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Apresentação

APRESENTAÇÃO

Em que medida a relação juventude e ensino médio pode representar provocações ainda instigantes na atualidade?

Não têm faltado, no Brasil, programas, projetos e discursos sobre a(s) problemática(s) que envolvem a juventude brasileira. Por isso, os autores reunidos neste Caderno buscam, a partir de pesquisas, aguçar o pensamento e exercitar a investigação em torno de contradições e discrepâncias verificadas na formulação de propostas feitas para o ensino médio, seja por reformas educacionais, seja por iniciativas locais. Nosso propósito é defender um debate político quanto à garantia

da oportunidade de uma qualificada aprendizagem para os jovens das classes populares que frequentam as escolas públicas.

Convictos da relevância desse debate, parece-nos imprescindível refletir sobre a condição dos alunos e como esta tem afetado o trabalho escolar em relação às possibilidades de melhoria da formação. Pensar nesses jovens é buscar possibilidades para enxergá-los, reavivar diálogos e interpretar políticas que nos provocam no presente e nos remetem aos embates do passado.

Nesse percurso, tomando de empréstimo algumas reflexões contidas nos textos desta coletânea, ressaltamos que os autores desenvolveram, com diferentes abordagens, um conjunto de produções que, interrelacionadas, não só discutem os modos próprios de organização da escola na ótica dos jovens alunos, problematizando os sentidos que atribuem à vivência escolar, mas também apontam algumas perspectivas para refletirmos sobre o ensino médio, que vem sendo historicamente objeto de conflito no campo educacional.

Em meio a esse movimento, pensar esse tema com um grupo de professores, pesquisadores, é revisitar os vinte anos em que estive trabalhando numa escola pública estadual, ministrando aulas de Filosofia da Educação para moços e moças que me inspiravam e instigavam. Hoje, meus trabalhos de pesquisa na universidade são endereçados a eles, buscando sistematizar os saberes que circulam no cotidiano escolar.

Em meados da década de 1990, período marcado pela implementação da LDB n. 9.394, de 1996, as salas de aula ficaram lotadas. Os jovens alunos enchiam o ambiente com seus risos, questionamentos, caprichos, adereços, vestimentas, ousadias e conflitos, entre outros. Com atitudes contraditórias, ora se mostravam participativos, interagindo com os colegas, durante a realização de atividades, ora se manifestavam arredios, agressivos e desesperançados com relação ao futuro incerto.

Esses múltiplos espaços e tempos de integração pela via da instituição de ensino, com a intenção de dar continuidade aos estudos e introduzir-se no mercado de trabalho, foram explicitados, muitas vezes, por essa juventude pobre que conseguia chegar ao ensino médio em meio a muitas defasagens educacionais.

Sem dúvida, esse caminho de mão dupla – "prolongamento dos estudos e profissionalização" – faz parte de um legado antigo no Brasil, que cobre boa parte de sua história educacional, onde o dualismo dos sistemas escolares, estruturados a partir do paralelismo entre escolas orientadas para a continuidade dos estudos e escolas orientadas para o ingresso imediato no mercado de trabalho, tornou profundo o fosso entre educação e trabalho, que na atualidade parece assumir novas configurações.

Assim, permeando as políticas educacionais, para examinar o que tem sido feito e o muito que precisamos fazer pela juventude que se encontra no ensino médio, exploramos nas páginas desta publicação as experiências daqueles que vivem sob o jugo de muitas negações – por exemplo, a da "promessa" da escola para todos e de qualidade, que pode se traduzir em maior vigor para um contingente de jovens excluídos de realização humana. Nessa direção, alguns autores trazem pesquisas feitas nas regiões Norte e Sudeste do Brasil, sobre as expectativas juvenis e as experiências oferecidas por suas escolas, também focalizando e refletindo algumas das políticas educacionais reformadoras adotadas para o ensino médio no país, a partir de 1990.

Nesses termos, o primeiro artigo se propõe a analisar a obrigatoriedade da escola média, recentemente fixada pela lei educativa argentina, colocando em questão seu histórico atravessado por critérios de seleção excludente.

Na sequência, o segundo artigo busca analisar alguns objetivos e metas propostas para o ensino médio, pelo "antigo" Plano Nacional de Educação (PNE – Lei n. 10.172/01), no sentido de avaliar quais deles foram totalmente alcançados, quais foram parcialmente alcançados e quais não foram atingidos, visto que um novo PNE está sendo proposto. Por outro lado, também avalia em que medida o alcance ou não das metas propostas no início da década passada influencia na percepção e nas expectativas dos alunos do ensino médio em relação ao seu ingresso no ensino superior, num futuro próximo.

No terceiro artigo, os autores analisam quinze proposições que foram apresentadas na Câmara Federal, no período posterior à aprovação da proposta do Ensino Médio Inovador pelo Ministério da Educação (MEC) e pelo Conselho Nacional de Educação (CNE). Conclui-se que, na contramão de uma proposta inovadora para o ensino médio, o Congresso brasileiro insiste na apresentação de projetos de lei que incluam disciplinas obrigatórias na escola, contemplando diferentes conteúdos, a partir de uma perspectiva fragmentada do currículo.

O quarto artigo procura analisar as inflexões ocorridas nas políticas para o ensino médio no Brasil, a partir de 2007, problematizando o contexto em que foram produzidas e as contradições presentes nesse processo. Procura identificar as mudanças empreendidas, os discursos que lhes deram sustentação e as medidas e programas governamentais decorrentes.

O quinto artigo discute os resultados de uma pesquisa realizada com estudantes do Pará sobre as relações entre projetos de vida de jovens e as escolas públicas de ensino médio. Os dados foram coletados em 2009, por meio de doze Grupos de Diálogos com 245 jovens, realizados em duas cidades do interior do estado (Moju e Santarém) e na capital. A partir dos depoimentos dos jovens, foi possível identificar algumas contribuições das escolas à realização de suas demandas e expectativas,

mas também muitas lacunas e impasses.

O artigo "Juventude, trabalho e escola: elementos para análise de uma posição social fecunda" é o sexto deste Caderno e se propõe a analisar a questão, no quadro particular da situação brasileira, a partir de dois movimentos: primeiramente, pela constituição da noção de juventude como posição social e analítica desta sociedade; em segundo lugar, pelo uso da "ferramenta" na análise da importância relativa da escola e do trabalho na transição do jovem para a vida adulta, a partir do estudo do caso particular de um conjunto de jovens de periferia do Rio de Janeiro.

Na seção Caleidoscópio, apresentamos os apontamentos de uma pesquisa atrelada às políticas para a formação de professores no estado do Rio de Janeiro. A pesquisa, realizada numa escola pública estadual em Campos dos Goytacazes, mostra a complexidade dessa formação, que atinge um considerável contingente de jovens que buscam o exercício do magistério e a profissionalização.

Por fim, produz-se, nesta coletânea, um ciclo que articula a produção da política educacional às realizações do contexto das práticas escolares. Lançar-se nessas discussões é criar canais para a valorização do ensino médio, negando os ceticismos, potencializando e refinando, de acordo com De Rossi (2001), procedimentos decisórios democráticos, constituintes das práticas sociais capazes de influenciar na definição de políticas de interesses públicos a favor da juventude brasileira.

LENY CRISTINA SOARES SOUZA AZEVEDO

(Organizadora)

  • DE ROSSI, V.L.S. Desafio à escola pública: tomar em suas mãos seu próprio destino. Cadernos CEDES, Campinas, v. 21, n. 55, p. 127-144, 2001.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    18 Out 2011
  • Data do Fascículo
    Ago 2011
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