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Efeito da idade relativa nas categorias do futebol brasileiro: critérios de seleção ou uma tendência populacional?

The relative age effect on the categories of Brazilian soccer: selection criteria or a population trend?

Efecto de la edad relativa en futbolistas de la cantera en el fútbol brasileño: ¿criterios de selección o tendencia de la población?

Resumo

O objetivo deste estudo consistiu em comparar a frequência de datas de nascimento entre atletas de futebol e a população brasileira e verificar possíveis diferenças entre categorias. Participaram 868 atletas avaliados entre 2001 a 2009, pertencentes às categorias sub-15, sub-17, sub-20 e profissional. As datas de nascimento foram classificadas por trimestres. Usou-se o teste qui-quadrado para análise, adotou-se P < 0,05. Houve diferença significativa entre os quartos de ano, com tendência a nascimentos no primeiro semestre, similar à distribuição da população brasileira. Não foram identificadas diferenças significativas entre as categorias. Concluiu-se que há uma tendência de nascidos no início do ano que desfavorece possíveis talentos nascidos no fim do ano competitivo.

PALAVRAS-CHAVE
Efeito da idade relativa; Data de nascimento; Futebol; Talento

Abstract

The purpose of this study was to compare the birth dates of soccer players and the Brazilian population as well as assess possible differences among categories. 868 players participated in this study, distributed according to the U-15, U-17, U-20 and professional categories. The birth dates were classified by quartiles. The chi-square test was used for the analyses, considering P < 0.05. Significant difference was identified among quartiles of births with a tendency to births in the first half, similar to the distribution of the Brazilian population. No differences were significant among categories. It was concluded that there is a tendency for births in the beginning of the year, discouraging potential talent ones who were born at the end of the competitive year.

KEYWORDS
Relative age effect; Birth date; Soccer; Talent

Resumen

El objetivo de este estudio fue comparar la frecuencia de las fechas de nacimiento entre jugadores de fútbol y la población brasileña, e investigar las posibles diferencias entre categorías. Participaron 868 jugadores nacidos entre 2001 y 2009, y pertenecientes a las categorías sub-15, sub-17, sub-20 y profesional. Las fechas de nacimiento se clasificaron por trimestres. Se utilizó la prueba de chi cuadrado y se utilizó el valor de P < 0,05. Hubo diferencias significativas entre los diferentes cuatrimestres, con tendencia al nacimiento en el primer semestre, de forma similar a la distribución de la población brasileña. No hubo diferencias significativas entre las categorías. Se concluye que existe una tendencia de nacimientos a principios de año, lo cual trae consigo una desventaja para aquellos posibles talentos que nacen a finales del año competitivo.

PALABRAS CLAVE
Efecto de la edad relativa; Fecha de nacimiento; Fútbol; Talento

Introdução

No contexto esportivo, muitos fatores são relevantes para determinação do sucesso de um jogador de futebol e a exigência para a prática em alto nível competitivo é multifatorial, justifica a complexidade de predizer o desempenho esportivo de jovens atletas. Em esportes nos quais a composição corporal, potência e força são determinantes para o desempenho, indivíduos precocemente maturados tendem a ter vantagem sobre seus pares que apresentam maturação tardia, considerando a mesma idade cronológica (Malina, 1998Malina RM. Growth and maturation of young athletes: is training for sport a factor? In: Chang KM, Micheli L, editors. Sports and children. Hong Kong: Williams & Wilkins; 1998. p. 133-61., 1994Malina RM. Physical growth and biological maturation of young athletes. Exerc Sport Sci Rev. 1994;22:389-433.). Entre a fase da infância e da adolescência (9-16 anos), indivíduos em estado de maturação biológica avançada apresentam vantagens na composição corporal, massa isenta de gordura e em uma série de componentes físicos, como potência aeróbia, força, resistência e velocidade (Malina et al., 2009Malina RM, Bouchard C, Bar-Or O. Crescimento maturação e atividade física. 2nd ed. São Paulo: Phorte; 2009.).

Concomitantemente, sugere-se ainda que competições baseadas na idade cronológica que envolvam atletas jovens não só dão vantagem aos indivíduos precocemente maturados, mas também àqueles que nascem no início do ano competitivo (Helsen et al., 2005Helsen WF, Winckel JV, Williams AM. The relative age effect in youth soccer across Europe. J Sports Sci. 2005;23:629-36.; Brewer et al., 1995Brewer J, Balsom P, Davis J. Seasonal birth distribution amongst European soccer players. Sports Exerc Inj. 1995;1:154-7.).

