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Sobre o status metafísico das cores

The metaphysical status of colors

Resumo:

Neste artigo, pretende-se desenvolver uma concepção sobre as cores como parte de uma visão cética do mundo. Para isso, investiga-se como alguns dos principais céticos, ao longo da história da filosofia, conceberam as cores, seja em relação a outras qualidades sensíveis, seja em relação ao objeto físico. Depois, à luz do debate entre Barry Stroud e John McDowell, descreve-se aquela que parece ser a concepção comum das cores, sustentando-se que o cético não apenas aceita que os objetos são coloridos, mas que ele pode saber qual é a sua cor, por meio da percepção.

Palavras-chave:
Qualidade secundária; Qualidade primária; Metafísica; Visão cética do mundo; Dogmatismo; Percepção

Abstract:

My intention, in this paper, is to elaborate a conception of colors as part of a skeptical view of the world. In order to do that, I examine how some of the major skeptics throughout the history of philosophy conceived colors, in relation both to other sensible qualities and to the physical object. Next, in the light of the exchange between Barry Stroud and John McDowell, I describe what seems to me to be the common conception of color, which the skeptic not only accepts, but goes even further claiming that he may know the color of objects through sense-perception.

Keywords:
Secondary qualities; Primary qualities; Metaphysics; Skeptical view of the world; Dogmatism; Perception

1 Suspensão do juízo e visão cética do mundo2 2 Agradeço a André Vasques Abreu, Israel Vilas Bôas, Oscar Moreira dos Santos e, especialmente, a Raquel Albieri Krempel, cujos comentários e sugestões me ajudaram a corrigir e reformular uma versão prévia deste artigo, evitando alguns erros e tornando algumas ideias mais precisas. Agradeço também ao parecerista, cujos comentários úteis e cuidadosos me levaram a reformular diversas passagens.

Os céticos foram vistos como críticos da metafísica. Contudo, historicamente, eles combateram o dogmatismo, não a metafísica. É comum confundir os termos “metafísica” e “dogmatismo”. A palavra “metafísica” adquiriu muitos sentidos diferentes, ao longo dos séculos, mas um de seus principais sentidos, hoje, é o de que a “metafísica” é uma área da filosofia: ao lado da ética, da política, da estética, da epistemologia etc., haveria um domínio específico que seria a “metafísica”. Enquanto, por exemplo, a epistemologia trata do conhecimento e a ética do bem e do mal, a metafísica trataria da realidade. Todavia, o dogmatismo é um tipo de reflexão que pretende transcender o domínio da experiência, de modo que uma teoria dogmática se diferencia radicalmente de uma teoria científica. Com efeito, Sexto define “dogma” como “[...] assentimento a uma proposição não-evidente (adelon)” (2000SEXTO EMPÍRICO. Outlines of Pyrrhonism. Tradução, introdução e notas de J. Annas e J. Barnes. Cambridge: Cambridge University Press, 2000., 1.16) e Hume condena às chamas todo livro que não tratar de matemática ou não contiver “[...] raciocínios experimentais sobre questão de fato ou existência.” (1985HUME, D. An enquiry concerning human understanding. Oxford: Clarendon, 1985., 12.iii.132, p. 165).

Mas é preciso manter essas duas expressões separadas. Neste artigo, usarei “metafísica” no sentido de uma área específica da filosofia, aquela que se ocupa em saber como é a realidade e, por “dogmatismo”, entenderei um tipo de teoria que envolve de maneira crucial a aceitação de entidades naturalmente não observáveis, isto é, que não podem nunca ser observadas, ou um discurso explicativo não submetido a um controle empírico. Assim, em qualquer investigação filosófica, um filósofo pode ser dogmático ou cético: dogmático, quando aceita entidades controversas e que não fazem parte da experiência do mundo; ou cético, quando suspende o juízo a respeito delas, mas pode aceitar explicações empíricas sobre o mundo em que vivemos e que percebemos (neste caso, entidades aceitas pelas teorias científicas, na medida em que são passíveis de controle empírico, podem ser aceitáveis para o cético). Como veremos, suspender o juízo sobre entidades não empíricas e controversas não impede o filósofo cético de ter crenças, e até conhecimento, sobre as coisas que fazem parte de nossa experiência do mundo. Convém insistir nessa ideia, porque ela diverge da ideia de ceticismo que boa parte dos filósofos tem.

Os céticos investigam questões filosóficas tanto quanto os dogmáticos. Sexto destaca que estes pretendem ter encontrado a resposta correta, enquanto aqueles não têm nenhuma resposta a oferecer e continuam investigando (2000SEXTO EMPÍRICO. Outlines of Pyrrhonism. Tradução, introdução e notas de J. Annas e J. Barnes. Cambridge: Cambridge University Press, 2000., 1.1-4). Mas essa posição inicial de Sexto precisa ser mais bem explicada, porque há ao menos dois tipos de investigação. A investigação filosófica, tal como praticada pelos dogmáticos, concerne a algo obscuro ou não evidente (na terminologia estoica que Sexto utiliza). Na medida em que é controverso (diferentes dogmáticos dão diferentes respostas), um assunto é obscuro ou “não evidente”. Porém, há investigações que lidam com as coisas manifestas, claras e evidentes e que, enquanto tais, não suscitam controvérsia. Essas investigações são empíricas, visto que lidam com aquilo que se revela na experiência. Os dogmáticos, para estabelecer a verdade de uma tese sobre o não evidente, pretende transcender o domínio da experiência. Teses sobre as coisas obscuras só podem ser estabelecidas, segundo os próprios dogmáticos, com argumentos não empíricos. A suspensão cética do juízo só diz respeito a essa pretensão dogmática de transcender a experiência por meio de um discurso argumentativo. Quando se tem essa pretensão, os céticos lembram que há argumentos para teses opostas e, assim, a investigação não chegou a um consenso.

Isso vale, por exemplo, para a epistemologia e para a ética. Os céticos investigam os principais tópicos em cada uma dessas áreas da filosofia e não chegam a nenhum veredito, não defendendo nenhuma teoria do conhecimento, em particular, nem advogando uma doutrina sobre valores morais como objetivos ou subjetivos. Isso não os impede, contudo, não somente de ter conhecimentos empíricos em sua vida cotidiana ou de sustentar valores que digam respeito à sua prática, como também podem ter uma concepção filosófica do conhecimento ou dos valores morais, desde que não envolva “coisas não evidentes” ou um saber não empírico. A meu ver, um cético pode ter uma teoria empirista ou naturalista do conhecimento, desde que essa teoria fosse construída empiricamente e se sujeitasse aos resultados empíricos e científicos.

O que vale para a epistemologia e para a ética também vale para a metafísica. O cético não aceita nenhuma teoria dogmática sobre uma realidade obscura, porque controversa, e, no entanto, pode ter uma concepção sobre o mundo, quais coisas existem (pessoas, rios, pedras) e quais são imaginárias (bruxas, formas platônicas e os átomos de Demócrito), pois, em nossa experiência do mundo, traçamos essa distinção. O dogmático, entretanto, transforma essa distinção comum entre a realidade e a aparência numa distinção dogmática. Qual a diferença? Primeiro, a diferença reside nos objetos que caem em cada lado da distinção: o que, na distinção comum, é um objeto real (um livro), na distinção filosófica, é considerado uma aparência. De fato, todos os objetos reais, segundo a nossa distinção comum, passam a ser vistos como meras aparências e, no melhor dos casos, indícios da “verdadeira” realidade.

Isso leva a uma segunda diferença entre a distinção comum e a dogmática. O próprio conceito de realidade parece mudar, embora talvez seja difícil explicar essa mudança. É certo que, para as duas distinções, toda realidade é independente do que percebemos ou pensamos; se não fosse independente, não diríamos se tratar de uma realidade. Enquanto, na distinção comum, o que percebemos ou concebemos é independente de nós, para o filósofo dogmático, contudo, é algo dependente. Assim, o dogmático parece dar um passo a mais: além de ser independente, a realidade também seria, por assim dizer, absoluta. Então, para deixar clara a diferença entre a concepção comum e a concepção dogmática, seria conveniente usar a expressão “realidade absoluta” para a última, falando só da “realidade”, quando se tratar da concepção comum. Os dogmáticos exigem que, além da experiência, seria preciso de um argumento que demonstrasse que as coisas são realmente como as percebemos, ao passo que os céticos aceitam, como todo mundo, que a experiência basta para estabelecer a realidade de alguma coisa.

A essa concepção empírica e não dogmática do mundo, Porchat (2007PORCHAT, O. Rumo ao ceticismo. São Paulo: Editora da Unesp, 2007., p. 136) deu o nome de “visão cética do mundo”, embora, por prudência, tenha se recusado a chamá-la de “metafísica” (2007, p. 137). Porém, tendo esclarecido o significado em que uso “metafísica”, não vejo por que não a caracterizar como tal. Parte importante da visão cética do mundo depende de uma compreensão de como nós concebemos o mundo, em nossa vida cotidiana (SMITH, 2017SMITH, P. J. Uma visão cética do mundo: Porchat e a filosofia. São Paulo Editora da Unesp, 2017., p. 159-196; 2020SMITH, P. J. A experiência do cético. São Paulo: Scientiae Studia, 2020., p 162-171). Não vejo como começar uma investigação filosófica sem aceitar a nossa visão cotidiana do mundo. É preciso partir de algum lugar, e esse lugar não pode ser a suposição de alguma teoria filosófica, ou mesmo científica, porque isso seria arbitrário, ou dependeria da aceitação prévia da visão comum do mundo. Se, no final dessa investigação filosófica, acabamos por nos tornar céticos, isso se deve, ao menos em parte, por não termos aceitado as teorias dogmáticas que fatalmente envolvem uma reformulação de nossa visão inicial. Portanto, sem termos razões filosóficas para abandonarmos as crenças de que partimos, a filosofia “[...] deixa tudo como está.” (WITTGENSTEIN, 2009WITTGENSTEIN, W. Philosophical investigations. Tradução de G. E. M. Anscombe, P. M. S. Hacker e J. Schulte. Revisão da quarta edição P. M. S. Hacker e J. Schulte. Oxford: Wiley-Blackwell, 2009., p. 124).

