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Bancos públicos e política monetária: teoria e alguns resultados com base em projeções locais dependentes de estado* * Os autores agradecem os comentários de Carmem Feijó e de Fernanda Feil, isentando-as, como de praxe, de eventuais erros e omissões.

Public banks and monetary policy: theory and some results based on state dependent local projections

Resumo

Os efeitos dos bancos públicos sobre a política monetária é um tema central para o fortalecimento das instituições financeiras de desenvolvimento. Reformas recentes na atuação de bancos de desenvolvimento se basearam no argumento de que os bancos públicos reduzem a potência da política monetária. Tais reformas foram realizadas a despeito da escassa literatura empírica apontando os efeitos negativos dos bancos públicos. Alguns estudos evidenciaram que empresas com acesso a crédito de bancos públicos ou a crédito direcionado apresentam menores quedas no investimento e na produção após um choque de política monetária. Contudo, tais estudos utilizam dados microeconômicos e ignoram possíveis efeitos de custo decorrentes de variações na taxa básica de juros. Neste artigo explicitam-se as questões teóricas envolvidas neste debate e evidencia-se empiricamente o efeito do canal de custos da política monetária. Quando se compara os efeitos macroeconômicos dos ciclos de crédito guiados por bancos públicos ou privados não são encontradas evidências de que a política monetária é menos potente nos períodos de alto crédito dos bancos públicos. Mesmo que em períodos de alto crédito dos bancos públicos a política monetária apresente menor efeito sobre a produção, nestes períodos os enigmas dos preços se mostram menos persistentes. A maior estabilidade dos juros dos bancos públicos acarreta menor transmissão de custos financeiros, menor redução no estoque de capital e menor puzzle no câmbio contribuindo, assim, para a condução da política monetária.

Palavras-chave:
Bancos públicos; política monetária; projeções locais; canal de crédito

Abstract

We test the hypothesis that public banks reduce monetary policy power for Brazilian economy, during the 2000-2018 period. Previous studies have shown that companies with access to government driven credit present smaller fall in investment and production after a contractionary monetary policy shock. Nevertheless, these studies are based on microeconomic data and ignore cost-push effects of monetary policy. We employ state dependent local projections (Jordà, 2005Jordà, O. (2005). Estimation and inference of impulse responses by local projections. American economic review, 95(1):161-182.) to compare monetary policy power (defined as the sensibility of inflation to changes in basic interest rate) between periods of high credit of public banks and periods of high credit of private banks. We do not find evidence that monetary policy is less powerful in periods of high credit of public banks. Even though periods of high credit of public banks present a lower effect over output, those periods present less persistent price puzzles than periods of high private credit. We conduct several robustness tests to confirm our results. We attribute those results to lower flexibility in interest rates of credit from public banks, what leads to lower transmission in financial costs, lower reduction in capital stock and lower puzzle in exchange rate.

Keywords:
public banks; monetary policy; local projections; credit-channel

INTRODUÇÃO

A intervenção governamental no mercado de crédito se dá por mecanismos diretos, operados por bancos públicos, e indiretos, em que bancos privados são incentivados a conceder crédito a setores prioritários. A atuação em segmentos prioritários caracteriza o direcionamento de crédito, cujo objetivo é afetar taxas de juros, prazos e demais condições em segmentos promotores do desenvolvimento.

Os bancos públicos detêm cerca de 3/4 do total do crédito direcionado - que, por sua vez, representa quase 2/3 do crédito dos bancos públicos. Os três maiores bancos públicos são responsáveis pela maior parcela do crédito direcionado em seus respectivos setores prioritários: o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) é responsável (via empréstimos diretos e indiretos) por 72% do crédito direcionado concedido às firmas; o Banco do Brasil por 61% do crédito rural e a Caixa Econômica Federal (CEF) por 74% do crédito imobiliário. Com a manutenção de elevadas taxas de juros do crédito livre, a oferta de crédito de longo prazo se concentra no crédito direcionado, concedido sob a liderança destes três bancos públicos federais (Lundberg, 2011Lundberg, E. (2011). Bancos oficiais e crédito direcionado-o que diferencia o mercado de crédito brasileiro? Technical Report Working Paper 258, Central Bank of Brazil, Research Department.; Torres Filho, 2017Torres Filho, E. T. (2017). O crédito corporativo de longo prazo em uma encruzilhada: onde estamos e para onde podemos ir? http://web.bndes.gov.br/bib/jspui/handle/1408/15500.
http://web.bndes.gov.br/bib/jspui/handle...
).

A resposta dos bancos públicos à crise de 2008 foi fundamental para a recuperação econômica (Paula et al., 2013Paula, L. F. d., Oreiro, J. L., e Basilio, F. A. (2013). Estrutura do setor bancário e o ciclo recente de expansão do crédito: o papel dos bancos públicos federais. Nova Economia, 23(3):473-520.; Bonomo et al., 2015Bonomo, M., Brito, R. D., e Martins, B. (2015). The after crisis government-driven credit expansion in brazil: A firm level analysis. Journal of International Money and Finance, 55:111-134.). Barros et al. (2018Barros, L., dos Santos Silva, C. K., de Freitas Oliveira, R., et al. (2018). Presença estatal no mercado de crédito: o papel dos bancos públicos e do crédito direcionado na crise de 2008. Technical report, Banco Central do Brasil: Trabalhos para Discussão no. 488.) demonstram que os bancos públicos garantiram a suavização do choque externo expandindo tanto as concessões de crédito livre quanto direcionado.

Entretanto, o uso ativo dos bancos públicos como instrumento de política econômica foi muito criticado (Bonomo et al., 2015Bonomo, M., Brito, R. D., e Martins, B. (2015). The after crisis government-driven credit expansion in brazil: A firm level analysis. Journal of International Money and Finance, 55:111-134.; Segura-Ubiergo, 2012Segura-Ubiergo, M. A. (2012). The puzzle of brazil’s high interest rates. Technical Report 12-62, International Monetary Fund.). Uma das críticas recorrentes aponta efeitos negativos da atuação dos bancos públicos para o cumprimento das metas de inflação do Banco Central.

É difundida a crença de que a presença de bancos públicos reduz a potência (ou eficácia) da política monetária, definida como a sensibilidade da inflação à taxa Selic. Esta tese foi postulada por Pérsio Arida (2005Arida, P. (2005). Mecanismos compulsórios e mercado de capitais: propostas de política econômica. E.L. Bacha e L.C. de Oliveira Filho (Orgs), Mercado de capitais e crescimento econômico: lições internacionais, desafios brasileiros. Rio de Janeiro: Contracapa.) e passou a ser usada como argumento contrário à existência de bancos públicos, notadamente, o BNDES. A extinção da Taxa de Juros de Longo Prazo (TJLP) se fundamentou nessa tese. A perda da participação do BNDES no financiamento do investimento idem. Ela também serviu para justificar o fim da atuação mais ativa dos bancos públicos.

Arida (2005Arida, P. (2005). Mecanismos compulsórios e mercado de capitais: propostas de política econômica. E.L. Bacha e L.C. de Oliveira Filho (Orgs), Mercado de capitais e crescimento econômico: lições internacionais, desafios brasileiros. Rio de Janeiro: Contracapa.) argumenta que a menor resposta dos juros cobrados pelos bancos públicos a alterações na Selic causaria uma redução na potência da política monetária. Assim, seria necessária a manutenção da Selic em níveis mais elevados do que necessário, caso não houvesse intervenção governamental no mercado de crédito.

Apesar da tese de Arida ser amplamente difundida, são escassas as evidências empíricas favoráveis a ela. Dentre os poucos estudos empíricos sobre o tema, Bonomo e Martins (2016Bonomo, M., Martins, B., et al. (2016). The impact of government-driven loans in the monetary transmission mechanism: what can we learn from firm-level data? Banco Central do Brasil, Texto para discussão no, 419.) é um dos mais citados. No entanto, eles usam apenas dados microeconômicos de firmas brasileiras. Eles mostram que as empresas com acesso ao crédito público, em resposta a uma elevação da Selic, reduzem menos a produção do que as empresas sem acesso ao crédito público. Daí concluem que a política monetária se torna menos eficaz devido ao crédito público. Implícita está a ideia de que os juros do crédito direcionado são menos correlacionados com a Selic, o que a tornaria menos potente no combate à inflação.

No entanto, a potência da política monetária é um fenômeno de natureza genuinamente macroeconômica. Não se trata de uma questão microeconômica que pode ser mensurada no nível de firmas individuais. A mera extrapolação de um argumento microeconômico para o nível macroeconômico é falaciosa. A macroeconomia tem lógica própria que não se reduz ao somatório das lógicas individuais. Trata-se de erro clássico de falácia da composição.