Comparações entre datas de nascimento que envolvem atletas jovens e profissionais de esportes como beisebol, hóquei, rugby, futebol e tênis revelaram uma distribuição assimétrica que favorece indivíduos nascidos no início do ano (Musch e Grondin, 2001Musch J, Grondin S. Unequal competition as an impediment to personal development: a review of the relative age effect in sport. Dev Rev. 2001;21:147-67.). Esse fenômeno é denominado efeito da idade relativa (EIR) (Barnsley; Thompson; Barnsley, 1985Barnsley RH, Thompson AH, Barnsley PE. Hockey success and birthdate: the RAE. Canadian Association for Health, Physical Education, and Recreation Journal. 1985;51:23-8.). Musch e Hay (1999)Musch J, Hay R. The relative age effect in soccer: cross-cultural evidence for a systematic discrimination against children born late in the competition year. Sociol Sport J. 1999;16:54-64. e Brewer et al. (1995)Brewer J, Balsom P, Davis J. Seasonal birth distribution amongst European soccer players. Sports Exerc Inj. 1995;1:154-7. já demonstravam uma distribuição assimétrica de datas de nascimento de jogadores de futebol profissional da Suécia, da Alemanha, do Japão e da Austrália, com tendência para nascimentos no primeiro semestre, mais especificamente no primeiro quarto do ano competitivo. Um importante estudo de Helsen et al. (2005)Helsen WF, Winckel JV, Williams AM. The relative age effect in youth soccer across Europe. J Sports Sci. 2005;23:629-36., que envolveu jogadores de futebol europeus das categorias sub-15 a sub-18, apresentou uma prevalência de nascidos no primeiro trimestre do ano competitivo. Da mesma maneira, dados recentes de Mujika et al. (2009)Mujika I, Vaeyens R, Matthys SP, Santisteban J, Goiriena J, Philippaerts R. The relative age effect in a professional football club setting. J Sports Sci. 2009;27:1153-8., Wiium et al. (2010)Wiium M, Lie SA, Ommundsen Y, Enksen HR. Does relative age effect exist among norwegian professional soccer players? Int J Appl Sports Sci. 2010;22:66-76. e Altimari et al. (2011)Altimari JM, Altimari LR, Paula L, Bortolotti H, Pasquarelli BN, Ronque ER, et al. Distribuição do mês de nascimento dos jogadores das seleções brasileiras de futebol. Rev Andal Med Deporte. 2011;4:13-6. demonstraram a existência do EIR em jogadores espanhóis de futebol profissional e das categorias de base, jogadores profissionais noruegueses e jogadores brasileiros das categorias de base e profissional, respectivamente.

A ocorrência do efeito da idade relativa é atribuída à enorme variabilidade biológica dentro de um grupo de mesma idade cronológica, durante a infância e a adolescência (Baxter-Jones, 1995Baxter-Jones ADG. Growth and development of young athletes: should competition levels be age related? Sports Medicine. 1995;20:59-64.). Se assimetrias na distribuição de data de nascimento resultam da variabilidade da maturação biológica, pode-se afirmar que atletas maturados precocemente são favorecidos na seleção e detecção de talentos. Certamente, estudos recentes sugerem que atletas jovens de futebol que apresentam maturação física precoce podem ser preferencialmente selecionados, enquanto os maturados tardiamente, automaticamente excluídos (Malina, 2003Malina RM. Growth and maturity status of young soccer (football) players. In: Reilly T, Williams M, editors. Science and soccer. 2nd ed. London: Routledge; 2003. p. 287-306.; Malina et al., 2000Malina RM, Peña Reyes ME, Eisenmann JC, Horta L, Rodrigues J, Miller R. Height, mass, and skeletal maturity of elite Portuguese soccer players aged 11-16 years. J Sports Sci. 2000;18:685-93.; Williams e Reilly, 2000Williams AM, Reilly T. Talent identification and development in soccer. J Sports Sci. 2000;18:657-67.).