Não é claro, no entanto, como descrever essa visão comum do mundo que compartilhamos na vida cotidiana. Neste artigo, eu gostaria de investigar um tópico específico, para tentar descrever um aspecto certamente secundário, mas ainda assim relevante, da nossa visão comum do mundo e, dessa maneira, começar a elaborar uma parte da visão cética do mundo. A questão a ser investigada é: numa metafísica cética, qual o status das cores? Eis, a meu ver, uma questão filosófica instigante que um cético contemporâneo, isto é, o neopirrônico, pode responder positivamente, mesmo que suspenda o juízo sobre as respostas dogmáticas.

Todavia, no cenário contemporâneo, o ceticismo é visto, com frequência, como uma doutrina negativa ou uma forma de dogmatismo negativo, isto é, como a tese de que não temos conhecimento ou de que não sabemos nada. Essa concepção do ceticismo (a meu ver, equivocada) favorece uma determinada posição na questão das cores. Para um cético contemporâneo, poder-se-ia pensar, as cores são meras sensações subjetivas, e não propriedades objetivas das coisas materiais ou objetos físicos, como mesas, livros, frutas e árvores. Uma maçã não seria vermelha, mas o vermelho seria uma característica fenomênica da nossa sensação, ao perceber a maçã; uma flor não seria amarela, mas teria a disposição de produzir em nós a sensação do amarelo. Afirmar que as coisas materiais ou objetos físicos têm uma determinada propriedade (por exemplo, essa ou aquela cor) seria comprometer-se com um dogmatismo inaceitável para um cético, porque implicaria uma crença sobre como as coisas são, no mundo à nossa volta.

Talvez se pudesse mesmo dizer que essa foi, desde sempre, a opinião de todos os céticos. Os céticos antigos admitiriam que as coisas aparecem de tal ou tal cor para nós, porém, isso seria admitir somente que é em relação a nós que elas aparecem com essa ou aquela cor, mas, sobre se as coisas têm realmente essa ou aquela cor, eles suspenderiam o juízo. Do mesmo modo, os céticos modernos, como HumeHUME, D. Tratado da natureza humana. Tradução de D. Danowski. São Paulo: Editora da Unesp, 2000., sustentam que as qualidades secundárias estão na mente; ora, as cores são qualidades secundárias; portanto, estão apenas na mente, não nos objetos externos a ela.

Não me parece, entretanto, que o assunto se resolva de maneira tão fácil, seja do ponto de vista histórico, seja da reflexão contemporânea. Porque o subjetivismo das cores pode parecer, para um cético pirrônico antigo, uma forma de dogmatismo, uma vez que o subjetivismo afirma a tese filosófica de que as cores são propriedades de sensações (ou percepções), não das coisas materiais ou dos objetos físicos. Um cético deveria, antes, suspender o juízo a respeito do status metafísico das cores. A seção 2 deste artigo é dedicada a um estudo do que os céticos antigos e modernos disseram sobre as cores.

A seção 3 apresenta o debate entre Barry Stroud e John McDowell. Ambos tentam, cada um à sua maneira, descrever nosso conceito comum de cor. Mas encontramos descrições conflitantes. McDowell defende uma concepção subjetivista e Stroud faz a crítica do subjetivismo. Esse debate me permite balizar a discussão sobre qual seria uma concepção cética das cores. Talvez seja importante assinalar, desde já, que esse é um debate que pretende prescindir das ciências naturais ou de qualquer argumento que dependa da investigação empírica do mundo. Isso, certamente, limita o interesse do debate, mas, de outro, enseja determinar com mais precisão o conceito comum de cor, antes mesmo de qualquer investigação científica.

O objetivo da seção 4 é descrever qual seria, numa visão cética do mundo, o status metafísico das cores. Supondo que Stroud e McDowell apresentem respostas compatíveis com o neopirronismo, qual dessas respostas expressa de forma mais adequada e coerente uma visão cética do mundo? Qual dessas descrições das cores capta melhor a concepção comum das cores e, dessa maneira, constitui o ponto de partida para a elaboração de uma visão cética das cores? A meu ver, uma concepção cética do mundo não se limita a uma descrição do conceito comum de cor, contudo, deve começar com ela, para, em seguida, avaliar as contribuições da ciência ao nosso conceito comum de cor (SMITH, 2020SMITH, P. J. A experiência do cético. São Paulo: Scientiae Studia, 2020., p. 162-171).

2 A tradição cética e as cores

Qual teria sido a posição de um pirrônico antigo a respeito das cores? Nos Dez Modos de Enesidemo, as cores são exemplos frequentes de oposição entre nossas percepções do mundo físico e dos objetos externos (por ex., SEXTO EMPÍRICO, 2000SEXTO EMPÍRICO. Outlines of Pyrrhonism. Tradução, introdução e notas de J. Annas e J. Barnes. Cambridge: Cambridge University Press, 2000., 1.94, 1.120). Um exemplo clássico é o dos olhos de quem sofre amarelão ou de quem tem olhos avermelhados, os quais alterariam a percepção das cores de um objeto. Nesses casos, o cético concluiria que podemos dizer que os objetos aparecem com esta ou aquela cor para nós, mas não podemos dizer qual é realmente a sua cor. Entretanto, os céticos antigos têm argumentos que parecem ir mais longe: se o que percebemos é uma mistura do objeto externo com o meio externo, com nossos órgãos sensoriais e com nossa mente (2000, 1.126) ou se tudo é relativo a quem percebe e julga (2000, 1.135-136), então pode ser que, não somente não sabemos qual é a cor que um objeto tem, mas sequer sabemos se os objetos têm cor. Haveria uma suspensão do juízo a respeito das cores entendidas como propriedades objetivas das coisas, porém, o cético admitiria com que cor elas nos aparecem.

Além disso, na investigação da parte física da filosofia, Sexto não trata da realidade das cores. Os tópicos de que trata a física são: Deus, causa, corpo, espaço, movimento, número, tempo etc., mas não há uma preocupação específica com as cores. Não estaria Sexto admitindo implicitamente que as cores não fazem parte do mundo físico ou, pelo menos, que os objetos físicos poderiam não ter cor? Com base nessas passagens, poder-se-ia inferir que as cores são, para um pirrônico antigo, uma mera sensação que não corresponde a nada objetivo.

Nos Dez Modos, entretanto, as cores são exemplos menos frequentes do que se poderia esperar, à primeira vista. Não há nenhum privilégio da variação das percepções de cores, e outros exemplos, como o gosto do vinho e a sensação causada pelo vento, são tão, ou até mais, frequentes quanto as cores dos objetos. Por exemplo, quando trata das oposições entre as percepções dos sentidos usadas por Heráclito (2000, 1.210-211) e por Demócrito (2000, 1.213-214), Sexto não menciona as cores. O gosto do mel é seu exemplo preferido. Sexto estabelece oposições entre percepções referentes aos cinco sentidos com igual insistência e, mesmo entre percepções visuais, as cores não gozam de nenhum privilégio. Sexto opõe também percepções visuais das assim chamadas qualidades primárias, como movimento e repouso (2000, 1.107), e a forma de um objeto (2000SEXTO EMPÍRICO. Outlines of Pyrrhonism. Tradução, introdução e notas de J. Annas e J. Barnes. Cambridge: Cambridge University Press, 2000., 1.118). Desse ponto de vista, as cores seriam tão “subjetivas” quanto o movimento e a forma de um objeto.

De fato, o cético opõe percepções visuais a percepções táteis, já que, diante de um quadro, a visão percebe um objeto tridimensional, enquanto o tato percebe um objeto bidimensional (2000, 1.92). Noutras palavras, Sexto não dá nenhuma indicação de traçar a distinção entre qualidades primárias e secundárias, incluindo as cores nesta última categoria. Assim, ou todas as propriedades dos corpos são igualmente subjetivas, ou não há nenhuma razão para afirmar que as cores, em oposição à forma e movimento, o são. Embora haja controvérsia entre os estudiosos de Sexto, a interpretação mais plausível, a meu ver, sustenta que o fenômeno (o que aparece) não é uma mera entidade mental, contudo, é o objeto que aparece. Se isso for correto, pode-se dizer que, assim como o mel aparece doce, uma maçã aparece vermelha.