A transmissão de elevações da Selic para a inflação usualmente é descrita de forma linear e, fundamentalmente, intermediada pela demanda agregada. No entanto, o impacto da política monetária sobre a inflação também é mediado pelos custos de produção, particularmente o custo financeiro (especialmente a taxa de juros do crédito rotativo ou do capital de giro). Se os custos se elevam em resposta a um aumento da Selic, uma queda da demanda agregada não necessariamente se traduz em redução da inflação.

A relevância dos custos financeiros na formação dos preços está na base da explicação daquilo que ficou conhecido na literatura empírica como enigma dos preços. Em resposta a uma elevação dos juros, os preços inicialmente se elevam, devido ao repasse do incremento dos custos financeiros; e, somente em um momento posterior, a inflação cede, em resposta ao desaquecimento econômico.

Com base em um modelo de projeção local dependente de estado, testamos a hipótese de que os bancos públicos comprometem a potência da política monetária. Usamos dados mensais da economia brasileira, entre os anos de 2000 e 2018. É uma amostra grande, o que torna mais confiável nossas estimativas.

Os resultados mostram que a potência da política monetária depende do estado de crédito da economia. Períodos de alto crédito agregado (i.e., considerando-se os bancos públicos e privados em conjunto) apresentam enigmas de preços mais proeminentes e o PIB se retrai mais do que nos momentos de baixo crédito. Essa evidência é corroborada pela literatura internacional.

A novidade de nosso trabalho reside no fato de que investigamos o efeito dos bancos públicos na potência da política monetária de forma agregada. Os resultados são robustos e contrariam a hipótese de que o crédito público diminui a potência da política monetária.

Demonstra-se que os períodos de alto crédito dos bancos públicos apresentam enigmas dos preços menores e menos persistentes. Isto é, a potência da política monetária é maior; e durante os períodos de alto crédito dos bancos públicos o controle da inflação está associado a uma menor queda do PIB. Ou seja, a taxa de sacrifício da política monetária é menor nos períodos em que os bancos públicos são mais atuantes do que nos períodos de alto crédito dos bancos privados. Dito de outra forma, o efeito (baixista sobre a inflação) acumulado de uma alta da Selic é mais intenso nos momentos de alto crédito dos bancos públicos. Além disso, a queda acumulada do PIB, resultante da elevação da Selic, é menor quando os bancos públicos emprestam mais.

Além desta introdução o artigo é dividido em três seções, uma conclusão e um Apêndice. Na primeira, apresentamos o mecanismo de transmissão da política monetária. Na segunda, resenhamos a literatura sobre o efeito dos bancos públicos e do crédito direcionado sobre a potência da política. Na terceira, apresentamos os principais resultados (detalhados no Apêndice APÊNDICE PROJEÇÕES LOCAIS As estimações são realizadas com o pacote lpirfs, implementado em R por Adämmer (2018). Neste software, as projeções locais dependentes do estado são computadas com a especificação: y t + h i = F z t - 1 β h a c h o q u e t + θ h a x t + 1 - F z t - 1 β h b c h o q u e t + θ h b x t + u t (1) Os coeficientes βh estimam o efeito médio de um choque sobre a variável yi no horizonte h. O coeficiente βh depende do regime da economia (a ou b), definido pela função F(zt). O vetor xt inclui as variáveis de controle utilizadas. A função F(zt) retorna uma definição de regimes que representa a probabilidade da economia se encontrar em um estado de alto ou baixo crédito. VARIÁVEIS DE ESTADO Os regimes de crédito são identificados seguindo a literatura financeira sobre o “hiato de crédito” (Drehmann e Tsatsaronis, 2014). Os regimes de alto crédito são definidos como aqueles em que o saldo de crédito em razão do PIB é maior que sua tendência de longo prazo. Deste modo, a diferença entre o Crédito/PIB e sua tendência é utilizada para diferenciar os regimes nas projeções locais, constituindo a série zt na Equação 1. ESTIMAÇÕES: REGIMES DE CRÉDITO DOS BANCOS PÚBLICOS Adotamos o pressuposto da recursividade para a identificação do choque, o que implica o ordenamento: produto, inflação e juros. Utilizamos 12 defasagens, tal qual recomendado pelo critério AIC. Adicionalmente, acrescentamos uma dummy mensal, para impedir que os efeitos capturados reflitam sazonalidades. A Figura A.1 apresenta as estimações básicas utilizando a variável de estado de saldo dos bancos públicos. A primeira coluna apresenta as estimações das funções impulso-resposta a um choque de um desvio padrão da Selic, sobre o IPCA e o Produto. O estado de alto crédito é marcado pela linha preta sólida e o estado de baixo crédito pela linha vermelha pontilhada. Os intervalos de confiança (95%) para alto e baixo crédito estão respectivamente representados pelas linhas finas sólidas e pela área sombreada. A resposta da Inflação apresenta um marcante enigma dos preços até o quinto mês. Este enigma dos preços é mais relevante no período de alto crédito de que baixo crédito. A partir do sexto mês a política monetária passa a ter efeito negativo significativo sobre a inflação no regime de alto crédito, que mantêm até o 15º mês. Já no regime de baixo crédito, a política monetária não tem efeito negativo significativo sobre os preços. Neste regime, após o 6º mês o choque permanece não significativo em praticamente todos os períodos. Nota-se que a política monetária só teve efeitos significativos sobre a inflação nos períodos em que havia alto saldo de crédito dos bancos públicos. Os efeitos sobre o PIB são consonantes com a hipótese de que no período de maior endividamento os efeitos da política monetária são mais fortes. O efeito negativo sobre o produto ocorre desde o primeiro mês e se intensifica nos meses seguintes. Até o oitavo mês, as trajetórias do alto e baixo crédito se mantêm próximas. A partir daí, nota-se maior distanciamento entre as duas estimativas, com o produto tendo perdas maiores no estado de alto crédito. Nota-se que os efeitos sobre o produto não se dissipam até o 15º mês. Efeitos da política monetária em períodos maiores que dois anos também são notados por Jordà et al. (2019); Tenreyro e Thwaites (2016). É interessante ressaltar que, para as três variáveis, o regime de alto crédito tem intervalos de confiança maiores que o de baixo crédito. Isso reflete o fato de que, além de efeitos mais intensos, no regime de alto crédito os efeitos são menos previsíveis. A segunda coluna da Figura A.1 apresenta a estatística T para a hipótese nula de que (βha−βhb) = 0, com a área de ± 1,96, sombreada, representando o intervalo de confiança.6 Ou seja, testa-se a hipótese de não há diferença entre as respostas no estado de alto e de baixo crédito. Os resultados indicam que a diferença entre os dois regimes é significativa para o enigma dos preços inicial e para a maior queda da inflação a partir do 7º mês. Para o produto, o período de alto crédito tem efeitos mais significativos nos primeiros meses após o choque e nos meses posteriores ao 11º. A terceira coluna da Figura A.1 apresenta o resultado acumulado das funções impulso-resposta, calculado pelo somatório de todos choques até certo horizonte h. Para a inflação, nota-se que o efeito líquido negativo só se torna relevante após o 12o mês do regime de alto crédito. Para o produto, destaca-se que a trajetória dos dois regimes é próxima, até o oitavo mês, quando a política monetária passa a ter efeitos crescentemente maiores no regime de alto crédito. ESTIMAÇÕES: REGIMES DE CRÉDITO DOS BANCOS PRIVADOS Repetimos as estimativas acima apresentadas utilizando como variável de estado os regimes de crédito dos bancos privados. A Figura A.2 apresenta os resultados básicos para um choque de um desvio-padrão na Selic sobre as três variáveis de interesse, condicionados aos ciclos de saldo de crédito dos Bancos Privados. A resposta da inflação apresenta um resultado paradoxal, de um enigma dos preços duradouro nos períodos de alto crédito. Um enigma dos preços semelhante nos dois estados é notado até o 6º mês. A partir de então, nota-se um efeito contrário àquele percebido no ciclo de crédito dos bancos públicos: os períodos de baixo crédito privado apresentam uma resposta negativa da inflação e os períodos de alto crédito apresentam uma resposta positiva. O produto é significativamente mais responsivo no período de alto crédito. Na segunda coluna da Figura A.2, notamos que as diferenças apontadas entre os estados são significativas. Em especial, é significativo o maior enigma dos preços e a maior queda do Produto nos períodos de alto crédito privado. Os efeitos se explicitam também nos gráficos acumulados da terceira coluna. Se nota a reversão da inflação apenas após o 13º mês, a grande diferença acumulada na resposta do Produto, com a diferença que no período de baixo crédito a estabilização já se nota no 12º mês. Figura A.1: Estimação Básica com o Filtro de Bancos Públicos Figura A.2: Estimação Básica com o Filtro de Bancos Privados Nota: A primeira coluna mostra as funções impulso-resposta nos estados de alto crédito (preto sólido) e baixo crédito (cinza tracejado), os respectivos intervalos de confiança (95%) estão representados pela linha sólida e pela área sombreada. A segunda coluna apresenta a as estatísticas T para a hipótese de que a diferença entre os coeficientes nos dois estados é igual a 0, a área sombreada marca o intervalo de ±1,96. A terceira coluna apresenta a função impulso-resposta acumulativa para o estado de alto crédito (sólido) e baixo crédito (pontilhado). ). Por fim, ressaltamos que nossas estimativas não corroboram a hipótese de que a atuação dos bancos públicos compromete a potência da política monetária.