A categorização de jogadores jovens de futebol usa um sistema similar ao empregado na maioria das organizações educacionais, baseado na idade cronológica. Essa categorização objetiva uma apropriada participação e igualdade de oportunidades. Com esse propósito, a maioria dos países adota as regras e os regulamentos da Fifa (Federation Internationale de Football Association), a qual usa o ano de nascimento como critério de seleção e define 1º de janeiro como data-limite. Entretanto, essa regra é demasiadamente simplista para agrupamento por faixa etária, na medida em que acarreta diferenças entre jovens da mesma idade cronológica considerando aqueles indivíduos nascidos logo após a data-limite do ano e aqueles nascidos quase um ano após. Por exemplo, considerando 1º de janeiro como data-limite do ano, aqueles nascidos logo após essa data (ex.: 5 de janeiro) são cronologicamente mais velhos do que aqueles que nasceram quase um ano após (ex.: 30 de dezembro) (Vaeyens et al., 2005Vaeyens R, Philippaerts RM, Malina RM. The relative age effect in soccer: a match-related perspective. J Sports Sci. 2005;23:747-56.). Nos casos em que as categorias são organizadas em períodos de 24 meses, essas diferenças são maximizadas no contexto esportivo quando comparadas com o contexto educacional (Mujika et al., 2009Mujika I, Vaeyens R, Matthys SP, Santisteban J, Goiriena J, Philippaerts R. The relative age effect in a professional football club setting. J Sports Sci. 2009;27:1153-8.), já que existem variabilidades significativas que envolvem fatores como aspecto emocional, motivação e experiência (Hirose, 2009Hirose N. Relationships among birth-month distribution, skeletal age and anthropometric characteristics in adolescent elite soccer players. J Sports Sci. 2009;31:1-8.).

Até o presente momento, é notória a escassez de estudos científicos sobre o efeito da idade relativa que envolve atletas brasileiros de futebol. É identificado um número maior de publicações na literatura internacional, o que origina um viés na comparação de dados considerando diferenças no calendário esportivo competitivo. Considerando tais fatos, duas hipóteses foram destacadas: a distribuição das frequências de datas de nascimento de atletas pertencentes à equipes brasileiras de futebol é diferente da distribuição de frequências de nascimentos da população brasileira; e não há diferença entre a distribuição de frequência de datas de nascimento entre as categorias de base e categoria profissional.

Portanto, o objetivo deste estudo consistiu em identificar e comparar a frequência de datas de nascimento por períodos do ano (quartos de ano) entre atletas de futebol e a população geral brasileira; e verificar as possíveis diferenças entre as distribuições da frequência de datas de nascimento por categorias.

Material e métodos

Amostra

Participaram do estudo 868 jogadores de futebol de sete equipes avaliadas no Centro de Excelência Esportiva (Cenesp/UEL) entre 2001 e 2009, pertencentes às categorias sub-15 (n = 120), sub-17 (n = 182), sub-20 (n = 283) e profissional (n = 283). As categorias sub-15 e sub-17 foram representadas por equipes que disputavam competições regionais e estaduais e as categorias sub-20 e profissional foram representadas por equipes que disputavam competições estaduais e nacionais.

Procedimentos

Para determinar a frequência absoluta (F) e frequência relativa (FR) de jogadores nascidos em diferentes períodos do ano foi feita análise descritiva das datas de nascimento. Essas foram classificadas por quartos de ano, ou seja, janeiro a março (Q1), abril a junho (Q2), julho a setembro (Q3) e outubro a dezembro (Q4), com 1º de janeiro como data-limite de início da temporada esportiva. Os dados foram devidamente filtrados com intuito de evitar a repetição de sujeitos em anos consecutivos.

Para análise de datas de nascimento da população geral brasileira, foi feito um levantamento de informações na base de dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) referentes aos nascidos em cada ano entre 1984 e 2002, por mês de nascimento. Posteriormente, foram classificados por quartos de ano. Determinou-se assim a frequência absoluta e a frequência relativa de nascimentos. Usou-se o período de 1984 a 2002 para equivalência dos dados com a presente amostra, na qual os sujeitos nasceram entre 1975 e 1996.

Os atletas e responsáveis foram previamente informados de forma verbal e escrita sobre o modelo do estudo e receberam um termo de consentimento livre e esclarecido, que foi assinado após total concordância em participar da pesquisa. Este estudo foi previamente aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa Local da Universidade Estadual de Londrina, protocolo nº 242/2009.

Tratamento estatístico

O teste não paramétrico qui-quadrado (χ2) foi usado para análise das diferenças entre as distribuições de data de nascimento observadas e esperadas e das possíveis diferenças entre as categorias. As distribuições de datas de nascimento esperadas foram calculadas a partir dos dados da população geral brasileira, disponíveis entre 1984 e 2002, na página do IBGE (http://www.ibge.gov.br/home, acesso em 04/09/12). Para a análise estatística foi usado o software SPSS 18.0 e o nível de significância adotado foi P < 0,05.

Resultados

Os resultados do presente estudo demonstraram diferenças estatisticamente significativas (χ2 = 70,55; g.l. = 3; P = 0,000/χ2 esperado = 7,815; g.l. = 3; P < 0,05) entre as frequências de datas de nascimento de jogadores de futebol, divididas em quartos do ano. A distribuição de datas de nascimento dos jogadores de futebol foi similar à distribuição apresentada pela população brasileira de 1984 a 2002 (IBGE), conforme ilustrada na tabela 1.