Com relação à parte física, convém lembrar que Sexto investiga o que está nas doutrinas dogmáticas, e são estas que definem os tópicos a serem investigados, não o cético. Nesse sentido, quem exclui as cores como um assunto privilegiado a ser investigado pela filosofia é o dogmático, não o cético. A nenhum momento vemos Sexto traçar alguma distinção entre tipos de qualidades dos objetos, tal como estamos discutindo aqui, ou tratar as cores e outras qualidades de modo diferente das assim chamadas qualidades primárias. Seguindo os dogmáticos, Sexto ordena sua investigação de outra maneira, em torno de noções como princípios ativos e passivos, corpóreos e incorpóreos. Tudo leva a crer que essa distinção entre qualidades primárias e secundárias é, a seu ver, uma distinção dogmática, cujo representante na Antiguidade é o dogmatismo atomista de Demócrito. Essa é, portanto, uma distinção de um dogmatismo particular, não uma distinção relevante (naquele contexto) para ordenar uma investigação geral sobre a parte física da filosofia. O cético pirrônico faz um ataque metódico ao dogmatismo, não se preocupando, em geral, com doutrinas dogmáticas particulares (2000SEXTO EMPÍRICO. Outlines of Pyrrhonism. Tradução, introdução e notas de J. Annas e J. Barnes. Cambridge: Cambridge University Press, 2000., 2.21, 2012SEXTO EMPÍRICO. Against the physicists. Tradução e edição de R. Bett. Cambridge: Cambridge University Press, 2012., 1-3).

Os céticos modernos viram-se confrontados com a distinção entre qualidades primárias e qualidades secundárias como um tópico central da filosofia moderna. Hume chega mesmo a dizer que “[...] o princípio fundamental dessa filosofia é a opinião a respeito das cores, sons, sabores, aromas, calor e frio, os quais afirma serem apenas impressões na mente, derivadas das operações dos objetos externos e sem qualquer semelhança com as qualidades dos objetos.” (2004HUME, D. A treatise of human nature. Oxford: Clarendon, 2004., 1.4.4.3). Após referir-se à importância de Gassendi na retomada do ceticismo antigo, Bayle deixa esse ponto muito claro: “Hoje, a nova filosofia tem uma linguagem mais positiva: o calor, o odor, as cores etc. não estão nos objetos de nossos sentidos, são modificações de minha alma, sei que os corpos não são como me parecem.” (2005, “Pirro”, B).

Como essa distinção foi empregada por diversos filósofos, para sustentar uma visão dogmática da realidade, a saber, que os objetos físicos seriam essencialmente extensos e suas propriedades (forma, movimento etc.) poderiam ser matematizadas, os céticos modernos trataram de atacar essa distinção:

[...] gostar-se-ia de excluir a extensão e o movimento, mas não se pode, pois, se os objetos dos sentidos nos parecem coloridos, quentes, frios, cheirosos, embora não o sejam, por que não poderiam parecer extensos e figurados, em repouso e em movimento, ainda que não tivessem nada disso? (BAYLE, 2005BAYLE, P. Dictionnaire historique et critique. Paris: Desoer/Elibron Classics, 1820/2005., “Pirro”, B).

Talvez seja importante notar, para deixar mais claro qual é o foco do problema, que os céticos não atacaram o uso da matemática na explicação da natureza, mas tão somente a ideia dogmática de que a natureza seria em si mesma escrita em linguagem matemática; o recurso à matemática, para explicar os fenômenos naturais, não é questionado pelos céticos (HUME, 1985HUME, D. An enquiry concerning human understanding. Oxford: Clarendon, 1985., 4.i.27, p. 31). Mesmo que não se aceite a tese de que os corpos materiais são extensos na sua essência, isso não impede uma ciência que lance mão da matemática para explicar o seu comportamento. A questão, portanto, diz respeito somente à essência da matéria.

Bayle desferirá um poderoso ataque à ideia de que a extensão é a essência dos corpos materiais, em seu verbete “Zenão de Eléia”. Primeiro, Bayle relembra os argumentos de Zenão contra o movimento (2005, “Zenão de Eléia”, F). Mas a crítica de Zenão atinge somente uma modalidade do corpo material, a saber, o movimento, mas não a sua essência, isto é, a extensão. É preciso, então, levar essa batalha até o seu âmago e mostrar que a extensão não pode ser uma propriedade dos corpos. Para Bayle, a extensão é somente algo “ideal”, não uma propriedade dos objetos em uma realidade independente. Primeiro, Bayle desenvolve um longo raciocínio, idêntico na forma a muitos argumentos empregados por Sexto, para provar que a extensão não existe. Eis o silogismo hipotético de Bayle:

Se a extensão existisse, seria composta, ou por pontos matemáticos, ou por pontos físicos, ou por partes infinitamente divisíveis;

Ora, a extensão não é composta, nem por pontos matemáticos, nem por pontos físicos, nem por partes infinitamente divisíveis;

Portanto, a extensão não existe. (2005, “Zenão de Eléia”, G)

A forma lógica, assevera ele, é claramente válida, restando somente estabelecer as premissas. A primeira premissa enumera exaustivamente as possibilidades lógicas da questão: ou a matéria é divisível, ou não é; se for divisível, sua divisão termina num ponto com extensão (ponto físico) ou sem extensão (ponto matemático). O problema, por conseguinte, gira em torno da segunda premissa. Segundo Bayle, “[...] cada uma dessas três seitas, quando somente ataca, triunfa, arruína, abate, mas, por sua vez, é abatida e destruída quando se coloca na defensiva.” (2005, “Zenão de Eléia”, G). É fácil ver que, com base em pontos matemáticos, nunca se produzirá uma reta, pois a soma de infinitos zeros é zero; assim, a extensão não pode ser constituída de pontos matemáticos. Também é fácil ver que a ideia de pontos físicos (ou átomos) é absurda, pois um ponto físico admite partes (o lado direito, mais perto de outro ponto físico à sua direita, e o lado esquerdo, mais longe desse outro ponto físico; assim, pode-se dividir o ponto físico). Mais longa é a refutação da doutrina da infinita divisibilidade. Deixo-a de lado, por nos afastar demais do nosso assunto. Se as duas premissas são verdadeiras e a forma lógica é válida, a conclusão se segue inevitavelmente: a extensão não existe.

Após estabelecer essa conclusão, Bayle dá um passo a mais e afirma:

É preciso reconhecer, com relação ao corpo, o que os matemáticos reconhecem com relação às linhas e superfícies, dos quais demonstram tantas coisas belas. Eles aceitam de bom grado que um comprimento e largura sem profundidade são coisas que não podem existir fora de nossa alma. Digamos o mesmo das três dimensões. Estas só poderiam encontrar lugar em nossa mente, podem existir apenas idealmente. (2005, “Zenão de Eléia”, G)

Portanto, a posição de Bayle não somente nega a existência real da extensão, mas também admite que ela existe apenas na mente. Enquanto Sexto se utilizava de argumentos hipotéticos para negar a existência de alguma coisa, a fim de equilibrar o debate, contrapondo-os a argumentos igualmente fortes a favor da existência real do espaço (e do corpo material), Bayle parece julgar que esse argumento hipotético é o mais forte, impondo uma conclusão negativa.

De modo coerente, já que não traça a distinção entre qualidades primárias e secundárias, Bayle afirma que as cores também existem apenas idealmente, mas não realmente. “Nossa mente é um certo fundo em que cem mil objetos de cor diferente, de figura diferente e de situação diferente se reúnem, pois podemos ver todos de uma só vez do alto de uma colina uma vasta planície salpicada de casas, árvores, rebanhos etc.” (2000, “Zenão de Eléia”, G). Dessa forma, Bayle dá um passo que Sexto não deu, porque nega que a extensão e as cores sejam propriedades objetivas dos corpos materiais, afirmando que existem apenas na nossa mente, enquanto Sexto suspende o juízo sobre esse tópico. Há, portanto, uma forma de idealismo, na posição de Bayle.

Talvez seja interessante fazer uma breve comparação entre o idealismo fenomênico de Bayle e o idealismo transcendental de Kant, porque se pode sustentar o idealismo, seja com a distinção entre qualidades primárias e secundárias, seja sem essa distinção. Bayle parece ter antecipado, ao menos em parte, a filosofia transcendental kantiana, segundo a qual devemos distinguir entre as coisas em si mesmas e as coisas enquanto fenômenos que aparecem para nós. Kant (2000KANT, I. Critique of pure reason. Tradução de P. Guyer & A. Wood. Cambridge: Cambridge University Press, 2000., A28-9/B44), contudo, traçará a distinção entre qualidades primárias e secundárias no interior desse mundo que aparece à mente humana: o vermelho da rosa não é uma propriedade da rosa que aparece, mas somente sua forma.

Bayle, ao contrário de Kant, rejeita essa distinção e, no interior do mundo fenomênico, tratará todas as qualidades sensíveis em pé de igualdade. Berkeley (1998BERKELEY, G. A treatise concerning the principles of human knowledge. J. Dancy (ed.). Oxford: /New York: Oxford University Press, 1998., I, 9-15, p. 105-8) levará adiante a posição de Bayle, elaborando de maneira mais detalhada o que significa que qualidades primárias (extensão, movimento, forma etc.) e qualidades secundárias (cores, odores, sabores etc.) são somente propriedades de objetos que existem na mente, não na matéria. Essa divergência mostra que o status metafísico das cores pode reaparecer, num debate entre idealistas.