MECANISMO DE TRANSMISSÃO DA POLÍTICA MONETÁRIA

A visão ortodoxa: a formação de preços no nível macroeconômico

A literatura convencional elenca fundamentalmente cinco canais através dos quais a política monetária pode afetar a variação do nível geral de preços: a estrutura a termo da taxa de juros; o crédito; as expectativas; o preço dos ativos; e a taxa de câmbio (Mishkin, 1995Mishkin, F. S. (1995). Symposium on the monetary transmission mechanism. Journal of Economic perspectives , 9(4), 3-10., 1996Mishkin, F. S. (1996). The channels of monetary transmission: lessons for monetary policy (No. w5464). National Bureau of Economic Research.). A Figura 1 sintetiza a visão ortodoxa do processo de formação de preços no nível macroeconômico, conforme o BCB (1999Banco Central do Brasil (BCB) (1999). Relatório de Inflação, v. 1, nº 1, jun. 1999).

As decisões de investimento e de consumo de bens duráveis são pautadas pela estrutura a termo da taxa de juros. Uma redução da taxa básica de juros, ao se propagar para as taxas de juros de médio e longo prazos, induz uma elevação do investimento e do consumo (notadamente de bens duráveis) que, por sua vez, gera ampliação da demanda agregada, pressionando o nível geral de preços para cima.

O canal do crédito funciona da seguinte forma: ao diminuir a Selic e elevar o volume de reservas bancárias, o BCB faz aumentar a quantidade de recursos disponíveis para empréstimos. Caso exista demanda por crédito reprimida, haverá uma expansão dos empréstimos bancários. Assim, haverá um aumento dos gastos com investimento e consumo de bens duráveis, determinando uma ampliação da demanda agregada e, finalmente, pressionando o nível geral de preços para cima.

Figura 1:
Mecanismo de Transmissão da Política Monetária: abordagem macroeconômica ortodoxa

O terceiro canal de transmissão da política monetária é o das expectativas. Variações na Selic influenciam as expectativas quanto ao comportamento futuro da economia que, por sua vez, afetam as decisões correntes dos agentes econômicos quanto aos níveis de investimento poupança e consumo.

Variações nos preços dos ativos financeiros, ao alterar o estoque de riqueza dos agentes econômicos, podem influenciar as decisões de consumo. Uma redução da taxa básica de juros, ao estimular o crescimento econômico, aumenta a expectativa de lucro das empresas gerando, normalmente, uma elevação no preço das ações. Além disso, o preço dos títulos (pré-fixados) aumenta. Diante de volume maior de riqueza financeira, decorrente do aumento do valor dos títulos e das ações, é possível que os agentes econômicos se disponham a gastar mais. Dessa forma, uma redução da Selic, ao incentivar o consumo - por meio do efeito riqueza financeira - também amplia a demanda agregada, pressionando para cima o nível geral de preços.

Finalmente, uma desvalorização cambial tende a elevar a inflação na medida em que aumenta as exportações líquidas - ao tornar as importações menos competitivas -, deslocando a demanda de produtos importados para similares nacionais; isto tende a reduzir a competição externa, possibilitando que os produtores domésticos formem (ou aumentem) os preços com mais liberdade.

Resumindo, de acordo com o BCB, variações na taxa Selic se transmitem para a inflação por meio dos cinco canais acima. Através desses canais, um estímulo monetário influencia as decisões de investimento, poupança e consumo de bens duráveis e as exportações líquidas que, por sua vez, afetam a demanda agregada e, por fim, o nível geral de preços (Meltzer, 1995Meltzer, A. H. (1995). Monetary, credit and (other) transmission processes: a monetarist perspective. Journal of Economic perspectives , 9(4), 49-72.; Mishkin, 1995Mishkin, F. S. (1995). Symposium on the monetary transmission mechanism. Journal of Economic perspectives , 9(4), 3-10., 1996Mishkin, F. S. (1996). The channels of monetary transmission: lessons for monetary policy (No. w5464). National Bureau of Economic Research.; Bogdanski et. al., 2000Bogdanski, J., Tombini, A. A., & Werlang, S. R. D. C. (2000). Implementing inflation targeting in Brazil. Werlang, Sergio R., Implementing Inflation Targeting in Brazil (July 2000). Banco Central do Brasil Working Paper, (1).).

A descrição convencional desse mecanismo omite o papel crucial desempenhado por fatores microeconômicos - regras de formação de preço, estruturas de mercado e padrões de concorrência etc. - na determinação do nível geral de preços. É justamente aqui que se encontra a necessidade de uma abordagem que integre os determinantes microeconômicos e macroeconômicos do nível geral de preços, tratada a seguir.

A visão Heterodoxa: uma abordagem micro-macroeconômica integrada

O estado das artes da pesquisa sobre os determinantes da inflação possui um viés essencialmente macroeconômico. Além disso, a literatura existente é fortemente condicionada pela visão ortodoxa sobre política monetária, seus canais de transmissão e sua interpretação acerca das causas da inflação. Neste último aspecto, deve-se ressaltar que o regime de metas de inflação (RMI) tem como foco um tipo específico de inflação, a de demanda.

Este diagnóstico pode apresentar problemas em função da presença de dois elementos cruciais, de ordem microeconômica, subjacentes à dinâmica da inflação: padrões de concorrência distintos do modelo de concorrência perfeita, em que se destacam os oligopólios, e as suas implicações para o repasse de variações de custos para os preços finais; e a rigidez de preço a variações na demanda. Como bem ressaltado por Modenesi et al. (2012Modenesi, A. D. M., Pires-Alves, C. C., & Martins, N. M. (2012). Mecanismo de transmissão da política monetária: a importância dos fatores microeconômicos. Oikos (Rio de Janeiro), 11(2).), a definição de um arcabouço teórico alternativo, que ofereça uma explicação mais completa para o processo inflacionário deve envolver, necessariamente, uma abordagem micro-macro integrada.

A visão monetarista ortodoxa do processo de formação de preços implícita na descrição convencional do mecanismo de transmissão da política monetária omite importantes fatores microeconômicos na determinação do nível geral de preços (Martins et al., 2018Martins, N. M., Pires-Alves, C. C., Modenesi, A. D. M., & Leite, K. V. B. D. S. (2017). The transmission mechanism of monetary policy: Microeconomic aspects of macroeconomic issues. Journal of Post Keynesian Economics, 40(3), 300-326.). Para contornar essa séria limitação, propõe-se uma abordagem integrada micro-macroeconômica, marcadamente heterodoxa, que englobe os fatores omitidos pela ortodoxia.

Conforme a Figura 2, além dos cinco canais de transmissão da política monetária contemplados pela teoria ortodoxa, propõe-se a inclusão de canais adicionais, que levem em conta as estruturas de mercado e os padrões de concorrência, como variável explicativa do processo de formação do nível geral de preços. Assim, pretende-se chamar a atenção para a relevância e abrir espaço para a inclusão dos variados canais de transmissão associados aos fatores microeconômicos.

Particularmente propõe-se a introdução de dois canais: crédito-custo; e câmbio-custo. O primeiro é um canal perverso: um aumento na taxa de juros contribui para uma elevação da inflação. Trata-se de uma razão para o que a literatura chama de enigma dos preços: a evidência empírica mostra que diante de um choque (positivo) de taxa de juros a inflação inicialmente se acelera. Esse comportamento, apesar de não encontrar respaldo na teoria ortodoxa, se tornou espécie de regra em modelos VAR (Eichenbaum, 1992Eichenbaum, M. (1992), “Comment on interpreting the macroeconomic time series facts: the effects of monetary policy”. European Economic Review, vol. 36 (5), pp.1001-011.; Walsh, 2003Walsh, C. E. (2003). Monetary theory and policy. MIT press., cap. 1)1 1 Esse fenômeno também foi identificado para a economia brasileira, por exemplo, por Luporini (2007) e Modenesi e Araújo (2013). A explicação convencional é que se trata de um problema de má especificação: as variáveis incluídas no modelo não esgotam o conjunto de informação à disposição do banco central (Sims, 1992Sims, C. A. (1992). Interpreting the macroeconomic time series facts: The effects of monetary policy. European economic review, 36(5), 975-1000.).2 2 Partindo dessa premissa, Christiano et al. (1996) e Sims e Zha (1998) “eliminam” o enigma dos preços com a introdução de um índice de preço de commodities.