Tabela 1
Distribuição de datas de nascimento dos jogadores de futebol da amostra do presente estudo (nascidos entre 1975-1996) e da população brasileira (nascidos entre 1984-2002), por períodos do ano

Não foram identificadas diferenças estatisticamente significativas (χ2 = 10,86; g.l. = 9; P = 0,285/χ2 esperado = 16,91; g.l. = 9; P < 0,05) entre as frequências de datas de nascimento divididas por quartos do ano quando comparamos as diferentes categorias de futebol. Fica evidente nas figuras 1 e 2 que tanto nas categorias de base quanto na categoria profissional a distribuição de datas de nascimento se direciona para o início do ano.

Figura 1
Frequência de datas de nascimento dos jogadores de futebol por categoria, divididos por quartos do ano.

Figura 2
Frequência de datas de nascimento dos jogadores de futebol por categoria, divididos por semestre.

A partir da tabela 2, pode-se observar que 34,2% dos atletas da categoria sub-15, 36,8% da sub-17, 39,9% da sub-20 e 32,3% da profissional nasceram nos três primeiros meses do ano (Q1).

Tabela 2
Distribuição de datas de nascimento de cada categoria, dividido por períodos do ano

Discussão

De acordo com os resultados obtidos no presente estudo, foi verificada diferença estatisticamente significativa entre a frequência de datas de nascimento de jogadores de futebol, divididas por quartos de ano, que apresentou uma prevalência de atletas nascidos em Q1. Esse resultado está de acordo com estudos de Brewer et al. (1995)Brewer J, Balsom P, Davis J. Seasonal birth distribution amongst European soccer players. Sports Exerc Inj. 1995;1:154-7., Musch e Hay (1999)Musch J, Hay R. The relative age effect in soccer: cross-cultural evidence for a systematic discrimination against children born late in the competition year. Sociol Sport J. 1999;16:54-64., Helsen et al. (2005)Helsen WF, Winckel JV, Williams AM. The relative age effect in youth soccer across Europe. J Sports Sci. 2005;23:629-36., Mujika et al. (2009)Mujika I, Vaeyens R, Matthys SP, Santisteban J, Goiriena J, Philippaerts R. The relative age effect in a professional football club setting. J Sports Sci. 2009;27:1153-8. e Wiium et al. (2010)Wiium M, Lie SA, Ommundsen Y, Enksen HR. Does relative age effect exist among norwegian professional soccer players? Int J Appl Sports Sci. 2010;22:66-76., nos quais foram evidenciadas predominâncias de datas de nascimento no primeiro quarto (Q1) do ano esportivo de países europeus e asiáticos. Interessante destacar que, apesar de alguns países usarem diferentes datas-limite como critério para início da temporada esportiva (1º janeiro ou 1º agosto), nota-se, ainda assim, a ocorrência do fenômeno EIR.

Sendo a ocorrência do EIR atribuída à enorme variabilidade biológica dentro de um grupo de mesma idade cronológica, durante a infância e adolescência (Baxter-Jones, 1995Baxter-Jones ADG. Growth and development of young athletes: should competition levels be age related? Sports Medicine. 1995;20:59-64.), aqueles em vantagem na idade relativa, quando comparados com os semelhantes, parecem ter consideráveis vantagens físicas (estatura, peso corporal e força), as quais podem afetar a percepção de potencial talento e predição de sucesso esportivo. Sugere-se, então, que atletas jovens de futebol os quais apresentam maturação física precoce podem ser preferencialmente selecionados, enquanto os maturados tardiamente, automaticamente excluídos.

Diante do exposto, três argumentos podem ser destacados para explicar o EIR verificado no presente estudo: 1) o atual processo de detecção e seleção de talentos é, expressivamente, influenciado pelos atributos físicos do jovem, em vez das suas habilidades técnicas; 2) as competições das categorias de base são organizadas por períodos bianuais (ex.: sub-15, sub-17); 3) a idade precoce em que se iniciam as competições de alto nível no futebol quando comparada com a de outros esportes.

Ainda, de acordo com os resultados obtidos, identificou-se uma semelhança na distribuição de datas de nascimento da presente amostra com os dados estatísticos da população brasileira, que correspondeu a 28,3% para Q1 e 28,1% para Q2, o que rejeitou a primeira hipótese apresentada no nosso estudo. Considerando o restrito acesso aos dados da população brasileira, houve a impossibilidade de fazer análise estatística para comparação entreos quartos, embora visualmente note-se uma tendência de nascimentos no início do ano referente a 1984-2002.