Vejamos como Hume lidou com essa questão. O ceticismo humiano claramente se distingue do de Bayle (RYAN, 2013RYAN, T. Hume’s reply to Baylean scepticism. In: CHARLES, S.; SMITH, P. J. (ed.). Scepticism in the Eighteenth Century: Enlightenment, Lumières, Aufklärung. Dordrecht: Springer, 2013. p. 125-38.). Para Hume, é possível encontrar uma maneira de resolver o impasse entre aquelas três teorias sobre a extensão que foram criticadas por Bayle. Se este, raciocinando à maneira dos céticos antigos, destruía as três teorias e concluía, de maneira pouco cética, que a extensão não existe, Hume deixará de lado o raciocínio hipotético que rejeita as três teorias, e defenderá uma delas, porém, paradoxalmente, restaurará a suspensão do juízo por uma via original. Para evitar as dificuldades levantadas por Bayle, Hume admitirá que existem pontos matemáticos coloridos (ou táteis) e, assim, será possível gerar uma reta com base em pontos matemáticos coloridos, caindo por terra a dificuldade levantada por Bayle (2004, 1.2.2.9, T 1.2.3.14). Hume, obviamente, não tinha a intenção de reviver a teoria dogmática de que a extensão é a essência da matéria, mas pretendia mostrar que a nossa ideia de extensão é uma ideia adequada dos corpos físicos (2004, 1.2.2.1). A seu ver, a ideia que temos da extensão e que representa adequadamente a extensão é uma ideia que não pode ser separada das cores.

Essa solução humiana para o problema cético da extensão possibilita reavaliar o status metafísico das cores. Como a ideia de extensão é uma ideia adequada, pode-se dizer do objeto aquilo que concebemos na sua ideia. Logo, se a ideia de extensão que temos envolve necessariamente a cor, então, os corpos materiais, por serem extensos, também são coloridos. A indissociabilidade da extensão e da cor estaria na base da nossa ideia do que é um corpo material e, sem essa indissociabilidade, o ceticismo de Bayle triunfaria. Não somente concebemos que o corpo material extenso é colorido, como também é impossível para nós conceber os corpos de outra maneira, sob o risco de cair no trilema suscitado por Bayle. Se retirarmos as cores dos objetos físicos, não teremos como concebê-los adequadamente. Na verdade, ao retirar qualidades primárias e secundárias, não restará nada que possamos conceber como a causa de nossas percepções (1985, 12. i.123, p. 155).

Assim, longe de relegar as cores à categoria de qualidades secundárias que existiriam apenas na mente, em oposição à extensão (como fazem dogmáticos realistas, como Descartes, Locke e Malebranche), ou de considerá-las como meramente mentais ao lado das demais qualidades que seriam igualmente mentais (como fazem dogmáticos idealistas, como Bayle, Berkeley e Kant, embora este recupere a distinção dogmática realista no interior do “mundo fenomênico”), o cético humiano se limita a reconhecer que os corpos materiais extensos são também coloridos, tentando explicar como a mente humana concebe esses corpos.

Há, portanto, quatro posições básicas. Entre os que aceitam a distinção entre qualidades primárias e secundárias, estão sobretudo os realistas (Galileu, Descartes, Hobbes, Locke, Malebranche etc.), mas também idealistas transcendentais (Kant). Entre os que não aceitam a distinção entre qualidades primárias e secundárias, estão principalmente os idealistas fenomênicos (como Bayle) ou “idealistas dogmáticos”, como Kant (2000KANT, I. Critique of pure reason. Tradução de P. Guyer & A. Wood. Cambridge: Cambridge University Press, 2000., B274) chamava Berkeley (Berkeley chamava sua própria filosofia de “imaterialismo”), mas também os céticos (Sexto Empírico e Hume), os quais aceitam a vida cotidiana e a existência de objetos físicos extensos e coloridos (entre outras qualidades).

Em suma, os céticos, quer antigos, quer modernos, jamais assentiram à proposição de que as cores são sensações produzidas em nós pelos objetos físicos. Embora se notem diferenças entre suas posições, resta que, de um modo geral, cores são concebidas por eles como uma qualidade, entre tantas outras, com que os corpos materiais se apresentam a nós. Diante das controvérsias entre os dogmáticos, os céticos não podem afirmar que cores são propriedades intrínsecas dos corpos, e eles dispõem mesmo de argumentos que parecem estabelecer que não o são, todavia, podem dizer, segundo sua concepção, que os corpos são coloridos, que lhes aparece que os corpos têm cores, assim como têm forma, que a maçã, por exemplo, além de ser redonda, também é vermelha. Para o cético, concebemos e percebemos as cores como qualidades que os objetos têm.

3 Uma investigação do conceito comum de cor

Passemos ao problema das cores, tal como tratado pela filosofia contemporânea. A questão que nos ocupará é a de saber se, fora do contexto dogmático e dentro do contexto da vida cotidiana, aceita-se a distinção entre qualidades primárias e secundárias e, mais especificamente, se as cores são tomadas como qualidades secundárias ou como primárias, isto é, se, de acordo com a nossa concepção comum de cor, as cores existem no objeto ou apenas em nossa mente. Claramente, as coisas aparecem como tendo cores. Não somente percebemos as folhas das árvores como sendo verdes, mas também efetivamente pensamos que os corpos são coloridos. Mas no que consiste, exatamente, esse pensamento? Qual é a concepção comum que temos das cores?

O fio condutor de minha reflexão será o debate entre Stroud e McDowell sobre o status metafísico das cores. Ambos os autores são difíceis e suas posições, complexas. O debate tem uma dinâmica própria. Antes, porém, eu gostaria de tecer algumas considerações iniciais, para situar melhor suas divergências e justificar o meu interesse particular por esse debate. Não entendo o debate entre Stroud e McDowell como um debate entre dois dogmáticos. A meu ver, Stroud é um neopirrônico e McDowell, embora um pensador mais obscuro e ambíguo, tem afinidades com o neopirronismo. Vejamos isso mais de perto.

Stroud (2000STROUD, B. The quest for reality: Subjectivism and the metaphysics of color. Oxford: Oxford University Press, 2000.) considera três possibilidades de desmascarar as cores, isto é, de argumentar para provar que as cores não são propriedades intrínsecas ou objetivas dos corpos materiais: as cores poderiam ser somente entidades mentais subjetivas ou meras sensações internas, como a dor; as cores poderiam ser uma percepção intencional produzida por um objeto físico, de modo que elas existiriam nesse objeto como uma disposição a causar a percepção; as cores poderiam ser propriedades do objeto, só que o objeto físico não teria a propriedade que vemos, mas outra diferente. Se alguma dessas tentativas de desmascarar a opinião de que os corpos são coloridos for bem-sucedida, os filósofos se tornariam dogmáticos e diriam: “as cores não existem realmente”, sugerindo que a opinião inicial de que existiriam foi, após a investigação filosófica, abandonada (“as cores parecem existir, mas não existem realmente”).

Para cada maneira de tentar desmascarar as cores como propriedades dos corpos materiais, Stroud esgrime um argumento diferente. Não é o caso de passá-los em revista aqui. Suponhamos que sua argumentação seja bem-sucedida. O que se segue? De um lado, que o veredito negativo dos filósofos, segundo o qual “as cores não são propriedades intrínsecas dos objetos”, não se justifica, pois os argumentos não o sustentam. De outro, tampouco se seguiria o veredito positivo, “as cores existem realmente”, porque o fracasso da tentativa filosófica de desmascarar a objetividade das cores não implica que elas sejam propriedades intrínsecas dos objetos, isto é, não há uma argumentação dogmática que estabeleça a conclusão de que as cores existem. Permanecemos com a crença cotidiana, dado que não há por que abandoná-la, mas isso não significa que a investigação filosófica descobriu algum argumento que a justifique (STROUD, 2000STROUD, B. The quest for reality: Subjectivism and the metaphysics of color. Oxford: Oxford University Press, 2000., p. 192-209).

McDowell (2011MCDOWELL, J. Colors as secondary qualities. In: BRIDGES, J.; KOLODNY, N.; WONG, W.-H. (ed.) The possibility of philosophical understanding: reflections on the thoughts of Barry Stroud. Oxford: Oxford University Press, 2011. p. 217-31., p. 218-219) concorda, em linhas gerais, com essa posição de Stroud. Também ele pensa que o projeto filosófico de rejeitar ou justificar a crença cotidiana de que os objetos são coloridos está fadado ao fracasso. O famoso “quietismo” de McDowell pode ser interpretado desta maneira: permanecer “quieto” é não afirmar, nem negar nada, é simplesmente não se pronunciar sobre uma questão filosófica concebida como uma “busca da realidade”, ao mesmo tempo que se preserva a crença comum. Quando Stroud não emite um juízo negativo, nem um positivo, ele está ipso facto suspendendo o juízo; quando McDowell adota uma postura quieta, ele também está retendo o seu juízo. Portanto, McDowell parece aceitar a ideia de que, na busca filosófica da realidade, não caberia afirmar, nem negar a objetividade das cores. Isso não os impede, como visto, de continuar a manter a crença comum, sem, no entanto, dar-lhe um peso dogmático.