Propomos aqui uma motivação alternativa para o enigma dos preços, fundada na existência do canal de crédito-custo na transmissão da política monetária. Uma elevação da taxa de juros aumenta o custo financeiro de produção das firmas (juros do crédito rotativo) que - dependendo de seu poder de mercado e das condições de demanda - pode ser repassado para preços. Assim, em um primeiro momento, uma contração monetária gera um aumento de custos que se transmite mais rapidamente para os preços. Posteriormente, uma elevação dos juros desaquece a economia e, finalmente, impacta negativamente a inflação. O enigma surgiria, portanto, de um descompasso entre os efeitos da política monetária sobre os custos de produção - que são mais imediatos - e seus impactos defasados sobre a demanda agregada e, por fim, nos preços.

Figura 2:
Mecanismo de Transmissão da Política Monetária: abordagem micro-macroeconômica integrada

O canal câmbio-custo funciona com o sinal esperado e reforça o canal câmbio-demanda (que opera via exportações líquidas). Assim, uma valorização cambial - ao tornar mais barata a importação de máquinas, equipamentos e insumos - contribui para uma redução dos custos de produção. Dependendo das características estruturais e comportamentais do mercado, além das condições de demanda, essa redução dos custos será repassada aos preços finais, concorrendo para o arrefecimento da inflação.

BANCOS PÚBLICOS, CRÉDITO DIRECIONADO E POLÍTICA MONETÁRIA

A existência da segmentação do crédito entre crédito livre e direcionado no Brasil foi apontada como causa da baixa potência da política monetária pelo canal do crédito. Segura-Ubiergo (2012Segura-Ubiergo, M. A. (2012). The puzzle of brazil’s high interest rates. Technical Report 12-62, International Monetary Fund.), por exemplo, evidencia que o nível da taxa de juros no Brasil é elevado em relação a outros países de estrutura econômica semelhantes. O autor sugere que tal nível elevado poderia se explicar pela segmentação do mercado de crédito e pela inércia inflacionária.

Em artigo que inaugura este debate, Arida (2005Arida, P. (2005). Mecanismos compulsórios e mercado de capitais: propostas de política econômica. E.L. Bacha e L.C. de Oliveira Filho (Orgs), Mercado de capitais e crescimento econômico: lições internacionais, desafios brasileiros. Rio de Janeiro: Contracapa.) argumenta que a falta de densidade do mercado de capitais brasileiros não é suavizada pela existência dos bancos públicos, mas, sim, acentuada por ela. Os bancos públicos seriam responsáveis pela redução da potência da política monetária, o que dificultaria a estabilização macroeconômica. Na medida em que as taxas cobradas pelos bancos públicos são menos responsivas à taxa Selic, tomadores de crédito dos bancos públicos seriam protegidos de apertos monetários. Seus gastos sofreriam menores reduções do que no caso em que tomassem empréstimos apenas a taxas de mercado. Assim, o Banco Central deveria impor maiores aumentos da taxa básica de juros para uma dada contração de demanda, considerada necessária para conter o aumento da inflação. Barboza (2015Barboza, R. d. M. (2015). Taxa de juros e mecanismos de transmissão da política monetária no brasil. Brazilian Journal of Political Economy, 35(1):133-155.), utilizando um modelo Novo-Keynesiano, formaliza o argumento de que a menor sensibilidade à política monetária dos juros cobrados pelos bancos públicos implica uma taxa de juros de equilíbrio mais elevada.

Além de serem mantidas em um nível inferior à taxa Selic, os juros do crédito direcionado apresentam menor resposta às alterações na taxa básica de juros (Bonomo et al., 2018Bonomo, M., Brito, R., e Lazzarini, S. (2018). Crédito Direcionado e Financiamento do Desenvolvimento. In Desafios da Nação, volume 1, chapter 14, pages 629-661. IPEA.). De fato, as taxas de juros médias dos créditos livre e direcionado têm alta correlação com a taxa Selic (68% e 65%, respectivamente). Apesar disso, a correlação da Selic é menor com a TJLP, com os juros médios do BNDES e com o spread do crédito direcionado (30%, 28% e 0,03%, respectivamente). Esse resultado reflete a busca dos bancos públicos pela estabilidade das taxas de juros em setores considerados prioritários (principalmente bens de capital, habitação e agricultura).

O argumento de que o crédito direcionado reduz a potência da política monetária foi trazido à tona devido ao fortalecimento da atuação anticíclica dos bancos públicos. No período posterior à crise de 2008 (Figura 3), o governo brasileiro intensificou a atuação dos bancos públicos visando evitar que a instabilidade financeira internacional afetasse a produção doméstica (Paula et al., 2013Paula, L. F. d., Oreiro, J. L., e Basilio, F. A. (2013). Estrutura do setor bancário e o ciclo recente de expansão do crédito: o papel dos bancos públicos federais. Nova Economia, 23(3):473-520.; Barros et al., 2018Barros, L., dos Santos Silva, C. K., de Freitas Oliveira, R., et al. (2018). Presença estatal no mercado de crédito: o papel dos bancos públicos e do crédito direcionado na crise de 2008. Technical report, Banco Central do Brasil: Trabalhos para Discussão no. 488.). A despeito da intervenção ter sido bem-sucedida, sua continuidade foi criticada tão logo os efeitos iniciais da crise cessaram (Bonomo et al., 2015Bonomo, M., Brito, R. D., e Martins, B. (2015). The after crisis government-driven credit expansion in brazil: A firm level analysis. Journal of International Money and Finance, 55:111-134.; Segura-Ubiergo, 2012Segura-Ubiergo, M. A. (2012). The puzzle of brazil’s high interest rates. Technical Report 12-62, International Monetary Fund.).

Figura 3:
Saldos de crédito - bancos públicos e privados (%PIB)

Em setembro de 2017, tais críticas fundamentaram a aprovação da Medida Provisória 777, que instituiu a Taxa de Longo Prazo (TLP), em substituição da TJLP. A TJLP foi criada em 1994, quando Arida presidia o BNDES, com o objetivo de vincular os empréstimos do banco ao custo de captação de longo prazo do Governo Federal. A inexistência de títulos de dívida de longo prazo exigiu que a taxa de juros longa fosse definida pelo Conselho Monetário Nacional, o qual utilizaria a meta de inflação mais um prêmio de risco para o estabelecimento da TJLP. Como não havia uma regra clara para sua definição, a TJLP foi mantida sistematicamente em níveis inferiores à Selic.

A introdução da TLP visou eliminar a discricionariedade na determinação da taxa de longo prazo, atrelando-a ao rendimento da NTN-B. A rentabilidade da TLP é composta pela variação do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), acrescida de uma taxa de juros real prefixada. Durante os cinco anos posteriores a janeiro de 2018, o custo dos empréstimos do BNDES será calculado como uma média ponderada da TJLP e da TLP. A partir de 2023, a TLP se constituirá apenas do IPCA mais o juro real da NTN-B de cinco anos. Na prática, a alteração implica a indexação do custo dos empréstimos do BNDES aos movimentos de mercado, restringindo a discricionariedade política na determinação da taxa de longo prazo.

A literatura empírica sobre os efeitos dos bancos públicos para a potência da política monetária é limitada a estudos microeconômicos, no nível das firmas e indústrias. No principal trabalho utilizado para a fundamentação da TLP, Bonomo et al. (2016Bonomo, M., Martins, B., et al. (2016). The impact of government-driven loans in the monetary transmission mechanism: what can we learn from firm-level data? Banco Central do Brasil, Texto para discussão no, 419.) argumentam que empresas com acesso ao crédito de bancos públicos são menos afetadas pela política monetária. Ou seja, após um choque contracionista, empresas com acesso ao crédito dos bancos públicos apresentam menor redução no volume de captação de novos empréstimos e no volume de emprego. Ademais, estas empresas têm menor sensibilidade a choques externos, como a elevação do risco internacional. Corroborando tais evidências, Perdigão (2018Perdigão, B. (2018). Essays on Monetary Economics and Banking. PhD thesis, PUCRio, Rio de) mostra que há menor resposta à política monetária em setores industriais com maior parcela de crédito direcionado no crédito total.

A base de dados utilizada por Bonomo et al. (2016Bonomo, M., Martins, B., et al. (2016). The impact of government-driven loans in the monetary transmission mechanism: what can we learn from firm-level data? Banco Central do Brasil, Texto para discussão no, 419.) não permite avaliar características dos bancos emprestadores, como sua solvência, o que dificulta a identificação do canal analisado pelo trabalho. Para os autores, os efeitos identificados ocorrem por meio do crédito (Bernanke e Gertler, 1995Bernanke, B. S. e Gertler, M. (1995). Inside the black box: the credit channel of monetary policy transmission. Journal of Economic perspectives, 9(4):27-48.). A oferta de crédito público seria mais estável (em termos de custos e de prazos) do que a oferta de crédito livre, justificando a menor resposta à política monetária de empresas com acesso ao crédito público.