Dessa maneira, parece não consistir na forma como os clubes brasileiros fazem o processo de detecção e seleção de talentos, preferem os mais velhos e maturados, mas, sim, uma tendência de nascimentos nos primeiros meses do ano da população brasileira de uma maneira geral. Entretanto, é uma situação que deve ser analisada com cautela considerando a exclusão automática de possíveis jovens talentos por parte de treinadores justificada apenas por uma tendência populacional, descarta-se a possibilidade do desenvolvimento de uma carreira esportiva para esses jovens.

Por fim, no presente estudo, foi observada uma predominância de nascidos no primeiro quarto do ano em todas as categorias analisadas e um aumento estatístico não significativo do EIR entre as categorias de base, o que confirma a segunda hipótese apresentada. O fato de apresentar um aumento do EIR entre as categorias de base pode ser explicado pela heterogeneidade da presente amostra, a qual se originava de equipes de futebol de diversos estados brasileiros, além de possíveis diferenças na filosofia de trabalho dos clubes e seus critérios estabelecidos no processo de detecção e seleção de talentos.

Em contrapartida, em um estudo de Altimari et al. (2011)Altimari JM, Altimari LR, Paula L, Bortolotti H, Pasquarelli BN, Ronque ER, et al. Distribuição do mês de nascimento dos jogadores das seleções brasileiras de futebol. Rev Andal Med Deporte. 2011;4:13-6., no qual analisaram o EIR em jogadores das categorias de base e profissional da seleção brasileira de futebol, foi relatada uma predominância de datas de nascimento nos quatro primeiros meses do ano (janeiro-abril), constatando uma diminuição do EIR conforme o avanço das categorias. Apesar da similaridade de resultados, nossa investigação constatou a diminuição descrita pelos autores supracitados somente entre a categoria sub-20 e profissional, confirmando os achados de Mazzucco (2007)Mazzucco MA. Relação entre maturação e variáveis antropométricas, fisiológicas e motoras em atletas de futebol de 12 a 16 anos. 2007. 76f. Dissertação (Mestrado)–Curso de Educação Física, Departamento de Educação Física, UFPR, Curitiba, 2007., o qual relatou que na medida em que se avança das categorias de base às categorias profissionais, tais frequências de nascimentos tendem a se modificar, ou seja, o EIR torna-se menor.

Conclusão

O presente estudo demonstrou que, para a amostra avaliada, há uma tendência de jogadores do futebol brasileiro nascidos no início do ano, mais especificamente entre janeiro e março. Ademais, a distribuição de datas de nascimento dos jogadores de futebol foi similar à distribuição apresentada pela população brasileira de 1984 a 2002. E, por fim, não foi observada diferença entre as frequências de datas de nascimento entre as categorias analisadas.

Conclui-se, então, que muitos jovens talentosos podem ser subestimados simplesmente por nascerem no fim do ano e, por consequência, pelos seus atributos físicos inferiores. Considerando a atual categorização das competições de jovens futebolistas em períodos bianuais, baseada na idade cronológica, potencializa-se o cenário de desvantagens físicas, cognitivas e experiência de jogo para aqueles que apresentam idade biológica inferior à cronológica, principalmente aqueles que compõem o grupo de novatos da categoria.

Em um esporte como o futebol, no qual o desenvolvimento físico avançado é determinante, os jogadores mais jovens (biologica e cronologicamente) estão em considerável desvantagem. Por conseguinte, sugerem-se novos estudos longitudinais em que haja o acompanhamento de jogadores em formação, considerando seus atributos físicos, maturacionais e técnicos relacionados ao desempenho no ambiente real de jogo. São sugeridos, ainda, estudos que quantifiquem o número de jovens jogadores, identificados como potenciais talentos pela maturação avançada na fase de formação, que se tornaram atletas profissionais em equipes de alto nível competitivo. Tais medidas são importantes para melhorar o processo de seleção de atletas e evitar prejuízos quanto à perda desses talentos em potencial, ponderando o exacerbado investimento financeiro de clubes e centros esportivos, destinado ao processo de desenvolvimento de seus atletas.

Portanto, o entendimento do impacto do EIR sobre jovens esportistas pode modificar a maneira como atletas, pais, treinadores e federações percebem o potencial talento e predizem o sucesso esportivo.

Referências

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Oct-Dec 2016

Histórico

  • Recebido
    31 Mar 2013
  • Aceito
    13 Jan 2014
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