O caráter cético dessa posição é reconhecido por McDowell. Com efeito, este “[...] aplaude o ceticismo de Stroud sobre a ideia de que desmascarar a realidade das cores como propriedades dos objetos, com o argumento de que cores são subjetivas, pode servir como um meio para dar substância àquela suposta noção especial de realidade.” (2011MCDOWELL, J. Colors as secondary qualities. In: BRIDGES, J.; KOLODNY, N.; WONG, W.-H. (ed.) The possibility of philosophical understanding: reflections on the thoughts of Barry Stroud. Oxford: Oxford University Press, 2011. p. 217-31., p. 218-9). Para McDowell, o [...] “ceticismo de Stroud sobre a adequação dela [distinção entre qualidades primárias e secundárias] para esse propósito está bem fundamentado.” O que talvez explique essa afinidade é que, até onde posso ver, esses dois filósofos se nutrem de Wittgenstein, cuja filosofia exibe uma certa desconfiança das teses dogmáticas. Stroud e McDowell parecem, ambos, cada um à sua maneira, suspender o juízo no que diz respeito à pergunta filosófica sobre o status metafísico das cores.

Podemos ver tanto Stroud como McDowell envolvidos num projeto não dogmático (portanto, cético) de descrever ou explicar nossa concepção comum das cores. O próprio Stroud (2018aSTROUD, B. Are the colours of things secondary qualities? In: STROUD, B. Seeing, knowing, understanding. Oxford: Oxford University Press, 2018a. p. 179-192.) reconhece uma série de afinidades entre o seu pensamento e o de McDowell, embora procure ressaltar que essas são somente superficiais. Ambos aceitam que os objetos causam em nós uma determinada percepção, que, por exemplo, um tomate produz em nós a percepção de um tomate vermelho. Ambos aceitam que a percepção da cor de um objeto envolve algum elemento subjetivo, temos uma experiência. E ambos recusam que se trate de uma “experiência interna” (MCDOWELL, 1996MCDOWELL, J. Mind and world. Cambridge, Massacusetts/London, England: Harvard University Press, 1996., p. 31, n. 7; 2005, p. 68, n. 7).

Além disso, ambos concordam que os objetos físicos têm a disposição para produzir em nós essa percepção. Um objeto físico, dadas certas circunstâncias e certos seres com certos órgãos de percepção, tem a capacidade de produzir nesses seres percepções de determinado tipo. Stroud admite até que se possa ver que objetos físicos têm disposições, como podemos verificar, por exemplo, que o açúcar tem a disposição de se dissolver em água, quando colocamos uma colher de açúcar na água e a mexemos com uma colher. A meu ver, uma explicação cética do conceito comum de cor tem de admitir todos esses pontos, sem incorrer em dogmatismo. Por exemplo, um cético não pode pensar que a cor é “essencialmente perceptível”. A tese neutra de Stroud, de que a cor é somente visível, parece fazer jus ao conceito comum e, ao mesmo tempo, é perfeitamente compatível com o ceticismo.

Passemos ao debate e às divergências entre eles. Seguirei a seguinte ordem: (a) primeiro, apresentarei o que McDowell (1996MCDOWELL, J. Mind and world. Cambridge, Massacusetts/London, England: Harvard University Press, 1996.) diz sobre as cores e, em seguida, como McDowell (2004MCDOWELL, J. Reality and colours: comment on Stroud. Philosophy and Phenomenological Research, v. 68, n. 2, p. 395-400, 2004., 2011MCDOWELL, J. Colors as secondary qualities. In: BRIDGES, J.; KOLODNY, N.; WONG, W.-H. (ed.) The possibility of philosophical understanding: reflections on the thoughts of Barry Stroud. Oxford: Oxford University Press, 2011. p. 217-31.) elabora um subjetivismo com “conexão direta” das cores; (b) depois, volto-me a Stroud (2000STROUD, B. The quest for reality: Subjectivism and the metaphysics of color. Oxford: Oxford University Press, 2000.), que já antecipa e refuta a posição posterior de McDowell, sustentando que um subjetivismo com “conexão direta” é incoerente; (c) cabe, então, retomar McDowell (2004MCDOWELL, J. Reality and colours: comment on Stroud. Philosophy and Phenomenological Research, v. 68, n. 2, p. 395-400, 2004., 2011MCDOWELL, J. Colors as secondary qualities. In: BRIDGES, J.; KOLODNY, N.; WONG, W.-H. (ed.) The possibility of philosophical understanding: reflections on the thoughts of Barry Stroud. Oxford: Oxford University Press, 2011. p. 217-31.) para ver em que medida ele pretende ter afastado as objeções de Stroud (2000STROUD, B. The quest for reality: Subjectivism and the metaphysics of color. Oxford: Oxford University Press, 2000.), mostrando a coerência de sua posição; (d) Stroud (2004STROUD, B. Replies. Philosophy and Phenomenological Research, v. 68, n.2, p. 387-194, 2004., 2018aSTROUD, B. Are the colours of things secondary qualities? In: STROUD, B. Seeing, knowing, understanding. Oxford: Oxford University Press, 2018a. p. 179-192.), diante dos argumentos de McDowell (2004MCDOWELL, J. Reality and colours: comment on Stroud. Philosophy and Phenomenological Research, v. 68, n. 2, p. 395-400, 2004., 2011MCDOWELL, J. Colors as secondary qualities. In: BRIDGES, J.; KOLODNY, N.; WONG, W.-H. (ed.) The possibility of philosophical understanding: reflections on the thoughts of Barry Stroud. Oxford: Oxford University Press, 2011. p. 217-31.), procura mostrar que este não conseguiu elaborar uma concepção adequada do subjetivismo; (e) para encerrar esta seção, proponho uma avaliação desse debate.

(a) Nas três primeiras conferências de seu já clássico Mente e mundo, McDowell sustenta a tese de que a experiência está impregnada de conceitos. Nesse contexto, ele trata das cores como possíveis contraexemplos para sua tese, porque, aparentemente, elas seriam não conceituais. Mas, argumenta McDowell (1996MCDOWELL, J. Mind and world. Cambridge, Massacusetts/London, England: Harvard University Press, 1996., p. 29-33, 56-60; 2005MCDOWELL, J. Mente e mundo. Tradução J. V. G. Cuter. São Paulo: Ideias & Letras, 2005., p. 66-71, 93-97), a sua tese vigora até onde pareceria não valer, isto é, mesmo as cores exibiriam algum elemento conceitual. Frases altamente observacionais também conteriam um elemento conceitual. Há, para McDowell, uma conexão racional entre “S vê que a maçã é vermelha” e “S pensa que a maçã é vermelha”, uma vez que ambas compartilham o mesmo conteúdo, isto é, a mesma frase “a maçã é vermelha”. Nessa obra, portanto, McDowell não está interessado especificamente nas cores, exceto na medida em que elas não somente ilustram a sua tese, mas também afastam aquela que poderia ser a objeção mais forte, já que nossos conceitos alcançariam até quando se está o mais próximo possível do observacional. Ele não está interessado em defender que cores são qualidades secundárias, mas simplesmente supõe que o são.

É somente quando é instado a criticar o livro de Stroud sobre as cores que McDowell (2004MCDOWELL, J. Reality and colours: comment on Stroud. Philosophy and Phenomenological Research, v. 68, n. 2, p. 395-400, 2004., 2011MCDOWELL, J. Conceptual capacities in perception. In: MCDOWELL, J. Having the world in view: essays on Kant, Hegel, and Sellars. Cambridge/London: Harvard University Press, 2009.) elabora sua concepção do que são as cores. Como já se disse, sua concepção das cores não se insere dentro do projeto tradicional de desmascará-las, porém, preserva a distinção entre qualidades primárias e secundárias. A seu ver, “[...] para um objeto ser, por exemplo, amarelo, é para ele ser tal como parecer amarelo...” (2011MCDOWELL, J. Colors as secondary qualities. In: BRIDGES, J.; KOLODNY, N.; WONG, W.-H. (ed.) The possibility of philosophical understanding: reflections on the thoughts of Barry Stroud. Oxford: Oxford University Press, 2011. p. 217-31., p. 219) Os três pontinhos servem para indicar uma especificação (para quem ou em que circunstâncias aparece amarelo). Não se deve entender o amarelo como uma sensação, mas como uma percepção (2011MCDOWELL, J. Colors as secondary qualities. In: BRIDGES, J.; KOLODNY, N.; WONG, W.-H. (ed.) The possibility of philosophical understanding: reflections on the thoughts of Barry Stroud. Oxford: Oxford University Press, 2011. p. 217-31., p. 220). Para McDowell, o que caracteriza o subjetivismo a respeito das cores é a tese de que os conceitos de cores são distintamente subjetivos, isto é, cores são propriedades dos objetos que dependem essencialmente de seres que as percebem. Na frase citada acima, a palavra “amarelo” ocorre duas vezes: “ser amarelo” e “parecer amarelo”, e McDowell sugere que se deve identificar ser amarelo com parecer amarelo. Assim, essa frase exprime uma concepção disposicional da cor (“tal como”) e subjetiva (“parece”).

De maneira um pouco mais precisa, pode-se dizer que o subjetivismo das cores defendido por McDowell envolve dois elementos: uma formulação e uma explicação da relação dessa formulação. Eis a formulação subjetivista para a cor amarela:

Um objeto é amarelo se e somente se for tal que é capaz de produzir a sensação amarela em determinadas pessoas e em determinadas circunstâncias.

Talvez valha a pena simplificar esse bicondicional para facilitar a discussão:

O é C se e somente se O tem a disposição de produzir C em P nas M.

Nessa fórmula, O é um objeto, C é uma cor, P é uma pessoa normal e M são as melhores circunstâncias de percepção. A formulação tem um lado esquerdo [“O é C”] e um lado direito [“O tem a disposição de produzir C em P nas M”].