O principal motivo apontado por Bonomo et al. (2016Bonomo, M., Martins, B., et al. (2016). The impact of government-driven loans in the monetary transmission mechanism: what can we learn from firm-level data? Banco Central do Brasil, Texto para discussão no, 419.) para estes resultados é a falta de sensibilidade dos juros do crédito direcionado em relação à Selic. Os empréstimos direcionados não estariam inteiramente ligados aos custos de financiamento dos bancos, nem aos fundamentos financeiros dos tomadores, o que permitiria um descolamento entre a taxa cobrada e a taxa de captação. Os autores postulam que bancos públicos, por serem garantidos pelo Estado, não teriam a disciplina de mercado dos demais bancos, o que resultaria em uma má alocação de recursos (Bonomo et al., 2016Bonomo, M., Martins, B., et al. (2016). The impact of government-driven loans in the monetary transmission mechanism: what can we learn from firm-level data? Banco Central do Brasil, Texto para discussão no, 419.).

Ressaltamos que a definição de potência da política monetária é de natureza macroeconômica, e que bases de dados no nível das empresas dificilmente conseguirão captar os efeitos agregados da política monetária sobre a inflação (Kashyap e Stein, 2000Kashyap, A. K. e Stein, J. C. (2000). What do a million observations on banks say about the transmission of monetary policy? American Economic Review, 90(3):407-428.). Apesar de apresentarem evidências microeconômicas, Bonomo et al. (2016Bonomo, M., Martins, B., et al. (2016). The impact of government-driven loans in the monetary transmission mechanism: what can we learn from firm-level data? Banco Central do Brasil, Texto para discussão no, 419.) e Perdigão (2018Perdigão, B. (2018). Essays on Monetary Economics and Banking. PhD thesis, PUCRio, Rio de) não se propõe a mensurar o efeito agregado dos bancos públicos sobre o canal do crédito. Castro (2018aCastro, P. (2018a). Chapter 1: Earmarked credit and monetary policy power: micro and macro considerations. PhD thesis, PUCRio, Rio de Janeiro.) questiona a abrangência dos argumentos de Bonomo et al. (2016Bonomo, M., Martins, B., et al. (2016). The impact of government-driven loans in the monetary transmission mechanism: what can we learn from firm-level data? Banco Central do Brasil, Texto para discussão no, 419.) devido à apresentação de apenas evidências microeconômicas. A resposta de uma firma à política monetária não depende apenas de seu próprio acesso ao crédito direcionado, mas também ao acesso de todas as demais firmas. O efeito agregado seria a soma dos efeitos microeconômicos de cada firma com os efeitos externos de todas as firmas agindo simultaneamente, o que altera preços de insumos e de bens finais. Estimativas cross-section omitem os efeitos externos e, portanto, não são apropriadas para mensurar os efeitos macroeconômicos da política de crédito direcionado.

A desconsideração dos efeitos externos pode ocultar a intensificação dos enigmas dos preços pelo crédito livre. As variações positivas nos preços após choques contracionistas são fartamente documentadas na literatura (Ramey, 2016Ramey, V. A. (2016). Macroeconomic shocks and their propagation. In Handbook of Macroeconomics, volume 2, pages 71-162. Elsevier.). O enigma dos preços pode se originar de choques de oferta, devido ao aumento de custos operacionais causados pelos aumentos nas taxas de juros. Castro (2018aCastro, P. (2018a). Chapter 1: Earmarked credit and monetary policy power: micro and macro considerations. PhD thesis, PUCRio, Rio de Janeiro.) argumenta que caso haja um intervalo de tempo entre o pagamento da produção e as receitas a partir de vendas, é possível que os choques dos juros atuem pelo canal do crédito-custo (ver seção anterior). Caso as reduções na demanda agregada não resultem em reduções de preços suficientes para compensar o aumento dos custos financeiros, os choques de juros podem causar um aumento dos preços finais.

Uma vez que os juros cobrados no crédito direcionado são menos sensíveis à taxa Selic, o canal do crédito-custo é menos atuante em firmas com maior acesso ao crédito direcionado. Assim, o crédito direcionado teria um efeito dúbio para a política monetária. Por um lado, a menor volatilidade dos juros garante que o acesso ao crédito direcionado resulte em uma menor redução da produção, após choques contracionistas. Por outro lado, o acesso ao crédito direcionado reduz a intensidade dos choques de custos. Assim, o crédito direcionado pode garantir uma maior resiliência da demanda agregada e uma redução do enigma dos preços. Na ausência do crédito direcionado, após choques de política monetária a produção pode responder mais e a inflação responder menos (Castro, 2018bCastro, P. (2018b). Chapter 2: Earmarked credit, investment and monetary policy power. PhD thesis, PUCRio, Rio de Janeiro.).

Para avaliar o efeito deste canal de custos, Silva et al. (2018Silva, I. É. M., Paes, N. L., e Bezerra, J. F. (2018). Evidências de pass-through incompleto da taxa de juros, crédito direcionado e canal de custo da política monetária no brasil. Estudos Econômicos (São Paulo), 48(4):559-595.) constroem um modelo DSGE em que parte do crédito para financiar a produção é concedido por bancos públicos, cujas taxas de juros não respondem à política monetária. A existência do crédito direcionado suaviza os efeitos das taxas de juros sobre a produção e sobre a inflação. Nos efeitos sobre a inflação, o crédito direcionado ameniza tanto o enigma dos preços presente nos primeiros meses após a contração monetária, quanto a redução da inflação notada a partir do terceiro mês.

Além dos menores choques de custos, a existência dos bancos públicos poderia gerar menores reduções no estoque de capital após aumentos nas taxas de juros. Por meio da redução dos juros para o investimento, a existência da TJLP visava o aumento da participação do investimento no produto e uma redução da participação do consumo. Por este motivo, argumentou-se que manutenção da TJLP em níveis baixos afetava positivamente o produto potencial no longo prazo, ao permitir maior crescimento do estoque de capital. Por este canal, os impactos de curto prazo do crédito direcionado sobre a potência da política monetária poderiam ser compensados ao se permitir que o produto potencial se amplie, reduzindo o impacto de pressões de demanda sobre a inflação. Neste sentido, Feijó e Sousa (2012Feijó, C. e Sousa, A. (2012). A política monetária brasileira e suas recentes reespecificações: uma análise pela ótica da coordenação. In Sistema Financeiro e Política econômica em uma era de Instabilidade, volume 1, pages 132-143. Elsevier Editora.) argumentam que ao atuar do lado da oferta, bancos públicos contribuem para uma política estruturante anti-inflacionária, elevando não só a capacidade produtiva como a produtividade.3 3 Em geral, modelos Novo-Keynesianos desconsideram tal questão, por entender que no longo prazo o produto potencial é exógeno, determinado pelo progresso tecnológico e crescimento populacional. Modelos de crescimento heterodoxo consideram que a taxa de crescimento do produto é endógena à demanda, assim, a demanda corrente é relevante para a determinação do nível de oferta no longo prazo.

Quadro 1:
Literatura sobre Crédito Direcionado e Potência da Política monetária

Castro (2018bCastro, P. (2018b). Chapter 2: Earmarked credit, investment and monetary policy power. PhD thesis, PUCRio, Rio de Janeiro.) também pondera que, devido a um menor deslocamento na oferta, o direcionamento de crédito não necessariamente reduz a potência da política monetária - em termos da inflação. Para testar esta hipótese, o autor calibra com dados da economia brasileira um modelo DSGE em que o crédito direcionado financia o investimento das firmas. Com a existência do crédito direcionado, há uma redução da resposta da produção, mas que não se traduz inteiramente em uma redução na resposta da inflação. O autor relaciona tais resultados tanto a um menor deslocamento no estoque de capital e na oferta de trabalho. Assim, a redução dos efeitos da política monetária sobre o produto é maior do que aquela sobre a inflação, implicando menor taxa de sacrifício. Segundo o autor, este é um resultado positivo para a condução da política monetária, uma vez que permite obter uma mesma queda na inflação, a partir de menor queda no produto.

