto é, ela não é
    diretamente derivada do sucesso tecnológico prévio, mas sim, uma realimentação repleta de mediações que a tornam, ao fim de tudo, muito mais próxima a uma espécie de
    efeito-tamanho.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      25 Maio 2006
    • Data do Fascículo
      Jun 2006

    Histórico

    • Aceito
      Abr 2005
    • Recebido
      Abr 2004
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