A questão é saber qual a relação entre C do lado esquerdo e C do lado direito dessa formulação. A ideia que temos de uma cor é igual à cor do objeto ou não? Se vemos uma maçã vermelha, nossa ideia de vermelho (uma qualidade perceptível) é igual à propriedade da maçã ou dela difere: a maçã tem a qualidade de ser vermelha ou tudo o que existe na maçã é a disposição de produzir em nós a cor vermelha?

(b) De acordo com Stroud (2000STROUD, B. The quest for reality: Subjectivism and the metaphysics of color. Oxford: Oxford University Press, 2000.), o subjetivismo instaura uma “conexão indireta” entre os dois lados do bicondicional, isto é, a conexão entre a cor como qualidade e a cor como disposição não é direta. Stroud considera diversas formas de subjetivismo e conclui que nenhuma é satisfatória. Duas são as razões para essa condenação. Primeira, para sustentar a conexão indireta, seria preciso tornar a cor percebida inteligível independentemente da cor do objeto, e isso não seria possível: não se pode identificar a cor que percebemos independentemente de objetos vermelhos. Segunda, mesmo se fosse possível, a relação entre cada lado do bicondicional é meramente contingente e, se houvesse mudança na estrutura perceptiva de P ou nas circunstâncias de percepção, um objeto amarelo produziria, por exemplo, a sensação de azul. No entanto, como argumenta Stroud, a relação é contingente, pois, em diferentes circunstâncias ou em diferentes seres, o objeto físico produziria percepções diferentes e, por conseguinte, os objetos teriam cores diferentes. Por exemplo, em circunstâncias diferentes, o tomate produziria o azul, e não o vermelho, de modo que, dada a tese da identidade, o tomate seria azul, e não vermelho. O tomate, então, seria vermelho e azul, o que é absurdo.

(c) McDowell (2004MCDOWELL, J. Reality and colours: comment on Stroud. Philosophy and Phenomenological Research, v. 68, n. 2, p. 395-400, 2004., 2011MCDOWELL, J. Colors as secondary qualities. In: BRIDGES, J.; KOLODNY, N.; WONG, W.-H. (ed.) The possibility of philosophical understanding: reflections on the thoughts of Barry Stroud. Oxford: Oxford University Press, 2011. p. 217-31.) defende uma explicação subjetivista das cores, combinando-a com uma “conexão direta”. Essa é a sua originalidade. Para isso, ele aceita uma versão diferente da fórmula bicondicional:

O é C se e somente se O for tal que aparenta (looks) C em P nas M.

A modificação não é irrelevante. A meu ver, a substituição de “é capaz de produzir C” ou “tem a disposição para produzir C” por “aparenta C” tem a intenção de garantir que se trata de um subjetivismo sem precisar de uma interpretação redutivista da relação da cor, em um lado do bicondicional com a cor do outro lado do bicondicional. A tese redutivista diz que a cor se reduz à disposição, isto é, a cor de um objeto é meramente a sua disposição a produzir em nós a sensação ou percepção da cor. Mas também McDowell quer preservar a objetividade das cores, mesmo que isso possa parecer paradoxal, à primeira vista. A seu ver, é preciso fazer justiça à concepção comum de que os objetos são coloridos. Para preservar essa concepção comum, McDowell elabora a tese de que a cor é uma propriedade “essencialmente subjetiva”, já que nossa ideia de cor envolveria “essencialmente” a cor com a qual o objeto aparece para nós: ser vermelho e aparentar vermelho seriam indissociáveis. O conceito de uma cor é indissociável de como essa cor aparece para nós e, dessa maneira, não poderia ser reduzido a uma mera disposição.

Portanto, a formulação específica de McDowell seria uma concepção subjetivista das cores, sem o reducionismo da conexão indireta, o que permitiria a McDowell rejeitar a conexão indireta, a qual parecia aos olhos de Stroud uma tese indispensável para o subjetivismo das cores, e aceitar a conexão direta, isto é, a identidade entre a cor de um lado do bicondicional e a do outro. De seu ponto de vista, trata-se de uma única e mesma propriedade: a propriedade que pensamos que o objeto tem é a mesma propriedade que o objeto aparenta ter. Por exemplo, a ideia que temos de um objeto amarelo é idêntica à sensação de amarelo que temos, quando vemos esse objeto nas melhores condições.

Segundo McDowell (2004MCDOWELL, J. Reality and colours: comment on Stroud. Philosophy and Phenomenological Research, v. 68, n. 2, p. 395-400, 2004., 2011MCDOWELL, J. Colors as secondary qualities. In: BRIDGES, J.; KOLODNY, N.; WONG, W.-H. (ed.) The possibility of philosophical understanding: reflections on the thoughts of Barry Stroud. Oxford: Oxford University Press, 2011. p. 217-31.), o erro de Stroud estaria no fato de que ele teria considerado essa questão somente no contexto de um projeto metafísico (isto é, dogmático), em que se busca a realidade absoluta, corrigindo nossa visão comum do mundo. Dentro desse projeto metafísico (a meu ver, dogmático), o argumento de Stroud seria convincente, porque o subjetivista tentaria “reduzir” a propriedade do objeto (Ce) à sensação que temos dele (Cd). De fato, concorda McDowell, a redução não funciona. No entanto, continua McDowell, a motivação para sustentar o subjetivismo não precisa depender desse projeto metafísico (dogmático): não é preciso defender a redução da propriedade objetiva a uma propriedade subjetiva e disposicional para manter a distinção entre qualidade primária e secundária. O subjetivismo só implica reducionismo no contexto dogmático, porque, fora dele, seria possível ser subjetivista sem ser reducionista. No subjetivismo das cores de McDowell, as cores percebidas são as cores reais e, ainda assim, são também disposições do objeto.

Terá McDowell descrito adequadamente nossa concepção comum de cor? A visão comum do mundo é subjetivista a respeito das cores? Pode-se identificar a cor como uma qualidade do objeto e a cor como uma disposição do objeto?

(d) Stroud (2004STROUD, B. Replies. Philosophy and Phenomenological Research, v. 68, n.2, p. 387-194, 2004., 2018aSTROUD, B. Seeing what is so. In: STROUD, B. Seeing, knowing, understanding. Oxford: Oxford University Press, 2018b. p. 86-99.) não aceita a tese da identidade de McDowell como uma descrição adequada para o conceito comum de cor. Há, pelo menos, dois problemas fundamentais na posição de McDowell. Primeiro, mesmo que a tese da identidade tente preservar a objetividade da cor, o mero fato de pensar a cor como algo subjetivo já a tornaria incorreta. Conforme sua concepção, aceitar que os objetos são coloridos significa aceitar que a cor é uma qualidade que está no objeto físico e não no ser que o percebe com tal cor. Segundo, atribuir simultaneamente ao objeto a cor como sua aparência e a cor como sua disposição a produzir a percepção dessa aparência, o que parece conduzir a absurdos. Se a cor do objeto é a sua aparência, então, não é a sua disposição para produzir uma sensação ou percepção em nós; e se a cor é essa disposição, logo, não é a qualidade que lhe atribuímos. Ou se defende que a cor é a qualidade aparente que vemos, ou se defende que a cor é uma disposição. Não seria possível defender as duas coisas, ao mesmo tempo. Em suma, Stroud rejeita tanto que a cor de um objeto seja algo subjetivo quanto que ela possa ser identificada com uma disposição.

Para Stroud, as condições nas quais uma cor é percebida não fazem parte do conceito de cor, como argumenta McDowell. Não é porque a percepção de cor se produz em certos seres com certos órgãos perceptivos e em certas circunstâncias que a cor será uma propriedade subjetiva ou disposicional. De forma mais específica, Stroud nega que o conceito de cor inclua esses fatores contingentes.

Stroud substitui a tese subjetivista de McDowell, segundo a qual a cor seria “essencialmente perceptível”, pela tese neutra, por assim dizer, de que a cor é “essencialmente visível”. Ser “essencialmente perceptível” significa que a cor depende essencialmente de um ser que a perceba ou seja capaz de percebê-la em certas circunstâncias. Para essa tese ser correta, a relação entre o objeto físico que produz a percepção de cor e a percepção de sua cor deveria ser necessária (“rígida”) e não contingente. Mas já vimos os dois argumentos com base nos quais Stroud rejeitou essa tese. No seu lugar, Stroud defende a ideia muito mais modesta de que a cor é “essencialmente visível”. Aqui, o “essencialmente” não tem peso dogmático, porque significa que a cor é percebida somente pela visão, enquanto a forma de um objeto (por exemplo, ser redondo) pode ser percebida tanto pela visão como pelo tato. A forma, portanto, não é “essencialmente visível”, já que também é tátil. “Essencialmente” significa apenas “unicamente”: as cores são percebidas unicamente pela visão, não são percebidas por outros sentidos. Ora, essa é uma descrição do que ocorre, é uma tese trivialmente correta.

Do mesmo modo, Stroud critica a teoria disposicionalista das cores, tal como McDowell a defende. Mesmo que sejamos capazes de perceber a disposição dos objetos físicos para produzir em nós percepções de cores (se o formos), disso não se segue que a cor de um objeto, do ponto de vista objetivo, seria essa disposição. A cor, entendida como propriedade de um objeto físico, não é uma propriedade disposicional, mas é uma propriedade de outro tipo: assim como é redondo, o tomate é vermelho. Ser redondo e ser vermelho são propriedades do objeto, que este tem independentemente da capacidade de produzir uma percepção num outro ser. Um tomate tem a disposição de produzir em nós a percepção do redondo, porém, ser redondo não se identifica com essa disposição. O mesmo valeria para a disposição de produzir a percepção do vermelho: o tomate tem essa disposição, mas sua propriedade de ser vermelho não se identifica com essa disposição.