O Quadro 1 resume a literatura sobre o tema. A maioria dos estudos aponta uma redução dos efeitos da política monetária sobre a produção, devido à menor resposta das taxas de juros do crédito direcionado. Por outro lado, Castro (2018aCastro, P. (2018a). Chapter 1: Earmarked credit and monetary policy power: micro and macro considerations. PhD thesis, PUCRio, Rio de Janeiro.) levanta duas razões para acreditar que tais resultados não se reflitam sobre a inflação: a redução do enigma dos preços e menor variação no estoque de capital. A primeira hipótese é corroborada por Silva et al. (2018Silva, I. É. M., Paes, N. L., e Bezerra, J. F. (2018). Evidências de pass-through incompleto da taxa de juros, crédito direcionado e canal de custo da política monetária no brasil. Estudos Econômicos (São Paulo), 48(4):559-595.),4 4 Destaca-se que os autores concluem que há redução da potência da política monetária, pois tanto o enigma dos preços nos meses iniciais quanto a queda posterior na inflação seriam amenizados pela existência do crédito direcionado (Silva et al., 2018). enquanto a segunda havia sido apresentada também por Modenesi e Modenesi (2012Modenesi, A. d. M. e Modenesi, R. L. (2012). Quinze anos de rigidez monetária no brasil pós-plano real: uma agenda de pesquisa. Brazilian Journal of Political Economy , 32(3):389-411.) e Feijó e Sousa (2012Feijó, C. e Sousa, A. (2012). A política monetária brasileira e suas recentes reespecificações: uma análise pela ótica da coordenação. In Sistema Financeiro e Política econômica em uma era de Instabilidade, volume 1, pages 132-143. Elsevier Editora.).

MODELO ECONOMÉTRICO

Projeções Locais

A metodologia mais usada para avaliar a política monetária consiste na estimação de modelos VAR. Visando evitar os vieses decorrentes de más especificações em modelos VAR, Jordà (2005Jordà, O. (2005). Estimation and inference of impulse responses by local projections. American economic review, 95(1):161-182.) propôs a utilização de projeções locais. As projeções locais realizam previsões diretas a partir de uma regressão específica para cada horizonte de tempo. Num contexto de modelos de previsão, a diferença entre as projeções locais e o VAR é análoga àquela entre modelos de previsão direta e modelos de previsão iterada. Pode-se prever valores de uma variável utilizando tanto uma regressão por horizonte específico (previsão direta) ou iterar um passo à frente em um modelo já estimado (previsão iterada) (Ramey, 2016Ramey, V. A. (2016). Macroeconomic shocks and their propagation. In Handbook of Macroeconomics, volume 2, pages 71-162. Elsevier., p.84).

As projeções locais podem ser utilizadas para a mensuração dos efeitos da política monetária em função de diversos regimes econômicos. Por exemplo, Tenreyro e Thwaites (2016Tenreyro, S. e Thwaites, G. (2016). Pushing on a string: US monetary policy is less powerful in recessions. American Economic Journal: Macroeconomics, 8(4):43-74.) encontram que os choques de política monetária não têm efeito sobre a produção quando a economia está em recessão. Pode-se também avaliar os efeitos da política monetária entre diferentes regimes de crédito (Alpanda e Zubairy, 2018Alpanda, S. e Zubairy, S. (2018). Household debt overhang and transmission of monetary policy. Journal of Money, Credit and Banking, 135(1-2):499-526.; Jordà et al., 2020Jordà, Ò., Schularick, M., e Taylor, A. M. (2020). The effects of quasi-random monetary experiments. Journal of Monetary Economics.). Com base nessa metodologia, comparamos os efeitos da política monetária em regimes de alto crédito dos bancos públicos com os regimes de alto crédito dos bancos privados.

As estimativas deste trabalho incluem variáveis de produção, inflação e taxa de juros, além da variável de estado de saldo dos créditos públicos e privados. A Inflação é medida pelo IPCA, calculado pelo IBGE. O Produto Interno Bruto é calculado pela série de valores encadeados a preços de 1995 da FGV. Como variável de política monetária, utilizamos a taxa Selic (anualizada). Para as variáveis de estado, usamos os Saldos das Operações de Crédito das Instituições Financeiras sob Controle Público e sobre Controle Privado, divulgadas pelo Banco Central. As principais estimações realizadas são feitas para o período entre janeiro de 2000 e julho de 2018, resultando em 223 observações mensais. O início em janeiro de 2000 é justificado pela disponibilidade dos dados do PIB. Como o RMI de inflação fora adotado em junho de 1999, a amostra deste trabalho abarca todo o período do RMI, com exceção dos seis meses iniciais, devido à indisponibilidade de dados mensais do PIB para o período.

Resultados

Para comparar as estimativas entre as estimativas dos ciclos de crédito dos bancos públicos com as estimativas dos bancos privados, calculamos multiplicadores acumulados das funções impulso-resposta. Estes multiplicadores são calculados como a razão da resposta média do PIB e da inflação pela resposta média das taxas de juros. A normalização pela taxa de juros remove as diferenças entre estados que possam se originar de diferenças na trajetória das taxas de juros em cada estado.

Podemos entender os multiplicadores como a variação média necessária do produto (ou da inflação) para obter as funções impulso-resposta.5 5 Mais detalhes no Apêndice. O multiplicador nos fornece, assim, a percentagem de variação acumulada do produto (ou os pontos percentuais, no caso da inflação), dado um choque de 1 ponto percentual na Selic, em valores mensalizados. Os valores da Tabela 1 podem ser interpretados como o quanto o produto (ou a inflação) mudam em porcentagem (pontos percentuais) em média ao longo dos 15 meses após um choque inicial de política monetária.

Tabela 1:
Multiplicadores da Política Monetária - razão das respostas do PIB e do IPCA pela resposta da Selic

No caso da inflação, nota-se expressiva diferença das respostas nos ciclos de alto e de baixo crédito, para ambas as variáveis de estado, mas as diferenças têm sentido contrário. No período de alto crédito público, um aumento de 1 ponto percentual na taxa de juros reduz em 0,05 pontos percentuais a taxa de inflação, no período de 15 meses. Os multiplicadores negativos só ocorrem nos períodos de alto crédito público e de baixo crédito privado, com o efeito mais relevante neste último. Por sua vez, nos regimes de alto crédito privado e baixo crédito público o enigma dos preços permanece durante todo o período.

A resposta do produto, confirma a hipótese de que períodos de alto crédito dos bancos públicos apresentam maior resiliência à política monetária do que os períodos de alto crédito dos bancos privados. Atribuímos tal resultado à maior resposta das taxas de juros dos bancos privados às taxas de juros básicas. Tais resultados corroboram, para a produção agregada, as hipóteses testadas em Bonomo et al. (2016Bonomo, M., Martins, B., et al. (2016). The impact of government-driven loans in the monetary transmission mechanism: what can we learn from firm-level data? Banco Central do Brasil, Texto para discussão no, 419.) e Perdigão (2018Perdigão, B. (2018). Essays on Monetary Economics and Banking. PhD thesis, PUCRio, Rio de).

A Tabela 1 revela uma dinâmica divergente entre inflação e produto nos períodos de alto e de baixo crédito. A queda mais acentuada da produção não se reflete necessariamente em uma queda mais acentuada da inflação, como se esperaria. O maior efeito negativo das taxas de juros sobre a inflação ocorreu nos períodos de baixo crédito privado, o mesmo período com a menor queda no produto. Por outro lado, no período de alto crédito privado, a maior resposta do produto, foi acompanhada por persistente enigma dos preços.

Tal resposta divergente entre inflação e produto é explicada pelo enigma dos preços. Modelos que aplicam a teoria do acelerador financeiro de Bernanke e Gertler (1995Bernanke, B. S. e Gertler, M. (1995). Inside the black box: the credit channel of monetary policy transmission. Journal of Economic perspectives, 9(4):27-48.) não são capazes de explicar tal enigma. Para compreender os resultados aqui apresentados é necessária a inclusão dos canais de custo da política monetária, levados em conta nas análises heterodoxas (Martins et al., 2017Martins, N. M., Pires-Alves, C. C., Modenesi, A. D. M., & Leite, K. V. B. D. S. (2017). The transmission mechanism of monetary policy: Microeconomic aspects of macroeconomic issues. Journal of Post Keynesian Economics, 40(3), 300-326.).

Para corroborar nossos resultados, realizamos testes de robustez que consideram: critérios alternativos de seleção de defasagens; maior suavização nos regimes de crédito; exclusão de períodos recessivos; inclusão de variáveis de economia aberta; e variáveis de estado alternativas (considerando os estoques de crédito livre e direcionado).

Os resultados para a inflação são menos robustos às diferentes especificações, mas concluímos que nos períodos de alto crédito há maior probabilidade de enigma dos preços. Os enigmas dos preços são consideravelmente persistentes nos períodos de alto crédito privado. Os períodos de alto crédito público apresentaram relevantes enigma dos preços iniciais, mas que reduziram mais rapidamente que aqueles em períodos de alto crédito privado. Os períodos de alto crédito privado apresentaram também as maiores reduções do produto, após aumentos dos juros. Por sua vez, os períodos de baixo crédito privado apresentam comportamento mais próximo daquele esperado por modelos do Novo Consenso, com respostas negativas do produto e inflação.

CONCLUSÃO

Nossos resultados são sumariados no Quadro 2, a saber: 1) os períodos de alto crédito dos bancos públicos apresentam enigma dos preços menor e menos persistente. Isto é, a potência da política monetária é maior; e 2) Durante os períodos de alto crédito dos bancos públicos o controle da inflação está associado a uma menor queda do PIB. Ou seja, a taxa de sacrifício da política monetária é menor nos períodos em que os bancos públicos são mais atuantes do que nos períodos de alto crédito dos bancos privados. Dito de outra forma, o efeito (baixista sobre a inflação) acumulado de uma alta da Selic é mais intenso nos momentos de alto crédito dos bancos públicos. Além disso, a queda acumulada do PIB, resultante da elevação da Selic, é menor quando os bancos públicos emprestam mais.

Quadro 2:
Síntese dos Resultados para períodos de alto crédito

Em suma, a hipótese de que os bancos públicos diminuem a potência da política monetária não é corroborada pela evidência empírica. Antes pelo contrário, os bancos públicos não só tornam a política monetária mais eficaz, como também, reduzem o custo do combate à inflação.

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    Esse fenômeno também foi identificado para a economia brasileira, por exemplo, por Luporini (2007Luporini, V. (2007), “The monetary transmission mechanism in Brazil: evidence from a VAR analysis”. Estudos Econômicos, 28 (1), pp. 7-30) e Modenesi e Araújo (2013Modenesi, A.M. e Araújo, E. (2013). “Price Stability under Inflation Targeting in Brazil: an empirical analysis of the monetary policy transmission mechanism based on a VAR model (2000-2008)”. Investigación Económica.).
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    Partindo dessa premissa, Christiano et al. (1996Christiano, L. J., Eichenbaum, M., & Evans, C. L. (1996). Identification and the effects of monetary policy shocks. Financial factors in economic stabilization and growth, 36.) e Sims e Zha (1998Sims, C. e Zha, T. (1998), “Does monetary policy generate recessions?”. Federal Reserve Bank of Atlanta, Working Paper 12) “eliminam” o enigma dos preços com a introdução de um índice de preço de commodities.
  • 3
    Em geral, modelos Novo-Keynesianos desconsideram tal questão, por entender que no longo prazo o produto potencial é exógeno, determinado pelo progresso tecnológico e crescimento populacional. Modelos de crescimento heterodoxo consideram que a taxa de crescimento do produto é endógena à demanda, assim, a demanda corrente é relevante para a determinação do nível de oferta no longo prazo.
  • 4
    Destaca-se que os autores concluem que há redução da potência da política monetária, pois tanto o enigma dos preços nos meses iniciais quanto a queda posterior na inflação seriam amenizados pela existência do crédito direcionado (Silva et al., 2018Silva, I. É. M., Paes, N. L., e Bezerra, J. F. (2018). Evidências de pass-through incompleto da taxa de juros, crédito direcionado e canal de custo da política monetária no brasil. Estudos Econômicos (São Paulo), 48(4):559-595.).
  • 5
    Mais detalhes no Apêndice APÊNDICE PROJEÇÕES LOCAIS As estimações são realizadas com o pacote lpirfs, implementado em R por Adämmer (2018). Neste software, as projeções locais dependentes do estado são computadas com a especificação: y t + h i = F z t - 1 β h a c h o q u e t + θ h a x t + 1 - F z t - 1 β h b c h o q u e t + θ h b x t + u t (1) Os coeficientes βh estimam o efeito médio de um choque sobre a variável yi no horizonte h. O coeficiente βh depende do regime da economia (a ou b), definido pela função F(zt). O vetor xt inclui as variáveis de controle utilizadas. A função F(zt) retorna uma definição de regimes que representa a probabilidade da economia se encontrar em um estado de alto ou baixo crédito. VARIÁVEIS DE ESTADO Os regimes de crédito são identificados seguindo a literatura financeira sobre o “hiato de crédito” (Drehmann e Tsatsaronis, 2014). Os regimes de alto crédito são definidos como aqueles em que o saldo de crédito em razão do PIB é maior que sua tendência de longo prazo. Deste modo, a diferença entre o Crédito/PIB e sua tendência é utilizada para diferenciar os regimes nas projeções locais, constituindo a série zt na Equação 1. ESTIMAÇÕES: REGIMES DE CRÉDITO DOS BANCOS PÚBLICOS Adotamos o pressuposto da recursividade para a identificação do choque, o que implica o ordenamento: produto, inflação e juros. Utilizamos 12 defasagens, tal qual recomendado pelo critério AIC. Adicionalmente, acrescentamos uma dummy mensal, para impedir que os efeitos capturados reflitam sazonalidades. A Figura A.1 apresenta as estimações básicas utilizando a variável de estado de saldo dos bancos públicos. A primeira coluna apresenta as estimações das funções impulso-resposta a um choque de um desvio padrão da Selic, sobre o IPCA e o Produto. O estado de alto crédito é marcado pela linha preta sólida e o estado de baixo crédito pela linha vermelha pontilhada. Os intervalos de confiança (95%) para alto e baixo crédito estão respectivamente representados pelas linhas finas sólidas e pela área sombreada. A resposta da Inflação apresenta um marcante enigma dos preços até o quinto mês. Este enigma dos preços é mais relevante no período de alto crédito de que baixo crédito. A partir do sexto mês a política monetária passa a ter efeito negativo significativo sobre a inflação no regime de alto crédito, que mantêm até o 15º mês. Já no regime de baixo crédito, a política monetária não tem efeito negativo significativo sobre os preços. Neste regime, após o 6º mês o choque permanece não significativo em praticamente todos os períodos. Nota-se que a política monetária só teve efeitos significativos sobre a inflação nos períodos em que havia alto saldo de crédito dos bancos públicos. Os efeitos sobre o PIB são consonantes com a hipótese de que no período de maior endividamento os efeitos da política monetária são mais fortes. O efeito negativo sobre o produto ocorre desde o primeiro mês e se intensifica nos meses seguintes. Até o oitavo mês, as trajetórias do alto e baixo crédito se mantêm próximas. A partir daí, nota-se maior distanciamento entre as duas estimativas, com o produto tendo perdas maiores no estado de alto crédito. Nota-se que os efeitos sobre o produto não se dissipam até o 15º mês. Efeitos da política monetária em períodos maiores que dois anos também são notados por Jordà et al. (2019); Tenreyro e Thwaites (2016). É interessante ressaltar que, para as três variáveis, o regime de alto crédito tem intervalos de confiança maiores que o de baixo crédito. Isso reflete o fato de que, além de efeitos mais intensos, no regime de alto crédito os efeitos são menos previsíveis. A segunda coluna da Figura A.1 apresenta a estatística T para a hipótese nula de que (βha−βhb) = 0, com a área de ± 1,96, sombreada, representando o intervalo de confiança.6 Ou seja, testa-se a hipótese de não há diferença entre as respostas no estado de alto e de baixo crédito. Os resultados indicam que a diferença entre os dois regimes é significativa para o enigma dos preços inicial e para a maior queda da inflação a partir do 7º mês. Para o produto, o período de alto crédito tem efeitos mais significativos nos primeiros meses após o choque e nos meses posteriores ao 11º. A terceira coluna da Figura A.1 apresenta o resultado acumulado das funções impulso-resposta, calculado pelo somatório de todos choques até certo horizonte h. Para a inflação, nota-se que o efeito líquido negativo só se torna relevante após o 12o mês do regime de alto crédito. Para o produto, destaca-se que a trajetória dos dois regimes é próxima, até o oitavo mês, quando a política monetária passa a ter efeitos crescentemente maiores no regime de alto crédito. ESTIMAÇÕES: REGIMES DE CRÉDITO DOS BANCOS PRIVADOS Repetimos as estimativas acima apresentadas utilizando como variável de estado os regimes de crédito dos bancos privados. A Figura A.2 apresenta os resultados básicos para um choque de um desvio-padrão na Selic sobre as três variáveis de interesse, condicionados aos ciclos de saldo de crédito dos Bancos Privados. A resposta da inflação apresenta um resultado paradoxal, de um enigma dos preços duradouro nos períodos de alto crédito. Um enigma dos preços semelhante nos dois estados é notado até o 6º mês. A partir de então, nota-se um efeito contrário àquele percebido no ciclo de crédito dos bancos públicos: os períodos de baixo crédito privado apresentam uma resposta negativa da inflação e os períodos de alto crédito apresentam uma resposta positiva. O produto é significativamente mais responsivo no período de alto crédito. Na segunda coluna da Figura A.2, notamos que as diferenças apontadas entre os estados são significativas. Em especial, é significativo o maior enigma dos preços e a maior queda do Produto nos períodos de alto crédito privado. Os efeitos se explicitam também nos gráficos acumulados da terceira coluna. Se nota a reversão da inflação apenas após o 13º mês, a grande diferença acumulada na resposta do Produto, com a diferença que no período de baixo crédito a estabilização já se nota no 12º mês. Figura A.1: Estimação Básica com o Filtro de Bancos Públicos Figura A.2: Estimação Básica com o Filtro de Bancos Privados Nota: A primeira coluna mostra as funções impulso-resposta nos estados de alto crédito (preto sólido) e baixo crédito (cinza tracejado), os respectivos intervalos de confiança (95%) estão representados pela linha sólida e pela área sombreada. A segunda coluna apresenta a as estatísticas T para a hipótese de que a diferença entre os coeficientes nos dois estados é igual a 0, a área sombreada marca o intervalo de ±1,96. A terceira coluna apresenta a função impulso-resposta acumulativa para o estado de alto crédito (sólido) e baixo crédito (pontilhado). .
  • 6
    As estatísticas t são calculadas a partir dos desvios-padrão extraídos da matriz de Newey-West, portanto, robustos à autocorrelação nos resíduos. Para o teste, utilizamos a fórmula frm01, valendo-nos da hipótese forte de que a covariância entre os dois estimadores é desprezível.
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    JEL Classification: E5; E51; E58; E63.
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    Os autores agradecem os comentários de Carmem Feijó e de Fernanda Feil, isentando-as, como de praxe, de eventuais erros e omissões.