(e) É hora de tomar posição nesse debate. O que queremos saber é qual é o nosso conceito comum de cor, como elucidá-lo. Confesso que a explicação de McDowell me parece inadequada à nossa concepção de cor. Ele tenta combinar uma concepção subjetivista das cores, ao mesmo tempo que sustenta sua objetividade e, para isso, elabora a tese de que há uma identidade entre a aparência colorida de um objeto e a sua disposição para produzir em nós uma percepção. Essa tese parece gerar uma relação quádrupla, por assim dizer. Ou seja, a tese da identidade conduz a uma explicação que envolve quatro elementos: dois no objeto (a aparência e a disposição), dois no sujeito (a percepção da aparência e a percepção da disposição). É essa explicação das cores com quatro elementos que me parece estranha, não só por ser demasiado complexa, mas também por ir contra nosso conceito comum de cor. Parece-me que McDowell enfrenta um dilema, no qual essa consequência estranha da explicação de McDowell desempenha um papel crucial.

No que diz respeito ao objeto, a cor se bifurca em aparência e disposição. Ora, ter uma aparência colorida não é equivalente a ter uma disposição, pois uma aparência não é uma disposição. Uma disposição é algo que pode ou não ocorrer; uma aparência é algo que está ocorrendo. McDowell poderia dizer que ter uma disposição é algo tão permanente quanto uma aparência e, nesse sentido, um objeto tem permanentemente uma cor, mesmo que não a esteja produzindo em alguém. Mas não é assim que pensamos o que as cores são: como uma disposição para produzir uma aparência, e sim a própria aparência do objeto. Nós distinguimos a aparência e a disposição, e compreendemos que a cor é somente a aparência do objeto, não sua disposição. Ao negar essa distinção, McDowell vai contra o que pensamos; se, ao contrário, ele a sustenta (em conformidade com o que pensamos), então, a cor não seria uma coisa só, mas duas, o que também vai contra o que pensamos.

Correspondentemente, no que concerne à pessoa que percebe uma cor, essa percepção se bifurca, ocasionando o mesmo dilema: ou McDowell nega uma distinção óbvia ou, se a aceita, duplica de maneira incompreensível a percepção que temos ao perceber uma cor. Ao perceber uma cor, nós teríamos uma única percepção, na qual perceberíamos tanto a aparência da cor do objeto quanto a sua disposição a produzir em nós a sua aparência colorida; afinal, haveria uma identidade entre elas. O problema não é admitir a ideia de que percebemos também uma disposição; por exemplo, pode-se dizer que percebemos a disposição do açúcar se dissolver em água.

O ponto é que a percepção de uma disposição não é idêntica à percepção de uma aparência. Nós simplesmente não pensamos assim. Uma coisa é perceber a aparência colorida de uma coisa, outra coisa é perceber a sua disposição para produzir uma percepção dessa aparência. Se McDowell distinguir que, na percepção das cores, percebemos duas coisas (a percepção da aparência e a percepção da disposição), logo, segundo nossa concepção comum de cor, só a primeira constitui nossa percepção da cor. De novo, ou McDowell vai contra o que pensamos, ou propõe uma descrição estranha da percepção da cor.

Poder-se-ia dizer que o ponto da tese da identidade é, justamente, evitar essa duplicação da cor no objeto e da percepção no sujeito, garantindo que os objetos são coloridos e que as cores são essencialmente subjetivas, como, no entender de McDowell, seria a nossa concepção comum. Todavia, essa não me parece ser a concepção comum de cor e parece ir contra uma distinção que traçamos, na vida cotidiana, entre a aparência de uma coisa e a disposição de uma coisa. E simplesmente afirmar a tese da identidade parece um passe de mágica, que, no entanto, não faz desaparecer as dificuldades reais de tentar combinar a tese de que as cores são “essencialmente perceptíveis” e, contudo, estão no objeto na forma de uma disposição. Essa tese de McDowell reincide, talvez contra a expressa intenção de seu autor, no dogmatismo.

4 Uma concepção cética das cores

Resta, agora, descrever nossa concepção comum da cor e elaborar como um cético explicaria a percepção das cores. O primeiro ponto que eu gostaria de ressaltar é que as posições de Stroud e McDowell, apesar da grande divergência apontada, no final da seção anterior, contêm importantes elementos comuns na descrição da cor e da percepção da cor, como vimos no começo da seção anterior. A meu ver, esses elementos comuns podem ser incorporados numa visão cética das cores. Além disso, precisarei me posicionar diante de suas divergências. Tentarei, na sequência, esboçar a minha posição cética.

Em artigos sobre a percepção (SMITH, 2000SMITH, P. J. Sobre a distinção mente-corpo. In: DUTRA, L. H.; SMITH, P. J. (ed.). Ceticismo: perspectivas históricas e filosóficas. Florianópolis: Editora da UFSC, 2000. p. 109-135., 2005SMITH, P. J. Sobre a distinção mente-corpo. In: SMITH, P. J. Do começo da filosofia e outros ensaios. São Paulo: Discurso l, p. 197-230, 2005., 2014SMITH, P. J.. A percepção como uma relação: uma análise do conceito comum de percepção. Analytica, v, 18, n. 1 p. 109-132, 2014., 2020SMITH, P. J. A experiência do cético. São Paulo: Scientiae Studia, 2020., cap. 5), defendi, seguindo Austin, a ideia de que a percepção é um fenômeno complexo, como que um padrão de eventos. O esquema da percepção pressupõe dois polos, o objeto (ou evento) e a pessoa, e as relações que se estabelecem entre eles. Simplificadamente, pode-se dizer o seguinte: a pessoa que percebe um objeto (ou evento) busca informação sobre o mundo; ao dirigir seu olhar para um objeto (ou evento), este causa uma percepção, nessa ocasião determinada; produz-se um efeito na pessoa que percebe o objeto, o qual é sua experiência; e a pessoa age no mundo com base nessa percepção. Eu gostaria de aplicar esse esquema, ainda que brevemente, ao caso das cores.

Suponha-se que eu queira saber se um tomate já está maduro para ser cortado e posto na salada. Ele estava ainda meio amarelado, até um ou dois dias atrás. Vou até a cozinha, acendo a luz, pego o tomate na mão e olho para ele, prestando atenção na sua cor (e também na sua consistência, se ainda está muito duro ou se já amoleceu um pouco). O tomate, nessas circunstâncias, produz em mim a percepção de um tomate vermelho (e sinto que não está mais tão duro). Então, corto-o em rodelas e ponho na salada. Vejamos como o esquema se aplica a uma situação corriqueira como essa.

Comecemos pelo lado do objeto, que causa em nós a percepção de uma determinada cor. O objeto certamente tem a disposição para causar em nós a percepção da sua cor e só exerce sua capacidade em determinadas situações, as quais são as ocasiões em que sua disposição se realiza. Se as ocasiões não ocorrerem (haver luz suficiente, não haver nenhum obstáculo que impeça sua visão etc.), o tomate não produzirá a percepção do vermelho ou até não produzirá nenhuma percepção. Para que essa disposição se realize, é preciso também que determinadas coisas ocorram no lado da pessoa, a qual só o perceberá com a aparência do vermelho, se estiver de olhos abertos, se tiver sua cabeça voltada para o tomate e se estiver prestando atenção ao tomate. Dessa maneira, estabelecem-se ao menos duas relações entre o objeto físico e a pessoa: uma relação causal, por meio da qual o objeto atua sobre a pessoa; e uma relação em que a pessoa dirige seu olhar para ele e presta atenção à sua cor.

Se isso for correto, vemos que, de fato, a disposição do tomate em causar em nós a experiência perceptiva do vermelho é um elemento componente da percepção. Segue-se que essa disposição é idêntica à cor? De maneira nenhuma. Ao contrário, a disposição de causar uma experiência perceptiva é diferente da própria experiência que causa. Enquanto a disposição está no objeto, a experiência está na pessoa; a disposição para produzir a experiência do vermelho pode ou não ocorrer e, se não ocorrer, não há experiência do vermelho.

De acordo com o esquema, uma pessoa percebe que o tomate é vermelho, vê o tomate vermelho, tem uma sensação de vermelho. Essa experiência (a qual pode ir de uma percepção mais complexa até uma mera sensação) está na pessoa, é um efeito na pessoa, isto é, aquilo que o objeto produz, quando produz a experiência perceptiva de cor, é algo que ocorre num ser percipiente. Segue-se que a cor é subjetiva? De forma nenhuma. Não se deve supor que se trata de uma “experiência interna”, como se o que a pessoa experiencia é somente o que ocorre nela, uma representação do objeto colorido. O fato de o objeto produzir um efeito na pessoa não implica que é esse efeito que a pessoa experiencia. O que é subjetivo é a experiência (a sensação do vermelho ou a percepção de um tomate vermelho ou de que o tomate é vermelho), mas não a cor. A experiência que se tem é a de que o tomate se apresenta a nós como sendo vermelho.

Desse modo, temos uma experiência, e essa experiência é a de que o tomate é vermelho, de que o tomate aparenta ser vermelho, de que ele tem a aparência vermelha. “Aparência”, aqui, tem um significado objetivo, como quando dizemos que alguém tem uma aparência elegante ou aparenta estar doente. A “aparência” se distingue da “experiência”, posto que esta é o efeito produzido pelo objeto na pessoa, enquanto aquela está no objeto. Não se deve, portanto, identificar a cor a esse elemento subjetivo da percepção, como se fosse uma representação, mas a cor é uma maneira pela qual o objeto se apresenta para nós.

No esquema proposto, distingue-se também entre a relação causal, que parte do objeto e afeta a pessoa, e a relação ativa, a qual parte da pessoa e alcança o objeto. Isso permite acomodar tanto a disposição para causar determinado tipo de percepção, que é uma relação causal, quanto a aparência colorida do objeto. De um lado, por meio da relação causal, o objeto exerce a sua disposição, se as circunstâncias forem apropriadas, e, de outro, através de uma relação na qual a pessoa exerce suas capacidades perceptivas, ela dirige a sua atenção a um objeto e o vê como tendo uma determinada cor. A pessoa fica sabendo qual é a aparência do tomate (se já está vermelho ou não), por intermédio do exercício de sua capacidade perceptiva (que é uma capacidade cognitiva).

Assim, uma coisa é a disposição do objeto de causar uma experiência e outra é sua aparência; cada uma está associada a um tipo de relação entre o objeto e a pessoa, que se estabelece na relação perceptiva. A propriedade de ter uma certa disposição, portanto, não é idêntica à propriedade de ter uma certa aparência. A cor é, precisamente, essa aparência que o objeto tem e que percebemos, quando ele produz em nós uma experiência, quando sua disposição se exerce sobre nós, nas situações apropriadas.

Cabe às ciências examinar como ocorre esse processo causal. Para isso, o cientista lança mão de teorias, como a teoria ótica (a fim de explicar como os objetos refletem a luz, como o cristalino projeta os raios de luz na retina) e nossas teorias sobre a fisiologia humana (como os cones e bastonetes na retina absorvem a luz e transmitem para o cérebro). A psicologia pode estudar nossa capacidade perceptiva e descobrir como o ser humano investiga o mundo, através de sua percepção, como esta se relaciona com a ação, não somente fornecendo informações sobre o mundo, mas buscando essas informações como resultado de nossas questões e preocupações. Nessa perspectiva, as ciências pressuporão nossa concepção comum de percepção e investigarão como esse processo acontece, propondo hipóteses explicativas mais ou menos bem corroboradas, de modo que entenderemos cada vez melhor como percebemos e conhecemos o mundo.

Também se pode examinar cientificamente a experiência que se tem, quando percebemos algo. Por exemplo, se nossas experiências são penetráveis por crenças ou não, se só contêm informações “pobres” ou se incluem conteúdos “ricos”, se têm módulos ou não, se os módulos só têm conteúdo “pobre” ou se têm conteúdo “rico”, qual a sua relação com as crenças. Cada um dos elementos da percepção pode ser investigado empiricamente, o que nos possibilitará sua compreensão mais detalhada e exata.

Tudo isso é um campo fértil de investigação científica, da qual os filósofos podem participar, e está aberto a hipóteses e discussões teóricas, talvez confirmáveis empiricamente. A meu ver, todo esse campo de investigação científica está condicionado pelo nosso conceito comum de percepção. As cores são um exemplo disso. Naturalmente, os resultados científicos podem levar a um refinamento de nossa concepção comum de percepção e a um entendimento detalhado de como a percepção das cores ocorre e de como nos orientamos por elas. Não vejo nenhuma oposição entre os resultados alcançados pelas ciências e nossa concepção comum de percepção. Justamente por isso, não haveria por que mudá-la fundamentalmente, contudo, somente refiná-la e entender melhor cada um dos seus elementos e como eles se articulam em nossa concepção comum.

Poder-se-ia afirmar que se, de um lado, argumentos filosóficos são insuficientes para mudar nossa concepção comum, porque a oposição entre eles leva à suspensão do juízo, resultados experimentais, de outro, podem nos fazer rever aspectos de nosso conceito comum. Para avaliar esse impacto das ciências naturais, seria preciso um estudo específico e detido. A visão cética do mundo, vale a pena repetir, começa com uma descrição da concepção comum, todavia, deve também investigar os resultados alcançados pelas ciências e refletir filosoficamente sobre eles.

A concepção que acabo de delinear me parece inteiramente compatível com o que assevera Sexto Empírico, ao menos na interpretação de Porchat (2013PORCHAT, O. A noção de phainómenon em Sexto Empírico. Analytica, v. 17, n. 2, p. 291-323, 2013., p. 305-309). Segundo Porchat (2013PORCHAT, O. A noção de phainómenon em Sexto Empírico. Analytica, v. 17, n. 2, p. 291-323, 2013., p. 307), “[...] os objetos (phainómena) levam o sujeito a dar assentimento a afecções (páthe) por eles causadas e que se configuram como phantasía em sua diánoia [intelecto].” Porchat (2013PORCHAT, O. A noção de phainómenon em Sexto Empírico. Analytica, v. 17, n. 2, p. 291-323, 2013., p. 308) repete essa ideia, logo em seguida: “Quando o phainómenon impacta a diánoia e nela dá origem à phantasía, o assentimento a esta se impõe de necessidade, isto é, o sujeito não pode não reconhecer que está experienciando a phantasía que corresponde ao phainómenon em questão.” Por conseguinte, o objeto causa em nossa mente uma phantasia, a qual é uma experiência perceptiva que temos desse objeto. Espero que esse breve resumo baste para que se perceba a notável semelhança com o que se frisou acima.

A única diferença com o que propus está na tradução de phantasia. Porchat (2013PORCHAT, O. A noção de phainómenon em Sexto Empírico. Analytica, v. 17, n. 2, p. 291-323, 2013., p. 308) propõe traduzir por “representação”. Não me parece boa tradução. Se o cético entender a phantasía como uma “representação”, seguem-se todos os problemas denunciados por Sexto, em sua crítica às noções estoicas e acadêmicas de phantasia (2000SEXTO EMPÍRICO. Outlines of Pyrrhonism. Tradução, introdução e notas de J. Annas e J. Barnes. Cambridge: Cambridge University Press, 2000., 2.70-79; 2012SEXTO EMPÍRICO. Against the physicists. Tradução e edição de R. Bett. Cambridge: Cambridge University Press, 2012., 7.370-439; PORCHAT, 2007PORCHAT, O. Rumo ao ceticismo. São Paulo: Editora da Unesp, 2007., p. 101-107). Bury (1983BURY, R. G. Sextus Empiricus II: Against the logicians. London/Cambridge. Massachusetts: William Heinemann/Harvard University Press, 1983.) traduz por presentation e Porchat, antes de publicar seu artigo, pensou em seguir Bury e traduzir por “presentação”. Mas argumentei que, segundo um dicionário que consultei, era um português arcaico e ninguém entenderia o que ele quer dizer. Sugeri “apresentação”, mas Porchat não gostou e preferiu voltar a “representação”. Entretanto, a meu ver, quando a mente é afetada por um objeto, o objeto se apresenta à mente, isto é, a mente percebe o objeto, não sua “representação”. Por isso, não me parece feliz a afirmação de Porchat (2013PORCHAT, O. A noção de phainómenon em Sexto Empírico. Analytica, v. 17, n. 2, p. 291-323, 2013., p. 307), segundo a qual “[...] nosso acesso ao mundo, isto é, nosso acesso aos phainómena, tem lugar em nossa diánoia.”

Porchat parece voltar, ao menos em parte, à sua antiga interpretação de um mentalismo no pirronismo antigo, quando a noção de phainómenon era interpretada como uma entidade mental e, portanto, como um dogmatismo implícito dos pirrônicos antigos (PORCHAT, 2007PORCHAT, O. Rumo ao ceticismo. São Paulo: Editora da Unesp, 2007., p. 100, 108-110). Agora, o phainómenon é, decerto, um objeto no mundo, mas a sua phantasia na diánoia é compreendida como uma representação por meio da qual a mente teria acesso ao objeto. Ora, se a phantasia fosse uma representação, o problema do mundo exterior ressurgiria com toda a sua força. Tivesse Porchat entendido a phantasia como uma apresentação do objeto na mente, então, a impressão de um retorno àquela velha interpretação se dissiparia e, portanto, a objeção ao pirronismo continuaria sem nenhuma força. O neopirronismo, concebendo a phantasia meramente como a apresentação do phainómenon à diánoia, não incide em dogmatismo, nem levanta o problema do mundo exterior. De fato, para voltar ao nosso tópico, está perfeitamente de acordo com a ideia de que os objetos se apresentam a nós como coloridos.

Referências

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    Agradeço a André Vasques Abreu, Israel Vilas Bôas, Oscar Moreira dos Santos e, especialmente, a Raquel Albieri Krempel, cujos comentários e sugestões me ajudaram a corrigir e reformular uma versão prévia deste artigo, evitando alguns erros e tornando algumas ideias mais precisas. Agradeço também ao parecerista, cujos comentários úteis e cuidadosos me levaram a reformular diversas passagens.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    07 Ago 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    12 Set 2022
  • Aceito
    21 Fev 2023
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