APÊNDICE

PROJEÇÕES LOCAIS

As estimações são realizadas com o pacote lpirfs, implementado em R por Adämmer (2018Adämmer, P. (2018). lpirfs: Local Projections Impulse Response Functions. R package version: 0.1.3.). Neste software, as projeções locais dependentes do estado são computadas com a especificação:

y t + h i = F z t - 1 β h a c h o q u e t + θ h a x t + 1 - F z t - 1 β h b c h o q u e t + θ h b x t + u t (1)

Os coeficientes βh estimam o efeito médio de um choque sobre a variável yi no horizonte h. O coeficiente βh depende do regime da economia (a ou b), definido pela função F(zt). O vetor xt inclui as variáveis de controle utilizadas. A função F(zt) retorna uma definição de regimes que representa a probabilidade da economia se encontrar em um estado de alto ou baixo crédito.

VARIÁVEIS DE ESTADO

Os regimes de crédito são identificados seguindo a literatura financeira sobre o “hiato de crédito” (Drehmann e Tsatsaronis, 2014Drehmann, M. e Tsatsaronis, K. (2014). The credit-to-gdp gap and countercyclical capital buffers: questions and answers. BIS Quartely Review.). Os regimes de alto crédito são definidos como aqueles em que o saldo de crédito em razão do PIB é maior que sua tendência de longo prazo. Deste modo, a diferença entre o Crédito/PIB e sua tendência é utilizada para diferenciar os regimes nas projeções locais, constituindo a série zt na Equação 1.

ESTIMAÇÕES: REGIMES DE CRÉDITO DOS BANCOS PÚBLICOS

Adotamos o pressuposto da recursividade para a identificação do choque, o que implica o ordenamento: produto, inflação e juros. Utilizamos 12 defasagens, tal qual recomendado pelo critério AIC. Adicionalmente, acrescentamos uma dummy mensal, para impedir que os efeitos capturados reflitam sazonalidades.

A Figura A.1 apresenta as estimações básicas utilizando a variável de estado de saldo dos bancos públicos. A primeira coluna apresenta as estimações das funções impulso-resposta a um choque de um desvio padrão da Selic, sobre o IPCA e o Produto. O estado de alto crédito é marcado pela linha preta sólida e o estado de baixo crédito pela linha vermelha pontilhada. Os intervalos de confiança (95%) para alto e baixo crédito estão respectivamente representados pelas linhas finas sólidas e pela área sombreada.

A resposta da Inflação apresenta um marcante enigma dos preços até o quinto mês. Este enigma dos preços é mais relevante no período de alto crédito de que baixo crédito. A partir do sexto mês a política monetária passa a ter efeito negativo significativo sobre a inflação no regime de alto crédito, que mantêm até o 15º mês. Já no regime de baixo crédito, a política monetária não tem efeito negativo significativo sobre os preços. Neste regime, após o 6º mês o choque permanece não significativo em praticamente todos os períodos. Nota-se que a política monetária só teve efeitos significativos sobre a inflação nos períodos em que havia alto saldo de crédito dos bancos públicos.

Os efeitos sobre o PIB são consonantes com a hipótese de que no período de maior endividamento os efeitos da política monetária são mais fortes. O efeito negativo sobre o produto ocorre desde o primeiro mês e se intensifica nos meses seguintes. Até o oitavo mês, as trajetórias do alto e baixo crédito se mantêm próximas. A partir daí, nota-se maior distanciamento entre as duas estimativas, com o produto tendo perdas maiores no estado de alto crédito. Nota-se que os efeitos sobre o produto não se dissipam até o 15º mês. Efeitos da política monetária em períodos maiores que dois anos também são notados por Jordà et al. (2019); Tenreyro e Thwaites (2016).

É interessante ressaltar que, para as três variáveis, o regime de alto crédito tem intervalos de confiança maiores que o de baixo crédito. Isso reflete o fato de que, além de efeitos mais intensos, no regime de alto crédito os efeitos são menos previsíveis.

A segunda coluna da Figura A.1 apresenta a estatística T para a hipótese nula de que (βha−βhb) = 0, com a área de ± 1,96, sombreada, representando o intervalo de confiança.6 6 As estatísticas t são calculadas a partir dos desvios-padrão extraídos da matriz de Newey-West, portanto, robustos à autocorrelação nos resíduos. Para o teste, utilizamos a fórmula frm01, valendo-nos da hipótese forte de que a covariância entre os dois estimadores é desprezível. Ou seja, testa-se a hipótese de não há diferença entre as respostas no estado de alto e de baixo crédito. Os resultados indicam que a diferença entre os dois regimes é significativa para o enigma dos preços inicial e para a maior queda da inflação a partir do 7º mês. Para o produto, o período de alto crédito tem efeitos mais significativos nos primeiros meses após o choque e nos meses posteriores ao 11º.

A terceira coluna da Figura A.1 apresenta o resultado acumulado das funções impulso-resposta, calculado pelo somatório de todos choques até certo horizonte h. Para a inflação, nota-se que o efeito líquido negativo só se torna relevante após o 12o mês do regime de alto crédito. Para o produto, destaca-se que a trajetória dos dois regimes é próxima, até o oitavo mês, quando a política monetária passa a ter efeitos crescentemente maiores no regime de alto crédito.

ESTIMAÇÕES: REGIMES DE CRÉDITO DOS BANCOS PRIVADOS

Repetimos as estimativas acima apresentadas utilizando como variável de estado os regimes de crédito dos bancos privados. A Figura A.2 apresenta os resultados básicos para um choque de um desvio-padrão na Selic sobre as três variáveis de interesse, condicionados aos ciclos de saldo de crédito dos Bancos Privados. A resposta da inflação apresenta um resultado paradoxal, de um enigma dos preços duradouro nos períodos de alto crédito. Um enigma dos preços semelhante nos dois estados é notado até o 6º mês. A partir de então, nota-se um efeito contrário àquele percebido no ciclo de crédito dos bancos públicos: os períodos de baixo crédito privado apresentam uma resposta negativa da inflação e os períodos de alto crédito apresentam uma resposta positiva. O produto é significativamente mais responsivo no período de alto crédito.

Na segunda coluna da Figura A.2, notamos que as diferenças apontadas entre os estados são significativas. Em especial, é significativo o maior enigma dos preços e a maior queda do Produto nos períodos de alto crédito privado. Os efeitos se explicitam também nos gráficos acumulados da terceira coluna. Se nota a reversão da inflação apenas após o 13º mês, a grande diferença acumulada na resposta do Produto, com a diferença que no período de baixo crédito a estabilização já se nota no 12º mês.

Figura A.1:
Estimação Básica com o Filtro de Bancos Públicos

Figura A.2:
Estimação Básica com o Filtro de Bancos Privados

Nota: A primeira coluna mostra as funções impulso-resposta nos estados de alto crédito (preto sólido) e baixo crédito (cinza tracejado), os respectivos intervalos de confiança (95%) estão representados pela linha sólida e pela área sombreada. A segunda coluna apresenta a as estatísticas T para a hipótese de que a diferença entre os coeficientes nos dois estados é igual a 0, a área sombreada marca o intervalo de ±1,96. A terceira coluna apresenta a função impulso-resposta acumulativa para o estado de alto crédito (sólido) e baixo crédito (pontilhado).


Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    12 Ago 2022
  • Data do Fascículo
    Jul-Sep 2022

Histórico

  • Recebido
    26 Jan 2021
  • Aceito
    12 Jul 2021
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